terça-feira, 21 de novembro de 2017

Sobre o Estatuto da Carreira Docente da educação e do ensino não superior

A propósito da luta dos professores portugueses pela integral contagem do serviço docente para efeitos de antiguidade profissional e consequente progressão na carreira – sendo que aqueles que viram o cronómetro parado durante dois períodos não consecutivos, um de 2 anos, 4 meses e 2 dias e outro de 7 anos (ainda estamos neste) deveriam ser reposicionados no escalão em que estariam se o tempo não tivesse estado congelado – muito se disse de imprecisão e até de mentira, parecendo querer de propósito intoxicar a opinião pública contra a classe docente, se é que não o querem mesmo fazer.
Chegaram a ponto de publicar o vencimento bruto dos professores em cada escalão/índice, o que não ofenderia, pois, as tabelas podem ser consultadas no site de qualquer sindicato ou federação de sindicatos de professores, que também trazem os descontos para CGA (11%), ADSE (3,5%) e IRS (variável consoante o estado civil e o número de titulares e de dependentes) – coisa que os “amigos” dos professores não sabem ver. O anedótico dessa publicitação reside em querer expor a classe, que alegadamente ganha bem e sai cedo, esquecendo que trabalham por tempos letivos, as reuniões de trabalho são fora do tempo de serviço, a formação contínua e especializada é for do tempo de serviço e, na maior parte das vezes, é paga pelo próprio. Onde mais é que isto acontece?!
Chegou a dizer-se que a grande diferença que há entre o trabalhador privado e o trabalhador público é que aquele é avaliado e que este não o é. Quando se contrapõe que os funcionários da Administração Pública (AP) estão sujeitos anualmente ao SIADAP (sistema integrado de avaliação na administração pública) e do SIADAPL (sistema integrado de avaliação na administração pública local), respondem que essa avaliação é apenas formal. Quem está dentro da AP sabe que não é assim e, se há erros na avaliação no âmbito da AP, também os pode haver na avaliação dos trabalhadores do setor privado, se é que todos estão sujeitos à avaliação de desempenho ou se não são penalizados discricionariamente. A prestação de serviço, pelos contactos que tenho tido, é equivalente no público e no privado: depende das pessoas que encontro no serviço. Tão simples!
Quando se fala dos professores, diz-se que não são avaliados e que, sempre que se levanta a questão da avaliação do seu desempenho vêm para a rua em força, porque não querem ser avaliados. O Primeiro-Ministro em funções em 2008 dizia que os professores não eram avaliados há mais de 30 anos e um antigo Secretário de Estado da Educação (na minha terra chamar-lhe iam “saieiro”) da Ministra Maria de Lurdes Rodrigues carpiu-se há dias porque alegadamente quiseram implantar um sistema adequado, mas os professores não o aceitaram. Recordo que tal sistema se inspirava num dos países pobres da América Latina que em breve o abandonou.
Também se confundiu com a avaliação dos professores a temática da PACC (prova de avaliação de conhecimentos e capacidades) a que tentaram sujeitar, sem êxito, os professores já profissionalizados por Escolas Superiores de Educação e Universidades que pretendessem entrar na carreira docente – quando o que está em causa é a avaliação de desempenho docente (ADD) que permite ou não a progressão na carreira, ou seja a mudança de escalão funcional e consequentemente de índice remuneratório.
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Indecentemente se espalhou na comunicação social a ideia de que a progressão dos professores é automática (contando apenas um conjunto determinado de anos de permanência em cada escalão).
Tal não é verdade, como se verá a seguir.
O Decreto-Lei n.º 41/2012, de 21 de fevereiro, que alterou o ECD (estatuto da carreira docente) e levou a cabo a última republicação, estabelece que a progressão na carreira em 10 escalões se faz mediante a verificação cumulativa dos seguintes requisitos:
1. Permanência dum período mínimo de serviço no escalão imediatamente anterior;
2. Atribuição, na última avaliação do desempenho, de menção não inferior a Bom;
3. Frequência, com aproveitamento, de formação contínua ou de cursos de formação especializada, pelos docentes em exercício efetivo de funções em estabelecimentos de ensino não superior durante, pelo menos, metade do ciclo avaliativo, num total não inferior a:
3.1 – 25 horas, no 5.º escalão da carreira docente;
3.2 – 50 horas, nos restantes escalões da carreira docente.
A progressão aos 3.º, 5.º e 7.º escalões depende, além dos requisitos previstos:
a) Observação de aulas, no caso da progressão aos 3.º e 5.º escalões;
b) Obtenção de vaga, no caso da progressão aos 5.º e 7.º escalões.
Onde está o automatismo?
A obtenção das menções de Excelente e Muito Bom no 4.º e 6.º escalões permite a progressão ao escalão seguinte, sem a observância do requisito relativo à existência de vagas.
Os módulos de tempo de serviço docente nos escalões têm duração de quatro anos, com exceção do tempo de serviço no 5.º escalão, que tem a duração de dois anos.
A progressão ao escalão seguinte opera-se nos seguintes momentos:
a) A progressão aos 2.º, 3.º, 4.º, 6.º, 8.º, 9.º e 10.º escalões opera-se na data em que o docente perfaz o tempo de serviço no escalão, desde que tenha cumprido os requisitos de ADD, incluindo observação de aulas quando obrigatório e formação contínua previstos nos números anteriores, sendo devido o direito à remuneração correspondente ao novo escalão a partir do 1.º dia do mês subsequente a esse momento e reportado a essa data;
b) A progressão aos 5.º e 7.º escalões opera -se na data em que o docente obteve vaga para progressão, desde que tenha cumprido os requisitos de ADD, incluindo observação de aulas quando obrigatório e formação contínua previstos nos números anteriores, sendo devido o direito à remuneração correspondente ao novo escalão a partir do 1.º dia do mês subsequente a esse momento e reportado a essa data. (cf ECD, art.º 37.º).
Os ciclos de avaliação dos docentes integrados na carreira coincidem com o período correspondente à duração dos escalões da carreira docente, devendo o processo de ADD ser concluído no final do ano escolar anterior ao do fim do ciclo avaliativo.
A avaliação dos docentes em regime de contrato a termo realiza-se no final do período de vigência do respectivo contrato e antes da eventual renovação da sua colocação, desde que tenham prestado serviço docente efetivo durante, pelo menos, 180 dias. (cf ECD, art.º 42.º).
O resultado final da avaliação a atribuir em cada ciclo de avaliação é expresso numa escala graduada de 1 a 10 valores. As classificações quantitativas são ordenadas de forma crescente por universo de docentes de modo a proceder à sua conversão em menções qualitativas nos seguintes termos:
a) Excelente se, cumulativamente, a classificação for igual ou superior ao percentil 95, não for inferior a 9 e o docente tiver tido aulas observadas;
b) Muito Bom se, cumulativamente, a classificação for igual ou superior ao percentil 75, não for inferior a 8 e não tenha sido atribuída ao docente a menção Excelente;
(Como se vê, o acesso a estas menções é limitado)
c) Bom se, cumulativamente, a classificação for igual ou superior a 6,5 e não tiver sido atribuída a menção de Muito Bom ou Excelente;
d) Regular se a classificação for igual ou superior a 5 e inferior a 6,5;
e) Insuficiente se a classificação for inferior a 5.
 Os percentis das alíneas a) e b) aplicam-se por universo de docentes a estabelecer por despacho dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da Administração Pública e da educação.
A atribuição das menções qualitativas de Muito Bom e Excelente depende do cumprimento efetivamente verificado de 95 % da componente letiva distribuída no decurso do ciclo de avaliação, relevando para o efeito as ausências legalmente equiparadas a serviço efetivo nos termos do ECD. (cf ECD, art.º 46.º).
A avaliação de desempenho dos professores (ADD) é objeto do Decreto Regulamentar n.º 26/2012, de 21 de fevereiro, que estabelece que a ADD é composta por uma componente interna, a cargo do coordenador do respetivo departamento curricular ou de quem fizer as suas vezes, e uma componente externa, a cargo de avaliador externo (de escalão igual ou superior ao do avaliado e do mesmo grupo) que observa as aulas, quando tal observação é obrigatória para a mudança de escalão nos termos acima referidos e quando o docente requer a sua sujeição a ela como condição para eventualmente obter a menção de Muito Bom ou de Excelente.
O Diretor avalia os docentes posicionados no 9.º e no 10.º escalão, bem como os do 8.º que tenham obtido pelo menos a menção de Bom ou, nos termos da legislação anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de fevereiro, a de Satisfaz.
O processo de avaliação fica a cargo da SADD (secção de avaliação do desempenho docente), constituída no âmbito do conselho pedagógico.
A avaliação baseia-se no relatório de autoavaliação (a sua não entrega implica a não contagem daquele ano para progressão na carreira) e respetivo parecer do avaliador, em que se descreva quantitativa e qualitativamente a participação do docente nas diversas vertentes da ADD e as ações de formação frequentadas com êxito, que também mereceram uma avaliação quantitativa e qualitativa (Excelente, de 9 a 10; Muito Bom, de 8 a 8,9; Bom, e 6,5 a 7,9; Regular, de 5 a 6,4; ou Insuficiente, de menos de 5); no documento de registo de participação nas dimensões – científica e pedagógica (esta só para os sujeitos à observação de aulas); de participação na escola e relação com a comunidade; e de formação contínua e desenvolvimento profissional –; e, facultativamente, o projeto docente, que tem por referência as metas e objetivos traçados no projeto educativo do agrupamento de escolas ou escola não agrupada e consiste no enunciado do contributo do docente para a sua concretização.
A avaliação com a menção de Irregular implica que o tempo de serviço daquele ano só seja contado após a sujeição do avaliado a um plano de formação com a duração de um ano proposto pelo avaliador e aprovado pelo Conselho Pedagógico; e a avaliação com a menção de Insuficiente implica a não contagem do tempo de serviço do respetivo ciclo avaliativo para efeitos de progressão na carreira docente e o reinício do ciclo de avaliação, bem como a obrigatoriedade de conclusão com sucesso de um plano de formação com a duração de um ano que integre a observação de aulas, proposto pelo avaliador ou avaliadores e aprovado pelo conselho pedagógico. Duas menções consecutivas de Insuficiente determinam a instauração de um processo de averiguações.
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Está visto que as progressões não são automáticas. Há dois escalões que exigem a existência de vaga e dois em que se exige a prova da observação de aulas, a qual se exige para os candidatos às menções de Muito Bom e Excelente, sujeitas ao sistema de quotas.
Assim, chegam mesmo todos os docentes ao topo da carreira? Quantos não foram para a aposentação e rescisão por mútuo acordo? Quantos chegaram ao atual 10.º escalão? (Que eu saiba, nenhum chegou a esse dito escalão). Aonde foram desencantar o mito de que todos os professores chegam ao topo da carreira em 34 anos? Se as progressões fossem automáticas, sim. De resto, não. E que os outros funcionários públicos demorariam 120 anos… Ora se a maior parte progride através do sistema de promoções para ocupação de categoria superior onde tem de haver vaga (e o conteúdo funcional pode ser diferente) e de promoção por mérito – o que não acontece com os docentes (os que estão fora do serviço na escola estão abrangido pelo regime de destacamento ou de requisição ou viraram a técnicos superiores). Apenas a Maria de Lurdes Rodrigues, para inglês ver atribuiu uns míseros prémios de liderança, de docência e de inovação – expressos em euros. As carreiras não são comparáveis, mas não pelos motivos invocados publicamente, mas pela especificidade da função.
É justo que polícias, militares e magistrados e outros trabalhadores da AP reivindiquem justiça para as suas classes, mas não pelo que é, ou não, hipoteticamente reconhecido aos professores, que iam ficando fora do barco, só porque são muitos. Mondem-nos ou podem-nos a ver se ficam mais viçosos. Mal hajam os fazedores de opinião pública, de meia tigela!
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Recordo que o Decreto Regulamentar n.º 26/2012, de 21 de fevereiro, sucede ao Decreto Regulamentar n.º 2/2010, de 23 de junho, que sucede aos Decretos Regulamentares n.os 2/2008, de 10 de Janeiro, 11/2008, de 23 de Maio – estes largamente rejeitados pelos professores –, n.os 1-A/2009, de 5 de Janeiro (promulgado em 31 de Dezembro de 2008, provavelmente como prenda de ano novo para os professores), e 14/2009, de 21 de Agosto. E estes sucederam, por mercê da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de fevereiro, ao Decreto Regulamentar n.º 11/98, de 15 de maio, que regulamentava o processo de avaliação do desempenho do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, que tinha anexo o “quadro de referência para a elaboração do documento de reflexão crítica, e que sucedeu ao Decreto Regulamentar n.º 14/92, de 4 de julho, que regulamentava o processo de avaliação dos docentes, previsto do ECD aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, e ao Decreto Regulamentar n.º 58/94, de 22 de setembro, que regulamentava o processo de avaliação dos docentes que exercem funções de direção nos órgãos de administração dos estabelecimentos de educação pré-escolar e dos ensino básico e secundário, introduzindo no regime genérico do diploma anteriormente mencionado as especificidades daquelas funções.
Como se vê, logo que houve ECD, apareceu um consistente regime de avaliação sistemática dos professores, que dantes era a aplicada aos restantes trabalhadores da AP, com adaptação ao sistema de ensino. O resto são balelas que apenas pretendem denegri a classe docente.

2017.11.20 – Louro de Carvalho

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