domingo, 13 de agosto de 2017

Em memória da 4.ª Aparição e em homenagem à Senhora de Agosto

Decorreu a 12-13 de agosto a 4.ª peregrinação internacional a Fátima no ano centenário sob o tema mariano “Santa Maria Mãe de Deus” e a coroar a 45.ª Semana Nacional de Migrações 2017 com o tema ‘Acolher o futuro – Novas gerações migrantes são o amanhã da humanidade’.
Esta peregrinação, que evoca a 4.ª aparição da Virgem do Rosário, foi presidida por Dom Rino Fisichella, Presidente do Pontifício Conselho para a Nova Evangelização.
Pessoalmente, aguardava com alguma curiosidade, por motivos que deixei explícitos noutra reflexão, pelo que este arcebispo nos iria dizer em Fátima. E, excetuando a despropositada referência, na sua homilia do dia 13 (que até foi muito boa) à profissão de latoeiro do administrador (também tive primos latoeiros) que impediu os videntes de irem à Cova da Iria para os molestar com interrogatórios e ameaças, penso que o promotor da Nova Evangelização esteve muito bem.
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Na Conferência de Imprensa que antecedeu o início da peregrinação, Dom Rino Fisichella afirmou que “o evangelho pede-nos para abrir o coração” e disse que a Igreja “não pode alhear-se da situação dos migrantes no mundo”, salientando a especificidade das migrações atuais:
“O fenómeno da migração é mundial e pertence à história da humanidade e, analisando os últimos anos, significa um grande desafio, porque o fenómeno de migração que agora vivemos é uma segunda dimensão da guerra, e não tanto pela migração, mas sim pela perda de dignidade”.
No contexto das dificuldades que obriga pessoas e povos a deixarem as suas terras, o Presidente do Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização explicou que “não se pode olhar para o lado” e explicitou a sua preocupação e o significado da sua presença em Fátima:
“Hoje no mundo milhões de pessoas estão privadas de dignidade, sem trabalho, e a minha presença em Fátima quer recordar o grande papel que o Santuário tem na evangelização que é comum a toda a Igreja”.
E, falando de Fátima e do seu papel evangelizador, frisou:
“O Santuário de Fátima é espaço privilegiado da nova evangelização porque é um lugar que faz parte do mundo, crentes e não crentes estão juntos nesta meta e a nova evangelização é visível neste lugar através do acolhimento e do saber acolher a todos sem exceção”.

Na dita Conferência de Imprensa, o Bispo da diocese de Leiria-Fátima afirmou que “é preciso despartidarizar um problema que é uma causa nacional” e deixou um apelo ao Presidente da República a que “mobilize energias” e “não deixe cair no esquecimento” as vítimas dos incêndios. Mas deixou, sobretudo, uma palavra de “solidariedade com as vítimas dos incêndios e para com aqueles que os combatem com grande dedicação pondo em risco a própria vida”. Neste sentido, evocando a nota pastoral do episcopado sobre o tema, alertou:

“Permitam-me evocar a nota pastoral do episcopado de 27 abril passado, que já chamava a atenção dos responsáveis políticos para a prevenção destes incêndios que se mostraram uma catástrofe e se repetem todos os anos, e todos os anos denunciam erros que se repetem e é fundamental à mobilização da sociedade nas suas diversas instâncias”.
O prelado frisou a pertinência de “criar sinergias” de forma concertada nas diferentes instâncias”, sendo que, para tal “é preciso despartidarizar um problema que é uma causa nacional e não permitir que ninguém o instrumentalize”. E, apelando à arte do Presidente, disse:
“Deixo um apelo em nome pessoal ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, para que com a sua responsabilidade, arte de diálogo e capacidade de fazer consensos, seja ele a assumir esta mobilização de energias e não deixe cair no esquecimento esta causa”.
O bispo de Leiria-Fátima, garantindo a presença espiritual das Vítimas dos incêndios na oração da peregrinação”, comunicou:
“Segundo informações da Cáritas Portuguesa, a recolha de fundos da campanha “Cáritas com Portugal abraça vítimas dos incêndios” contabiliza 1.704.813€, dos quais 1.300.000€ estão destinados à Cáritas Diocesana de Coimbra, que anunciou assumir a construção e reconstrução de 40 casas de primeira habitação. A restante parte da verba está destinada à Caritas Diocesana de Portalegre e Castelo Branco para a construção e reconstrução de 8 casas de primeira habitação identificadas no concelho de Mação.”.
Mais referiu que, no ofertório nacional do passado dia 2 de julho, foram totalizados 917.221€, que exprimem manifestamente a “generosidade do povo português”.
Ademais, salientou “a causa da paz como prioridade clara e urgente, não só no Médio Oriente, mas também na Ásia”, e fez eco dos bispos da Coreia, que citam o pedido de Nossa Senhora para rezar pela paz, apelando a isso de forma particular nesta peregrinação, sem esquecer a Venezuela e os cristãos perseguidos na Nigéria e na República Centro-Africana.
O Bispo do Lis também insistiu no sentido da peregrinação com “um momento privilegiado para fazer a experiência da ternura e da misericórdia da Mãe”, que, por isso, é algo que vai “muito mais além duma aventura ou duma simples viagem”, pois “o Peregrino de Fátima traz consigo anseios pessoais e íntimos e traz também os problemas e dramas do mundo”.
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No início oficial da Peregrinação, o Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização saudou, em nome do Papa, os peregrinos da Peregrinação Internacional Aniversária de agosto, que é também a peregrinação dos migrantes e refugiados, dizendo:
“Antes de vir, cumprimentei o Papa e ele encarregou-me de saudar todos os peregrinos que virão em peregrinação a Fátima e pediu-me para reforçar o convite a rezar por ele”.
Além disso, Dom Rino Fisichella afirmou estar confiante numa resolução rápida do processo de canonização da Irmã Lúcia, que decorre em Roma. A este respeito, começou por dizer que “os dois pastorinhos – Francisco e Jacinta – são santos para toda a igreja”, pois “a fé e a palavra do Papa atestam que eles estão no paraíso de onde intercedem por nós”, e acrescentou:
“Estamos confiantes em que rapidamente também a Serva de Deus, irmã Lúcia, possa receber o reconhecimento que lhe é devido e assim também na santidade os três pastorinhos estejam reunidos como outrora”.
Dom Rino Fisichella, lembrando o exemplo dos pastorinhos, que foram “objeto de escárnio, de dúvidas, violência gratuita, e mesmo assim, a simplicidade da sua narrativa e a sinceridade das suas pobres vidas conquistaram o coração de tantas pessoas”, sustenta:
“Maria, a mãe de Deus serviu-se deles para nos fazer chegar o pedido de oração. Nestes dias, estamos aqui na Capelinha diante dos olhos amorosos da linda Senhora vestida de branco para rezar. Peçamos-lhe a graça de aprender cada dia a rezar sem nos iludirmos de já o sabemos fazer; que nos ajude a rezar como Jesus nos ensinou sem nos cansarmos e a fazermos da nossa vida uma oração, que ainda que frágil, sobe até Deus, que a aceita. […] Já passaram cem anos, mas aqui nada mudou: a grandiosidade do Santuário modificou a fisionomia do espaço de oração; a Cova da Iria está transformada, mas tanto no passado como hoje viemos aqui para rezar à Virgem.”.
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Na homilia da missa da noite, o Presidente da Concelebração frisou a importância da oração em Fátima, aduzindo que a devoção à Senhora de Fátima pertence à identidade do povo português:
“Nossa Senhora de Fátima está impressa no coração de cada português, que a leva consigo para onde quer que vá́. Ela pertence à identidade deste povo e cada um de nós sente que Lhe pertence, que pertence à linda Senhora vestida de branco”.
Ciente de que esta peregrinação acolhe muitos peregrinos que vêm da diáspora, o prelado que tutela a pastoral dos Santuários desde abril, altura em que Francisco o nomeou para esse múnus, destacou a importância da peregrinação ao Santuário:
“Estes dias são dedicados em particular àqueles que, em anos passados, deixaram família, casa, a sua cidade e Portugal, para ir procurar trabalho noutros países. […] Muitas pessoas que estão entre nós conheceram a fadiga e o sofrimento de aprender outra língua, de viver longe dos afetos, de encontrar tradições diferentes. […] Este momento do ano é dedicado ao regresso a casa, falando de novo a própria língua, reaprendendo as tradições que marcaram a nossa história e o nosso modo de viver. Voltar a casa significa também fazermo-nos peregrinos à capelinha onde a Mãe de Deus nos acolhe e nos sentimos protegidos.”.
Depois, apontou o sofrimento e a “ladainha da dor” que “não para de aumentar” para dizer:
 “Rezarmos esta noite, juntos como uma família, e voltarmos às nossas casas para recomeçarmos a rezar juntos como uma verdadeira família é um dos desafios que se colocam nos dias de hoje. […] Muitas vezes esquecemo-nos disto e perdemos algo de grande valor”.
O prelado, sabendo que o “olhar único e forte da Mãe” é “a única certeza” e os cristãos “devem pedir-Lhe ajuda” face ao sofrimento e à dor, lembrou que “nascemos numa família cristã, pertencemos a uma família ainda maior que é a Igreja”, pelo que “não podemos fazer da oração um ato privado”, tornando-se esta noite “para cada um de nós um momento particular de encontro com o Senhor, porque estamos a rezar-Lhe unidos à sua Mãe”. E acrescentou:
“Descobrimos que aqui, neste lugar, jorra uma nascente inextinguível de graça que pode colmatar a nossa sede, sem que nunca nos sintamos saciados. Nesta capelinha, está a nascente da graça: se tivermos fé́, podemos vê̂-la; se tivermos esperança, podemos beber da água que escorre em direção a nós; se tivermos amor e caridade, podemos levar connosco os frutos da graça que aqui são semeados.”.
E concluiu:
“A nossa oração desta noite é amparada pela oração de Maria, que se une a nós, dando-nos força para crescer na fé́, esperança para encarar o futuro com serenidade e paixão para testemunhar a caridade fraterna”.
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Na homilia da Missa do dia 13, Dom Rino Fisichella acentuou que Fátima recorda a “essência” da vida cristã, “feita de conversão, de silêncio, de oração e de testemunho da caridade”.
Centrado, por um lado, na vida e no exemplo dos pastorinhos e, por outro, na frescura da Palavra de Deus que aponta a presença eficaz, mas discreta de Deus, o ilustre Presidente da Concelebração Eucarística sublinhou que, tal como os Pastorinhos foram vitimas da perseguição e da maldade, e nunca desistiram, também a humanidade precisa de reencontrar uma nova forma de ser livre, através da oração e da conversão. Assim, o arcebispo lembrou as provações passadas pelos pastorinhos nesta data, há cem anos, quando foram impedidos de se deslocar à Cova da Iria na data ‘acertada’ por Nossa Senhora devido “à maldade” e “à falta de fé” dos homens e como isso os afetou sem nunca perderem a esperança. Assim, Fisichella apelou aos peregrinos a que também eles não desistam mesmo diante das incertezas da vida. E sublinhou:
“Muitos de entre nós sabem o que significa a distância de casa, da família, dos afetos; sabem o que significa viver num país estrangeiro. Hoje voltastes aqui à capelinha de Fátima, porque esta é a vossa casa.”.
Dom Rino frisou que, mesmo diante dos momentos de dor e de sofrimento, “quando parece que não somos escutados” ou “experimentamos o pecado”, o bem acaba por prevalecer. Diz ele:
“Cristo agarra-nos e, segurando-nos bem próximos de Si, não nos impede de sermos livres, não nos faz mal, mas dá-nos a possibilidade de descobrir a verdadeira liberdade e abre diante de nós horizontes de paz e de alegria, tão desejados e nunca alcançados, porque sem Ele não podemos fazer nada”.
E concluiu, lembrando que a sociedade de hoje cria “a ilusão dramática” de uma ‘liberdade’ que nos impede de estabelecer “relações de amizade, de sinceridade e de amor”.
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Esta peregrinação, vivida sob o odor ‘incendiário’, terminou com o pedido de oração pelas vítimas e pelos que “abnegadamente” combatem os incêndios que neste momento grassam no país. Dirigindo-se aos peregrinos, no final da Missa Internacional, antes da procissão do adeus, o bispo de Leiria-Fátima não esqueceu o momento que o país atravessa com mais de 9 fogos em plena atividade e pediu uma oração para que a Senhora interceda no fortalecimento da “coragem e determinação” das pessoas que combatem os fogos, nomeadamente os bombeiros.
O prelado, que tinha deixado, no dia 12, um apelo ao Presidente da República para que não deixe cair este assunto no esquecimento e seja o promotor do consenso em busca de uma solução para este problema que anual e repetidamente afeta o país, referiu-se a este momento como de grande “dor, mas também de solidariedade”. Depois, referindo os inúmeros migrantes presentes na celebração e recordando esta peregrinação como “uma experiência refrescante de fé, um autêntico cântico de louvor a Deus através de Maria”, frisou que “aqui percebemos, uma vez mais, que na travessia deste mundo não vamos sozinhos”, pois, “na barca vão também Jesus e a sua Mãe”, o que é um “conforto para todos”. E aludiu às palavras de Nossa Senhora a Lúcia:
“Não desanimes, eu nunca te abandonarei e no meu coração imaculado encontrarás sempre o refúgio e o caminho que te conduzirá até Deus”.
No final, deixou um pedido ao Presidente da Peregrinação, Dom Rino Fisichella, para que transmitisse ao Santo Padre uma “afetuosa saudação” a partir de Fátima,  que “nunca o esquece e reza sempre por ele”.
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Na Peregrinação de agosto estão inscritos no Serviço de Peregrinos do Santuário de Fátima 158 grupos num total de 13 912 peregrinos de origem italiana (31 grupos), Polaca (18 grupos), Espanha (7) e ainda da Áustria, Austrália, Alemanha, Canada, China, republica Checa, Costa do Marfim, República Dominicana, Brasil, Angola, França, Gabão, reino Unido, Hungria, Indonésia, Irlanda, Israel, Índia, Iraque, Jamaica, Japão, Coreia do Sul, Líbano, Sri Lanka, Estados Unidos, Malta, México, Malásia, Moçambique, Nigéria, Holanda, Filipinas, Eslováquia, Senegal, São Tomé e Príncipe e Vietname.
A missa da vigília foi concelebrada por 180 sacerdotes, 11 bispos e um cardeal. E a Missa Internacional foi concelebrada por 8 bispos e 261 sacerdotes, e na assembleia fizeram-se anunciar 158 grupos, num total de 13.912 peregrinos oriundos dos países dos 5 continentes, com uma predominância para os países europeus nomeadamente Itália, Espanha e Polónia.
Durante o ofertório, os peregrinos trouxeram trigo e farinha para oferta a Nossa Senhora. Trata-se dum gesto que acontece desde 1940, ano em que um grupo de jovens da Juventude Agrária Católica da diocese de Leiria ofereceu 30 alqueires de trigo com destino ao fabrico de hóstias para consumo no Santuário. A partir desse ano, os peregrinos das várias dioceses deram continuidade ao gesto que remete para a referência eucarística da Mensagem de Fátima. Em 2016, foram oferecidos 8 530 quilos de trigo e 437 quilos de farinha.
É de sublinhar que “o centenário tem tido um grande impacto pela presença do Papa Francisco e pela projeção mundial da mensagem de Fátima e que faz com que seja um centro mundial de peregrinação”.
Segundo o Serviço de Peregrinos do Santuário de Fátima, em julho de 2017, foram registados 809 grupos num total de 37 926 peregrinos. Já no mesmo mês de 2007, foram registados 290 grupos organizados e 14 700 peregrinos estrangeiros. Sabe-se que julho “é normalmente o mês com mais grupos estrangeiros” presentes no Santuário e que 2007 foi o ano em que se “atingiram números que nunca se tinham atingido”. A diferença também se nota quando se contabilizam os dias 12 e 13 de julho de 2017 e de 2007. Em 2007 (nesses dias), registaram-se 80 grupos e 3 936 peregrinos estrangeiros, ao passo que, em 2017, se contabilizaram 225 grupos e 9 911 peregrinos. 
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Esta foi uma grande jornada de fé e de preocupação com a situação do mundo. Mesmo assim, terminou com um concerto pelo Grupo Regina Coeli, com o apelo de fundo “Alegra-te”.

2017.08.13 – Louro de Carvalho

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