O Dia
Internacional de Oração pelos Cristãos Perseguidos no Mundo ocorre
anualmente no dia 6 de agosto em evocação da noite e madrugada de 7 de agosto
de 2014, em que milhares de cristãos fugiram do norte do Iraque, expulsos pelos
extremistas do grupo Estado Islâmico. Na verdade, como declarou, na ocasião o
patriarca Louis Raphael Sako, da Igreja Católica Caldeia:
“Cerca
de 100 mil cristãos, aterrorizados e em pânico, fugiram de suas casas sem nada,
somente com as roupas do corpo, a pé, rumo às cidades curdas. Entre eles havia
doentes, idosos, crianças e mulheres grávidas, precisando de água, comida,
medicamentos e um lugar para ficar”.
Assim que recebeu as primeiras informações na manhã do
dia 7 de agosto, a Fundação Pontifícia AIS (Ajuda à Igreja que sofre) mobilizou os benfeitores e iniciou campanhas e projetos
para socorrer material e espiritualmente os perseguidos e refugiados. Desde
então, a AIS realiza um dos maiores projetos de ajuda da sua história,
direcionando esforços para alimento, abrigo e educação para os refugiados –
ação que já resulta em mais de 2 mil projetos no Oriente Médio desde o início
da crise.
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Por mais injusto que isso pareça e seja, as perseguições
aos cristãos não ocorreram apenas nos primeiros séculos do cristianismo nem foi
somente o Império Romano que protagonizou a sanha dos perseguidores. A perseguição
àqueles e àquelas cujo pensamento e ação não sejam ou não se manifestem
alinhados com os ditames do poder político que enforma quaisquer regimes totalitários
é um facto transversal aos diversos tempos históricos. E os cristãos, que
professam, defendem e missionam à luz dum Evangelho que não admite meias tintas
nem o serviço a Deus e ao dinheiro ou àquilo que valha dinheiro (poder, ambição,
prestígio, ocupação de postos cimeiros), estão na
ribalta dos alvos dos perseguidores, que os classificam de sectários ou agentes
de associação criminosa. Os romanos até acusavam os cristãos de ateus (por não
queimarem incenso diante do imperador, considerado um deus), idólatras (por supostamente adorarem um ídolo, a
imagem do Cristo crucificado), antropófagos
(por comerem
o corpo de alguém, Cristo),
incestuosos (pois, apesar de se considerarem irmãos, havia casamento entre cristãos), orgíacos (por celebrarem em termos de festa o
ágape, que os romanos assimilavam pela suposta aparência às bacanais) e incendiários (por preverem a destruição do mundo
pelo fogo).
Só os cristãos que vivam um cristianismo descafeinado,
acomodado à corrente, não incómodo é que escapam às incompreensões e
perseguições. E nem os condutores ou participantes em ditaduras das direitas ou
das esquerdas podem entreter-se em atirar as culpas para o lado oposto.
Jesus, quando enviou os Doze em missão, previu que as
pessoas poderiam não os receber (cf Mt 10,14-15; Mc 6,11; Lc 9,5;
10,10-11) e até os acautelou para o facto
das perseguições, dando-lhes as convenientes indicações sobre como proceder,
como se vê em Mateus:
“Envio-vos como ovelhas para o meio
dos lobos; sede, pois, prudentes como as serpentes e simples como as pombas. Tende
cuidado com os homens: hão de entregar-vos aos tribunais e açoitar-vos nas suas
sinagogas; sereis levados perante governadores e reis, por minha causa, para
dar testemunho diante deles e dos pagãos. Mas, quando vos entregarem, não vos
preocupeis nem como haveis de falar nem com o que haveis de dizer; nessa
altura, vos será inspirado o que tiverdes de dizer. Não sereis vós a falar, mas
o Espírito do vosso Pai é que falará por vós. O irmão entregará o irmão à
morte, e o pai, o filho; os filhos hão de erguer-se contra os pais e
causar-lhes a morte. E vós sereis odiados por todos, por causa do meu nome. Mas
aquele que se mantiver firme até ao fim será salvo. Quando vos perseguirem numa
cidade, fugi para outra. Em verdade vos digo: Não acabareis de percorrer as
cidades de Israel, antes de vir o Filho do Homem.” (Mt 10,16-23; cf Mc 13,9-13;
Lc 21, 12-19).
E Paulo
alertou os anciãos de Éfeso para os perseguidores externos e para os internos:
“Sei que,
depois de eu partir, se hão de introduzir entre vós lobos temíveis que não
pouparão o rebanho e que, mesmo no meio de vós, se hão de erguer homens de
palavras perversas para arrastarem discípulos atrás de si. Estai, pois,
vigilantes e recordai-vos de que, durante três anos, de noite e de dia, não cessei
de exortar, com lágrimas, a cada um de vós. E agora, confio-vos a Deus e à
palavra da sua graça, que tem o poder de construir o edifício e de vos conceder
parte na herança com todos os santificados.” (At 20,29-32).
Também Jesus, no sermão da montanha enuncia as
bem-aventuranças da justiça:
“Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão
saciados. Felizes os que sofrem perseguição por causa da
justiça, porque deles é o Reino do Céu. Felizes sereis, quando vos insultarem e perseguirem e, mentindo,
disserem todo o género de calúnias contra vós, por minha causa. Exultai e
alegrai-vos, porque grande será a vossa recompensa no Céu; pois também assim
perseguiram os profetas que vos precederam.” (Mt 5,6.11-12).
E, em Lucas, vemos a advertência de Jesus:
“Ai de vós, quando todos disserem bem de vós! Era mesmo
assim que os pais deles tratavam os falsos profetas.” (Lc 6,26).
Também, nos tempos que atravessamos, as perseguições são
um facto lastimável que dá sofrimento a muitos. Segundo recente relatório da CNEWA (Catholic
Near East Welfare Association) –
agência criada pelo papa Pio XI em 1926 para o apoio dos pobres – os cristãos
médio-orientais que vivem entre Chipre, Egito, Iraque, Israel, Jordânia,
Líbano, Cisjordânia, Gaza, Síria e Turquia são 14,5 milhões. O dado foi divulgado
na primeira metade de 2017. Há 7 anos, o número era de 200 mil pessoas a mais.
(fonte:
RV e SP-CNBB). E sabemos
como tantos cristãos encontram a morte, por exemplo, no Iraque, no Egito, na Arábia
saudita e em tantos lugares.
***
Assim se compreende que a fundação pontifícia AIS tenha
promovido para hoje, dia 6 de agosto, um dia de oração pelos Cristãos
Perseguidos no Médio Oriente, em especial no Iraque.
A data é, segundo a agência Ecclesia, assinalada em Portugal com uma celebração eucarística na
Paróquia de Penacova, em Felgueiras. Com efeito, assinalam-se, a 6 de agosto, três
anos da tomada de Mossul e da Planície de Nínive, no Iraque, por parte do
autoproclamado Estado Islâmico (EI), que fez um
ultimato à população: “converter-se ao
Islão, pagar o imposto para poder continuar a viver naquela terra ou morrer”.
Como refere a AIS, “este ultimato levou à fuga de milhares de pessoas, muitos
delas cristãs, que se refugiaram na cidade de Erbil no Curdistão iraquiano”,
vivendo desde então “em campos de refugiados”. E a AIS está a apoiar, com a
ajuda dos benfeitores, os cristãos perseguidos, fornecendo ajuda de emergência,
reconstruindo casas, igrejas e escolas.
***
Ao menos na aparência, o contributo de Portugal parece
minúsculo comparado com o do Brasil. Com efeito, segundo a Rádio Vaticano, a Igreja esteve unida em oração pelos cristãos perseguidos em todo
o mundo, no âmbito da iniciativa do Dia
Internacional de Oração pelos Cristãos Perseguidos, promovida pela AIS,
recebendo mais uma vez recebe o apoio da CNBB (Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil) e
ainda participação de todas as paróquias do país.
Porém, a edição deste ano amplia as intenções
de oração realizadas nas edições anteriores, que estavam direcionadas
para os grupos perseguidos no Oriente Médio. De acordo com a AIS, a mudança
ocorre porque em alguns países da África, por exemplo, morrem mais pessoas por
serem cristãos do que em qualquer outro lugar do mundo. Neste contexto, o Bispo
auxiliar de Brasília e Secretário-geral da CNBB, Dom Leonardo Steiner, explica:
“A Igreja é uma grande comunhão, nós até chamamos de
comunhão dos santos aqueles que pertencem a Cristo, que foram revestidos de
Cristo. E manifestarmos, através da nossa oração essa comunhão, essa caridade,
significa sermos cada vez mais Igreja.”.
E, evidenciando a percepção de que a vivência da fé em
determinados lugares do mundo presume o testemunho com o sangue, Dom Leonardo
afirma, neste campo da comunhão dos santos que professamos no Símbolo dos Apóstolos, que todos os
cristãos participam do martírio e da perseguição: “Participarmos deste dia de oração pelos cristãos perseguidos é mostrarmos
também a nossa fé comum em Cristo Jesus”.
Rodrigo Arantes, membro da AIS-Brasil, salienta que a
Fundação tem recebido o apoio da CNBB desde a 1.ª edição do Dia de Oração. E
refere que, desde então, muitos frutos foram colhidos, lembrando que, em cada
ano, a AIS traz uma personalidade de algum país onde os cristãos sofrem
perseguição para dar o seu testemunho no Brasil e de uma forma bem concreta na
Assembleia Geral da CNBB.
Neste ano, foi à Aparecida (SP) o Bispo copta católico de Assiut, no Egito, Dom Kyrillos
Samaan, que falou aos bispos sobre os cristãos perseguidos no seu país e,
segundo Rodrigo, “ficou maravilhado ao saber como os cristãos brasileiros se
dedicam a rezar pelos cristãos perseguidos do Egito e do mundo todo”. E Rodrigo
descreve dois exemplos como fruto da campanha de oração no Brasil e noutros países
do mundo. Em primeiro lugar, refere, citando o local de onde foram expulsos
mais de 100 mil cristãos na noite do dia 6 para o dia 7 de agosto de 2014 pelo
Estado Islâmico:
“É impressionante como, desde que esse Dia de Oração
teve início com o apoio da CNBB, sinais de esperança têm aparecido: há alguns
anos as estimativas eram de que os cristãos no Iraque iriam desaparecer, hoje
vemos a Planície de Nínive pacificada e os cristãos retornando e reconstruindo
seus lares”.
Depois, evoca outro caso “que não se explica sem
considerar o poder da oração”: o retorno de Cristina que, com apenas
3 anos de idade, havia sido sequestrada pelos terroristas do EI no dia 6 de
agosto de 2014 e foi devolvida à família sã e salva em junho 2017. Diz Rodrigo:
“Graças a essa iniciativa da AIS com o apoio da CNBB,
os cristãos brasileiros não apenas passaram a saber o que acontece com aqueles
que correm o risco de perderem as suas vidas para viverem a sua fé como ainda
podem rezar por eles e os encher de esperança por meio da oração”.
Para o Bispo Dom Leonardo Steiner, o testemunho dos
cristãos perseguidos no Oriente Médio, na África e na Ásia, por exemplo, ajuda-nos
“a viver uma fé transparente, mais límpida, que realmente mostre a eternidade
já encarnada, o reino de Deus já presente neste mundo, mas que será também um
reino definitivo”. Aos brasileiros, de acordo com o Bispo, fica a mensagem de
testemunhar a fé onde se vive. Diz ele:
“Nós também temos intempéries, dificuldades, nós do
Brasil temos corrupção, às vezes nos deixamos envolver por determinados
elementos de corrupção. Mesmo assim, o exemplo é para sermos esse testemunho
transparente e livre do evangelho.”.
Em São Paulo, houve uma celebração na Sé Catedral, às
9 horas, presidida pelo arcebispo de São Paulo, o cardeal Dom Odilo Pedro
Scherer. Na ocasião, AIS-Brasil exibiu, antes e depois da celebração, vídeos
realizados nos países onde ocorrem perseguição religiosa, com imagens e relatos
dos cristãos que conseguiram escapar e sobreviver aos ataques extremistas. E,
no Rio de Janeiro, realizou-se no Cristo Redentor, às 17 horas, um momento de
Oração pelos Cristãos Perseguidos, conduzido pelo arcebispo local, o cardeal Dom
Orani João Tempesta. Este evento contou com a presença de testemunhos dos que
sofrem com a perseguição religiosa e o monumento foi iluminado de vermelho para
representar o sangue dos mártires de hoje.
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Também o Jornal do Brasil anunciava que, neste domingo, 6 de agosto, data que marca
o Dia Internacional de Oração pelos
Cristãos Perseguidos no Mundo, o Monumento ao Cristo Redentor iria receber
uma iluminação especial na cor vermelha, como símbolo do sangue dos mártires de
hoje. Na ocasião, dizia o periódico, “será conduzido um momento de oração pelos
cristãos perseguidos pelo Arcebispo Metropolitano do Rio de Janeiro, Cardeal
Orani João Tempesta, no Santuário”. E ainda: “O evento, que terá início às 17 horas,
também contará com a participação especial dos músicos Luis Kiari e Shalom, e
com a presença de testemunhos daqueles que sofrem com a perseguição religiosa”.
Salientava o
jornal tratar-se duma iniciativa da Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que
Sofre (ACN), que, nesta edição, se propõe a abranger os cristãos
perseguidos em todo o mundo, pois nas duas edições anteriores contemplavam-se
apenas as minorias perseguidas no Oriente Médio.
E, destacando
o apoio da CNBB, referia que o evento” irá reunir todas as paróquias do país,
que já receberam da ACN um cartaz e a oração da campanha, com o intuito de
promover e convidar as pessoas a participarem desta corrente mundial a favor
dos cristãos que sofrem perseguição religiosa”.
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Em termos de
informação complementar, é de recordar que a ACN surgiu em 1947, após a Segunda
Guerra Mundial, e que se tornou uma Fundação Pontifícia com sede no Vaticano.
Atualmente, atende mais de 60 milhões de pessoas, por meio dos mais de cinco
mil projetos apoiados, por ano, por esta entidade, em cerca de 140 países,
incluindo o Brasil. Os projetos auxiliados pela ACN englobam a produção e
distribuição de material catequético, a construção e reconstrução de Igrejas;
locomoção e transporte para religiosos e missionários; recuperação de jovens
dependentes químicos; construção de escolas e de casas, alimentação,
medicamentos, agasalho e abrigo para refugiados.
Enfim, é a
grande batalha de solidariedade multiforme a travar diariamente em muitas
frentes, em tantas quantas há pessoas a sofrer – e a que ninguém pode ficar
alheio.
2017.08.06 – Louro de Carvalho
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