O mundo em
que vivemos é marcado por um contexto em que impera, na autoestrada da vida, a
oferta desgarrada e não raro doentia de informação a rodos, dando como
resultado a receção acrítica, a fixação no fragmento, a repetição, a
intoxicação, o consumo acéfalo. Não há tempo para proceder ao correto
discernimento, não há paciência para do tesouro comunicacional tirar coisas
novas e velhas e saber aproveitar as mais úteis e belas e criar personalidades
consistentes em ambientes sociais sadios.
A ordem
escolar, excessivamente inspirada pela uniformidade e impessoalidade, pelo
método da exposição, pelo centralismo e pela desautorização dos professores e
da escola, enferma de passividade, alheamento e tédio, mascarados de inúmeras
planificações, reiterados e repetitivos relatórios, poderosas análises de
resultados que levam à enfatização das debilidades e à subvalorização dos
progressos – ou exatamente ao contrário – conforme a ideologia ou os interesses
de quem aprecia.
A escola é
sentida como necessidade de guarda de crianças, adolescentes e jovens, mas é
desvalorizada na sua missão educativa e na sua função instrutiva, graças à
influência perniciosa de poderosas forças de bloqueio, em que avultam algumas
políticas educativas, a excessiva vigilância da administração educativa, a
judicialização escolar, a ação ambígua de muitos encarregados de educação, o
recurso aos explicadores, o crescimento do ensino individual e doméstico e os
fautores do facilitismo oferecido pela dita escola paralela expressa nos
recursos mediáticos e editoriais e pelo afunilamento do ensino no exame final
ou mecanismo similar.
É preciso,
então, pensar e implementar práticas educativas diferentes: mais interpelantes,
ativas e problematizadoras, mais incertas mas mais enriquecedoras para os intervenientes,
porque mais apoiadas na pesquisa e na cooperação e permanentemente secundadas
pela prestação de contas da aprendizagem.
O
educador/professor precisa de ser mais socrático para fazer emergir a
aprendizagem autónoma consistente e robusta, e não oferecer respostas feitas,
não dar receitas inquestionáveis, a não ser em relação a factos univocamente
comprovados. Por outro lado, tem de se lhe reconhecer o direito e o dever de
formular questões e marcar tarefas de programação e de avaliação, não de acordo
com as restrições e caprichos de calendário ou de interesses, mas em
consonância com o percurso da própria aprendizagem. Enfim, os professores têm
de usufruir de autoridade reconhecida para provocarem as aprendizagens e para
exigirem a avaliação atempada.
***
Segue-se um
painel de procedimentos que podem induzir diferenças consideráveis, se forem
criadas condições para tal.
1 – Se os alunos querem
saber algo estarão mais interessados e motivados para o aprender. Por isso, deve partir-se da formulação
de questões que suscitem a curiosidade.
2 – Os alunos precisam de referencializar as
aprendizagens. Assim, é conveniente a utilização de perguntas-guia, que levem a
evidenciar conceitos específicos e princípios gerais e sirvam de referência
para as aprendizagens que os alunos devem realizar.
3 – Importa consolidar
ou orientar aprendizagens e fixar a atenção dos alunos para que o tempo de aula
possa ter início efetivo. Para isso, é de aplicar uma prova curta de cinco
minutos no início de cada aula. Tal prova pode assumir diferente natureza: escolha
múltipla, V/F, correspondência, interpretação de texto, produção de texto… Uma
variante desta prática pode ser a escrita no quadro – ou em suporte equivalente
– de um verso, de um pensamento ou a exibição duma imagem ou a audição de peça
musical, que sirva de interpelação e debate breves.
4 – O uso de diferentes linguagens e suportes
reforça as possibilidades de aprender. Por consequência, é de utilizar (sem abuso) apresentações
multimédia.
5 – A apresentação de conteúdos deve levar o aluno
a analisar posições e contraposições, a colocar-se no lugar do outro, a julgar
a pertinência e a relevância dos factos, a sustentabilidade das opiniões… Então,
os conteúdos de cada disciplina devem ser apresentados de forma crítica e
problematizadora.
6 – É preciso, é humano que
os estudantes se conheçam mutuamente. Por isso, no primeiro dia de aulas, devem
ser distribuídos em pares e deve ser solicitado a cada um que peça ao seu
companheiro informação sobre vários itens, como: donde vem; quais são os seus
interesses, passatempos, cores, desportos, matérias preferidas. Cada elemento
regista as respostas e, depois, expõe à turma a informação recolhida.
7 – É conveniente que o
professor conheça os alunos e não lhes baralhe os nomes. Por isso, é
conveniente munir-se desse conhecimento. Pode solicitar a cada aluno que
escreva o seu nome num cartão e o coloque à sua frente. Depois, pode dirigir
perguntas a todos e verificar quem vai respondendo. Paralelamente, pode também
colocar o nome de cada aluno num pequeno cartão e tirar à sorte o nome a
inquirir.
8 – Deve fomentar-se o pensamento independente. Assim, é de
colocar aos alunos problemas que requeiram pensamento independente e tenham,
preferencialmente, várias soluções possíveis; pedir-lhes que escrevam as soluções
num papel; organizar a turma em grupos de 3 ou 4 alunos, em que cada um
apresente uma resposta, o grupo debata as diversas hipóteses e escolha a melhor,
apresentando-a depois ao grande grupo.
9 – Deve promover-se e
verificar-se a escuta atenta. Para tanto, há que pedir frequentemente a alunos
que resumam pelas suas próprias palavras o que disse outro aluno; e/ou colocar
a grupos de pares questões controversas de modo que cada um apresente a sua
solução.
10 – Sabe-se que a
capacidade de atenção é limitada no tempo e é preciso fazer que os alunos
pensem cada vez mais. Por isso, é vantajoso que o professor não fale mais do
que 20% do tempo de aula, que pare a sua exposição a cada 10 minutos e que peça
aos alunos que, em grupos de dois ou três, comuniquem, resumindo, dados-chave,
avaliando e explorando implicações do conteúdo apresentado.
11 – O professor deve ser um modelo, pensando em
voz alta frente aos seus alunos. Convém que permita que eles o escutem a
decifrar os problemas da matéria. Deve ele mesmo, de vez em quando, fazer
perante os alunos o exercício de leitura, a resolução de um problema, a
produção de um comentário ou resumo, o enunciado de um procedimento de
investigação, etc.
12 – Deve utilizar o método socrático para fazer
perguntas do tipo: Que queres dizer
quando usas essa palavra? Que
evidências comprovam essa afirmação? É
confiável essa evidência? Quais os
efeitos não desejados de uma proposta ou decisão?
13 – É necessário concitar a cooperação. Deve
dividir-se frequentemente a turma em pequenos grupos de dois, três ou quatro
elementos; atribuir-lhes tarefas específicas e limites temporais; inquirir do
resultado e dos procedimentos; e promover a exposição e o debate em grande
grupo.
14 – É desejável o uso do ensino em pirâmide. Isto
concretiza-se pedindo aos alunos que discutam uma questão ou problema em pares
até chegarem a consenso, juntando cada par a outro par até chegarem a novo
consenso e reunindo cada grupo de quatro com outro grupo de quatro até chegarem
a consenso.
15 – É necessário realizar exercícios de
pré-escrita. Antes da exposição da matéria de um tema, é de solicitar aos
alunos que, durante 5 minutos, escrevam o que julgam saber sobre o tema.
16 – É útil a consignação de tarefas de escrita que
requeiram o pensamento independente. Para isso, é conveniente solicitar durante
alguns minutos a escrita sobre um determinado tema, problema, conteúdo.
17 – Aprende-se avaliando, mas a tarefa de avaliar
é das mais exigentes em termos cognitivos. Por isso, peça-se aos alunos que
avaliem os trabalhos e a prestação dos colegas, mediante critérios e escalas
previamente explicitados. E o professor deve considerar, no seu juízo
avaliativo, essas avaliações. Este exercício constituirá uma excelente forma de
aprendizagem.
18 – São de utilizar cadernos de aprendizagem.
Pede-se aos alunos que organizem os cadernos em duas colunas: a 1.ª, para
anotação dos conteúdos que vão retendo; a 2.ª, para escrita dos pensamentos que
surgem a propósito do que se está a aprender: dúvidas surgidas, questões a
levantar, hipóteses a explorar.
19 – Faz parte da metodologia a organização de
debates. De vez em quando, deve estimular-se o debate sobre temas controversos.
Organizem-se grupos com pensamentos divergentes e coloquem-nos a procurar argumentos
que fundamentem as suas posições.
20 – O diálogo é parte integrante e objeto da
aprendizagem. Por isso, é de induzir os alunos a escreverem diálogos
construtivos, que incidam sobre temas atuais, pertinentes e educacionalmente
relevantes e que tenham como protagonistas alunos com pensares diferentes (reais ou simulados) sobre o assunto.
21 – O trabalho tem de ser esclarecido e as aprendizagens
enriquecidas. Para essa finalidade, há que levar os alunos a explicarem o objetivo
do trabalho e o sentido das tarefas que vão realizar. Com efeito, pensar e analisar
o que é pedido é uma excelente forma de clarificar o trabalho e de enriquecer
as aprendizagens.
22 – É crucial estimular os alunos a determinarem
as sequências da ação didática. Induzir e aceitar que a turma tome decisões de
aprendizagem é uma forma de inclusão, participação e motivação acrescida. Há que
suscitar a participação nas questões do devir das aprendizagens em torno de perguntas
como: Como podemos resolver o problema?
Como podemos verificar a validade da
hipótese?
23 – É pertinente que os alunos documentem o seu
progresso. Antes de iniciar um tema, é conveniente pedir-lhes que escrevam o
que sabem. No final, deve propor-se-lhes que escrevam o que ficaram a saber e
que o comparem com o texto anterior. Assim, tomarão consciência dos progressos
realizados e valorizarão o tempo de investimento na tarefa.
24 – É útil decompor projetos grandes em partes
mais pequenas. Assim, conseguir-se-á maior confiança na realização da tarefa,
reforça-se a autoestima e estrutura-se a capacidade para projetos mais
complexos.
25 – A aprendizagem deve preferencialmente decorrer
da pesquisa e da descoberta. Para isso, há que delinear atividades para os
alunos pesquisarem e descobrirem (individualmente ou em pequenos grupos) os conceitos, os
princípios e as técnicas, antes de os apresentar, fornecendo-lhes sínteses complementares.
26 – Importa incrementar
a cultura e a prática da autoavaliação. Definidos os critérios e a escala, devem
os alunos ser ensinados a autoavaliarem-se. É uma prática relevante para uma
aprendizagem de qualidade.
27 – Aprendemos habitualmente com mais vantagem o
que precisamos de saber. Por isso, devemos, sempre que possível, ensinar
aplicações úteis e demonstrar, na medida do possível, o valor de uso do que
ensinamos. O relevo pessoal e social do que se ensina é fator importantíssimo
da motivação e da aprendizagem, embora não se possa descurar o valor daquilo
que é belo como elemento constitutivo da personalidade, mesmo que não tenha utilidade
prática imediata. Conseguir que os alunos pensem ativa e independentemente
sobre o que aprendem não é suficiente. Além de ser necessário que eles pensem, é
preciso que pensem bem.
***
Desenvolver regular e sistematicamente
estas práticas dá outro sentido ao tempo escolar, gera novos compromissos,
aumenta a motivação e a participação.
Em suma, o sucesso escolar passa,
necessariamente, por aqui. Mãos à obra!
(cf Richard Paul e Linda
Elder, Fundação do Pensamento Crítico, in www. Eduteka.org/27IdeasPracticas.php)
2016.12.09
– Louro de Carvalho
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