A questão
das pausas no trabalho veio recentemente à ribalta porque se tornou público que
um tribunal autorizou a Galp Espanha a descontar do salário dos trabalhadores
as pequenas pausas diárias, ao passo que, tal como foi dito, essa penalização
não será aplicada em Portugal.
A convicção,
até há pouco tempo estribada na intuição, mas com o tempo aferida pelas investigações,
é a de que parar é essencial para o trabalhador e o empresário pode ver
aumentada a produtividade. E, aumentada esta, é possível apostar na competitividade.
Por alguma razão, acontece que, sendo Portugal o país em que os trabalhadores trabalham
muitas horas por dia e por semana, fica bastante abaixo na produtividade e competitividade
em relação a países onde se trabalha durante menos tempo.
É óbvio que
os fatores da pouca produtividade e competitividade não se cingem à falta de pausas,
mas sobretudo ao défice de organização e gestão da empresa/serviço e do
trabalho e à falta de formação de muitos trabalhadores, falha imputável
predominantemente às entidades patronais e gestoras, bem como à aposta em
salários baixos a par de remunerações altas aos trabalhadores-sanduíche. Se excetuarmos,
a pausa para o almoço – que usualmente é de 90 minutos, a menos que a empresa/serviço
disponha de refeitório ou similar, em pode baixar para 1 hora – não costumam
estar previstas outras pausas laborais nos contratos de trabalho. Não obstante,
muitas empresas têm normas e regulamentos internos que são comunicados aos
trabalhadores. E muitos dos gestores vêm tolerando pequenas pausas de 5 a 10
minutos para tomar um café ou outra bebida (de preferência não alcoólica), fumar um cigarro, apanhar ar e, se o trabalho é demasiado
sedentário por natureza, para esticar os músculos dos braços e das pernas.
É óbvio que
este regime de tolerância se presta a abusos, que alguns gestores, em vez de
exercerem o seu poder de moderação e a sua capacidade de motivação sobre os trabalhadores,
fazem finca-pé no horário observado milimetricamente – como se a presença fosse
meio caminho andado – e na intolerância em relação ao regime de faltas,
licenças e férias, como se daí resultasse maior eficiência, bem como ao agravamento
das condições de trabalho. Depois, queixam-se das baixas médicas ditas
excessivas e das situações de doença prolongada. De facto, cortar muito rente as
unhas leva os dedos a sangrar, originando eventuais despesas evitáveis.
Talvez seja
oportuno referir as condições de trabalho por que passam as escolas desde 2005,
em que, a par do reduzido número de auxiliares de ação educativa, vulgo assistentes
operacionais, os professores passam imenso tempo a dar aulas de 45 ou 50
minutos – sendo vigiados, em muitos casos os seus momentos de entrada na sala
de aula e os de saída dela, bem como a implacabilidade de eventual interrupção
da aula (incluindo
eventual ida à casa de banho) – e a
cumprir uma componente não letiva em que passam a maior parte do tempo com
alunos e em que os intervalos de 15 minutos, 10 ou 5 não são contados como
tempo de serviço, como se nesses tempos fosse possível irem tratar de algum
assunto pessoal ou familiar. E tentou-se que os intervalos que as crianças do
1.º Ciclo têm a meio da manhã ou a meio da tarde não contassem como tempo de
serviço. Depois, passou a poder contar-se, mas o professor/a teria que se
responsabilizar por algo de mal que acontecesse às crianças. Credo!
Está visto
que interromper o trabalho por 5 ou 10 minutos é uma necessidade e uma mais-valia,
para o trabalhador e para a entidade patronal. Assim, Filipa Jardim da Silva,
psicóloga clínica e coach alerta:
“Por mais que muitas empresas continuem a
pedir uma dedicação plena, sem intervalos nem distrações, não nos podemos
esquecer das nossas caraterísticas e necessidades, nem ignorar os dados
elaborados nos últimos anos em torno da produtividade”.
A predita especialista,
mencionando um estudo que analisou 5,5 milhões de registos diários de pessoal
dum escritório, segundo o qual os profissionais mais produtivos trabalham em
média 52 minutos até fazerem uma pausa de cerca de 17, refere:
“São muitos os estudos que, nos últimos
anos, têm aferido os múltiplos benefícios de micropausas ao longo de um dia de
trabalho ou de estudo, seja para garantir maiores níveis de saúde física e
mental, seja para favorecer a maior eficácia”.
Uma assistente
de backoffice em empresa de trabalho
temporário diz-se familiarizada com uma política de intervalos definida pela
empresa: direito a 5 minutos de pausa por cada hora de trabalho. Assim, além da
hora do almoço, há direito a 40 minutos diários utilizáveis ad libitum, não se contando como pausas
deste jaez as idas à casa de banho, apesar de a empresa já o ter tentado.
Porém, esta gestão flexível não se verifica em todos os departamentos, pois
quem atende o público, apesar de usufruir dos mesmos 40 minutos por dia,
precisa de autorização para parar, a fim de não haver sobreposições que
prejudiquem o serviço.
Filipa Silva
não tem dúvida de que as pausas regulares, a cada hora, promovem não só maior
produtividade, mas ainda melhor capacidade de decisão e de resolução de
problemas, maiores níveis de criatividade, maior consolidação de aprendizagens
e de memórias e níveis de motivação mais sustentáveis. E, sendo importantes
para todos, revestem-se de mais importância para a produtividade de quem tem
empregos cerebrais ou trabalho em áreas criativas. E a psicóloga, reconhecendo
que tais pausas revitalizam a capacidade de atenção, assegura:
“Para tarefas que exijam mais do nosso
cérebro do que do nosso corpo, a estrutura do córtex pré-frontal é
particularmente requerida. É esta área do nosso cérebro que nos ajuda a manter
focados nos objetivos e é também esta área que é responsável pelo funcionamento
lógico, funções cognitivas superiores e capacidade de tomada de decisão em
detrimento de impulsos.”.
Também
Dalila Madureira, designer e diretora
de arte numa agência de comunicação, frisa:
“É muito contraproducente insistir em vez de
parar para arejar. No caso de bloqueio, insistir significa passar horas de
volta de um trabalho sem necessidade. Por norma, quando se está bloqueado,
basta parar um bocado e ir fazer outra coisa que, quando se volta, sai tudo com
mais facilidade e mais rapidamente.”.
Todavia,
como as pausas não apresentam todas as mesmas vantagens e, para que realizem o
seu propósito, há que assegurar uma mudança de foco, avisa Filipa Silva:
“Se vamos continuar a falar sobre trabalho
ou a dizer mal do/a colega do lado, naturalmente, este tempo não será tão
eficaz como poderia”.
E faz
sentido fazer algum movimento físico, em escritório ou num espaço exterior,
para atenuar as longas horas passadas frente à secretária e ao computador,
aproveitando estes intervalos para abastecer o corpo com bons níveis de hidratação
e uma nutrição de qualidade, bem como para socializar e conversar um pouco, o
que reforça as relações entre colegas com vista à satisfação pessoal e à criação
e manutenção de um bom clima de trabalho.
Na verdade,
o que é importante não é o controlo rígido do horário e da presença, mas que o
trabalho apareça feito a horas, mesmo que isso implique meter mãos à obra a
desoras ou ao fim de semana. Com efeito, a questão também é: quando são
flexíveis connosco, nós somos igualmente flexíveis; e a motivação para produzir
é outra.
Assim, as pausas funcionam como o dia na produção da fotossíntese por
parte das plantas e para recarregar baterias em prol da dignificação da pessoa
humana, do bem-estar com a família (e
acompanhamento dos seus problemas) e a melhoria do desenvolvimento profissional.
2020.03.02 – Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário