domingo, 22 de março de 2020

Cuidado psicológico durante o tempo de quarentena – II



Na sequência do texto “Cuidado psicológico durante o tempo de quarentena –I”, com base na publicação da agência Ecclesia, que transcreve um conjunto de orientações da Equipa de Vida Religiosa e Sacerdotal da Unidade Clínica de Psicologia (UNINPSI) da Universidade Pontifícia de Comillas e que sintetizei e adaptei para uso também de leigos, cumpre dar conta da série de recomendações do foro psicológico e exercícios físicos de relaxamento que a mesma UNINPSI propõe na mesma peça que divulgou. Na verdade, não podemos esquecer o fenómeno da interação psicossomática e a necessidade da sua valorização.
É normal que a quarentena ofereça diferentes momentos e estados emocionais: stresse, ansiedade, solidão, frustração, tédio, aborrecimento, sentimentos de medo e falta de esperança, etc. – efeitos que podem prolongar-se depois do isolamento ou aparecer depois dele.
Importa cuidar dos próprios atos, pensamentos e sentimentos para lograr a resposta adequada aos períodos em que possa faltar o ânimo e cresça a sensação de incerteza ou desassossego.
Há quem se  encontre em isolamento, embora não esteja afetado pela doença, e está a sentir, de forma persistente ou com grande intensidade, alguma das seguintes emoções: nervosismo, agitação ou tensão, com sensação de perigo iminente e/ou pânico; pensamento obsessivo na doença ou preocupação de vir a ficar infetado(a); necessidade constante de estar a ver ou ouvir informações sobre este tema e dificuldade em se interessar por outras questões; dificuldade excessiva de concentração nos serviços quotidianos, custando imenso a realização do trabalho e ficando como que paralisado(a) pelo medo; estado de alerta, analisando continuamente as próprias sensações corporais e interpretando-as como sintomas de doença, mesmo sem serem sinais patológicos; dificuldade de controlo da própria preocupação e formulação constante de perguntas às pessoas que estão por perto sobre o estado de saúde, advertindo-as sobre os graves perigos que correm devido à situação atual; rejeição exagerada do contacto com outras pessoas, com medo de contágio; perceção dum aumento do ritmo cardíaco, da respiração acelerada, de transpiração ou tremuras sem causa justificada; dificuldade em manter um sono reparador; e agravamento ou reaparecimento dos problemas emocionais.
Nesse caso, recomenda-se a real identificação dos pensamentos causadores do mal-estar; o reconhecimento e aceitação das emoções; o questionamento do que se está a viver e procura de provas da realidade; o combate à saturação de informação; a consulta das fontes oficiais; a serena verificação da informação que se partilha, especialmente a usada nas redes sociais; a recusa do contributo para a difusão de boatos e notícias falsas; a prática dos cuidados de higiene adequados, recomendados pelas autoridades de saúde, mas tendo em conta que não é a única coisa a fazer ao longo do dia; a procura de outros assuntos de conversa; a procura de apoio nos membros da comunidade – sacerdotes, religiosos(as), familiares, colaboradores da obra de apostolado, etc.; a ajuda quem está perto a manter a calma e a desenvolver um pensamento adaptado a cada situação; o esforço por fazer vida o mais normal possível e continuar com as rotinas habituais, dentro da situação em que nos encontramos e reorganizar o horário próprio para os contextos em que não for possível mantê-las; e o cuidado com as atitudes de rejeição, estigma e discriminação.
De facto, pensar constantemente na doença pode levar a que apareçam ou se acentuem os sintomas que façam crescer o mal-estar. E a alternativa é falar sobre o que entusiasma. Talvez seja bom falar da própria situação, partilhando-a com as pessoas mais próximas – merecedoras de confiança – para encontrar a ajuda e o apoio necessário, pois as pessoas que nos apreciam sentir-se-ão melhor se souberem como estamos.
Considerando que, a partir de alguns fóruns, podem estar a ser transmitidas imagens alarmistas e excessiva informação a partir duma perspetiva negativa, engrandecendo o fenómeno e criando a perceção de ameaça maior que o normal, há que reconhecer os factos, confiar na informação dada pelos meios científicos oficiais, confirmada e veiculada por especialistas: Ministério da Saúde, Direção Geral de Saúde, Ordem dos Médicos, Organização Mundial de Saúde, outros organismos oficiais, etc. E viver constantemente conectado(a) não vai fazer com que se fique mais informado(a); só aumentará desnecessariamente a sensação de risco e nervosismo.
É bom não alimentar o próprio medo nem o dos outros. O medo pode levar-nos a comportar-nos de forma impulsiva, rejeitando ou discriminando certas pessoas. Ora, se alguém, nestes dias, se alguém se sentiu vítima de alguma destas atitudes, deve entender que há pessoas que estão ainda mais nervosas e que isto é, em princípio, fruto do próprio mal-estar.
Quem pertence a um grupo de risco tem de seguir as recomendações e medidas de prevenção ordenadas pelas autoridades de saúde e confiar nelas; informar-se de maneira realista e seguir as linhas sugeridas acima; não banalizar o próprio risco para tentar afastar a sensação de medo ou apreensão, agindo como se não estivesse a acontecer nada (uma forma natural que temos para nos protegermos face ao que nos provoca angústia ou muita preocupação), mas falar do que preocupa ou provoca medo, para poder encará-lo, sem necessidade de o esconder; não empolar o próprio risco, sendo precavido(a) e prudente sem alarmes, mas sabendo que, por vezes, o exagero serve para nos aliviarmos e protegermos do que nos assusta; não realizar ações que nos comprometam, com a pretensão pouco realista de ser invulnerável, evitando comportamentos que favoreçam atitudes de vício; e ser objetivo(a) e adotar uma perspetiva global, tendo em conta que há muitos cientistas a trabalhar nisto pelo mundo fora e que estão a dar-nos conselhos para resolver esta situação da melhor forma possível.
Quem está infetado com a doença deve seguir as recomendações anteriores e, além disso, observar o seguinte: tendo em conta que quanto mais desconhecida é uma doença, mais inquietação pode causar, deve procurar controlar os pensamentos invasivos, não imaginando o pior por antecipação; não se alarmar de forma desnecessária, sendo realista, já que os dados disponíveis apontam que a maioria das pessoas está a conseguir ficar curada; e, perante o medo, apoiar-se na experiência de situações parecidas em que houve êxito pessoal.
***
No atinente a exercícios de relaxamento, é de considerar que há diversas variantes e diferentes modalidades e cada pessoa encontra benefícios em técnicas diferentes. Aqui apresentam-se três, praticamente por transcrição: controlo da respiração; respiração diafragmática; e visualização.
Controlo da respiração
Constitui uma técnica simples contra a sensação de ansiedade, de que um dos sintomas é a respiração superficial. Pode ser posta em prática em qualquer lugar:
1. Inspirar pelo nariz em vez de respirar pela boca;
2. Respirar suave e profundamente, várias vezes;
3. Notar como o abdómen incha quando se inspira e desincha quando se expira;
4. Fazer algumas inspirações profundas pelo nariz, seguidas de expirações lentas e suaves pela boca.
Respiração diafragmática
Precisa de um pouco mais de treino e dum lugar tranquilo em que a pessoa se possa concentrar:
1. Colocar-se numa posição cómoda e tentar relaxar os músculos;
2. Colocar uma mão no peito e outra no abdómen;
3. Apanhar ar lentamente pelo nariz, levando-o até à mão que se tem em cima do abdómen, devendo ficar parada a mão do peito;
4. Quando se conseguir levar o ar até ao abdómen, retê-lo lá durante uns segundos;
5. Soltar o ar pouco a pouco pela boca, de modo que se sinta que o abdómen se vai abatendo, devendo a mão do peito continuar parada;
6. Repetir várias vezes este exercício.
Visualização
Combina as técnicas de relaxamento com as de meditação:
1. Procurar um lugar cómodo e sem interrupções;
2. Iluminar o espaço de forma suave e agradável;
3. Pôr música relaxante, mas com volume não muito alto, apenas o suficiente para que se possa escutar, mas sem perturbar nem distrair;
4. Fechar os olhos e concentrar-se na respiração, sentindo o ar que entra pelo nariz e sai pela boca;
5. Pensar num céu azul, percebendo a energia que dá o sol e centrando a atenção no sentimento que os dias assim provocam em nós;
6. Desfrutar da visão do céu durante uns minutos;
7. Juntar agora o mar à visão que se está a ter, escutando o som das ondas;
8. Inundar o cérebro com esta visão e concentrar-se nos sentimentos que ela provoca;
9. Estar cada vez mais relaxado(a) e, quando o conseguir, ver-se a si mesmo(a), nessa paisagem, caído(a) sobre a relva ou na areia da praia, sem mais ninguém à volta;
10. Durante uns minutos, desfrutar da sensação de relaxamento e paz que inunda;
11. Ver-se a si mesmo(a) a levantar-se na paisagem e começar a esticar os músculos do corpo, pouco a pouco e sem abrir os olhos;
12. À medida que for esticando, ir também tomando consciência de novo da música que envolve e, quando estiver preparado(a), abrir os olhos lentamente, sem pressas, com tranquilidade.
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Enfim, ter cuidados, mas também uma calma e uma serenidade inspiradoras. Deus não está longe nem a dormir ou de férias. Ele está connosco e ouve-nos quando O invocamos.
2020.03.22 – Louro de Carvalho

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