Ocorreu
a 23 de setembro e foi orientada pelo Bispo do Porto Dom António Francisco dos
Santos ante uma igreja matriz da sede da vigararia repleta de participantes.
A
reflexão que fora anunciada como Ser
Testemunhas da misericórdia – desafios pastorais consistiu no essencial na
apresentação do Plano Diocesano
de Pastoral para 2016/2017, que entronca no Plano Diocesano de Pastoral
2015-2020 (PDP)
e o integra. O plano quinquenal desenvolve-se e desdobra-se em 5 etapas, ao
ritmo de cada ano pastoral sendo que as suas metas, objetivos, caminhos e
atividades espelham a “consciência da Igreja” do Porto e projetam “o horizonte
temporal do trabalho eclesial a realizar e do caminho sinodal que a percorrer”.
Três coisas, portanto: consciência da Igreja, trabalho eclesial, caminho
sinodal – em que somos guiados “pelo
amor misericordioso de Deus”, amor que, animados pelo Espírito Santo, alma da
Igreja, vemos “em Cristo, Seu Filho e rosto da misericórdia do Pai”.
O lema ‘A alegria do Evangelho
é a nossa missão’ constitui a força inspiradora da programação pastoral e a
matriz unificadora do quinquénio e
cria a certeza de missão que “reforça o nosso vínculo à Palavra de Deus
e à Boa Nova de Jesus, que diariamente nos convoca a proclamar as
bem-aventuranças e a realizar as obras de misericórdia com alegria”.
Ao longo do quinquénio, traduzimos
para o hoje e aqui “a Palavra de Deus
e o Evangelho” e, focados na exortação apostólica Evangelii Gaudium (EG), (que Francisco apresentou como paradigma
do seu ministério e programa da sua missão), na encíclica Laudato si’ (LS) e na
exortação apostólica Amoris Laetitia (AL), encontramos no magistério da
Igreja, nomeadamente nos documentos conciliares, na vida, palavras e gestos do
Papa “orientações, instrumentos e contributos indispensáveis para a nossa
missão”. Conscientes dos imensos desafios de iniciação e de formação cristã que
enfrentamos, sobretudo na catequese e catecumenato, e dos “amplos e
interpeladores os novos horizontes de presença transformadora e de intervenção
ativa dos cristãos no mundo, mormente no campo da família, da educação, da
cultura e da ação social”, não olhamos o Plano como “produto acabado, “receita
eficaz” ou “resultado antecipadamente adquirido”. Porém, sabemos que “o tempo é
sempre maior do que o espaço” e que há sempre tempo desde que haja vontade. E
este é o nosso tempo, o tempo da Igreja referida a Cristo e enraizada nos “espaços
humanos, físicos, culturais e territoriais”. É tempo a gerir na união “em redes
de trabalho e comunhão paroquial, interparoquial, vicarial e diocesana”, pois,
“só na comunhão afetiva e efetiva da Igreja concreta”, em que cremos, que
servimos e amamos, “veremos o que Deus nos pede e receberemos em abundância os
dons que Deus tem oferecido à Igreja do Porto”.
O Plano não se reduz a “uma
metodologia pastoral, mesmo que ancorada em experimentadas pedagogias de práxis
pastoral”, mas procura, desde a conceção e elaboração, à execução e avaliação, delinear o rosto da Igreja na colegialidade, na corresponsabilidade, na comunhão
e na unidade. É o rosto duma Igreja,
“vivificada pelo Espírito de Deus, alimentada pela Palavra e fortalecida pelos
Sacramentos”, que “mostra ao Mundo a beleza da fé, a força da esperança e a
ousadia da caridade” – valores e virtudes que “o Mundo mais procura na Igreja e
mais direito tem a encontrar” nos cristãos. O Plano constitui “necessariamente
um sinal muito belo do amor de Deus pela Igreja do Porto e do compromisso
generoso de leigos, consagrados (as), diáconos, presbíteros e bispos,
disponíveis e prontos para a missão”, sendo que “um dos valores primeiros do
trabalho pastoral” que neste PDP se anuncia está na abertura de alma de cada um,
das comunidades, estruturas e serviços, movimentos e obras, instituições e
grupos “ao amor misericordioso de Deus por nós, acolhido, celebrado, vivido e
testemunhado em Igreja”. Para tanto, cumpre continuar a caminhada feita até o
presente, focados no Ano da Misericórdia, clamando ‘Felizes os
misericordiosos’ e ‘praticando as obras de misericórdia, com
alegria!’, pois os frutos do Ano Jubilar “perdurarão no tempo” e “a Igreja
deve prosseguir os caminhos” que Francisco “diariamente nos abre e nos convida
a percorrer”, procurando que a “misericórdia divina lhe modele o coração, para
que seja uma Igreja de rosto terno e de coração materno e nos ensine e eduque a
sermos misericordiosos como o Pai”.
A visita da Imagem Peregrina de
Nossa Senhora de Fátima à diocese (de 10 da abril a 1 de
maio) não deixou ninguém
indiferente à sua passagem e presença e “Ela levou, no seu coração de Mãe, esta
Igreja do Porto, sentiu a alma mariana das suas gentes e abriu-nos sendas novas
de evangelização e de missão”. Por isso, em sintonia com a celebração do
centenário das aparições aos pastorinhos e na perspetiva da visita do Papa a
Fátima e a Portugal, em maio pf, voltamo-nos para Maria, Mãe de Deus e nossa
Mãe, a Virgem Peregrina, a Mãe de ternura e a Senhora da Mensagem, que nos
impele a “uma pastoral de proximidade e de acolhimento” e “nos guia em todos os
caminhos de missão, nos conforta e consola nas aflições, nos fortalece na
comunhão, nos guia para as fontes da alegria, onde a Igreja se renova em missão”.
Que pela sua “mensagem de ternura, de graça, de misericórdia e de paz, nos
ilumine e nos guie para que ‘com Maria, a Igreja do Porto se renove
nas fontes da alegria!’. (cf Prólogo do Plano Diocesano).
***
O Plano
para o novo ano pastoral tem como referência dois eventos: a Visita da Imagem Peregrina de
Nossa Senhora no Ano da Misericórdia, com as intuições e desafios para a
missão que despertou; e a
celebração do Centenário das Aparições em Fátima, como fonte
de inspiração e de renovação pastoral.
***
A propósito da Visita da Imagem
Peregrina, Dom António remeteu para a saudação “Causa da nossa alegria” (04.04.2016), em que referiu com os bispos
auxiliares:
“Maria, Mãe de
Misericórdia, não nos distrai dos acentos pastorais que temos à nossa frente.
Melhor do que ninguém, Ela nos ajudará a abrir os olhos e o coração à Boa Nova
de Jesus Cristo; a descobrir que ‘a alegria do Evangelho’ é mais que uma frase:
é o segredo de uma vida com sentido e é, por isso, a nossa missão’.”.
E este tempo de graça “deu
ao Jubileu genuína expressão feminina e materna da misericórdia divina”, pelo
que azou a proposta dumas linhas de ação pastoral, emergentes da bênção desta
Visita e da vivência do Ano Jubilar, que ajudam a delinear o caminho pastoral
do quinquénio.
1.
A Imagem de uma Igreja em saída.
A Imagem da Virgem Peregrina, “que vai à frente, que sabe tomar a iniciativa
sem medo, ir ao encontro, procurar os afastados e chegar às
encruzilhadas dos caminhos” (EG,24), é um ícone expressivo da Igreja
em saída (EG,24; 49)
e missionária nas aldeias, vilas ou cidades, mesmo fora do próprio círculo de
relações eclesiais e serviços comunitários, “para entrar em contacto com as pessoas,
famílias e instituições”, a oferecer a todos “a vida de Jesus Cristo (EG,49) e a sua misericórdia”.
2.
A Virgem da ternura e a cultura do encontro. A adesão popular e a alegria
incontida e espontânea das pessoas evidenciaram a força dos afetos, pois, como
reitera o Papa, não podemos “ter medo
da ternura” e sabemos que “as relações materno-filiais não têm
códigos rígidos”. Este
epifenómeno sugere-nos a promoção da cultura do encontro e a pastoral de
proximidade, de atenção concreta às pessoas, de derrube de algumas “alfândegas”
(EG,47;
AL,310) e
“burocracias” que inibem, atrapalham e bloqueiam a nossa ação pastoral, que
constrangem as pessoas a aproximar-se da Igreja e a integrar-se nela. É preciso, além de promover a
formação de elites laicais, “dar voz e vez à consciência dos fiéis (AL,37;
222; 303), à
participação a que têm direito e ao dever missionário de todos os batizados. E será utópico pensar numa dinâmica
sinodal, sem que a corresponsabilidade pastoral esteja devidamente enraizada e organicamente
estruturada – o que exige uma conversão pastoral.
3.
Maria, “Causa da nossa alegria”. A
visita de Maria ficou marcada por uma alegria contagiosa, difusiva, e
por uma beleza, mais persuasiva do que qualquer discurso, sendo que o povo vive
“a alegria do Evangelho” (EG,84) e, no seu jeito e linguagem, “professa,
celebra, vive e reza a sua fé”.
Ora, no pastoral 2016-2017,
deveremos insistir no esforço de conduzir o Povo de Deus às fontes da alegria,
à frescura da Palavra e à seiva dos Sacramentos, onde a vida cristã se alimenta
e se renova em missão. Assim “Com Maria, renovai-vos nas fontes da
alegria” (cf Is 12,3)
será o lema do próximo ano pastoral a desafiar-nos a “recuperar a
frescura original do Evangelho” (EG,11), a percorrer “a via da
beleza” (cf EG,167),
“na redescoberta da Liturgia”, que põe “em comunhão o céu e a terra”, envolve “a
pessoa, na sua inteireza, no seu corpo espiritual e no seu espírito encarnado”.
4.
A Misericórdia como princípio de ação pastoral. Aquela alegria contagiosa
exprimiu-se “em muitas lágrimas de dor, de sofrimento, de solidão, de
desencanto, de feridas abertas nas famílias, de desespero” na procura de terra,
teto ou trabalho. Por isso, a Imagem da Virgem Peregrina desafia-nos a aprender
a chorar com os que choram (Rm 12,15), a fazer da misericórdia e compaixão
o nosso princípio de atuação pastoral, tratando misericordiosamente a todos, a
começar pelos que nos procuram (PDP,p 31), “resgatando a misericórdia de uma
conceção sentimental e moralizante”. “Precisamos
de comunidades samaritanas” numa sociedade que não raro parece sem coração,
comunidades capazes de se aproximarem e se abrirem ante os olhos que sofrem,
sem preocupação pela sua “identidade geográfica, religiosa ou legal” (alusão
aos migrantes e refugiados).
5.
A piedade popular como força de evangelização. Esta iniciativa tão acolhida em
toda a Diocese evidencia “a necessária valorização e evangelização da piedade
popular”, como “uma força de evangelização” (PDP,p
27). E esta adesão
em massa e emotiva desafia-nos a aproveitar melhor as manifestações da
religiosidade popular, para o primeiro anúncio, o do “amor pessoal de Deus
que Se fez homem, que Se entregou a Si mesmo por nós e, vivo, oferece a
sua salvação e a sua amizade” (EG,128). Hoje, a pastoral “deve ser fundamentalmente missionária”
(AL,230), partindo dos valores culturais
das comunidades e valorizando-os à luz do Evangelho.
6.
A beleza da comunhão que irradia em missão. O mais importante ponto desta
reflexão de proposição pastoral talvez seja “o sinal e a força da comunhão e da
corresponsabilidade na missão, que esta iniciativa evidenciou e potenciou”,
pois reuniram-se tantos filhos “à volta da Mãe de Jesus” em “clima de festa”. Assim,
“as iniciativas programadas e realizadas de modo interparoquial, o trabalho colaborativo
e subsidiário desenvolvido em vigararia, a sinergia de pessoas, grupos,
paróquias, movimentos, comunidades religiosas, associações e instituições, mostraram-nos
como em equipa, em conjunto e em comunhão, fazemos muito mais e muito melhor, e
que afinal “o todo é superior à parte”.
7.
O segredo de Maria: renovai-vos nas fontes da alegria. Não podemos deixar de nos
confiar à Mãe de Misericórdia e de Lhe pedir que volte para nós os seus olhos misericordiosos,
“porque Ela é Mãe”, e “consegue tanto e faz tanto por nós, ultrapassando limites
e excedendo expectativas”; ademais, o seu Coração Imaculado desafia-nos a
edificarmos uma Igreja de rosto materno, ‘uma
mãe de coração aberto’ (EG,46-49), “com as mesmas entranhas de
misericórdia, desafiada pela sua prontidão para sair e servir”.
***
Quanto ao centenário das
aparições, saliente-se que o cunho mariano da pastoral e a perspetiva da misericórdia
persistirão ao longo de todo o ano pastoral, tendo em conta a dimensão nacional
e internacional da celebração do centenário, sob o lema “O Senhor fez
maravilhas”.
A Mensagem de Fátima contém
elementos inspiradores e desafiadores, no âmbito do regresso às fontes da alegria,
como a prática da oração e adoração e o regresso à fonte dos sacramentos,
nomeadamente os da Reconciliação e da Eucaristia, que devemos potenciar e
valorizar. Por isso, está prevista a peregrinação da diocese do Porto a Fátima
(a
única ocorreu em 1956).
1.
O prelúdio das aparições: a fonte da Eucaristia. Antes das aparições de Maria,
vem o ciclo das aparições do Anjo da Paz: na primavera de 1916 e, com ela, a
comunicação das palavras de adoração, “Meu Deus, eu creio, adoro, espero e
amo-Vos; no verão, o
Anjo de Portugal fala de desígnios de misericórdia e pede o sacrifício pela conversão dos pecadores;
e, no outono, o Anjo dá a comunhão sob as duas espécies aos pastorinhos e
repete a oração:
“Santíssima
Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, adoro-Vos profundamente e
ofereço-Vos o preciosíssimo Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Jesus
Cristo…”.
Na aparição de 13 de julho de
1917, Maria pede a comunhão reparadora dos primeiros sábados e o sacrifício com
a intenção: Ó Jesus, é por vosso amor. Nas duas aparições a Lúcia
em Pontevedra, pediu a devoção dos primeiros sábados (confissão
e comunhão). Assim,
Fátima não se entende nem se vive sem a redescoberta da Eucaristia e da sua
centralidade, sendo que é na Eucaristia que a “Trindade” nos alcança.
Fátima desafia-nos, pois, a recolocar Deus no centro da nossa vida, o que
implica a expressão prática da volta à fonte da Eucaristia. Se Maria nos diz em
Caná Fazei o que Ele vos disser (Jo 2,5), Jesus diz-nos a respeito da Eucaristia
e suas implicações: “Fazei isto em memória de mim” (1Cor 11,24; Lc 22,19).
2.
A Mensagem das aparições: as fontes da oração e da penitência. Paulo VI define a Mensagem de
Fátima, como mensagem de oração e penitência, oração e conversão para
alcançar a Paz. Por isso, “importa rezar para abrir o coração à ação de
Deus e transformar o mundo”. O apelo à oração é comum a todas as
aparições de Fátima. Assim, Bento XVI diz que “Fátima é uma janela de
esperança que Deus abre, quando o homem Lhe fecha a porta”. Ora, a porta
que abre o homem a Deus é a oração: sem oração não há conversão, sem conversão
não há mudança de vida e sem mudança de vida não há paz. É, pois, necessário
recolocar e reinstalar Deus na nossa vida. A visão do Inferno na 3.ª
aparição é a imagem da vida sem Deus, imagem de que temos de nos livrar. Por
isso, a Mensagem reforça o apelo à conversão, que abre a pregação de João
Batista e o ministério público de Jesus: “Convertei-vos porque está
próximo o reino de Deus” (Mt 3,2). Cabe, pois, valorizar as
formas de primeiro anúncio e experiências de encontro com Cristo, na oração,
que levem a uma verdadeira conversão. E “destaca-se, com particular urgência, a
necessidade da formação da consciência” e de “educar para o verdadeiro
sentido da penitência”, nomeadamente em ordem ao sacramento da
Reconciliação. É verdade que, se o homem não se reconhece pecador, “nada faz
para evitar o pecado ou para o remediar, e a graça da salvação começa a ser por
ele descurada”, perdendo o crente a “consciência da Páscoa do Senhor e da razão
da sua morte na Cruz”.
3.
A revelação das aparições: Graça e Misericórdia. A Trindade de Deus-Amor é
revelada a Lúcia na última aparição, em Tui (13.06.1926), em duas palavras: Graça e
Misericórdia. E o Papa declara anaforicamente na Bula Misericordiae
vultus:
“Misericórdia é a palavra
que revela o mistério da Santíssima Trindade. Misericórdia é o ato último e
supremo pelo qual Deus vem ao nosso encontro. Misericórdia é a lei fundamental
que mora no coração de cada pessoa, quando vê com olhos sinceros o irmão que
encontra no caminho da vida. Misericórdia é o caminho que une Deus e o homem,
porque nos abre o coração à esperança de sermos amados para sempre, apesar da
limitação do nosso pecado” (MV,2).
Assim, a Mensagem fatimita
alenta-nos e desafia-nos a voltar às fontes da graça e da alegria como
expressão atualizada das “mirabilia Dei” que Maria canta no Magnificat (Lc
1,46-56) e como se
reza na Vigília Pascal, na bênção da água:
“Senhor nosso Deus:
pelo vosso poder invisível, realizais maravilhas nos vossos sacramentos”
(Catecismo da Igreja Católica – CIC,1217).
A perspetiva da celebração dos
sacramentos como “maravilhas” de Deus decorre do conceito bíblico de
“memorial”, essencial à nossa compreensão dos sacramentos:
“No sentido que lhe
dá a Sagrada Escritura, o memorial não é somente a lembrança dos acontecimentos
do passado, mas a proclamação das maravilhas que Deus fez pelos homens
(Ex 13,3). Na celebração litúrgica destes acontecimentos, eles tornam-se
de certo modo presentes e atuais” (CIC, 1363).
A mensagem teológica fatimita nas
duas palavras “Graça e Misericórdia” estimula a prossecução duma pastoral que
dê o primado à graça e à misericórdia. Porém, a tentação de pensar que os
resultados dependem da nossa capacidade de agir e programar sempre insidia
qualquer caminho espiritual e a ação pastoral. Ora, se Deus nos pede a real
colaboração com a sua graça, convidando-nos a investir no serviço pela causa do
Reino todos os recursos de inteligência e ação, também é certo que “sem Cristo,
nada podemos fazer” (cf Jo 15,5)”. E, sobre a misericórdia, como princípio
pastoral, recordou-nos o Papa Francisco:
“(…) sem diminuir o
valor do ideal evangélico, é preciso acompanhar, com misericórdia e paciência,
as possíveis etapas de crescimento das pessoas, que se vão construindo dia após
dia”, dando lugar à “misericórdia do Senhor que nos incentiva a praticar o bem
possível”.
Compreendendo quem prefere
pastoral mais rígida, sem confusões, o Papa crê sinceramente que Jesus quer uma
Igreja atenta ao bem que o Espírito derrama no meio da fragilidade: uma Mãe
que, enquanto expressa a sua doutrina objetiva, “não renuncia ao bem possível,
ainda que corra o risco de sujar-se com a lama da estrada”. Pelo que os pastores,
ao proporem aos fiéis o ideal pleno do Evangelho e a doutrina da Igreja, devem
ajudá-los a assumir a lógica da compaixão pelas pessoas frágeis e evitar
perseguição ou juízo demasiado duro e impaciente. É o Evangelho que exige que
não julguemos nem condenemos (cf Mt 7,1; Lc 6,37).
4.
A revelação aos pequeninos: a simplicidade evangélica. As aparições dão-se em país
pobre, num local ermo, a serra de Aire, a três humildes crianças: os irmãos
Francisco (9 anos)
e Jacinta (7 anos)
e a prima Lúcia (10 anos). É a lógica da revelação: a escolha dum povo pobre,
a escolha dos pobres, humildes e simples (Mt 11,25). Com efeito, só a humildade abre o coração para Deus,
só “os puros de coração verão a Deus” (Mt 5,8), na linha do cumprimento das
bem-aventuranças, dos pobres, humildes, puros de coração, perseguidos…, linha que
Fátima confirma. Foi Jesus quem convidou os discípulos
a “tornarem-se como as crianças”, pois é “a quantos são como elas que pertence
o Reino de Deus” (cf Mt 18,3; Mc 10,14). E disse o Papa (Audiência de 18.03.2015):
“As crianças trazem
vida, alegria, esperança e também problemas. Mas é melhor uma sociedade com
estas preocupações e estes problemas, do que uma sociedade triste e cinzenta,
porque permaneceu sem filhos!”.
5.
O testemunho das crianças: a resposta vocacional. Os pastorinhos são crianças que,
mesmo ante ameaças e ambiente de hostilidade, dão testemunho heroico de fidelidade
a Deus e à Igreja, espelhado na oração diária e no sacrifício generoso das suas
vidas, no amor à Eucaristia e ao Santo Padre e na atitude contemplativa face à
obra da criação. Ajudam-nos a perceber que a iniciação
à vida espiritual e a descoberta da vontade de Deus não é assunto que se possa
omitir, na infância ou relegar para a adolescência e juventude, pois também
nesta fase da vida é possível à pessoa responder e corresponder aos apelos de
Deus. Por isso, o Papa, a 7 de
setembro de 2015, aquando da Visita ad limina dos Bispos de Portugal,
foi claro no seu desafio, ao denunciar o risco duma catequese escolarizada e
esta urgência:
“Precisamos de conferir
dimensão vocacional a um percurso catequético global, que possa cobrir as
várias idades do ser humano, de modo que todas elas sejam uma resposta ao bom
Deus que chama: ainda no seio da mãe, chamou à vida e o nosso ser assomou à
vida; e, ao findar a sua etapa terrena, há de responder com todo o seu ser a
esta chamada: «Servo bom e fiel, entra no gozo do teu Senhor»”.
6.
Senhora mais brilhante que o sol: a dignidade da Mulher. A
exclamação de Lúcia, “Era uma Senhora mais brilhante que o Sol”, aproxima-se da visão bíblica da
Mulher “vestida de sol” (Ap 12,1-6) e inspira-nos a reforçar o
cunho mariano da atividade evangelizadora da Igreja, a partir do qual, sob novo
ângulo e profundidade, compreenderemos o mistério da Igreja, que valoriza o
génio feminino e desenvolve um rosto materno que a faz brilhar e resplandecer
como Mãe que “gera os filhos para uma vida nova, os alimenta, educa, orienta,
perdoa, cuida e acompanha sempre, com ternura e amor, sem nunca deixar de
interceder por eles”. Ademais, a
mulher, para a Igreja, é imprescindível. Bastar-nos-á imaginar o que seria a
vida das nossas comunidades, associações, movimentos e obras e o que seriam as
nossas celebrações e iniciativas pastorais sem o contributo específico das
mulheres.
O Papa, na Amoris Laetitia, afirma:
“A grandeza das mulheres implica todos os direitos decorrentes da
sua dignidade humana inalienável, mas também do seu génio feminino,
indispensável para a sociedade. As suas capacidades especificamente femininas –
em particular a maternidade – conferem-lhe também deveres, já que o seu ser
mulher implica também uma missão peculiar nesta terra, que a sociedade deve
proteger e preservar para bem de todos” (AL,173).
Com o Papa sentimos que “é necessário
ampliar os espaços de uma presença feminina mais incisiva na Igreja” (Revista
La Civiltá Cattolica, 19.08.2013). Estamos convictos, pois, de que os novos passos
a dar devem ter subjacente
uma profunda teologia da mulher na Igreja, que ainda está por fazer. No
recente encontro com as participantes na PUISG (Plenária
da União Internacional das Superioras-Gerais), o Papa reiterou que o génio
feminino é muito necessário nos lugares de discernimento, reflexão,
programação, decisão e revisão, na vida da Igreja, pois o olhar típico da
mulher enriquece a visão e a construção da realidade eclesial e do mundo.
7.
A alegria da criação: a aliança entre a humanidade e o ambiente. A Mensagem e os eventos de
Fátima dão-se em ambiente puro e agreste, num contexto de grande harmonia entre
os pastorinhos e o ambiente natural em que vivem e crescem. Gostavam de ouvir o
eco da sua voz no fundo dos vales e sabiam admirar o nascer e o pôr do sol e
chamavam ao astro-rei a “candeia de Nosso Senhor”. Quando não viam a
Lua, diziam que faltava o azeite na “candeia de Nossa Senhora”. E as estrelas
eram as “candeias dos Anjos”. Estas crianças viviam e praticavam os seus
jogos e brincadeiras em perfeita aliança com a natureza, numa atitude de
gratidão e louvor, nos seus cânticos, de respeito, de sobriedade (LS,224), em grande alegria e paz (LS,225), podendo ser, neste sentido, postos
como modelos duma “aliança entre a humanidade e o ambiente”, tal como
nos é proposto na Encíclica Laudato si’ (LS,209-227), e ajudar-nos a uma verdadeira “conversão
ecológica” (LS, 216-217), que nos leve a viver a alegria
da criação (LS,222)
e a “cuidar da casa comum”.
8.
O sentido da peregrinação: o caminho da alegria. O espírito de peregrinação
jubilar, vivido intensamente no Ano da Misericórdia, continua e amplia-se nas
peregrinações a Fátima, que devem ser devidamente preparadas, espiritualmente acompanhadas
e celebradas em clima de verdadeira alegria, que a experiência do caminho e
visão do santuário sempre desperta no peregrino. Os santuários comportam
o convite à alegria, que se experimenta ao abrigo desta “tenda do encontro”
de Deus com o seu povo, lugar da aliança, do encontro com a Palavra de Deus, com
a Eucaristia e com a Reconciliação e do compromisso com a Caridade, a partir do
exemplo de Maria, “santuário do Deus vivo”. No Salmo 122 (um
dos Salmos cantados pelos peregrinos a caminho do Templo) cantamos: “Exultei quando me disseram, “Iremos à casa do Senhor”...”.
Aí experimentamos a alegria do
encontro com os irmãos (cf Sl 122,1), a “alegria do perdão” para “fazer
festa (Lc
15,32), porque “há
alegria entre os anjos de Deus por um só pecador que se arrepende” (Lc
15,10). E, reunidos
à volta da mesma mesa da Palavra e da Eucaristia, sentimos a “alegria da
comunhão” com Cristo, a que foi sentida por Zaqueu quando O acolheu em sua casa
“cheio de alegria” (Lc 19,6), a “alegria perfeita” (Jo
15,11), que ninguém
poderá tirar (cf Jo 16,23)
de um coração fiel que se tornou, ele mesmo, templo vivo do Eterno” (Sl
43,4)”.
9.
O triunfo da misericórdia: irradiar a esperança. Na segunda aparição em Fátima (13.06.1917), Maria garante a Lúcia: “O meu
Imaculado Coração será o teu refúgio e o caminho que te conduzirá a Deus”.
Isto é: A misericórdia triunfa do juízo. Deus não desiste de nos
procurar, até nos alcançar. O seu amor e misericórdia vencem. É a redescoberta
da paixão e compaixão de Deus pela humanidade e um sinal de esperança
para todo o mundo. A devoção ao Imaculado Coração de Maria é a redescoberta
do coração materno de Deus e do seu amor visceral por nós. Neste
sentido, a Mensagem de Fátima estimula-nos a prosseguir a meta do
objetivo geral enunciado no Plano “irradiar a esperança e servir na caridade”.
A experiência da visita da Imagem Peregrina, o Ano da Misericórdia e
seus frutos e a perspetiva do centenário das aparições ajudarão redescobrir
a misericórdia divina e a tornarmo-nos pessoas misericordiosas.
***
O Plano
Diocesano de Pastoral 2016-2017, tendo em conta o tema geral “A
alegria do Evangelho é a nossa missão”,
gravita à volta do tema específico do ano “Com Maria, renovai-vos nas fontes
da alegria”. Entronca, pois, no Plano Diocesano de Pastoral para o
quinquénio 2015–2020, cujo objetivo
geral é:
A
Igreja Diocesana, marcada pela alegria do Evangelho, que nasce do encontro com
Cristo na beleza da fé, renova-se em missão para irradiar a esperança e servir
na caridade.
E os
seus objetivos específicos são:
1.
Descobrir a condição alegre e feliz da nossa identidade cristã;
2.
Assumir a vocação de discípulos missionários para uma Igreja em saída, que se
carateriza por:
2.1.
Ir à frente, tomar a iniciativa sem medo, ir ao encontro, procurar os afastados
e chegar às encruzilhadas dos caminhos para acolher e convidar os excluídos; 2.2.
Oferecer misericórdia, fruto de ter experimentado a misericórdia infinita do
Pai e a sua força difusiva; 2.3. Envolver-se com obras e gestos na
vida diária dos outros de modo a encurtar as distâncias, tocando a carne
sofredora de Cristo nos irmãos; 2.4. Acompanhar com bondade e paciência
e atenta aos frutos, porque Deus a quer fecunda; 2.5. Valorizar a
dimensão festiva bela e da fé como fonte de um renovado impulso para se dar; 2.6.
Abrir as suas portas de modo que os pobres sintam cada comunidade cristã como
sua casa.
3.
Consciencializar as pessoas, as famílias e as comunidades para o valor da
vocação e para a responsabilidade de serem promotoras das diferentes formas de
chamamento, nomeadamente as de especial consagração.
4.
Atualizar e implementar a renovação das estruturas eclesiais, paroquiais, vicariais
e diocesanas, adequando-as às novas exigências e dinamismo da missão.
O lema
para cada um dos cinco anos do Plano Diocesano de Pastoral é:
1.º Ano:
A Alegria do Evangelho é a nossa missão – Felizes os misericordiosos!
2.º Ano:
A Alegria do Evangelho é a nossa missão – Com Maria, renovai-vos nas fontes
da alegria!
3.º Ano:
A Alegria do Evangelho é a nossa missão – Movidos pelo amor de Deus!
4.º Ano:
A Alegria do Evangelho é a nossa missão – Todos discípulos missionários!
5.º Ano:
A Alegria do Evangelho é a nossa missão – Um caminho sinodal aberto a todos!
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O Bispo diocesano chamou a
especial atenção para a necessidade de fomentar e expressar a fé, mostrar o
rosto de Deus misericordioso e o rosto da Igreja do Porto, que é preciso amar,
enveredar pela caminhada em colegialidade e sinodalidade, nos ambientes mais
pequenos – família e paróquia – e ir alargando, pela comunidade vicarial, até
ao todo diocesano e a toda a Igreja universal enquanto espaço do Reino de Deus.
Por outro lado, é preciso ter em atenção o povo, as pessoas simples e descobrir
a relevância do papel da mulher na Igreja e na sociedade.
O capítulo das respostas às
questões levantadas pela plateia eclesial foi memorável pelo conteúdo, pelo
equilíbrio de postura e sobretudo pelos testemunhos arrolados pelo
bispo-orador.
Destaco: a ideia do bispo que
estabeleceu duas portas da misericórdia nas suas igrejas jubilares, uma, de
entrada, para o crente ganhar e acolher a misericórdia, e outra de saída, para
sair revestido dela e a comunicar e testemunhar; a prevalência da obra de
misericórdia de enterrar os mortos e da oração por eles sobre a própria
preparação da JMJ na ótica do Papa; o elogio à presença dos jovens, renunciando
a ocupações de fim de semana; a resposta de Santa Teresa de Calcutá ao jovem
que objetava com a dificuldade de pôr em prática a misericórdia num mundo
adverso – de que um homem com uma lâmpada acesa em pleno dia de sol não será
notado, mas, na escuridão, iluminará o seu caminho e os caminhos de outrem; a
resposta equilibrada à questão do desemprego, do trabalho precário e da
sobrecarga laboral com prejuízo para a vida de família, denunciando os excessos
e as injustiças e desigualdades, mas reconhecendo que a Igreja tem lugar também
para o empresário justo que garante postos de trabalho e progresso das famílias
e apelando ao estudo da doutrina social da Igreja, que outros leem mais que
muitos cristãos e reorientam a seu modo; a ideia da Igreja em saída, não originária
propriamente de Francisco, mas, mais que do Vaticano II, mas que vem logo desde
os primórdios, pois os apóstolos saíram por todo o mundo conhecido, fundavam
comunidades, que deixavam depois de consolidadas, mas que não esqueciam
revisitando-as ou escrevendo-lhes; a recordação de que, se não tivesse havido
Igreja em saída, nós não seríamos cristãos, tendo falado de casos concretos de
bispos do Porto e de Braga e de toda a expansão missionária ao longo da
História da Igreja; a afirmação da novidade que Francisco evidenciou, que não
basta mandar, é também preciso ir; e ainda os testemunhos pessoais da sua ação
com e entre sacerdotes e pessoas humildes do povo, em Paris (o
mistério do acolhimento)
e Luxemburgo (a receção e integração de refugiados por portugueses) ou o seu modo próximo de dizer nossa paróquia, nossa cidade, nossa
escola, etc.
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Depois abordou sumariamente
pontos do esquema do plano para 2016/17: o quadro sinótico com objetivos (Palavra
de Deus, Liturgia, Misericórdia, Alegria do Amor), meios, modos, agentes e destinatários; o
calendário pastoral para o ano, por meses e dias; um exame de avaliação do
desenvolvimento do Plano, para ir mais além, através de 7 blocos de itens/questões;
a oração de consagração e o hino do
centenário das aparições de Fátima (letra e música), o
siglário, a bibliografia e o índice.
Tudo
pode ser lido e meditado na página web
da diocese do Porto:
http://diocese-porto.pt/attachments/3054_15072016_Pl_Diocesano_IMP.pdf, aced. 27 de setembro de 2016
2016.09.27 – Louro de Carvalho
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