Foi divulgada no site da
Santa Sé, a 15 de setembro, a carta apostólica em forma de ‘Motu proprio’ “De concordia inter Codices”, com a qual
são modificadas algumas normas do Código de Direito Canónico (CIC),
assinada pelo Papa Francisco a 31 de maio do corrente ano.
O intento do Pontífice é a harmonização
de certas normas do CIC da Igreja latina com o das Igrejas orientais. Com efeito,
segundo a nota publicada pela Rádio Vaticana a partir to texto preambular da
Carta Apostólica, a necessidade desta harmonização, que diz respeito de modo particular
aos sacramentos do batismo e do matrimónio, fazia-se sentir em consequência da
emigração de numerosos cristãos orientais (católicos e
ortodoxos) para
países de rito latino. Porém, apesar de ter em vista matéria atinente ao batismo e ao matrimónio,
também apresenta muito indiretamente novidades no concernente a irregularidades
para receber ordenações.
Era, na verdade, necessário
encontrar um justo equilíbrio entre a tutela do direito próprio das minorias
orientais e o respeito pela tradição canónica da maioria latina. Neste contexto,
as normas ora estabelecidas têm por objetivo favorecer a cooperação entre os
diferentes ritos no seio de um mesmo território eclesiástico e de facilitar o
trabalho pastoral.
A Carta Pastoral foi preparada
pelo Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, através de uma comissão
de peritos em Direito Canónico Latino e oriental, que identificou as questões
que precisavam de adequação normativa e elaborou um texto que foi enviado a um
conjunto de 30 consultores e peritos de todo o mundo, bem como às Autoridades
dos Ordinários latinos para os orientais. Face às observações apresentadas, o
Conselho, em sua sessão plenária, aprovou o novo texto, que Francisco subscreveu.
***
O texto
preambular reconhece a existência de discrepâncias ente os dois códigos como
natural, já que, tendo em vista realidades diferentes numa mesma Igreja fundada
em Jesus Cristo, os códigos contém disposições ora peculiares ora comuns. Não obstante,
importa que também as normas peculiares se congracem entre si, sobretudo quando
tenham de ser geridas as relações entre os cristãos ora junto da Igreja latina
ora junto de alguma das Igrejas orientais sui
iuris (insiste-se
nesta expressão).
Tais
situações sucedem especialmente no nosso tempo em que, por força da emigração
dos povos, vários fiéis de Igrejas orientais residem ou transitam em regiões de
rito latino – o que levanta algumas questões pastorais e jurídicas, que
requerem normas adequadas à sua solução.
Ora a Carta
Pastoral vem no sentido de favorecer a pertença dos cristãos orientais ao seu
rito seja qual for o lugar em que se encontrem, o que deve ser tido na devida
conta pelas autoridades eclesiásticas competentes na procura dos meios
adequados à satisfação de tal desiderato.
Também a concordância
das normas se apresenta como preciosa ajuda a que as Igrejas rituais autónomas –
de seu direito (sui iuris) – possam exercer melhor o cuidado pastoral
dos seus fiéis.
No entanto, é
de ter na devida conta a necessidade de reconhecer as peculiares notas
disciplinares da região em que se estabelecem as relações inter e intraeclesiais.
Com efeito, no Ocidente, de maioria latina, deve procurar-se o equilíbrio adequado
entre a proteção do direito próprio da minoria oriental e as justas expectativas
da maioria latina, de modo que se evitem quaisquer rivalidades e conflitos
entre indivíduos e/ou comunidades e, antes, se promova e favoreça a frutuosa
cooperação.
***
O corpo normativo do Motu Proprio consta de 11 artigos, que alteram os cânones 111, 112,
535, 868, 1108, 1109, 1111, 1112, 1116 e 1127.
Assim:
-
O Cânone 111 é substituído integralmente pelo texto seguinte,
segundo o qual se lhe junta um novo parágrafo e se alteram algumas expressões (art.
1):
Cân. 111 – § l . Pela receção do
baptismo fica adscrito à Igreja latina o filho de pais que a ela pertençam ou,
se um ou outro a esta não pertencer, ambos, de comum acordo, tiverem optado por
que a prole fosse batizada na Igreja latina; na falta de acordo, fica adscrito
à Igreja de seu direito a que o pai
pertence.
No texto
latino substitui-se Ecclesiae rituali por Ecclesiae sui iuris – que se podia
traduzir por Igreja ritual autónoma.
§ 2. Se apenas um dos progenitores for católico, fica
adscrito à Igreja a que pertence este progenitor católico (Parágrafo
novo).
§ 3. O batizando
que tiver completado catorze anos de idade pode livremente escolher batizar-se
na Igreja latina ou em outra Igreja de
seu direito; neste caso, ele fica a pertencer à Igreja que tiver escolhido.
No texto
latino substitui-se Ecclesiae rituali sui iuris por Ecclesiae sui iuris.
-
O Cânone 112 é substituído integralmente pelo texto seguinte,
segundo o qual se lhe junta um novo parágrafo e se alteram algumas expressões (art.
2):
Cân. 112 — § 1. Depois de recebido o
batismo, são adscritos a outra Igreja sui
iuris:
1.° Quem tiver
obtido licença da Sé Apostólica;
2.° O cônjuge
que, ao contrair matrimónio ou durante ele, declarar que passa para a Igreja sui iuris do outro cônjuge; dissolvido,
porém, o matrimónio, pode regressar livremente à Igreja latina;
3.° Os filhos
das pessoas referidas nos n.os l e 2, antes dos 14 anos completos, e
ainda, nos matrimónios mistos, os filhos da parte católica que tenham passado
legitimamente para outra Igreja sui iuris;
atingida aquela idade, podem regressar à Igreja latina.
§ 2. A
prática, mesmo prolongada, de alguém receber os sacramentos segundo o rito de
uma Igreja sui iuris não acarreta a
adscrição a essa Igreja.
No texto
latino substitui-se Ecclesiae rituali sui iuris por Ecclesiae sui iuris.
§3.
A passagem para outra Igreja sui iuris vale a partir
do momento da declaração feita perante o Ordinário do lugar da mesma Igreja, ou
o pároco ou um sacerdote delegado por um ou por outro e duas testemunhas, a menos
que um rescrito da Sé Apostólica determine de outro modo; e assim se averbará
no livro dos batizados (Parágrafo
novo).
-
O parágrafo 2.º do cânone 535 é substituído integralmente pelo texto seguinte (art.
3):
§ 2. No livro
dos batizados, averbem-se também a adscrição à Igreja sui iuris ou a passagem para outra, bem como a confirmação e aquelas
circunstâncias que acompanham o estado canónico dos fiéis, em razão do
matrimónio, salvaguardado o prescrito no cân. 1133, em razão da adoção, bem
como a receção de ordens sacras, a profissão perpétua emitida num instituto
religioso e ainda a mudança de rito; e refiram-se sempre estes averbamentos nas
certidões do batismo. (É novo o grafado a negrito).
-
O n.º 2 do parágrafo 1.º do cânone 868 é substituído
integralmente pelo texto seguinte (art. 4):
2.° Haja
esperança fundada de que ela irá ser educada na religião católica, tendo-se
na devida conta o §3;
se tal esperança faltar totalmente, difira-se o baptismo, segundo as
prescrições do direito particular, avisando-se os pais do motivo. (É
novo o grafado a negrito).
- Posto isto, o Cânone 868,
terá um terceiro parágrafo do teor seguinte (art.5):
§3. Uma
criança filha de cristãos não católicos é batizada licitamente, se os pais ou
ao menos um eles, ou quem legitimamente tem o lugar dos mesmos, o pedirem e se lhe
for, física ou moralmente, impossível aceder a um ministro próprio (Parágrafo novo).
- Também o cânone 1108 terá um terceiro parágrafo do teor seguinte (art.6):
§3. Só
um sacerdote assiste validamente ao matrimónio entre partes orientais ou entre
parte latina e parte oriental – católica ou não católica (Parágrafo novo).
-
O Cânone 1109 é substituído integralmente pelo texto seguinte (art.
7):
Cân.
1109. O Ordinário do
lugar ou o pároco, a não ser que por sentença ou decreto tenham sido
excomungados ou interditos ou suspensos do ofício ou como tais declarados,
assistem validamente, em virtude do ofício, dentro dos limites do próprio
território, aos matrimónios não só dos súbditos mas também dos não súbditos,
contanto que, ao menos, uma ou outra parte esteja
adscrita à Igreja latina.
Apenas
no texto latino se transpôs para o fim a expressão non subditorum e se substituiu dumodo eorum alteruter sit ritus
latini por dummodo alterutra
saltem pars sit adscripta Ecclesiae latinae.
- O parágrafo 1.º do cânone
1111 é substituído integralmente pelo
texto seguinte (art. 8):
§1.
O Ordinário do lugar e o
pároco, durante todo o tempo que desempenharem validamente o ofício, podem
delegar em sacerdotes e em diáconos a faculdade, mesmo geral, de assistir a
matrimónios dentro dos limites do seu território, observado firmemente o prescrito
no §3 do cânone
1108. (É novo o grafado a negrito).
- O parágrafo 1.º do cânone
1111 é substituído integralmente pelo
texto seguinte (art. 9):
§ l. Onde
faltarem sacerdotes e diáconos, o Bispo diocesano, obtido previamente o parecer
favorável da Conferência episcopal e licença da Santa Sé, pode delegar em leigos
para assistirem a matrimónios, observado firmemente o prescrito no §3 do cânone 1108.
(É
novo o grafado a negrito).
- O cânone 1116 terá um terceiro parágrafo do teor
seguinte (art. 10):
§3. Nas mesmas circunstâncias de que tratam os n.os
1 e 2 do § l., o
Ordinário do lugar pode conferir a qualquer sacerdote católico a faculdade de
abençoar o matrimónio dos fiéis das Igrejas orientais que não tenham a plena comunhão
com a Igreja católica se eles o solicitarem espontaneamente e contanto que nada
obste à válida ou lícita celebração do matrimónio. O mesmo sacerdote, sempre
com a necessária prudência, deve informar do facto a competente autoridade da
Igreja não católica à qual o facto diga respeito. (Parágrafo novo).
-
O parágrafo 1.º do cânone 1127 é substituído integralmente
pelo texto seguinte (art. 11):
§ 1. Quanto à
forma a utilizar no matrimónio misto, observem-se as prescrições do cân. 1108;
todavia, se a parte católica contrai matrimónio com parte não católica de rito
oriental, a observância da forma canónica da celebração só é necessária para a
liceidade; mas para a validade requer-se a intervenção de um sacerdote,
observadas as demais prescrições exigidas pelo direito.
Apenas se
substituiu a expressão ministri sacri por sacerdotis.
***
Todas
estas disposições normativas entram em vigor após a publicação na edição diária
do L’Osservatore Romano e devem
ser editadas depois no boletim oficial Acta
Apostolicae Sedis.
Espera-se
que mais este esforço de Francisco e seus colaboradores contribua para a boa relação
entre os cristãos e as respetivas Igrejas, sempre com referência explícita à
pessoa de Jesus Cristo e em prol do bem da pessoa humana.
2016.09.17 – Louro de
Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário