Não chove, a humidade no solo, no ar e na vegetação é reduzidíssima.
Arroios, corgos, riachos, regatos, ribeiros e nascentes (incluindo a do
Douro)
estão secos. Há regiões onde é escassíssima a água. E o IPMA (Instituto
Português do Mar e da Atmosfera) não prevê chuva significativa para breve, vindo
os especialistas a alertar para a possibilidade de secas mais frequentes no futuro
e podendo Espanha e Portugal sofrer “secas gigantes”
com duração de 15 anos.
O IPMA vem monitorizando
o clima de Portugal Continental e, em particular, as situações de seca que ocorrem
no território, sendo tal monitorização efetuada com base em dados
essencialmente de temperatura e precipitação, obtidos na rede de estações do
IPMA.
Deve enquadrar-se
a ocorrência de secas em anomalias da circulação geral na atmosfera que geram
flutuações do clima em escala local ou regional, pois sabe-se que a nossa
situação geográfica é favorável à ocorrência de episódios de seca, quase sempre
associados a situações meteorológicas de bloqueio em que o anticiclone
subtropical do Atlântico Norte se mantém em posição que impede as perturbações
da frente polar de atingirem a Península Ibérica.
Para melhor
acompanhamento público do fenómeno, o IPMA passou a monitorizar as secas
meteorológicas em Portugal Continental, tendo vindo a efetuar a monitorização
da evolução das situações de seca meteorológica, dando indicação mensal do grau
de severidade e produzindo uma antevisão da evolução, com cenários baseados em
probabilidades de ocorrência de precipitação no médio e longo prazo, extremos
climatológicos, risco de incêndio, índices ultravioleta e biometereológicos,
gases com efeitos de estufa e previsão de tempo horária a 10 dias, por distrito
e concelho.
Para análise
da Seca, o IPMA utiliza o índice de seca PDSI (Palmer Drought Severity Indez), desenvolvido por Palmer em
1965 e implementado e calibrado para Portugal Continental em 2003. Entretanto,
tem vindo a ser trabalhado um outro índice SPI (Standardized Precipitation Index) , quer internamente, quer pela participação em vários
projetos de investigação, como recentemente no projeto “Gestão de Risco em Secas”, com o ISA (Instituto Superior
de Agronomia), FCT (Fundação para
a Ciência e Tecnologia), FCUL (Faculdade de
Ciências da Universidade de Lisboa) e FCSH (Faculdade de
Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa).
Como
resultado implementou-se a execução regular do índice SPI (Standardized
Precipitation Index) por bacias
hidrográficas para Portugal Continental que passa também a ser disponibilizado
na Monitorização da Seca Meteorológica. O IPMA optou pela produção regular
deste índice, que foi considerado pela OMM como o índice aconselhado a
utilizar pelos serviços de Meteorologia e Hidrologia do mundo, para caraterizar
a seca meteorológica, incentivando a divulgação da informação nos respetivos websites em complemento aos outros
índices em uso. A informação da monitorização, além da sua apresentação no
portal do IPMA, constitui parte integrante do Boletim Climatológico Mensal (através do índice PDSI) do Instituto.
***
Mas o
problema não é só da Península Ibérica. Segundo, dados do IPMA, outubro de 2017
foi mais quente do que o habitual na maior parte dos países da Europa.
Recorrendo a medições de temperatura de superfície do solo obtida por satélite
(em inlês, Land Surface Temperature – LST) o Instituto verificou que a anomalia é pronunciada
quando a LST é máxima, tendo a Península Ibérica apresentado um padrão notável
de temperatura máxima, com várias regiões no seu noroeste onde a LST apresenta
anomalias superiores a 7 ° C. Também se registaram valores de LST anómalos durante
a noite, mas não tão elevados.
Note-se que
a temperatura da superfície do solo é estimada a partir das radiâncias na banda
do infravermelho térmico, medidas pelo sensor SEVIRI a bordo do Meteosat Second Generation a cada 15 minutos,
em condições de céu limpo, e que a LST não corresponde às habituais medições de
temperatura do ar feitas na estações meteorológicas, podendo existir diferenças
entre as duas temperaturas de vários °C. Com efeito, a Satellite Application Facility on Land Surface Analysis, consórcio
liderado pelo IPMA e que faz parte integrante do segmento terrestre da EUMETSAT
(European Organisation for Meteorological
Satellites), disponibiliza aos seus utilizadores estimativas da LST a cada
15 minutos desde 2004.
Mais: a Fração de Cobertura Vegetal observada
por satélite (no inglês, Fraction of Vegetation
Cover, FVC) sobre
Portugal evidencia o stress térmico a que a vegetação tem estado sujeita, com
valores inferiores aos valores médios observados em outubro na região. No
entanto, é evidente uma área de grandes dimensões com anomalias elevadas de FVC
(< -0,2) nos primeiros 10 dias de outubro que corresponde às
áreas ardidas dos meses anteriores, enquanto nos últimos 10 dias a destruição
da vegetação devido aos incêndios de 15 de outubro torna-se notória. Estes
resultados apresentam correspondência com os mapas de áreas ardidas fornecidos
pelo ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas).
***
Indubitavelmente, o sul da Europa está a aquecer mais rapidamente
que a média mundial, sendo que, no final do século, Portugal e Espanha poderão
vir a sofrer secas gigantes que vão durar vários anos e partes da Península
Ibérica serão transformadas em deserto. Se as piores
previsões da Universidade de Newcastle se concretizarem, a partir de 2100
Portugal e Espanha vão ter períodos de 15 anos com níveis de chuva muito baixos.
Com efeito, as projeções dos investigadores da universidade britânica
baseiam-se em 15 diferentes modelos climáticos usados pelos organismos reconhecidos
a nível mundial, como a NASA ou o Instituto Meteorológico
Planck.
Embora
cada um dos modelos climáticos tenha produzido diferentes resultados, os que preveem
“futuras secas extremas” acertaram em anteriores previsões, como sublinham os
investigadores em artigo publicado, este ano, no International Journal of Climatology.
Portugal
está a atravessar a 8.ª situação de seca severa ou extrema desde 1940, com a
mais grave no período entre 2004 e 2006. Espanha, por sua vez, teve três
grandes períodos de seca, com a última a durar 5 anos, entre 1990-1995, mas tem
vindo a sofrer vários períodos mais pequenos de seca nos últimos anos.
Os
investigadores analisaram dados dos 3 maiores rios da Península e referem que, “em
todos os modelos climáticos se prevê a intensificação da seca no Douro, Tejo e
Guadiana”. E frisam:
“Alguns
preveem pequenos aumentos nas condições de seca, mas a maioria prevê secas, que
podem durar 8 a 15 anos, com médias anuais de chuva muito baixas”.
A seca
agravou-se em outubro e está a afetar todo o território de Portugal
continental. O mês de outubro foi excecionalmente seco e quente, mesmo o mais
quente dos últimos 87 anos, com o valor da temperatura média do ar cerca de 3
graus acima do normal. A situação é de seca severa em 24,8% do território e de
seca extrema em 75,2%. Os campos estão secos e sem pastagens, os animais têm
cada vez menos alimento e muitos definham e chegam morrer. Rios e albufeiras
estão com elevadíssima míngua de água, levando à morte de peixes em barda e ao racionamento
de água a muitas das populações, a qual, muitas vezes, tem de ser transportada
em comboios e autotanques – o que acontece sobretudo na zona de Viseu, que emoldura
uma das cidades a que chamavam o peniquinho do céu por lá chover abundantemente
muitas vezes.
Os
produtores pecuários deitam as mãos à cabeça desesperados, pois as rações e
palha não são suficientes para alimentar os animais. As ovelhas comem o feno
espalhado manualmente por trabalhadores devido à falta de pastagens provocada
pela seca no Alentejo, como aconteceu, por exemplo, em Mora, a 2 de novembro de
2017.
No que
diz respeito à temperatura máxima, o IPMA afirma que se registou o valor médio
mais alto desde 1931, cerca de 5º C acima do normal, precisando que “o valor
médio da temperatura mínima do ar foi superior ao normal em cerca de um grau
centígrado”. O IPMA destaca os novos recordes de temperatura máxima e mínima
para o mês de outubro, com especial destaque para o dia 15, o mais quente do
mês e aquele em que se verificaram os fogos que provocaram a morte de, pelo
menos, 45 pessoas. Lê-se no seu boletim:
“Em
grande parte do território foram registados dias quentes (temperatura máxima
igual ou superior a 30°C), muito quentes (temperatura máxima igual ou superior
a 35°C) e noites tropicais (temperatura mínima igual ou superior a 20°C), no
período de 01 a 15 de outubro”.
De 24
a 29 de outubro, ocorreram dias quentes, também com temperaturas a rondar os 30
graus. De acordo com o IPMA, ocorreram duas ondas de calor, entre os dias 1 e
16 e de 23 a 30 de outubro, que abrangeram grande parte do território do
continente, com exceção do litoral.
A
primeira onda de calor teve uma duração máxima de 15/16 dias e está entre as
mais longas para outubro, que foi o mês mais seco dos últimos 20 anos, com 30%
da precipitação normal para a época. No final de outubro, todo o território de
Portugal continental encontrava.se em situação de seca severa (24,8%) e extrema
(75,2%), como se disse. Em situações de seca anteriores, verificara-se no
início do outono significativo desagravamento da severidade. Ao invés, na atual
situação verificou-se em igual período um agravamento das classes de maior
severidade, como assegura o IPMA.
E o ano de 2017 deverá estar entre os três anos mais
quentes de sempre, segundo revelou a OMM (Organização Mundial de Meteorologia) no dia em que se
iniciou a 23.ª Conferência do Clima em Bona, na Alemanha. Este ano ficará, pois, em segundo lugar, acima de 2015, mas abaixo de 2016. Todavia,
será o mais quente de sempre sem se verificar o fenómeno El Niño, que afeta
temperaturas, correntes marítimas e precipitação, segundo a OMM.
O ano
de 2016, em que se verificou um forte El Niño, é o ano mais quente em absoluto,
seguido de 2017 e 2015, desde que há registos. O secretário-geral da OMM,
Petteri Taalas, afirmou:
“Os
três anos mais recentes são os mais quentes já registados e incluem-se na
tendência para o aquecimento a longo prazo do planeta”.
O ano
de 2017 ficou marcado por acontecimentos climáticos extremos de intensidade
inédita, como os furacões nas Caraíbas e no Atlântico, temperaturas de 50º na
Ásia e a seca na África austral. Petteri Taalas sublinhou:
“Vários
destes fenómenos – os estudos científicos revelarão exatamente quantos – têm a
marca do aquecimento global provocado pelas concentrações de gases de efeito
estufa libertados pela atividade humana”.
Contando
de 2013 a 2017, está-se perante os 5 anos mais quentes de sempre, com o solo
calcinado, a vegetação reduzida a cinzas e a terra em vias de erosão, bastando
que, para o efeito, o corra m momento de precipitação forte de enxurrada.
***
Como
se deixou entender, está a decorrer em Bona, na Alemanha, a 23.ª Conferência do
Clima.
Os
representantes de 196 países deverão, entre os dias 6 e 17, chegar a acordo
sobre a aplicação das regras definidas em Paris para manter o aquecimento
global abaixo dos 2º C em relação à época pré-industrial. Comparando com níveis
de 1750, a concentração de dióxido de carbono aumentou 1,5 vezes e a de metano
duas vezes.
A OMM,
afirmando que a tendência verificada leva a um caminho perigoso e que a
concentração de gases de efeito estufa continua a aumentar, salienta:
“O
oceano absorve até 30% das emissões anuais de dióxido de carbono produzidas
pelos humanos, mas isso tem um custo para os corais, a aquicultura e o
equilíbrio químico dos mares”.
A
secretária-executiva da conferência, Patricia Espinosa, defendeu que o encontro
“deve servir de trampolim para todos os países e setores da sociedade, que
serão chamados a rever em alta as suas ambições para o clima”.
***
A seca
postula, em situação de emergência, a poupança de água, a sua distribuição
racional e extraordinária por quem mais precisa e a solidariedade na afetação
de recursos a pessoas e animais e a culturas essenciais, bem como a atenção à
iminência de incêndios e à vigilância sobre incendiários e eventuais fenómenos
que provoquem o fogo ou o potenciem, com o necessário combate a mobilizar
pessoas e meios, em termos de abnegação, coordenação, racionalidade, profissionalismo,
voluntariado e adequação.
Porém,
embora sejam necessários os programas e as comissões e equipas de emergência,
tudo passa pelas medidas estruturantes, como: reordenamento florestal, com predominância
das espécies autóctones, diversificação de plantações, rasgamento de vias de
acesso, aceiros, pontos de água, charcas, intercalação com campos de cereal e
leguminosas; diversificação de culturas agrícolas e equilíbrio entre cultivo de
sequeiro e de regadio; incentivo ao povoamento humano, vegetal e zoológico do Interior;
aumento de cotas nas barragens existentes; construção de grandes barragens para
produção elétrica, regadio e abastecimentos de água aos aglomerados
populacionais; ramificação de canais para irrigação por vastas áreas,
implementação, sempre que adequado e possível da rega gota a gota; recuperação e
reciclagem de águas residuais e das barragens de produção hidroelétrica – sem pôr
uma barragem, necessariamente, a servir para tudo ou, necessariamente, só para
uma coisa
Se o
homem nada fizer, as alterações climáticas desertificarão o território. Ora, é
preciso intervir para garantir mais elevados níveis de humidade nos solos, na
vegetação e no ar, conseguir uma temperatura ambiente mais moderada e a
amplitude térmica menos acentuada e, se possível, obter condições de maior e melhor
precipitação. Por outro lado, há que drenar alguns solos e criar mecanismos de recuperação
de águas efluentes dessa drenagem, desentupir periodicamente arroios, corgos,
riachos e ribeiros, sarjetas e aquedutos e dragar estuários, rias e simples
fozes.
Deixemo-nos
de lamentos, circunscrição a poderosos interesses; façamos mais política eficaz
e mais e melhor obra.
2017.11.13 – Louro de
Carvalho
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