quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Porto perde EMA, que Amesterdão ganhou por sorteio

Foi escolhida, no passado dia 20 de novembro, a cidade que vai acolher a Agência Europeia do Medicamento (EMA, na sigla em inglês). Com as duas cidades finalistas – Milão e Amesterdão – empatadas na última ronda, com 13 votos cada uma, a decisão foi tomada através de sorteio.
O empate resultou do facto de, na contagem final, um dos votos dos 27 Estados-membros (cada um com direito a um voto na terceira ronda) ter sido considerado inválido. Pelo sistema de votação, para vencer, uma das cidades precisava de mais de metade dos votos, 14 votos neste caso. Por isso, houve necessidade de recurso ao sorteio entre as finalistas.
Percurso semelhante teve a escolha, também em 20 de novembro, da nova sede da Autoridade Bancária Europeia (EBA, na sigla em inglês), presentemente em Londres, com 8 candidaturas. Na votação para eleger a futura sede, passaram à segunda volta Dublin, Paris e Frankfurt, tendo as duas primeiras recolhido mais votos e passado à terceira e última volta, na qual se registou uma igualdade (13 votos cada), sendo por isso necessário recorrer a sorteio. No sorteio, realizado no Conselho de Assuntos Gerais da UE, a capital francesa venceu e, assim, acolherá o organismo de regulação dos bancos no mercado único.
Nesta corrida à EMA em três votações, a cidade do Porto ficou em 7.º lugar na primeira ronda de votações, tendo ficado por ali. É certo que esta era uma das cidades candidatas, mas foi afastada na primeira ronda da votação. Concorriam 16 cidades – Malta, Croácia e Irlanda retiraram as candidaturas – e a proposta portuguesa recolheu 10 votos, entre 13 cidades.
As rondas de votações sobre a nova localização da EMA, que vai deixar Londres por força da saída do Reino Unido da UE, decorreram na reunião do Conselho de Assuntos Gerais da União Europeia, em que Portugal esteve representado pela Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, sendo que a ausência foi duramente criticada pelo eurodeputado Paulo Rangel, como se o Estado estivesse atrelado à pessoa em si e não a quem o representa.
No escrutínio participaram 27 Estados-membros – o Reino Unido foi excluído por ter iniciado o Brexit –, que decidem um dossiê a que também se candidataram-se cidades de outros 18 países comunitários. Cada um dos 27 países votou, 1.ª ronda, com três pontos na proposta favorita, dois para o segundo projeto preferidos e um para a terceira escolha. Se um dos países tivesse conseguido as votações máximas de todos os Estados-Membros teria vencido automaticamente. 
Na 1.ª ronda de votações, Milão conseguiu 25 pontos, enquanto Amesterdão e Copenhaga conquistaram 20 pontos. O Porto foi a sétima cidade mais votada, a par de Atenas, tendo recolhido 10 votos. A Invicta ficou atrás de Bratislava (15 votos), Barcelona (13 votos) e Estocolmo (12 votos); e à frente de Bona, Lille e Sófia (todas com 3 votos), Viena (4 votos), Bruxelas e Helsínquia (ambas com 5 votos), Bucareste e Varsóvia (7 votos). As candidaturas da Irlanda e da Croácia nem sequer foram a votos, como se disse.
A 2.ª ronda de votações ditou a eliminação de Copenhaga, com esta cidade a conquistar apenas cinco votos. Assim, Milão e Amesterdão disputaram a votação final. Nesta 2.ª ronda, Milão conseguiu 12 votos e Amesterdão nove.
Na 3.ª ronda, Milão e Amesterdão conseguiram 13 votos, tendo sido necessário desempatar através de um sorteio conduzido, segundo o “The Politico”, pela Estónia, que está atualmente na presidência do Conselho da União Europeia.
A localização da agência é disputada pela movimentação de recursos que representa: conta atualmente com 890 trabalhadores; recebe cerca de 35 mil representantes da indústria por ano; e representaria um benefício de 1,3 milhões de euros para a economia portuguesa.
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A três dias desta votação em Bruxelas, o Governo português ainda mostrava confiança na vitória da candidatura portuguesa para acolher a sede da Agência Europeia do Medicamento. Ana Paula Zacarias assegurou que nos últimos meses “foi feito um intenso trabalho diplomático”, com “numerosíssimas diligências diplomáticas” junto dos outros 26 países e o envolvimento de “toda a rede de embaixadas, da Representação Permanente de Portugal junto da União Europeia e de vários membros do Governo”, incluindo o Primeiro-Ministro, António Costa, que, ainda na manhã do dia 20, tinha deixado uma mensagem de confiança no Twitter.
Segundo um relatório da Deloitte, pedido pelo Infarmed, a relocalização da EMA em Portugal teria um impacto de 1,3 mil milhões de euros na economia portuguesa até 2030, incluindo a geração de receitas fiscais de cerca de 164 milhões de euros nos primeiros dez anos e também a criação de 5.300 postos de trabalho.
A candidatura portuguesa arrancou mais tarde do que a generalidade das concorrentes, uma vez que Governo português quis inicialmente candidatar a cidade de Lisboa, que já acolhe duas infraestruturas comunitárias – a Agência de Segurança Marítima e o Observatório da Droga –, sem ponderar se outras localizações teriam melhores hipóteses. Só no Conselho de Ministros de 13 de Julho, a poucos dias de terminar o prazo oficial para a apresentação de um dossiê de candidatura junto da Comissão Europeia, é que o Executivo socialista, após as visíveis pressões, aceitou e referiu que a Cidade Invicta tinha melhores condições que a capital para protagonizar a candidatura portuguesa. Porém, no mês seguinte, o Ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, avisou que Portugal não “[iria] comprar a relocalização” da agência.
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O Porto, que protagonizou a candidatura portuguesa, ficou de fora desta corrida logo na primeira votação. A escolha foi feita em três rondas de votações e, no final, teve de se desempatar através de sorteio. Na 1.ª ronda e na 2.ª, Milão conseguiu recolher o maior número de votos. Mas na 3.ª e última registou-se um empate, tendo ambas as cidades captado 13 votos. A Eslováquia absteve-se nas duas últimas rondas, depois de Bratislava ter sido dada como uma das potenciais vencedoras, o que se soube logo ao início da tarde que não iria acontecer. 
Rui Moreira, autarca portuense, assentiu que sempre soube que “a batalha era muito difícil”, mas que, “apesar de geograficamente periférico, o país mostrou que tinha capacidade, que cumpria todos os critérios e que o Porto podia receber uma agência desta natureza e dimensão”. E acrescentou, segundo uma nota de imprensa do município:

O facto de o Porto se ter posicionado entre as cidades favoritas para acolher uma das maiores agências europeias fez com que a cidade atingisse níveis de notoriedade, prestígio e reconhecimento nunca antes alcançados. Agora estamos ainda mais mira dos investidores internacionais; para além de sermos um polo turístico de grande importância, hoje somos uma cidade para investir e para viver como há poucas na Europa.”.
O Primeiro-Ministro deixou uma mensagem à cidade e ao autarca portuense na rede social Twitter, salientando que o resultado “confirma o Porto como uma grande cidade europeia”.
E Marcelo Rebelo de Sousa confessou que não tinha criado grandes expectativas em relação a este processo. Porém, citado pela Lusa, à saída da conferência “O poder da Educação na conquista da Igualdade”, em Lisboa, disse:
Acho que a candidatura foi muito bem apresentada, mas as hipóteses sempre achei que eram muito limitadas”. 
O Presidente da República também considerou que o resultado seria o mesmo se Portugal tivesse apresentado Lisboa a esta corrida, pois “havia equilíbrios no quadro europeu em relação às várias agências que tornavam muitíssimo difícil à partida, quer para Lisboa quer para o Porto, a vitória”.
A Associação Comercial do Porto (ACP) considerou que, apesar de a cidade não ter sido a escolhida para acolher a Agência Europeia do Medicamento, ganhou “imensa reputação e prestígio” e beneficiou de grande promoção internacional.
O Presidente da ACP, Nuno Botelho, citado em comunicado a que a Lusa acedeu, sustentou:
Neste desafio competimos lado a lado com mais 18 grandes cidades europeias. Foi um trabalho árduo e muito intenso. Mostrámos as nossas forças, as nossas caraterísticas únicas e a nossa capacidade de unir o país pelo êxito comum.”.
Frisando o intenso envolvimento da cidade e do país no processo, o responsável pela ACP sublinhou que o Porto mostrou ser uma “cidade única, cosmopolita, equilibrada, enérgica e com muito charme histórico”.
Apesar de sair derrotada, a cidade ganhou “posicionamento e reputação” e mais visibilidade e capacidade para captar investimento; e o sucesso da candidatura é “inquestionável”. Depois, afirmou que os ganhos para o Porto e para o país nos próximos tempos serão “imensos”, não apenas em termos institucionais e políticos, mas também turísticos e económicos. Noutro sentido, segundo Botelho, o Porto conquistou a vitória da descentralização, da afirmação, da projeção e do trabalho em rede. E Nuno Botelho concluiu:
Estas foram as vitórias da cidade do Porto. Inequívocas. Todos nos devemos orgulhar. Estou certo que, numa próxima batalha, esta experiência e este empenho trarão ainda mais dividendos.”.
Também em comunicado, o Presidente da Câmara do Porto, o independente Rui Moreira, assinalou hoje que a cidade entrou “na corrida” para acolher a sede da Agência Europeia do Medicamento para ganhar, mas sempre soube que era uma “batalha muito difícil”.
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O que fica, afinal, para a Cidade Invicta?
Apesar deste insucesso na missão política e diplomática de atrair da EMA, o Governo antecipou-se, no dia 17 de Novembro, como se disse, a salientar as vantagens desta campanha promocional sobre a cidade, qualquer que fosse o resultado esta tarde em Bruxelas. Ana Paula Zacarias lembrou que “serviu para divulgar o Porto em todas as capitais europeias, onde [foi dada] a conhecer a capacidade para fazer uma candidatura desta dimensão”. E disse que “fazendo esta, pode fazer muitas outras no futuro para outras entidades e instituições”. E Adalberto Campos Fernandes, Ministro da Saúde concordou:
Independentemente do resultado, Portugal e o Porto ganharam com uma candidatura que honrou o país. Uma candidatura nacional que, nas diferentes condições postas, soube responder com competência e qualidade. […]. O Porto mostrou a sua vitalidade e capacidade para acolher instituições de elevada diferenciação, não apenas ao nível económico, mas sobretudo ao nível científico. E temos a certeza de que se abriram portas para a cidade no futuro.”.
Também o presidente da Câmara do Porto, que foi uma das vozes que mais se fizeram ouvir para que a cidade fosse também considerada neste processo, explicitou num encontro com a imprensa que “nada será como dantes” e “doravante, quer em situações desta natureza de carácter europeu, quer noutras, o Porto passa a estar no mapa das cidades que podem acolher estes investimentos e estas instituições”. E insistiu:
Passamos a estar no mapa, passamos a estar num campeonato onde até hoje nunca tínhamos estado. (…) Passar a fazer parte das cidades que podem concorrer neste tipo de candidaturas, é muito interessante.”.
Rui Moreira aludiu também ao “trabalho de levantamento importante” feito para este processo e que incluiu também “uma análise custo-benefício dos recursos” de que a cidade dispõe. Alguns desses elementos resultaram de um estudo encomendado à EY pela Associação Comercial do Porto, divulgado a 10 de Outubro, que colocava a Invicta numa lista de cinco favoritas para receber a sede da EMA em 2018.
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É verdade que a cidade do Porto ganhou mais visibilidade por estar numa corrida internacional. Que seja tanta notoriedade que dê para empolgar os dirigentes autárquicos e comerciais do Porto, longe disso. Mas, como dizia Jorge Coelho em 1999, quando os partidos da oposição festejavam o facto de o PS não ter obtido a maioria absoluta nas eleições legislativas, cada um festeja o que pode.
Não dou por garantido que seja pela corrida à EMA que haja mais investidores estrangeiros ou que o Porto ganhe preponderância em relação à capital. Também o Porto sediou a cimeira que estabeleceu o Espaço Económico Europeu, mas queria que a cimeira de Santa Maria da Feira, que encerrou a segunda presidência portuguesa da UE, ficasse designada por cimeira do Porto, o que Guterres acabou por travar. O megacentralismo não é, pois, exclusivo de Lisboa. Está por demonstrar se o Porto tinha ou não mais capacidades do que Lisboa para se candidatar à corrida pela EMA e o contrário.
As declarações de Rui Moreira e de Nuno Botelho sabem mesmo a provincianismo e saloiísmo. Não é propriamente o saber perder, mas querer vislumbrar vitória onde ela não está.
Por seu turno, o Governo acenou aos portuenses com um prémio de consolação, um rebuçadito para entreter as crianças: a sede do Infarmed fica no Porto, passando Lisboa a ter um polo regional. Os trabalhadores ficaram surpreendidos pela decisão meramente política não suportada em nenhum estudo, vindo o Governo a correr tranquilizar os trabalhadores. E ainda demagogicamente Governo e seus sequazes vêm elogiar um primeiro grande rasgo da descentralização.
Somos mesmo uma cáfila. Então, um ato de descentralização quando acabam de sair do Porto os serviços da CMVM! E que descentralização significou a instalação, por 8 meses, de quatro secretarias de Estado fora de Lisboa no consulado de Santana Lopes? Também o distrito de Viseu esteve sediado nos seus primeiros meses na cidade de Lamego. E com que vantagens para Lamego ou para Viseu?

2017.11.22 – Louro de Carvalho

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