sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Brincar às experiências bélicas de destruição

Um mês depois da sua decisão das maiores sanções de sempre contra o regime de Pyongyang, o Conselho de Segurança da ONU aprovou, por unanimidade, novas penalizações com vista a travar o desenvolvimento do programa nuclear e balístico da Coreia do Norte. Esta resolução é a resposta da ONU ao 6.º ensaio nuclear norte-coreano levado a cabo a 3 de setembro com uma bomba de hidrogénio, quase uma semana após ter lançado um míssil que sobrevoou o Japão.
A nova resolução determina o corte de mais de 55% de petróleo, gasolina, diesel e outros produtos refinados que pode a Coreia do Norte importar, relativamente ao atual nível de trocas comerciais. E estabelece um limite máximo ao equivalente a 2 milhões de barris de importações por ano. Praticamente, torna-se a China o seu único fornecedor de combustíveis, visto que o crude transportado pelo oleoduto que liga a cidade chinesa de Dandong à norte-coreana Sinuiju não está abrangido por estas novas sanções.
O debate sobre novas sanções tinha sido proposto pelos EUA, mas as pretensões iniciais de Washington – embargo total de combustíveis, colocação da Coreia do Norte na lista negra e congelamento a nível mundial dos ativos norte-coreanos – não integram a resolução final do Conselho de Segurança, aprovada na madrugada do passado dia 11 de setembro.
Para conseguir a concordância de China e Rússia (os principais aliados da Coreia do Norte e com poder de veto) os membros do Conselho optaram por suavizar outras pretensões iniciais. O embaixador britânico na ONU, Matthew Rycroft, declarou ao EL País que a resolução “é muito forte” e “é o preço a pagar em qualquer negociação para obter os votos favoráveis dos membros do Conselho de Segurança”. Não havendo congelamento dos ativos norte-coreanos no exterior, fica, todavia, proibido contratar cidadãos norte-coreanos para trabalhar no estrangeiro.
Já em matéria de energia, a resolução impõe a proibição total de venda à Coreia do Norte de gás natural e de outros produtos condensados. Por outro lado, a proibição de importar têxteis norte-coreanos constituirá outro golpe nas finanças de Pyongyang. Na ótica de Washington, o embargo aos têxteis corta receitas em cerca de 800 milhões de dólares (661 milhões de euros), valor anual das exportações registado nos últimos anos.
Segundo o South China Morning Post, têxteis e vestuário têm vindo a substituir o vazio criado pelo corte aplicado por Pequim às compras de carvão norte-coreano, até há pouco a principal fonte de divisas do regime de Pyongyang. Pequim proibiu as compras de carvão no início de agosto em consequência das sanções decretadas então. Do total de 385,2 milhões de dólares de bens importados pela China no 2.º trimestre, 38% dizem respeito a vestuário, enquanto peixe e marisco representaram 68 milhões de dólares no mesmo período.
Em suma, esta ronda de sanções configura, como principais sanções contra a Coreia do Norte pela ONU, a proibição total das importações de gás natural e produtos condensados, redução em mais de metade das compras de petróleo e a interdição de todas a exportações de têxteis.
A primeira reação do regime norte-coreano às novas sanções da ONU teve como alvo o alegado “regime fantoche” da Coreia do Sul e o “criminoso pedido” de mais proibições contra Pyongyang. “Bajuladores atos de traição e a dependência de forças estrangeiras conduzirão à miserável destruição (da Coreia do Sul)”, segundo o editorial do Randong Sinmum, órgão oficial do comité central do partido liderado por Kim Jong-un.
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Apesar do acúmulo de ameaças aos norte-americanos, foi esta a primeira vez que Kim Jong-un emitiu uma ameaça explícita ao país vizinho desde que um seu míssil balístico sobrevoou uma parte do território nipónico.
A Coreia do Norte ameaçou, a 14 de setembro, afundar uma parte do território do Japão e declarou que os EUA devem ser “espancados até à morte como um cão raivoso” após estes dois países terem conseguido que o Conselho de Segurança da ONU aprovasse uma nova ronda de sanções ao regime de Kim Jong-un, mercê do seu mais recente teste de uma bomba nuclear, o 6.º e mais poderoso da sua História.
A este respeito, o Comité de Paz Coreia Ásia Pacífico, que supervisiona as relações da Coreia do Norte com a comunidade internacional, descreveu, em comunicado, a resolução aprovada pelo Conselho de Segurança no passado dia 11 como “um instrumento do mal” pago pelos EUA, exigindo que as novas sanções sejam suspensas. No mesmo documento, citado pela agência estatal norte-coreana KCNA, o comité sublinha:
“As quatro ilhas do arquipélago [do Mar do Japão] devem ser afundadas no mar por uma bomba nuclear da Juche [a ideologia oficial da Coreia do Norte]. O Japão já não tem de existir perto de nós.”.
É, como se disse, a primeira vez que Kim Jong-un tece ameaças diretas ao país vizinho desde que um dos seus misseis balísticos sobrevoou a ilha nipónica de Hokkaido no final do passado mês de agosto, ação inédita que levou as autoridades do Japão a fazerem soar sirenes de emergência e a emitirem alertas em massa para que a população da ilha procurasse abrigo.
No passado dia 11, os 15 membros do Conselho de Segurança aprovaram uma resolução apresentada pelos EUA no sentido da condenação explícita e veemente dos mais recentes testes de mísseis da Coreia do Norte e o teste da bomba de hidrogénio, impondo novas sanções, como a suspensão das importações de têxteis norte-coreanos e restrições às exportações de produtos petrolíferos pelo país. Por consequência, o Comité norte-coreano, enquanto dizia que, por causa disso, os EUA devem ser “espancados até à morte como um cão raivoso” pela sua “hedionda resolução de sanções”, prometia:
“Vamos reduzir os EUA continentais a cinzas e escuridão. Vamos ventilar o nosso despeito através da mobilização de todos os meios retaliatórios que temos estado a preparar até agora”.
Com efeito, pelo menos em teoria, os mais recentes mísseis balísticos intercontinentais (ICBM) testados pelo regime de Kim têm alcance suficiente para atingir o território norte-americano.
Em resposta às ameaças, Yoshihide Suga, porta-voz do Governo do Japão, condenou o comunicado “extremamente provocador e escandaloso”, descrevendo-o como “algo que acentua marcadamente as tensões regionais e que é absolutamente inaceitável”.
Nesta semana, um grupo de especialistas norte-americanos advertiu que a bomba atómica detonada, a 3 de setembro, pelo regime norte-coreano envolveu cerca de 250 quilotoneladas de hidrogénio, o que mostra que é muito mais poderosa do que se julgava inicialmente. De acordo com site 38 Norte, a CTBTO (Organização do Tratado de Interdição Completa de Ensaios Nucleares) já reviu a magnitude sísmica gerada pelo teste de 5,8 para 6,1. E os analistas falam numa “revisão significativa”, pois, em vez do propalado “rendimento equivalente a cerca de 120 quilotoneladas das estimativas iniciais”, que apontavam para “uma magnitude mais baixa”, fica provado que a capacidade dessa bomba corresponde a cerca de 250 quilotoneladas (um quarto de megatonelada). Referindo não importar “se este teste mais recente envolveu uma ogiva operacional de guerra para um ICBM ou um simples dispositivo”, sustentam que “a potência deste teste demonstra claramente o progresso da Coreia do Norte no reforço do poder das suas armas nucleares”.
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No fim do dia 14, a Coreia do Norte voltou a lançar um míssil, a partir da base aérea de Sunan, nos subúrbios da capital, Pyongyang, que sobrevoou o Japão, tendo atingido uma altitude de 770 quilómetros e voado 3700 quilómetros antes de cair ao largo da ilha de Hokkaido, em águas do oceano Pacífico, aproximadamente 2.000 quilómetros do cabo de Erimo.
E as reações da parte dos líderes internacionais já começaram a chegar.
O secretário-geral da ONU disse que a questão norte-coreana será discutida na próxima semana à margem da Assembleia Geral das Nações Unidas. António Guterres condenou o lançamento, que considerou uma “manifesta violação das resoluções do Conselho de Segurança”.
A China ficou a meio caminho, tendo-se limitado a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Hua Chunying, a sublinhar os “enormes sacrifícios” feitos pelo seu país para resolver a crise na península coreana.
Também a Rússia condenou “firmemente” o disparo do míssil e manifestou-se “muito preocupada” com tudo isto. A este propósito, Dmitri Peskov, porta-voz do Kremlin, disse aos jornalistas que estes são “atos que conduzem a uma escalada das tensões na península coreana”.
A China, como vem sendo usual, não adotou a postura de total condenação, preferindo adotar um tom mais apaziguador, em virtude da relação que tem com a península coreana. Na verdade, a China é o principal aliado diplomático e maior parceiro comercial da Coreia do Norte. Cerca de 90% do comércio externo norte-coreano é feito com o país vizinho. Assim, em conferência de imprensa, Hua Chunying, referiu que todas as resoluções do Conselho de Segurança, de que a China é membro permanente (e com direito a veto), “se opõem ao desenvolvimento da capacidade nuclear da Coreia do Norte”. E, questionada sobre se o seu país considera necessária a aplicação de novas sanções contra Pyongyang, como resposta ao lançamento, limitou-se a sublinhar os “enormes sacrifícios” feitos pelo seu país para resolver a crise naquela península, relevando:
 “A nossa sinceridade no cumprimento das nossas obrigações internacionais não deixa espaço para dúvidas”.
Segundo Hua, todas as partes devem ter como “missão” fazer cessar “todas as ações provocativas e perigosas, a favor de uma solução pacífica”, pelo que advogou a importância do “regresso imediato ao diálogo” entre as partes diretamente implicadas no conflito e frisou que a China “não é responsável pelo aumento das tensões”.
Shinzo Abe, Primeiro-Ministro japonês, considerou o teste uma “ação provocatória perigosa” que o país “nunca irá tolerar” e advertiu que, “Se a Coreia do Norte continuar a seguir este rumo, não terá um futuro brilhante”.
O Secretário de Estado norte-americano, Rex Tillerson, acusou Pyongyang de violar as resoluções do Conselho de Segurança no rescaldo do teste da bomba de hidrogénio e atribuiu a responsabilidade à China e à Rússia, os grandes parceiros económicos do regime de Kim Jong-un, dizendo que os dois países “devem demonstrar a sua intolerância perante estes lançamentos imprudentes de mísseis através de ações diretas próprias”, pedindo-lhes medidas adequadas.
Por seu turno, a Coreia do Sul, minutos depois do teste, lançou dois mísseis balísticos para o mar que banha a península num ataque simulado à Coreia do Norte. Segundo agência sul-coreana Yonhap, numa reunião de emergência com o seu Conselho de Segurança Nacional, o Presidente sul-coreano, Moon Jae-in, pareceu reverter a postura de abertura face ao Norte, que contribuiu para a sua eleição, ao sublinhar que dar início a um diálogo com Pyongyang “é impossível numa situação como esta”.
Cálculos iniciais apontam para o hipotético facto de este míssil haver atingido uma altitude e uma distância superiores ao que foi lançado a 29 de agosto, altura em que Pyongyang avisou que esse tinha sido somente o 1.º passo para operações militares no Pacífico. Especialistas que monitorizam os programas militares norte-coreanos dizem que as forças de Kim testaram agora um míssil balístico de alcance intermédio (IRBM), apesar de as autoridades nipónicas admitirem a possibilidade de se tratar de um míssil balístico intercontinental (ICBM). A confirmarem-se os dados, o míssil teve alcance suficiente para atingir a ilha de Guam, território não incorporado dos EUA naquele oceano, localizado a 3400 quilómetros da capital norte-coreana, território que Pyongyang ameaçara atacar. Acima de tudo, o teste demonstra que a Coreia do Norte continua a melhorar o seu programa de mísseis, numa altura em que não só já terá desenvolvido ICBMs com alcance suficiente para atingirem o território continental dos EUA, como terá conseguido incorporar nesses mísseis ogivas nucleares em miniatura.
O Conselho de Segurança vai voltar a reunir-se em Nova Iorque a pedido do Japão e dos EUA para debater novas medidas face ao mais recente teste de mísseis. Os especialistas sublinham que o grande objetivo de Kim Jong-un – que reitera precisar dos seus mísseis e armas nucleares para garantir a sua sobrevivência face às ameaças à sua soberania pelos EUA, Coreia do Sul e Japão – é forçar negociações diretas com a administração Trump, o diálogo que a China e a Rússia vêm aconselhando tem sido inviabilizado.
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Assim, em vez do recurso à diplomacia e ao concerto entre as nações, brinca-se à guerra através de ameaças subtis ou ostensivas e experiências perigosas. E todos os meios servem, desde que almejem os fins. A alguns líderes não lhes basta serem senhores absolutos intra muros; querem ser donos e senhores do mundo, sobretudo do mundo que lhes interesse
Não se pense que a guerra continuará no regime de “aos pedaços” ou que se confinará a focos regionais. A bola de neve das provocações e as convenientes alianças com mira nos despojos e nos dividendos, se a diplomacia fracassar ou se andarmos de sanção em sanção, de ameaça em ameaça, de experiência em experiência…, engrossará, alastrará e tornar-se-á pandémica. E o uso dos meios previstos levará à destruição da Natureza, das edificações e, sobretudo das vidas. Ficará pedra sobe pedra?
Que os homens se cuidem, cuidem do Planeta e zelem a segurança e o bem-estar das populações e que Deus ajude!

2017.09.15 – Louro de Carvalho

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