terça-feira, 29 de agosto de 2017

O Oriente Médio é notícia por bons e por tristes motivos

A Gaudium Press.org e a Rádio Vaticano, no dia 28 de agosto, deram relevo à exposição temática “Cristãos do Oriente – Dois mil anos de história” que se realizará na capital francesa com o brilhante escopo de “mostrar documentos e obras muito antigas e únicas que narram e documentam a milenar presença cristã no Oriente Médio e a sua contribuição para a vida cultural, política e intelectual do mundo árabe no decorrer dos séculos”.
A mostra expositiva estará patente ao público no IMA (Instituto do Mundo Árabe de Paris) de 26 de setembro de 2017 a 24 de janeiro de 2018. Organizada e preparada em colaboração com a “Ouvre d’Orient” – Associação francesa empenhada na ajuda aos cristãos no Oriente Médio –, esta exposição apresentará mapas, pinturas e documentos, bem como raras obras-primas, algumas das quais ficarão expostas pela primeira vez na Europa.
Entre estas obras inéditas que serão expostas ao público estão os Evangelhos de Rabula, célebre manuscrito “iluminado” (ou seja, decorado com ouro ou prata) siríaco do século IV, conservado na Biblioteca Laurenciana de Florença, além dos primeiros afrescos cristãos conhecidos no mundo e que são provenientes da antiga Igreja de Doura-Europos, a leste do sítio arqueológico de Palmira, na Síria, fronteira com Iraque, e que remonta ao século III.
A mostra apresentará também ícones e fotografias que retratarão o singular papel dos cristãos na região – tópico que será ainda destacado por meio da apresentação de materiais sobre algumas etapas históricas fundamentais, como a adoção do cristianismo no Império Romano como religião de Estado, os Concílios fundadores, o desenvolvimento das missões católicas, a contribuição dos cristãos para o Nahda, designação dada ao Renascimento árabe, e as mudanças ocorridas nos séculos XX e XXI. E outro dos pontos a serem abordados na exposição será a vitalidade das atuais comunidades cristãs no mundo árabe, cuja sobrevivência está hoje ameaçada pela difusão do fundamentalismo islâmico.
De acordo com Charles Personnaz, responsável pelas iniciativas culturais e pelo património dos cristãos do Oriente do “Ouvre d'Orient”, a finalidade da mostra é fazer ressaltar a riqueza da cultura cristã da região, visto que a história dos cristãos não é só feita de dramas e perseguições, mas também de períodos de prosperidade mesmo atualmente com os frequentes perigos que ameaçam a presença dessas comunidades de fé nas regiões do Oriente Médio, que são acompanhados pela esperança de que estas comunidades tomem consciência de uma identidade comum e secular, baseada em uma história compartilhada.
O itinerário da mostra traz ainda a grande diversidade do cristianismo nas suas várias declinações: copta, assírio-caldaica, siríaca, arménia, maronita, latina, ortodoxa e protestante.
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Por outro lado, como atesta a Rádio Vaticana, o Oriente Médio encontra-se totalmente fragmentado, pois as guerras dizimaram as populações e a presença cristã foi reduzida a números decimais. Na Síria, onde a guerra parece enveredar pelo caminho que almeja o fim, o maior desafio é convencer as pessoas a voltarem e a entrarem novamente nas suas casas. De facto, as perspetivas são incertas, as vidas devem ser reconstruídas, nada será como antes. Há iniciativas louváveis levadas adiante pelas Igrejas locais, em que ressalta, de modo especial, a ação dos franciscanos, dos jesuítas e dos salesianos. Mas não se revelam suficientes. Há, com efeito, muitos cristãos esperam emigrar definitivamente, como testemunham tantos jovens iraquianos deslocados. Foi nestes termos que deu testemunho o administrador apostólico do Patriarcado Latino de Jerusalém, o arcebispo Dom Pierbattista Pizzaballa, durante pronunciamento no Encontro de Rimini – centro-norte da Itália – concluído no passado dia 26 de agosto. Para o religioso franciscano, que citou as palavras de um jovem palestino que havia encontrado, “não basta reconstruir, é preciso dar uma orientação, pois, ligar a nossa esperança e o nosso futuro a soluções políticas ou sociais criará somente frustração”.
Dom Pizzaballa vê como fundamental no Oriente Médio em agudas dificuldades a radicação do cristianismo em Cristo e a mostrar o lado atraente e sedutor do seu rosto. Garante o hierarca:
 “Aquilo que salvará o cristianismo será o estar radicado em Cristo. Os cristãos são chamados a evangelizar e a testemunhar o belo, o bom e o verdadeiro que existe no Evangelho e na Tradição, sem se lamentarem por aquilo que foi perdido.”.
Diz o arcebispo que é necessário os cristãos serem “capazes de um anúncio compreensível e atraente”, pois “não se pode falar de valores cristãos sem dizer que Cristo é o que se pode encontrar de melhor”. E propõe a não construção de quaisquer muros que separem porque “não há nada que não possa ser valorizado pela experiência do Evangelho” – uma experiência “grande” porque “é desejo de esperança”. Com efeito, disse, os “nossos pais com esse desejo construíram catedrais e fizeram tudo aquilo que vemos”.
Porém, não basta a convicção interior. Ao invés, tudo quilo que fazemos deve ser caraterizado pelo estilo cristão com um anúncio e uma proposta que encontrará expressão na vida civil, social, política e económica. É o modo cristão de dizer que Cristo se fez homem e reconhecer a glória de Deus no quotidiano. O que conta é a transmissão do desejo duma geração a outra.
E o homem dos nossos dias, ainda que não o manifeste, espera essa tal ‘boa nova’. Portanto, diz ainda o administrador do Patriarcado Latino de Jerusalém que não se trata de recordar por saudade, mas “para despertar o desejo”. É este “o modo com o qual nossos pais testemunharam que se pode viver com estímulo, com satisfação”. E é preciso encontrar os diferentes modos de comunicar a beleza, “porque o homem contemporâneo, inconscientemente, está esperando essa tal ‘boa nova’, que o revela a si mesmo”.
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O Conselho dos Patriarcas Católicos do Oriente esteve reunido na sua sessão anual, antes da Assunção (com início a 10 de agosto), em Dimane, no Líbano, residência patriarcal de verão do Patriarca maronita, tendo alguns participantes sido recebidos pelo Presidente libanês. Na agenda do encontro, esteve a complexa situação vivida pelas comunidades cristãs autóctones em muitas partes do Oriente Médio. E os temas abordados estão intimamente conexos com os problemas pastorais e com as emergências políticas e sociais que afligem, de modo cada vez mais intenso e preocupante, as comunidades católicas orientais, que registaram, em alguns países médio-orientais, nos últimos anos, uma drástica diminuição do número de fiéis.
Nos últimos anos, este organismo que congrega todos os Primazes das Igreja católicas Orientais presentes naquela região do mundo não se pôde reunir devido, sobretudo,  aos conflitos na Síria e no Iraque. Agora, pela primeira vez, tomou parte no encontro como Patriarca, Youssef Absi, novo Primaz da Igreja Greco-católica melquita.
Neste encontro, em Dimane, tomou parte o Núncio Apostólico no Líbano, Dom Gabriele Giordano Caccia e, numa das sessões ecuménicas, estiveram presentes  os Patriarcas greco-ortodoxo Giovani Yazigi, Siro-ortodoxo, Ignazio Efrem II, o Catholicos da Igreja Apostólica Armena, Aram I, e o Presidente da Comunidade Evangélica na Síria e no Líbano, Salim Sahyouni. E, entre os participantes, contam-se ainda o Cardeal Patriarca de Antioquia dos Maronitas, Béchara Boutros Rai, o Patriarca de Antioquia dos Sírios, Ignace Youssif III Younan, o Patriarca de Antioquia dos Greco-melquitas, Joseph Absi, o Patriarca de Alexandria dos Coptas, Ibrahim Isaac Sedrak, o Patriarca de Babilónia dos Caldeus, Louis Raphael Sako, e o Patriarca da Cilícia dos Arménios, Grégoire  Pierre XX Ghabroyan. 
No final do encontro emitiram um comunicado em que sublinham, verificando e exortando:
“É tempo de lançar um apelo profético em testemunho da verdade. Fomos convidados a permanecer apegados à nossa identidade oriental e a permanecer fiéis à nossa missão. Assumindo a atenção pelo pequeno rebanho, nós Patriarcas orientais sentimo-nos aflitos ao assistir à hemorragia humana dos cristãos que abandonam as suas terras de origem no Médio Oriente. […]. Permaneçamos enraizados na terra dos padres e dos antepassados, esperando contra toda a esperança num futuro em que, como componentes de um património autêntico e específico, seremos compreendidos como fontes de enriquecimento para a nossa sociedade e para a Igreja universal no Oriente e no Ocidente.”.  
Os Patriarcas exortam assim a não cessar de proclamar  “a verdade na caridade, a legitimidade da separação entre o Estado e a religião na constituição  das nossas pátrias, a igualdade de direitos e deveres para todos, sem olhar para a pertença religiosa e comunitária”.
O jornal do Vaticano “L’Osservatore Romano” retomou a nota final do encontro e frisa que o Conselho dos Patriarcas Católicos do Oriente aponta o dedo à comunidade internacional por considerar que ela assiste à agonia, causada pela insegurança e pela emigração, uma depois da outra, das igrejas orientais no Iraque, Síria, Palestina, Líbano, Egito, sem reagir devidamente a esta tragédia. O Conselho adverte que, se este estado de coisas continuar, estaremos perante um verdadeiro projeto de genocídio e de uma “afronta contra a humanidade”. Por isso, o Conselho solicita, por carta, às Nações Unidas e aos países afetados de forma direta pelos conflitos na região que ponham termo à guerra, cujos objetivos são claros: destruir, matar, levar ao êxodo, relançar as organizações terroristas, difundir o espírito de intolerância e de conflito entre religiões e culturas. A perpetuação deste estado situacional, com a incapacidade de estabelecer uma paz justa, global e duradoura na região, assegurando o retorno dos refugiados e dos deslocados aos seus lares na dignidade e na justiça, permanecerá como “um estigma de vergonha por todo o século XXI”.
Os Patriarcas Católicos do Oriente dirigem-se também ao Papa Francisco nestes termos:
Nós somos uma nação com amplas fronteiras e que atrai a atenção dos gigantes das finanças; já não somos mais que um pequeno rebanho pacífico. Um pequeno rebanho que não conta com ninguém senão Convosco para convidar os grandes que presidiam os destinos do mundo”.
Estas mensagens coincidem com a publicação de dados eloquentes sobre a diminuição dos cristãos nos vários países do Médio Oriente, sobretudo no Iraque, Síria e Terra Santa (onde já são apenas 1,2% da população); na Síria, devido à guerra desencadeada em 2011, o número de cristãos passou de 250 mil para 100 mil. E no Iraque, os representantes da comunidade cristãos estão a fazer um enorme esforço por convencer a população de Nínive a voltar para a sua terra.
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É tanto de saudar a exposição de Paris a evidenciar a produção cultural e cristã do Oriente Médio, como suscitar a solidariedade para com as Igrejas e grupos étnicos que ali sofrem. É de acolher o apelo dos Patriarcas Católicos do Oriente e rogar a Deus que não seja necessário que no Ocidente hedonista venha o sofrimento para levar os cristãos à radicalidade do evangelho.

2017.08.29 – Louro de Carvalho

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