A Missa dominical do dia 12 de novembro na Basílica da
Santíssima Trindade do Santuário de Fátima juntou grupos de Portugal, Espanha,
França, Itália, Alemanha, Polónia e Irlanda.
O reitor do
Santuário, comentando à homilia o Evangelho do XXXII domingo do Tempo Comum no
Ano A (Mt 25,1-13), que enuncia a parábola das 10 virgens (5 prudentes
e 5 insensatas) desafiou
os peregrinos a estarem “prontos” para o encontro com Deus, vivendo vigilantes
e comprometidos para serem Seus colaboradores, à imagem dos pastorinhos de
Fátima, as candeias acesas para Deus que brilharam para o mundo.
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Nos finais
do séc. I (década de 80), em que já
tinha passado a “febre escatológica”, não tendo os cristãos como iminente a vinda
de Jesus e, passado o entusiasmo inicial, a vida de fé dos crentes tinha
arrefecido e a comunidade tinha-se instalado na rotina, comodismo, facilidade.
Era urgente apresentar algo que abanasse os discípulos e os “redespertasse”
para o compromisso com o Evangelho. Neste ambiente, Mateus descobre que as
palavras do “discurso escatológico” de Jesus, colhido em Marcos, encerram uma
poderosa interpelação; e recompõe, com elas, uma exortação dirigida aos
cristãos, lembrando-lhes que a segunda vinda do Senhor está no horizonte final
da história humana, mas, enquanto não se realiza, os crentes são chamados a
viver com coerência e entusiasmo a sua fé, fiéis aos ensinamentos de Jesus e
comprometidos com a construção do Reino. Isto corresponde, na catequese primitiva,
ao que se denomina por chama “estar vigilantes, à espera do Senhor que vem”.
A parábola das
10 virgens alude aos rituais típicos dos casamentos judaicos. Segundo os
costumes, a cerimónia do casamento começava com a ida do noivo a casa da noiva,
para levá-la para a sua nova casa. O noivo chegava atrasado, pois devia, antes,
discutir com os familiares da noiva os presentes que ofereceria à família da
amada, sendo as negociações muito demoradas, mas necessárias por terem importante
função social. Os parentes da noiva deviam mostrar-se exigentes, sugerindo que
a família perdia algo de muito precioso ao entregar a menina a outra família. Por
seu turno, o noivo e os seus familiares ficavam contentes com as exigências,
pois assim mostravam aos vizinhos e conhecidos o valor e a importância da
mulher que entrava na família. Quem testemunhava o acordo, estava pronto para
ir avisar a noiva de que as negociações se concluíram com êxito e que o noivo
ia chegar. Entretanto, a noiva, vestida a preceito, esperava em casa do pai que
o noivo viesse ao seu encontro. As amigas da noiva esperavam também, com as
lâmpadas acesas, para acompanharem a noiva, entre danças e cânticos, à sua nova
casa, onde decorreria a festa do casamento e para onde era preciso partir.
A parábola tal como saiu da boca de Jesus, era uma
“parábola do Reino” (v. 1: “o Reino dos céus pode comparar-se…”). O Reino de Deus, aqui, é assemelhado a uma das
celebrações mais alegres e felizes dos israelitas: o banquete de casamento. As dez donzelas representam a totalidade
do Povo de Deus, que espera ansiosamente a chegada do Messias (o noivo). Uma parte desse Povo (as jovens prudentes
ou previdentes) está
preparada e, quando o Messias surgir, pode entrar a fazer parte da comunidade
do Reino; outra parte (as jovens, insensatas, descuidadas ou negligentes) não está preparada e não pode entrar na comunidade
do Reino. Não se prepara por comodismo, distração, indiferença.
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A parábola constitui, pois, um apelo aos israelitas no
sentido de não perderem a oportunidade de participar na grande festa, o se
replica como insistente apelo a todos os membros da Igreja de ontem, de hoje e
de sempre. Não consiste em ter só a alminha preparada para prestar contas ao
Senhor, mas em trabalhar pacientemente na construção e dilatação do Reino,
estendendo-o aos pobres, desabrigados, doentes, oprimidos e descartados
Mateus, quando escreveu, retomou a parábola,
adaptando-a às necessidades da comunidade. A parábola foi convertida em
exortação a estar preparado, em jubilosa e esperança e afincado trabalho, para
a vinda do Senhor, a qual pode acontecer no momento menos esperado. A festa é,
neste contexto, a segunda vinda de Jesus. O noivo que está para chegar é Jesus.
As dez jovens representam a Igreja que, experimentando na história as
dificuldades e as perseguições, anseia pela chegada da libertação definitiva.
Uma parte da Igreja está preparada, vigilante, atenta e, quando o “noivo”
chega, pode entrar no banquete da vida eterna; a outra parte não está preparada,
pois preferiu apostar nos valores do mundo, guiou a sua vida por eles e
esqueceu os valores do Reino.
Na perspetiva de Mateus, “estar preparado para acolher
a vinda do Senhor” significa escutar as palavras de Jesus, acolhê-las no
coração e viver de forma coerente com os valores do Evangelho. Significa,
fundamentalmente, viver na fidelidade aos projetos do Pai e amar os irmãos até
ao dom da vida, em todos os instantes da nossa existência – fazer comunidade
viva.
A mensagem que Mateus pretende, com a parábola, transmitir
aos cristãos da sua comunidade (e, no fundo, aos cristãos de todas as comunidades
cristãs de todos os tempos e lugares) é: nós os crentes, não podemos afrouxar a
vigilância e enfraquecer o nosso compromisso com os valores do Reino. Na
verdade, com o passar do tempo, as nossas comunidades têm tendência para se
instalarem no comodismo, na tibieza, no adormecimento, no descuido, numa vida
de fé que não compromete, numa religião de “meias tintas” e de facilidade, num
testemunho pouco empenhado e pouco coerente. É, no entanto, preciso que o nosso
compromisso com Jesus se renove cada dia. A certeza de que Ele vem outra vez,
deve impulsionar-nos a um compromisso ativo com os valores do Evangelho, na
fidelidade aos ensinamentos de Jesus e ao compromisso com o Reino.
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A partir do
Evangelho proclamado em todas as igrejas, cuja parábola sublinha a necessidade
de estar preparados para a vinda de Deus, a qualquer momento, o Padre Carlos
Cabecinhas sublinhou a importância de uma atitude vigilante, que não é apenas
“esperar passivamente” mas uma vida cristã atenta e comprometida.
O reitor do
Santuário frisou que “vigiar não é uma atitude passiva de quem se limita a
esperar a vinda de algo” mas uma vida “desperta” e “comprometida”, ciente
“das fragilidades e das limitações”. E precisou:
“Ter as lâmpadas acesas como nos convoca o
Evangelho é comprometermo-nos com Jesus, com os caminhos que Ele nos abre, com
o mandamento novo que é a Sua palavra”.
Por outras
palavras, “a parábola exorta-nos à vigilância e a estarmos preparados”, pois,
“o Senhor vem sempre; a questão é sabermos se estamos preparados ou não para O
seguir e fazer a Sua vontade”. E o reitor, lembrando que Deus se manifesta de
várias formas através da palavra, dos sacramentos e, sobretudo, no “amor aos
irmãos”, advertiu:
“Não basta dizer `sim Senhor, sim Senhor´; é
preciso fazer a vontade de Deus tal como os pastorinhos fizeram sempre,
procurando agradar a Deus em tudo o que faziam”.
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Em plena Semana
Nacional dos Seminários, que termina no dia 19, o Santuário de Fátima vem rezando
em todas as celebrações oficiais pelos Seminários, sintonizando nesta matéria
com toda a Igreja e, em particular, com a diocese de Leiria-Fátima, onde
está inserido.
E, às 11
horas do dia 13 de novembro, dia de peregrinação mensal que evoca as aparições
de Nossa Senhora na Cova da Iria – para o que se fizeram anunciar quatro grupos
da França, um da Alemanha, um da China, um de Itália, um do Brasil, um de
Espanha e um de Portugal – foi celebrada a Solenidade da Dedicação da Basílica
da Santíssima Trindade.
Ora, como
será de notar esta celebração tem semelhança com a parábola de Mateus, pois,
como a Basílica tem de estar exemplarmente com todos os seus elementos
materiais bem colocados e ajustados de modo que o edifício se torne
equilibrado, robusto e belo e se apresente com uma referência genuína de Jesus
Ressuscitado para o meio ambiente, também a Igreja edifício espiritual, que é
mais importante, precisa de todas as suas pedras vivas no sítio, em equilíbrio
dinâmico e harmónico, de modo que se mantenha sempre como gruta de acolhimento,
marco de referência, torre de vigia esperançosa que estenda dos braços a todas
as periferias existenciais.
Por isso, o reitor do Santuário de Fátima desafiou, na homilia, os
peregrinos a viverem “como ‘pedras vivas’ da Igreja e em união com o Santo
Padre”, cabeça visível deste edifício místico.
Na celebração
da solenidade da Dedicação da Basílica da Santíssima Trindade, o Padre Cabecinhas salientou o significado de ser Igreja e sublinhou a importância
de se fazer memória de uma Dedicação, afirmando:
“A celebração da Dedicação de uma igreja é
um convite a tomarmos consciência do que significa ser Igreja, uma vez que nos
orienta sempre para o mistério da Igreja de pedras vivas que aí se reúne”.
Também disse
que “a comunidade cristã e o coração humano são o verdadeiro templo, o lugar do
encontro com Deus”. E salientou que, além do convite a ser igreja, este é um
momento “de tomada de consciência da nossa união com o Santo Padre, sinal
visível da unidade da Igreja”.
O Reitor do
Santuário lembrou que os Pastorinhos, depois das aparições, manifestaram sempre
essa comunhão com o Santo Padre, sobretudo através da oração, referindo:
“Desde então, rezar pelo Santo Padre e pelas
suas intenções tornou-se parte integrante da própria mensagem e prática
habitual no Santuário”.
Recorde-se
que o Santuário de Fátima celebrou a 13 de novembro de 2012, pela primeira vez,
a solenidade da Dedicação da Basílica da Santíssima Trindade. Pelo decreto de
19 de junho de 2012, assinado pelo então Prefeito da Congregação para o Culto
Divino e a Disciplina dos Sacramentos, cardeal Dom António Canizares Llovera, a
Igreja da Santíssima Trindade recebeu o título de Basílica e ficou estipulado o
dia 13 de novembro como a data anual da Celebração Litúrgica da Dedicação da
Basílica da Santíssima Trindade.
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Podemos
olhar as virgens insensatas da parábola como pedras pouco cuidadas do templo,
deslocadas, mal conservadas ou como pessoas ignorantes, desmazeladas e
desprevenidas. Por isso, fazem quatro coisas inúteis: pedem às outras que as
salvem, pois já não têm tempo; saem de noite para procurar quem venda azeite
para as lâmpadas, o que é absurdo; chegam quando a porta já está fechada; e
obviamente clamam sem serem escutadas: “Senhor, Senhor, abre-nos”. Como resposta têm a recusa: “Não
vos conheço”. Assim,
ficamos a saber que temos de estar preparados para a segunda vinda de Cristo e
não estar a perder azeite da nossa lâmpada durante o caminho da vida por negligência,
por brincadeira no carrossel da fortuna ou com as solicitações do prazer. Como
são Paulo, cremos firmemente na segunda vinda do Senhor. Por isso, temos de
estar preparados e acordados, mas não de braços caídos e, sim, trabalhando de
forma consciente e digna pelo sustento integral, ajudando os outros a
preparar-se. Desta sorte, quando o Senhor vier, encontrar-nos-á com a lâmpada
da fé acesa, com a alegria da esperança satisfeita, com o azeite da caridade
derramando-se por essa nossa lâmpada, com a consciência tranquila e com a paz
na alma esperando o abraço de Deus.
Olharemos
Cristo, dado como o Esposo, pois o que teremos e saborearemos na parusia serão
as bodas eternas com o nosso Salvador e os seus amigos que se mantiveram fiéis
à aliança. A metáfora das bodas simboliza a relação de amor, de índole nupcial,
que se realiza entre Deus e cada um de nós, entre Jesus e a sua Igreja. Porque
este Esposo Cristo chega mesmo, mas chega tarde e de improviso, temos de estar
preparados, bem-dispostos e com a paciência de Deus. Cristo abrir-nos-á a porta
com às virgens sensatas, que estavam acordadas e tinham tudo preparado e que
entram na festa das bodas. Mas a porta fechar-se-á atrás de nós para os
negligentes como se fechou para as virgens néscias. Puderam entrar as sensatas porque
encheram de azeite as suas almotolias, e assim impediram que a caridade, que é
a chama da alma, se extinguisse. Não podemos cabecear, dormitar ou adormecer.
Um automobilista não pode permitir-se o luxo de conduzir sob sono, álcool ou
estupefacientes; um médico não pode se ausentar duma operação delicada e ir
embora para dormir; um piloto de avião não pode converter a sua cabina num dormitório.
Um só instante de sono ou mesmo de sonolência poderia ser fatal para tais
pessoas e causaria um desastre nunca justificável. Assim acontece com a nossa
vida cristã.
Por fim, que lições
encerra para nós esta parábola? Primeiro,
ficamos a saber que que estamos na vida para ir para a
eternidade gozar do Reino que está preparado para nós desde o princípio do
mundo (cf Mt 25,34), para o encontro com Cristo, que está já a preparar
o banquete de bodas definitivo, antecipado e significado aqui na terra pelo banquete
da Eucaristia pelo sinal e véu do sacramento. Segundo, sabemos que temos de encher sempre a
lâmpada da nossa fé com o azeite da caridade e do amor e a força da esperança,
pois só assim Jesus nos reconhecerá e daremos com a porta no meio da escuridão
do caminho; finalmente, saberemos que, se não fazemos isto, entraremos
desgraçadamente dentro do grupo dos ignorantes e fátuos, por falta de
prudência, e seremos excluídos do banquete e escutaremos de Cristo a voz justiceira
que será o irreversível “Não vos conheço”, pois não praticámos a justiça como Deus quer. Com
isto, o Senhor alerta-nos que, junto com a possibilidade da salvação final,
existe a possibilidade da condenação eterna, que muitos hoje querem negar,
tendo como escudo este sofisma: “Deus é
tão bom, que não permitirá que ninguém se condene”. Deus é sério. “De
Deus ninguém zomba. O que o homem semear, isso colherá” (cf Gl 6,7). Se brincarmos com a lâmpada da fé comprando outras velas
no supermercado do mundanismo imoderado, talvez se quebre. Se não se alimentar a
lâmpada com a caridade, ela apagar-se-á. Mas até lá temos sempre a oportunidade
da misericórdia, que nos dá a fortaleza para prosseguirmos depois da queda de
que nos refazemos.
Não percamos,
pois, o lugar, a sobriedade, a vigilância, a rota, o lume, o azeite. Assim
seremos sempre as pedras vivas do templo do Senhor, no lugar certo e no momento
certo, na função certa para glória de Deus e bem de todos nós.
2017.11.17 – Louro de Carvalho
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