A Gaudium Press.org e a Rádio Vaticano, no
dia 28 de agosto, deram relevo à exposição temática “Cristãos
do Oriente – Dois mil anos de história”
que se realizará na capital francesa com o brilhante escopo de “mostrar
documentos e obras muito antigas e únicas que narram e documentam a milenar
presença cristã no Oriente Médio e a sua contribuição para a vida cultural,
política e intelectual do mundo árabe no decorrer dos séculos”.
A mostra expositiva estará patente ao público no IMA (Instituto do Mundo Árabe de Paris) de 26 de setembro de 2017 a 24 de janeiro de 2018. Organizada e preparada
em colaboração com a “Ouvre d’Orient”
– Associação francesa empenhada na ajuda aos cristãos no Oriente Médio –, esta
exposição apresentará mapas, pinturas e documentos, bem como raras
obras-primas, algumas das quais ficarão expostas pela primeira vez na Europa.
Entre estas obras inéditas que serão expostas ao público estão os
Evangelhos de Rabula, célebre manuscrito “iluminado” (ou seja, decorado com ouro ou prata) siríaco do século IV, conservado na Biblioteca Laurenciana de Florença,
além dos primeiros afrescos cristãos conhecidos no mundo e que são provenientes
da antiga Igreja de Doura-Europos, a leste do sítio arqueológico de Palmira, na
Síria, fronteira com Iraque, e que remonta ao século III.
A mostra apresentará também ícones e fotografias que retratarão o singular papel
dos cristãos na região – tópico que será ainda destacado por meio da
apresentação de materiais sobre algumas etapas históricas fundamentais, como a
adoção do cristianismo no Império Romano como religião de Estado, os Concílios
fundadores, o desenvolvimento das missões católicas, a contribuição dos
cristãos para o Nahda, designação dada ao Renascimento árabe, e as mudanças
ocorridas nos séculos XX e XXI. E outro dos pontos a serem abordados na
exposição será a vitalidade das atuais comunidades cristãs no mundo árabe, cuja
sobrevivência está hoje ameaçada pela difusão do fundamentalismo islâmico.
De acordo com Charles Personnaz, responsável pelas iniciativas culturais e pelo
património dos cristãos do Oriente do “Ouvre
d'Orient”, a finalidade da mostra é fazer ressaltar a riqueza da cultura
cristã da região, visto que a história dos cristãos não é só feita de dramas e
perseguições, mas também de períodos de prosperidade mesmo atualmente com os
frequentes perigos que ameaçam a presença dessas comunidades de fé nas regiões
do Oriente Médio, que são acompanhados pela esperança de
que estas comunidades tomem consciência de uma identidade comum e secular,
baseada em uma história compartilhada.
O itinerário da mostra traz ainda a grande diversidade do
cristianismo nas suas várias declinações: copta, assírio-caldaica, siríaca,
arménia, maronita, latina, ortodoxa e protestante.
***
Por outro lado, como atesta a Rádio Vaticana, o Oriente Médio
encontra-se totalmente fragmentado, pois as guerras dizimaram as populações e a
presença cristã foi reduzida a números decimais. Na Síria, onde a guerra parece
enveredar pelo caminho que almeja o fim, o maior desafio é convencer as pessoas
a voltarem e a entrarem novamente nas suas casas. De facto, as perspetivas são
incertas, as vidas devem ser reconstruídas, nada será como antes. Há
iniciativas louváveis levadas adiante pelas Igrejas locais, em que ressalta, de
modo especial, a ação dos franciscanos, dos jesuítas e dos salesianos. Mas não se
revelam suficientes. Há, com efeito, muitos cristãos esperam emigrar
definitivamente, como testemunham tantos jovens iraquianos deslocados. Foi nestes
termos que deu testemunho o administrador apostólico do Patriarcado Latino de
Jerusalém, o arcebispo Dom Pierbattista Pizzaballa, durante pronunciamento no
Encontro de Rimini – centro-norte da Itália – concluído no passado dia 26 de agosto.
Para o religioso franciscano, que citou as palavras de um jovem palestino que
havia encontrado, “não basta reconstruir, é preciso dar uma orientação, pois, ligar
a nossa esperança e o nosso futuro a soluções políticas ou sociais criará
somente frustração”.
Dom Pizzaballa vê como fundamental no Oriente Médio em agudas
dificuldades a radicação do cristianismo em Cristo e a mostrar o lado atraente e
sedutor do seu rosto. Garante o hierarca:
“Aquilo
que salvará o cristianismo será o estar radicado em Cristo. Os cristãos são
chamados a evangelizar e a testemunhar o belo, o bom e o verdadeiro que existe
no Evangelho e na Tradição, sem se lamentarem por aquilo que foi perdido.”.
Diz o arcebispo que é
necessário os cristãos serem “capazes de um anúncio
compreensível e atraente”, pois “não se pode falar de
valores cristãos sem dizer que Cristo é o que se pode encontrar de melhor”.
E propõe a não construção de quaisquer muros que separem porque “não há nada que não possa ser valorizado
pela experiência do Evangelho” – uma experiência “grande” porque “é desejo de esperança”. Com efeito, disse,
os “nossos pais com esse desejo
construíram catedrais e fizeram tudo aquilo que vemos”.
Porém, não basta a
convicção interior. Ao invés, tudo quilo que
fazemos deve ser caraterizado pelo estilo cristão com um anúncio e uma proposta
que encontrará expressão na vida civil, social, política e económica. É o modo
cristão de dizer que Cristo se fez homem e reconhecer a glória de Deus no quotidiano.
O que conta é a transmissão do desejo duma geração a outra.
E o homem dos nossos
dias, ainda que não o manifeste, espera essa tal ‘boa nova’. Portanto, diz ainda o administrador do
Patriarcado Latino de Jerusalém que não se trata de recordar por saudade, mas “para
despertar o desejo”. É este “o modo com o qual nossos pais testemunharam que se
pode viver com estímulo, com satisfação”. E é preciso encontrar os diferentes modos
de comunicar a beleza, “porque o homem contemporâneo, inconscientemente, está
esperando essa tal ‘boa nova’, que o revela a si mesmo”.
***
O Conselho dos Patriarcas Católicos do Oriente esteve reunido
na sua sessão anual, antes da Assunção (com início a 10 de agosto), em Dimane, no Líbano, residência patriarcal de verão do Patriarca
maronita, tendo alguns participantes sido recebidos pelo Presidente libanês. Na agenda do
encontro, esteve a complexa situação vivida pelas comunidades cristãs
autóctones em muitas partes do Oriente Médio. E os temas abordados
estão intimamente conexos com os problemas pastorais e com as emergências
políticas e sociais que afligem, de modo cada vez mais intenso e preocupante,
as comunidades católicas orientais, que registaram, em alguns países
médio-orientais, nos últimos anos, uma drástica diminuição do número de fiéis.
Nos últimos anos, este organismo que
congrega todos os Primazes das Igreja católicas Orientais presentes naquela
região do mundo não se pôde reunir devido, sobretudo, aos conflitos na Síria
e no Iraque. Agora, pela primeira vez, tomou parte no encontro como
Patriarca, Youssef Absi, novo Primaz da Igreja Greco-católica melquita.
Neste encontro, em Dimane, tomou parte o Núncio Apostólico no
Líbano, Dom Gabriele Giordano Caccia e, numa das sessões ecuménicas, estiveram
presentes os Patriarcas greco-ortodoxo Giovani Yazigi, Siro-ortodoxo,
Ignazio Efrem II, o Catholicos da Igreja Apostólica Armena, Aram I, e o
Presidente da Comunidade Evangélica na Síria e no Líbano, Salim Sahyouni. E, entre
os participantes, contam-se ainda o Cardeal Patriarca de Antioquia dos
Maronitas, Béchara Boutros Rai, o Patriarca de Antioquia dos Sírios, Ignace
Youssif III Younan, o Patriarca de Antioquia dos Greco-melquitas, Joseph Absi,
o Patriarca de Alexandria dos Coptas, Ibrahim Isaac Sedrak, o Patriarca de
Babilónia dos Caldeus, Louis Raphael Sako, e o Patriarca da Cilícia dos
Arménios, Grégoire Pierre XX Ghabroyan.
No final do encontro emitiram um comunicado em que sublinham,
verificando e exortando:
“É tempo de lançar um apelo profético em testemunho da verdade. Fomos
convidados a permanecer apegados à nossa identidade oriental e a permanecer
fiéis à nossa missão. Assumindo a atenção pelo pequeno rebanho, nós Patriarcas
orientais sentimo-nos aflitos ao assistir à hemorragia humana dos cristãos que
abandonam as suas terras de origem no Médio Oriente. […]. Permaneçamos enraizados na terra dos padres e dos antepassados,
esperando contra toda a esperança num futuro em que, como componentes de um
património autêntico e específico, seremos compreendidos como fontes de
enriquecimento para a nossa sociedade e para a Igreja universal no Oriente e no
Ocidente.”.
Os Patriarcas exortam assim a não cessar de proclamar
“a verdade na caridade, a legitimidade da separação entre o Estado e a
religião na constituição das nossas pátrias, a igualdade de direitos e
deveres para todos, sem olhar para a pertença religiosa e comunitária”.
O jornal do Vaticano “L’Osservatore
Romano” retomou a nota final do encontro e frisa que o Conselho dos
Patriarcas Católicos do Oriente aponta o dedo à comunidade internacional por
considerar que ela assiste à agonia, causada pela insegurança e pela emigração,
uma depois da outra, das igrejas orientais no Iraque, Síria, Palestina, Líbano,
Egito, sem reagir devidamente a esta tragédia. O Conselho adverte que, se este
estado de coisas continuar, estaremos perante um verdadeiro “projeto de genocídio” e de uma “afronta contra a humanidade”. Por isso, o
Conselho solicita, por carta, às Nações Unidas e aos países afetados de forma
direta pelos conflitos na região que ponham termo à guerra, cujos objetivos são
claros: destruir, matar, levar ao êxodo, relançar as organizações terroristas,
difundir o espírito de intolerância e de conflito entre religiões e culturas. A
perpetuação deste estado situacional, com a incapacidade de estabelecer uma paz
justa, global e duradoura na região, assegurando o retorno dos refugiados e dos
deslocados aos seus lares na dignidade e na justiça, permanecerá como “um
estigma de vergonha por todo o século XXI”.
Os Patriarcas Católicos do Oriente dirigem-se também ao Papa
Francisco nestes termos:
“Nós somos uma nação com amplas fronteiras e que atrai a atenção
dos gigantes das finanças; já não somos mais que um pequeno rebanho pacífico.
Um pequeno rebanho que não conta com ninguém senão Convosco para convidar os
grandes que presidiam os destinos do mundo”.
Estas mensagens coincidem com a publicação de dados
eloquentes sobre a diminuição dos cristãos nos vários países do Médio Oriente,
sobretudo no Iraque, Síria e Terra Santa (onde já são apenas 1,2% da população); na Síria, devido à guerra
desencadeada em 2011, o número de cristãos passou de 250 mil para 100 mil. E no
Iraque, os representantes da comunidade cristãos estão a fazer um enorme
esforço por convencer a população de Nínive a voltar para a sua terra.
***
É tanto de saudar a exposição de Paris a evidenciar a
produção cultural e cristã do Oriente Médio, como suscitar a solidariedade para
com as Igrejas e grupos étnicos que ali sofrem. É de acolher o apelo dos Patriarcas
Católicos do Oriente e rogar a Deus que não seja necessário que no Ocidente
hedonista venha o sofrimento para levar os cristãos à radicalidade do
evangelho.
2017.08.29
– Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário