A Amazónia está em chamas e o próprio Presidente
do Brasil já entendeu que devia fazer alguma coisa, aliás tudo o que deve, pela
Amazónia. Reconhecendo a amplitude da crise, decidiu destacar militares para o
combate ao fogo e assumiu a luta contra as queimadas.
A Igreja Católica, além de lançar o brado pela
Amazónia reforça a sua posição sobre o território em nome da proteção dos
indígenas e da salvação do planeta, que daí haure uma mui grande porção do oxigénio
que alimenta a nossa respiração, como a dos demais seres vivos.
***
Assim a urgência do cuidado da Casa Comum inspira os jesuítas do SJPAM (Serviço
Jesuítico Pan-amazónico) a defender
e promover a sustentabilidade ambiental e os direitos dos povos indígenas da
Amazónia, através dos projetos sociais, educativos e pastorais que realizam no
Brasil, Bolívia, Peru, Colômbia, Equador, Venezuela e Guiana.
Segundo o Vatican News, “Déjate abrazar” (“Deixa-te abraçar”) é o título da campanha lançada com um triplo
objetivo: “aumentar a conscientização
sobre os principais problemas do território, mostrar o trabalho realizado pelos
jesuítas na região e expandir redes de solidariedade que permitam captar
recursos para a sustentabilidade de seu trabalho”.
A campanha
pretende concretizar a rejeição a todas as formas de indiferença diante do
inadiável cuidado do bioma pan-amazónico e “deixar-nos abraçar pela Amazónia,
para acolher assim a vida que nos doa e suas necessidades mais urgentes”.
À “Vida Nueva” Alfredo Ferro, responsável
do SJPAM, comenta que “a Companhia de Jesus na América Latina, através da
Conferência dos Provinciais, tem uma rede chamada Red Claver que arrecada fundos para as obras sociais”. E, para
divulgar e participar na campanha, o SJPAM criou o site “dejateabrazar.org”.
Entretanto, o
alcance da campanha ultrapassa as obras da Companhia de Jesus na Amazónia,
conforme declarou o Padre Ferro:
“Nós, como SJPAM, respondemos à prioridade regional para a Amazónia,
motivo pelo qual se considerou importante unirmo-nos em prol das atividades que
realizamos e mais especificamente no apoio que damos à REPAM”.
Que a
Amazónia está em perigo revelam-no os números, que falam por si mesmos. Neste
sentido, o site “déjate abrazar” recorda que, segundo o World Wide Fund for Nature, nos últimos 50 anos a Amazónia perdeu
quase 20% de sua extensão social. Segundo a FAO, 420 comunidades indígenas
dependem diretamente dos seus recursos. E a ONG
Global Witness revela que em 2017 foram assassinados 57 líderes indígenas
brasileiros, por defenderem o meio ambiente. Por tudo isto, o SJPAM faz um
apelo à solidariedade por meio de uma plataforma de doação on-line, para a dádiva de qualquer valor
mensal em dólares ou soles peruanos, referindo o portal que a “sua doação ajudará a fortalecer a defesa da nossa
Mãe Amazónia”.
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Por sua vez, a Presidência do CELAM (Conselho Episcopal Latino-Americano) manifestou a 22 de agosto, a sua preocupação com os
incêndios que ocorrem em diferentes partes do mundo, especialmente na Amazónia,
cujos efeitos são de natureza global.
Fazendo eco
das palavras do Papa, os representantes da Igreja na América Latina e no Caribe,
em nota publicada pela presidência sob o título “Levantamos a voz pela Amazónia”,
exortam os homens e as mulheres a serem guardiões da criação.
O texto é,
segundo o Vatican News, assinado pelo
presidente, Dom Miguel Cabrejos Vidarte, Arcebispo de Trujillo, Peru; pelo 1.º
vice-presidente, Cardeal Odilo Pedro Scherer, Arcebispo de São Paulo, Brasil;
pelo 2.º vice-presidente, Cardeal Leopoldo José Brenes Solórzano, Arcebispo de
Manágua, Nicarágua; pelo presidente do Conselho de Assuntos Económicos, Dom
Rogelio Cabrera López, Arcebispo de Monterrey, México; e pelo secretário-geral,
Dom Juan Carlos Cárdenas Toro, Bispo-auxiliar de Cali, Colômbia.
Considerando
os terríveis incêndios que estão a consumir grande parte da flora e da fauna no
Alasca, na Gronelândia, na Sibéria, nas Ilhas Canárias e, em particular, na
Amazónia, os Bispos desejam manifestar a sua preocupação perante a gravidade
desta tragédia, que não é apenas de impacto local ou mesmo regional, mas de
proporções planetárias. E lê-se no seu texto:
“A esperança pela proximidade do Sínodo Amazónico, convocado pelo Papa
Francisco, está agora manchada pela dor desta tragédia natural. Aos irmãos
povos indígenas que habitam este amado território, expressamos toda a nossa
proximidade e unimos a nossa voz à sua para clamar ao mundo por solidariedade e
chamar a atenção para acabar com esta devastação”.
E, citando a
advertência profética do preâmbulo do Instrumentum
laboris para o Sínodo da Amazónia, escreve a presidência do CELAM:
“Na selva amazónica, de vital importância para o planeta, desencadeou-se
uma profunda crise por causa de uma prolongada intervenção humana, onde
predomina uma ‘cultura do descarte’ (LS 16) e uma mentalidade extrativista. A
Amazónia é uma região com uma rica biodiversidade, é multiétnica, pluricultural
e plurirreligiosa, espelho de toda a humanidade que, em defesa da vida, exige
mudanças estruturais e pessoais de todos os seres humanos, dos Estados e da
Igreja. Esta realidade vai além do âmbito estritamente eclesial amazónico,
porque se focaliza na Igreja presente em todo o mundo e também no futuro de
todo o planeta.”.
Por conseguinte,
a nota do CELAM exorta os governos dos países amazónicos (especialmente
do Brasil e da Bolívia) as Nações
Unidas e a comunidade internacional a tomarem medidas sérias para salvar o
pulmão do mundo, pois, como afirmam os bispos, o que acontece com a Amazónia
não é só uma questão local, mas global. Ou seja, “se a Amazónia sofre, o mundo
sofre”. E, recordando as palavras de Francisco na Homilia no início do
ministério Petrino, a 19 de março de 2013, diz o texto da presidência do CELAM:
Gostaríamos de “pedir, por favor, a todos aqueles que ocupam cargos de responsabilidade
nos âmbitos económico, político e social, a todos os homens e mulheres de boa
vontade: sejamos guardiães da criação, do projeto de Deus inscrito na natureza,
guardiães do outro, do ambiente; não deixemos que os sinais de destruição e de
morte acompanhem o caminho deste nosso mundo”.
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Também a
CNBB (Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil) emitiu na
tarde do passado dia 23, uma nota (também disponível em vídeo), sob o título “Levante a voz pela Amazónia”, sobre o
recente quadro de aumento de queimadas na região amazónica de que resultaram os
“absurdos incêndios” e outras criminosas depredações em curso na Amazónia, chamando
a atenção para a exigência de posicionamentos adequados. Diz o documento, que é
um lancinante apelo:
“É urgente que os governos dos países amazónicos,
especialmente o Brasil, adotem medidas sérias para salvar uma região
determinante no equilíbrio ecológico do planeta – a Amazónia. Não é hora de
delírios, desgraças e juízos e comentários.”.
No
documento, a CNBB ressalta que Sínodo dos Bispos sobre a Amazónia, convocado
pelo Santo Padre para outubro próximo – no cumprimento de sua tarefa
missionária e da evangelização – é sinal de esperança e fonte de indicações
importantes no dever de preservar a vida, a partir do respeito ao meio
ambiente.
E os Bispos
da CNBB observam:
“O povo brasileiro, os seus representantes e servidores têm a maior
responsabilidade na defesa e preservação de toda a região amazónica. O Brasil
possui significativa extensão desse precioso território, com o rico tesouro da
sua fauna, flora e recursos hidrominerais. Os absurdos incêndios e outras
criminosas depredações requerem, agora, posicionamentos adequados e
providências urgentes. O meio ambiente precisa de ser tratado nos parâmetros da
ecologia integral, em sintonia com o ensinamento do Papa Francisco, na sua
Carta Encíclica Laudato Si’, sobre o cuidado com a casa comum.”.
O pregão “Levante
a voz pela Amazónia” implica “um movimento, agora, indispensável, em
contraposição aos entendimentos e escolhas equivocados”, pois “a gravidade da
tragédia das queimadas e outras situações irracionais e gananciosas, com
impactos de grandes proporções, locais e planetárias, requerem que,
construtivamente, sensibilizando e corrigindo rumos, se levante a voz”. Por isso,
não se estranha o teor da nota da CNBB ao clamar:
“É hora de falar, escolher e agir com equilíbrio e responsabilidade, para
que todos assumam a nobre missão de proteger a Amazónia, respeitando o meio ambiente,
os povos tradicionais, os indígenas, de quem somos irmãos. Sem assumir esse
compromisso, todos sofrerão com perdas irreparáveis.”.
E a nota conclui
com o apelo “a construir juntos uma nova
ordem social e política, à luz dos valores do Evangelho de Jesus, para o bem da
humanidade, da Pan-Amazónia, da sociedade brasileira e sobretudo dos pobres
desta terra”, pois torna-se “indispensável promover e preservar a vida na
Amazónia e em todos os outros lugares do Brasil, mediante diálogos e
entendimentos lúcidos”.
***
Enfim,
jesuítas, bispo do CELAM e bispos da CNBB estão apostados na salvação do
planeta, que pode baquear pelo lado daquela região latino-americana. “Levantamos a voz” ou “Levante a voz” pela Amazónia são clamores oportunos – e deviam ser importunos – pela
preservação do planeta e pela ecoeconomia de rosto humano e de solidariedade
com os mais desprotegidos.
O Sínodo dos
Bispos para a Amazónia agendado para outubro próximo parece estar a ser toldado
pela espessura das nuvens do fumo amazónico e chamuscado pelas labaredas ígneas,
mas não deixa de ser luminoso “sinal de esperança e fonte de indicações
importantes no dever de preservar a vida a partir do respeito ao meio
ambiente”.
Também a
comunidade internacional se tem manifestado em prol da Amazónia que,
atualmente, é destaque na imprensa mundial pela emergência ambiental. O
presidente francês, Emmanuel Macron, pediu uma reunião neste final de semana
durante o encontro do G7. E a Amazónia tornou-se o tema central da cimeira do
G7.
O aumento no
número de focos de incêndio em florestas tem sido um dos assuntos mais repercutidos,
inclusive nas redes sociais, com destaque para a #PrayForAmazonia (“Reze pela Amazónia”). A repercussão dos internautas e de chefes de Estado faz referência às
imagens e aos dados do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que mostram um aumento de 82% no número de focos de
incêndio florestal entre janeiro e agosto de 2019, em comparação com o período homólogo
de 2018. O Mato Grosso é o estado com mais ocorrências. A relação, segundo
especialistas, é mais com o desmatamento e não tanto com uma seca mais forte.
“Esse círculo vicioso de poluição ambiental,
que o Papa Francisco denunciava na Laudato si’, convocando todos a uma
verdadeira cruzada contra a poluição e em defesa da nossa Casa Comum,
infelizmente é uma consciência que está longe ainda de chacoalhar (incomodar), de sacudir a consciência mesmo dos
cristãos e católicos”.
Assim, a
emergência ambiental na Amazónia implica o apelo a uma ética ecológica de desenvolvimento. A região tem sido afetada por aquela que, segundo especialistas, é a maior
onda de incêndios florestais no Brasil em sete anos. A repercussão, a nível
internacional, levou chefes de Estado e bispos brasileiros e bispo de toda a
América Latina a posicionarem-se: é, de facto, necessária uma orientação ética
ecológica na Amazónia, além da fiscalização séria por órgãos “que não podem, de forma alguma, ser
desautorizados ou desacreditados”, como afirmou Dom Jaime Spengler, o
vice-presidente da CNBB.
Por seu turno, Dom Dimas
Lara Barbosa, Arcebispo metropolitano da Arquidiocese de Campo Grande/MS,
relata a situação vivida localmente, como a atuação constante dos bombeiros
para apagar focos de incêndio. A consciência para o alerta desse “círculo
vicioso de poluição ambiental”, como comenta Dom Dimas, precisa de partir dos
cristãos para uma “verdadeira cruzada em
defesa da Casa Comum”. A este respeito, Dom Dimas declara:
“É com tristeza que a sociedade brasileira e
internacional constata esse permanente e crescente índice da utilização de
queimadas como alternativa para limpeza, fins agrários, e isso em todos os
campos do Brasil. Aqui em Campo Grande não é diferente. No nosso Estado, os
bombeiros já tiveram, nos últimos meses, que apagar focos de incêndio em quase
300 lugares – mas certamente são ações localizadas. Quando essa mentalidade se
espalha para o Brasil todo, a gente acaba ficando insensível diante, por
exemplo, do que acontece na Amazónia.”.
E clarifica em prol duma ecologia integral na sequência da encíclica
social do Papa Francisco e do que a CNBB vem defendendo de há muito tempo:
“Afinal de contas, a Amazónia não é um
património privado, nem é só do governo, ela é um património de todos os
brasileiros. E esse círculo vicioso de poluição ambiental, que o Papa Francisco
denunciava na Laudato si’, convocando todos a uma verdadeira cruzada
contra a poluição e em defesa da nossa Casa Comum, infelizmente é uma
consciência que está longe ainda de chacoalhar (incomodar), de sacudir a consciência mesmo dos
cristãos e católicos. Precisamos, de novo, de resgatar a Laudato si’ e a
história mesmo da Igreja no Brasil, que já promoveu várias Campanhas da
Fraternidade em torno do tema ecológico. Eu lembro-me de que já em 1979 houve
uma Campanha com o título ‘Preserve o que é de todos’. Então, a
consciência ecológica é por uma ‘ecologia integral’ que precisa ser
assimilada pelo nosso bom povo brasileiro e, particularmente, por aqueles que
têm o ofício de cuidar do que é de todos.”.
Por outro
lado, a CNBB pede fiscalização séria. As queimadas fora de controlo na Amazónia
também “chamam a atenção e preocupam” a CNBB. O vice-presidente, Dom Jaime
Spengler, afirma que é necessária uma fiscalização séria por órgãos “que não
podem, de forma alguma, ser desautorizados ou desacreditados”, pois, “segundo especialistas, o fator que melhor
explica o aumento no número de focos de calor naquela região é o desmatamento”,
embora provavelmente haja “também outras situações que caraterizam crimes
ambientais e que merecem atenção”. Ora, esses elementos apontam para a sempre
necessária fiscalização séria.
E Dom Jaime
discorre:
“Papel de destaque, nesse âmbito, possuem os órgãos de controlo que não
podem, de forma alguma, ser desautorizados ou desacreditados. Há vozes, é
verdade, que defendem o desenvolvimento da região através da exploração do
subsolo, das florestas, do avanço da agricultura... Certamente tudo isso pode,
sim, cooperar para o desenvolvimento da região, mas a que preço? Pode cooperar
para o desenvolvimento da região desde que as iniciativas sejam orientadas por
uma ética, digamos, ecológica; pela responsabilidade socioeconómica e
ambiental. Além disso, não se pode esquecer a dignidade e a nobreza dos
ecossistemas da região.”
Depois, estribando-se na palavra do Papa Francisco e na de pesquisadores
de renome, afirma:
“Recordo-me de que o Papa Francisco, na
Encíclica Laudato si’, fala do perverso sistema de propriedade e consumo
atual. É impressionante essa expressão. Por isso, daí a necessidade de
encontrar novos caminhos para a promoção da ‘ecologia integral’, no respeito
pelo ambiente, pelos povos nativos e pela própria terra.
“Pesquisadores renomados têm alertado com
insistência sobre a urgência de cuidado sério para os diversos ecossistemas.
Não se pode aceitar que expressões de impacto ou opiniões vagas sustentadas ou
influenciadas por interesses nebulosos ou escusos interfiram na vida desse
património extraordinário que é a região pan-amazónica.”.
***
Em suma,
a promoção, a defesa e a preservação do património comum da humanidade deve
mobilizar todos os cidadãos, instituições e organizações. E, se mais ninguém quiser
campear esta mobilização urgente, deve a Igreja fazê-lo: é também parte do núcleo
da sua missão de evangelizar. Cabe aos órgãos de soberania dos Estados travar o
espírito iconoclasta sobre o meio ambiente e o afã do lucro por quaisquer
meios. E a Igreja, obrigatoriamente perita em humanidade deve incentivar e
acompanhar a luta por estas causas.
2019.08.25 – Louro
de Carvalho
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