O
Jornal Público do dia 18 traz, a páginas
13, uma local sob o título “Notas subiram
em 73% das provas de exame que foram reapreciadas”, assinada por Clara
Viana, que merece um comentário algo detalhado. E o lead mais nada faz que repetir a ideia plasmada no título, embora utilizando
o recurso da generalização, pelo que escreve: “Processos de reapreciação dos exames do ensino secundário resultam
quase sempre em melhoria das notas”.
O
pedido de reapreciação da prova é uma possibilidade reconhecida ao encarregado de
educação do aluno ou ao próprio aluno, se maior de idade, caso o entenda fazer,
após a consulta da prova. Para tanto, tem de ser
requerida, em modelo próprio, a consulta da prova no prazo de 2 dias úteis imediatos ao
da publicação das classificações dos exames nacionais, devendo a escola fornecer,
no prazo de 2 dias úteis, a cópia da prova e as cotações (material que deve ser pago pelo requerente), com a qual se
decidirá pelo pedido, ou não, de reapreciação.
Nesta fase, o encarregado de educação ou o aluno – melhor,
para não sermos hipócritas, um professor da disciplina respetiva conhecedor dos
programas do ensino secundário (antigamente não
podia exercer tal papel um professor do ensino oficial no ativo) – analisa a
prova e, na maior parte dos casos, a conclusão é a de que a prova está
razoavelmente corrigida. E, quando surgem deficiências de correção nalgumas
respostas, tem-se em conta a prova toda, não vá o diabo tecê-las e a classificação
vir a ser alterada para menos, mercê da reapreciação das questões menos bem
conseguidas e eventualmente hipervalorizadas. É por isso que o número de
pedidos de reapreciação é e continua a ser reduzido, como o comprovam os dados
deste ano. Houve 7142 pedidos de reapreciação (2,1%
de 332 340 provas) da 1.ª fase do ensino secundário. Resultaram em subida de
nota 73%; em descida, 10%; e, em manutenção, 16%. Em valores absolutos, as disciplinas
com mais pedidos foram aquelas em que houve mais provas. Ao topo, vem Português
(prova a que se sujeitam todos os alunos dos cursos
científico-humanísticos e os das outras vias de ensino que tenham Português como
prova de ingresso no ensino superior). Em 76 643 provas, foram reapreciadas 2062 (2,7%), sendo que a nota subiu em 72% dos casos e desceu em 15%. Em
43 007 provas de Física e Química A (uma
das piores médias da 1.ª fase – 9,9), foram reapreciadas 1044 (2,4%), das quais 69%
resultaram em subida de nota, tendo descido em 11%. Matemática A surge em 3.º lugar com a
reapreciação de 1021 provas em 49 298 (2,1%), mas é a que regista
mais descidas (16%) na reapreciação. Biologia e
Geologia viu 1,8% de provas reapreciadas (873 em
47 215), com subida de notas em 70%. Porém, foi Geometria Descritiva que
registou maior subida percentual de notas (91%),
seguindo-se-lhe História B, Alemão e Francês, com 90%.
Há, em todo o caso, algumas razões pelas quais os resultados
em regra compensam, como os dados deste ano em relação à 1.ª fase comprovam,
das quais se recordam algumas.
Em algumas disciplinas, por mais objetivos que pretendam ser
os critérios definidos pelo IAVE, IP, persiste grande margem de subjetividade,
a não ser em questões de resposta de escolha múltipla ou de resposta simples e
direta. É o caso, por exemplo, das disciplinas de Português, Filosofia,
Geografia, História… Mais difícil o será em Matemática e Ciências Experimentais.
Os professores corretores/classificadores passaram por significativa
situação de desconfiança da parte do IAVE, IP – que lançou ações e contratos de
formação para professores corretores e classificadores; criou a figura do
supervisor; condicionou fortemente o período de gozo de férias dos docentes e
não os alivia significativamente dos restantes serviços escolares; entrega número
excessivo de provas ao corretor/classificador; dá indicações sobre aplicação
dos critérios definidos e publicados no regime do estica e encolhe (do fole ou do acordeão); e, nalguns casos, estabelece patamares de desempenho nas
respostas não permitindo a atribuição de cotações intermédias.
De todo, é inaceitável que a investigadora da Universidade de
Lisboa, Leonor Santos, sustente que a tendência para a subida das notas no processo
de revisão se deve mais “à atitude de base do classificador do que propriamente
a erros cometidos na primeira fase de classificação”. E que fosse! Sobretudo num
trabalho de análise acurada de prova, com o nível geral de conhecimentos evidenciados
pelos alunos e a multiplicidade de critérios definidos, não será impossível cometer
erros. E o reapreciador da prova não está ali como mero homologante do
resultado anterior.
***
A não ser que o requerimento de reapreciação incida
exclusivamente sobre erro na soma das cotações – caso em que não há lugar à
apresentação da alegação e à entrega de depósito em dinheiro, devendo o
Diretor promover a retificação – o pedido da reapreciação comporta o depósito duma
quantia de 25 euros, a devolver se o pedido vier a ser favorável ao
requerente.
A formalização
do pedido de reapreciação duma prova implica a suspensão da classificação
atribuída, sem prejuízo da sua utilização, a título provisório, na apresentação
de candidatura ao ensino superior, no caso dos alunos do ensino secundário. Mas
o aluno pode utilizar as notas resultantes da reapreciação na 1.ª fase do
concurso ao ensino superior (resultados a conhecer em setembro), desde que o façam até 2 dias úteis após a afixação
dos resultados das reapreciações.
O pedido de reapreciação é instruído com: um requerimento dirigido,
em modelo próprio, ao Presidente do Júri Nacional de Exames (JNE) em que se identifica o aluno, a prova e o estabelecimento
de ensino onde ela foi realizada e se declara expressamente ter conhecimento do disposto no
Regulamento das Provas de Avaliação Externa e de Equivalência à Frequência dos
Ensino Básicos e Secundário, sobre o processo de reapreciação das provas; e o
texto da alegação (também em
modelo próprio),
que deve indicar as razões que
fundamentam o pedido de reapreciação e referir os itens cuja classificação se
contesta.
É
de notar que os motivos invocados na alegação apenas podem ser de natureza
científica ou de juízo sobre a aplicação dos critérios de classificação ou
existência de vício processual, não podendo conter elementos identificativos do
aluno ou referências à sua situação escolar ou profissional, nestes se
incluindo a referência a qualquer estabelecimento de ensino frequentado, ao
número de disciplinas em falta para completar a escolaridade, às classificações
obtidas nas várias disciplinas, bem como à classificação necessária para
conclusão de ciclo e, no caso dos alunos do ensino secundário, para acesso ao
ensino superior, sob pena de indeferimento liminar do processo de reapreciação.
A prova será entregue a relator(es) que a reaprecia(m) na
totalidade, pelo que a classificação pode subir, descer ou ficar na mesma. E,
mesmo em caso de descida, a classificação que prevalece é a decorrente da
reapreciação, a não ser que seja alterada de novo na fase de reclamação. No entanto, a classificação da reapreciação não pode
implicar a reprovação do aluno, caso a nota anterior permita a aprovação. Nesse
caso, a classificação passaria a ser a classificação mínima que permite que aprovação
à disciplina.
Obviamente,
a alegação, que não vai assinada ao contrário do requerimento, não resulta do
facto (só em casos
excecionais isso aconteceria) de o aluno
estar com a cabeça fria e dispor de capacidade de raciocínio e de poder
argumentativo. Nesta fase, entra também o tal professor rodado no programa da
disciplina no ensino secundário ou algum causídico que tenha capacidade
argumentativa em face dos critérios definidos e conhecidos do público e da sua aplicação
ou não no ato de correção e classificação da prova.
Não obstante, se o encarregado de educação, ou o aluno maior
de idade, não concordar com o resultado da reapreciação, pode apresentar
reclamação, através de requerimento, semelhante ao do pedido de reapreciação,
mas em modelo próprio, e a prova sobe a outro(s) reapreciador(es). Para tanto, devem
ser fornecidas ao requerente, mediante o respetivo pagamento, cópias das diferentes
peças do processo, designadamente dos pareceres dos relatores e das grelhas de
classificação, devendo ocultar-se as assinaturas dos relatores.
A
reclamação deve refutar os argumentos apresentados pelo professor relator,
constituindo apenas fundamento desta a discordância na aplicação dos critérios
de classificação e a existência de vício processual, sendo indeferidas
liminarmente as reclamações baseadas em quaisquer outros fundamentos e, ainda,
as que, na fundamentação, contenham elementos identificativos do aluno ou
referências à sua situação escolar ou profissional, nestes se incluindo a
referência a qualquer estabelecimento de ensino frequentado, ao número de
disciplinas em falta para completar a escolaridade, às classificações obtidas
nas várias disciplinas, à classificação necessária para conclusão de ciclo e,
no caso dos alunos do ensino secundário, para acesso ao ensino superior. A
reclamação apenas pode incidir sobre as questões que foram objeto de
reapreciação, quer as alegadas pelo aluno quer as que, não tendo sido alegadas,
mereceram alteração da classificação por parte do professor relator.
***
Devo dizer que todo o professor conhecedor dos programas que
são objeto de avaliação tem de estar preparado para corrigir provas, caso
contrário a escola onde presta serviço tem de lhe prestar apoio e a formação
inicial de professores tem de ser revista. O IAVE, IP deve definir critérios de
correção e abster-se de dar contínuas indicações a corretores/classificadores,
que não podem ser meras correias de transmissão (de
quem até nem terá muito apurada a ciência). O pedido de reapreciação de prova é perfeitamente
legítimo. Já duvido da sanidade pedagógica da reclamação sobre a reapreciação. Até
na justiça é raro admitir-se recurso de sentença de igual sentido em duas instâncias
sobre o mesmo objeto. E essa da limitação do efeito da nota da reapreciação no
caso de induzir a reprovação de aluno supostamente aprovado revela um excesso
de garantismo. Um erro é passível de correção a todo o momento. A reapreciação comporta
um risco. E quem aceita correr riscos deve assumi-los. É a vida!
Judicializar a escola e a educação já é mau sinal. Mas judicializar
a escola e a educação a meio gás é pior. E nem tudo se deve permitir. Por Deus,
Cristiano Ronaldo não pode ser aceite como protótipo da figura feminina
evidenciada na sociedade; e fatorização tem de ser fatorização. E, por mais que
um aluno que eu tive dissesse e redissesse que Bocage foi um ultrarromântico,
não o foi. E 2 + 2 serão sempre quatro, a não ser que a conta esteja errada!
2017.08.19 –
Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário