Sabem-no
aqueles e aquelas que apostam em preservar a vida e promover o reconhecimento
do seu valor. Sabem-no todos os profissionais de saúde – médicos, paramédicos,
enfermeiros, maqueiros, socorristas, farmacêuticos – os bombeiros, os nadadores-salvadores,
os homens-rãs, os psicólogos, os gerontologistas, os cientistas que tentam
encontrar e validar todos os apoios à vida e à vida de qualidade. Sabem-no,
sentem-no e vivem-no sobretudo os que que fizeram o juramento de Hipócrates, os
paladinos da Cruz Vermelha ou os do Crescente Vermelho, os sacerdotes,
religiosos e missionários e todos aqueles e aquelas para quem a vida humana é o
valor supremo pelo qual tudo vale a pena arriscar. Sabem-nos os verdadeiros
pais, educadores e professores. E o Senhor da Vida deu a vida para que todos tenham
a vida e a tenham em abundância (cf Jo 10,10).
A cada passo
se ouvem ou leem notícias de atentados à vida humana ou à sua dignidade e
respeitabilidade. É o tráfico de pessoas, a perseguição por motivos políticos,
religiosos e étnicos; é a violação e violência sexual; é o assalto, o
sequestro, o rapto; é o engano, o dolo, a trapacice; é o mexerico, a insídia, a
cilada; é a mutilação, o assassinato, o genocídio; é a repressão, a exploração,
o burnout laboral; é escravização, a
servilização, a exploração, carnalização e comercialização do corpo humano; é a
escravização, a violência doméstica, a violência conjugal, a violência no
namoro; é a migração forçada, a guerra, a fome, a dependência da droga; é o
tráfico de estupefacientes e de órgãos humanos; é o assédio sexual, o assédio
moral, o assédio laboral, a chantagem; é o fanatismo religioso, político e
desportivo. Tudo isto faz parecer que a perversidade humana e a falta de
respeito não têm fim.
É pouco dizer
que é repugnante. É mais que repugnante ver, ouvir e ler sobre as
condições a que seres humanos são forçados por pessoas que não entendem o valor
da vida. Essas más pessoas não têm ideia de que cada um de nós tem o mesmo valor
perante os olhos de Deus. Na verdade, Deus não tem um sistema de classes. Para
Ele, os pobres que dormem em cima de papelões são iguais aos que
dormem em realezas nos melhores colchões. Entretanto, há seres humanos com
necessidade extrema, gente que dorme no chão, na selva, gente que dorme em
celas minúsculas e sujas ou em esteiras exíguas e ásperas, pessoas enterradas
em tumbas sem nome, mortas em cativeiros. Todas elas deixaram de ter
poder sobre a sua própria vida. Encontram-se à mercê de quem lhes provoca
mal-estar e até doenças, de quem exerce sobre elas poder iníquo tipo de poder
prescrito sobre eles. E, muitas vezes, as pessoas de quem deviam
receber ajuda são corruptas ou, pelo menos, servem-se da posição que têm para
se governarem. A polícia e a justiça nem sempre funcionam com equidade,
eficácia e brevidade.
O mundo não
tem um recheio determinista. Há biliões de pessoas e Deus tem um amor pessoal
por cada uma. Quer que prosperemos (Jr 29,11). Cada um de nós tem os fios dos seus cabelos
contados (Mt 10,30). E os de
uns não são mais bem monitorados que os da cabeça de outros.
Quem nasceu num
mundo onde se sente seguro e amado, não pode deixar de se sentir responsável
pelo sofrimento que os demais devem suportar, mas deve desinstalar-se e tentar
fazer tudo o que pode para erradicar ou, ao mesmo, minorar esse sofrimento
alheio. Alinhar na preocupação de Deus, que é amor (1Jo 4,8) e justo (Gn 18,25). Não podemos duvidar disso sob pena de estarmos a
duvidar da nossa própria existência. Ora, quando vemos os muitos e imensos
dramas humanos que se disseminam e engrossam pelo mundo, não podemos
atribui-los a Deus, mas a fatores humanos pecaminosos e a estruturas políticas,
sociais e económicas de pecado. Têm origem em pessoas impelidas pelo poder, prestígio
e dinheiro, que tratam os outros como animais, levadas pelo egoísmo e pelo
desamor. Deus não controla ninguém; cada ação nossa decorre da nossa própria
vontade. As pessoas de rédeas soltas dão expressão às suas paixões e desejos,
deixando-se guiar por Satanás para infligirem pesados sofrimentos aos
inocentes.
Deus está
mais consternado do que nós sobre o que acontece no mundo, e não vai
deixar que essas condições continuem para sempre. Deu-nos a sua palavra em seu
Filho Jesus para nos mostrar o modo de vivermos sem pecado, na justiça do
Reino, na misericórdia, no amor. Através de Jesus e da Igreja, o pecado será
completamente derrotado e o julgamento final mostrará como Satanás é o
insidioso espírito do mal e pai da mentira. Será definitivamente cumprida a
vontade de Deus. Deus destruirá o velho mundo e criará “um mundo outro”, completamente
novo e livre de pecado. Ninguém pensará oprimir outrem e ninguém se lembrará da
miséria e do sofrimento.
Como podemos
considerar uma pessoa menos valiosa do que nós, uma vida humana menos valiosa
que a nossa?
***
Miguel Duarte, voluntário português
que participou, em 2016, em 4 missões de resgate de pessoas no mar Mediterrâneo
(cerca de 3
semanas cada, num ano), a bordo do navio ‘Iuventa’
falou a Lígia Silveira, da agência Ecclesia, dos 84 dias que lhe mudaram
a vida e que o levam a enfrentar 20 anos de prisão supostamente por auxílio à
imigração ilegal, segundo a nova lei italiana. Não obstante, afirma-se um
privilegiado porque, ao invés das 14 mil pessoas que ele e a tripulação
conseguiram salvar, não esquece as pessoas anónimas às quais, diz, chegaram
tarde.
Quanto a imagens sobre os refugiados, referiu que, em
2015 e 2016, quem na Europa lesse as notícias ficava completamente a par da
situação e do sofrimento das pessoas nas fronteiras da Europa, tanto no
Mediterrâneo como nos campos de refugiados. E, em termos pessoais, vincou:
“O que senti na altura foi provavelmente
indignação por viver num continente, numa União Europeia (UE) que pregava
certos valores de direitos humanos e que nada parecia estar a fazer que
efetivamente resultasse na preservação dos direitos destas pessoas. Víamos sofrimento
que parecia não acabar e milhares e milhares de pessoas que tinham de seguir
viagem para chegar à Europa”.
No atinente à autoperceção da responsabilidade
pessoal, confessou:
“Um jovem europeu, de certa forma
privilegiado, sem grandes responsabilidades, sem filhos para cuidar, por aí
adiante, tinha alguma responsabilidade de fazer alguma coisa, contribuir com o
pouco que pudesse. E, portanto, foi nesse sentido. Foi com isso em mente que
comecei à procura de projetos onde pudesse ser útil.”.
Já tinha participado em projetos sociais em Portugal, mas
nada propriamente humanitário: integrou associação “Gambozinhos”, foi animador
nos campos de férias, trabalho em que participou no trabalho ao longo do ano.
Porém, a missão em setembro de 2016 mudou-lhe a vida. E ele explica:
“Não há nada propriamente que nos prepare
para o que vamos ver ali, para a emoção, para o sofrimento humano e para as
situações que encontramos de facto quando nos vemos frente a frente com essas
pessoas. Uma coisa é ver os vídeos e ler as notícias, outra é estar ali e ser
propriamente a ponte que liga estas pessoas à vida. Para muita gente,
infelizmente ou felizmente, depende do ponto de vista, nós fomos a única
barreira entre eles e a morte, isso é uma responsabilidade enorme e penso que
me mudou a vida pelo sentimento de utilidade que tive. Acho que foram as duas
semanas, até aquele momento, mais úteis da minha vida. E, muito embora tenhamos
perdido pessoas (houve pessoas para quem chegamos tarde), conseguimos de
qualquer forma salvar muita gente e isso não tem preço.”.
E mais do que as pessoas que salvou, ficam-lhe na
retina da memória as que perdeu, sem dúvida, pois fala alto o sentimento da
responsabilidade no sentido de que “ficamos
sempre a pensar que podíamos ter sido mais rápidos”, que, “podíamos ter feito mais”. E, mais do que
a emoção, Miguel Duarte insiste na responsabilidade que reparte por várias
entidades: Estados europeus, Governos nacionais e sociedade civil:
“É uma responsabilidade moral dos europeus
fazer alguma coisa em relação a isto. Primeiramente é uma responsabilidade dos
Estados Europeus, tem de haver resgate marítimo. Resgate marítimo é uma
responsabilidade legal dos Estados Europeus, e, portanto, a responsabilidade
moral é primeiramente dos governos porque têm os meios para fazer isso. [E],
perante a inação governamental, a responsabilidade recai sobre a sociedade
civil, que tem de fazer alguma coisa e tem de se indignar pelo facto de os
Estados não estarem a fazer anda.”.
E este cidadão do mundo, que não estabelece ordens de
prioridades entre nacionais de vários países e continentes – porque “não
há vidas mais valiosas do que outras”, sendo “isso que temos de ter em mente quando
falamos de migrações” – sentiu que não podia, com a sua idade,
experiência e oportunidades, calar o que sabe e que “o pouco que pudesse dar
tinha de contribuir para que esta injustiça toda diminuísse ligeiramente”
Sobre a organização alemã que o acolheu para
participar nas ações de resgate, revelou:
“Há muitas coisas que nos ligam, mas a coisa
mais abrangente e que liga toda a gente que ali está é um respeito enorme pela
vida. Estamos ali porque damos um valor sem preço à vida humana, queremos
salvar vida. Acaba por ser o primeiro e mais fundamental objetivo das pessoas
que fazem o resgate marítimo ou qualquer tipo de trabalho humanitário. O
objetivo é salvar pessoas. Depois, muitas outras coisas nos ligam, acabamos por
viver situações muito tristes e situações muito felizes juntas, são situações
de emoções muito fortes, são situações muito intensas, e inevitavelmente isso
liga-nos.”.
Questionado se o número de 423 pessoas salvas em duas
semanas significa uma esperança que se lhe renova interiormente, disse com simplicidade
e realismo:
“Nós resgatamos muitas pessoas ao longo
desse ano, a tripulação do ‘Iuventa’
participou no resgate de 14 mil pessoas ao longo de um ano. Vejo esse número
com mais indignação do que esperança, na verdade. Se uma equipa de 15 voluntários
de cada vez consegue resgatar 14 mil pessoas ao longo de um ano alguma coisa
está fundamentalmente errada no que está a ser feito para que estas pessoas não
percam a vida.”.
Embora considere coisa muito boa o número de pessoas
resgatadas, acha-o “sintomático de um problema fundamental que não está a ser
abordado como devia”. E, ante uma geração a crescer com a crise dos refugiados,
frisa o dever de encarar esta crise humanitária por parte de cada um de nós e de
lutar para que ela seja debelada e não venha a repetir-se, desenvolvendo:
“Esta crise humanitária é a crise da nossa
geração. Se os nossos avós nos anos 70 tiveram de lutar pela liberdade, nós
temos de lutar por isto. Sinto que é a grande crise, é isto que vai aparecer
nos livros de História, estão neste momento a acontecer grandes acontecimentos
que dependem da nossa inação ou da nossa ação. (…) Vamos ter de explicar aos
nossos netos como é que deixamos morrer dezenas de milhares de pessoas ao longo
de 5, 6 ou 7 anos e eu sei de que lado é que quero estar. E acho que é uma
responsabilidade que cada um de nós tem de aceitar e cada um de nós tem de
encontrar a melhor forma de contribuir pessoalmente para que isto não se volte
a passar, que esta catástrofe tenha um fim.”.
No atinente à sua situação de porta-voz de tudo isto, esclarece-a
pela urgência ditada injustiça da criminalização da ajuda humanitária e a
atitude hostil por parte de vários governos da UE:
“Nós queríamos fazer resgate marítimo, não
queríamos fazer comunicação. O que sabemos fazer é tirar pessoas de dentro e
água, é muito simples e foi isso que fizemos. As circunstâncias, esta injustiça
da criminalização da ajuda humanitária e a atitude hostil por parte de vários
governos da União Europeia, em relação à solidariedade demonstrada pela
sociedade civil, é que nos [puseram] nesta situação em que somos obrigados a
ser o porta-voz e temos que aprender a fazer este tipo de trabalho que é
completamente diferente daquilo que fazíamos antigamente.”.
Preferiam continuar a fazer o que faziam em 2016 ou
2017, porque isso é preciso e importante: “é
preciso tirar as pessoas de uma situação de perigo porque elas continuam a vir”.
Mas, como estão impossibilitados de o fazer porque não têm navio, sente a
responsabilidade pessoal de passar a palavra, de “ser um bocadinho mais uma voz
a falar por estas pessoas”. E, sobre o caso legal da criminalização expressa na
nova lei italiana, esclarece:
“Quando nós falamos sobre este caso legal e
esta injustiça, não estamos só a tentar garantir a nossa liberdade pessoal, mas
a falar pelos verdadeiros desprivilegiados nesta situação. Estamos a falar de
milhares que pessoas que morrem afogados no Mediterrâneo sem voz e que depois
vão parar a listas anónimas de estatísticas de mortes no mediterrâneo.”.
Aquele mar traz-lhe muitas recordações e fá-lo sentir
que ali viveu “o melhor e o pior da vida”:
“[Es]tive muito em contacto com o desespero
das pessoas, mas também com a esperança e entreajuda e vi atos de heroísmo que
não pensei que fossem possíveis. Vi pessoas a pôr em risco a sua própria vida
para salvar outras e isso já ninguém me tira.” – diz .
Relativamente ao que dizia às pessoas quando as puxava
para o navio, narra:
“O que tentávamos fazer era acalmá-las. Em
geral as pessoas vêm numa situação de pânico, só querem segurança para si e
para os seus filhos. E o que é preciso dizer nesse momento é: ‘está tudo bem,
somos uma equipa de resgate e o nosso objetivo é tirar-vos desta situação e pôr-vos
em segurança’. É esse o nosso papel, é ser a primeira plataforma onde as
pessoas podem descansar numa situação de meses e meses, ou anos a fio, em
tenção constante.”.
Em relação às críticas contra o local aonde faziam
aportar as pessoas, responde com clareza:
“Quando se resgatam pessoas em águas
internacionais, para já somos obrigados por lei a resgatá-las e por lei a
levá-las a um porto seguro. A Líbia, não é preciso argumentar, não é um porto
seguro. Podia-se argumentar que se poderiam trazer as pessoas para a Tunísia,
que não assinou a convenção de Genebra nos anos 50, em que se definia refugiado
e, como se sabe, as pessoas que foram no passado entregues à Tunísia foram
depois devolvidas pelas autoridades à Líbia. E isso constitui uma violação da lei
internacional e não podemos deixar que isso aconteça. (…) Todo o nosso trabalho
era feito em coordenação com as autoridades italianas e, na esmagadora maioria
dos casos que atendemos, as pessoas eram passadas para bordo de navios
italianos, que os levavam depois a terra italiana. Não éramos nós que fazíamos
essa decisão, a decisão era das autoridades italianas que tinham a
responsabilidade de coordenar o resgate marítimo.”.
Assim, a ação judicial de que é objeto foi uma
surpresa. Com efeito, sabiam da existência de vozes influentes que não gostavam
do que eles faziam e representavam, mas nunca pensaram na possibilidade da
utilização de meios legais “para criminalizar a ajuda humanitária que é não só
protegida por lei como é um direito fundamental das pessoas”.
Não sabendo o que se vai passar a seguir, adverte que
“é muito importante que haja este tipo de resposta por parte da sociedade
civil” (Portugal e o
resto da Europa). E considera:
“Em Portugal houve uma resposta muito
consensual sobre este problema e isso é muito importante, ter tanta gente a
proferir declarações de apoio, tão diretamente em relação a nós e ao nosso trabalho.
Mas não pode ficar por aí. Já houve várias instituições governamentais, e não
só, que declararam publicamente o apoio à nossa causa, isso é importante, mas é
o mínimo que se espera de um estado democrático, que se espera de um pais que
respeita da declaração universal dos direitos humanos, mas é preciso fazer
mais.”.
E explana, quanto ao absurdo de pretenderem fazer
regressar os migrantes à Líbia:
“O problema está muito além de nós próprios,
o problema das migrações e das mortes no mediterrâneo vai continuar a acontecer.
As autoridades líbias, se é que podemos chamar de tal coisa, põem em risco a
vida de milhares de pessoas, com a conivência e o apoio explícito da UE e dos
estados membros e é contra isso que precisamos lutar. não podemos lutar pelas
duas coisas. Dizer que respeitamos os direitos humanos e, por outro lado,
apoiar quem viola os direitos humanos, quem acaba por intercetar estes barcos e
levá-lo de volta à Líbia em condições horrorosas em que estas pessoas vivem nos
campos de detenção.”.
Sobre uma hipotética intervenção da comunidade
internacional nos países de origem com vista a uma estabilização para as pessoas
não terem de fugir, diz que é “problema que está longe de ser simples”, não
havendo “uma medida que resolva o problema”, mas sendo preciso um conjunto de
medidas coordenadas. E indica medidas no momento e medidas a montante:
“São precisos resgates marítimos, sistemas
de acolhimento eficiente, mais humanitários que consigam trazer estas pessoas
de forma segura para a Europa sem terem de se pôr em barcos sem condições
nenhumas e pouca probabilidade de sobreviver, só para chegar à Europa e pedir
asilo. O ideal é que não haja resgate marítimo, não haja necessidade de
resgate, o ideal é que as pessoas não tenham de sair dos países; e aqui, se
calhar, é mais urgente do que uma intervenção de estabilização de qualquer
situação que se passe nos países de origem, eu diria que é preciso moderar
alguma intervenção que os países ditos ocidentais têm tido. Os maiores
exportadores de armas no mundo são os EUA e vários estados membros europeus.”.
Ora, antes das “ajudas para o desenvolvimento”, é
preciso pôr em causa “a venda de armas em situações de conflito”, pois os
migrantes “estão a fugir das bombas que são criadas em solo europeu”, pelo que
não podemos “fechar-lhes as portas quando estão a fugir de armas produzidas por
nós”. A este respeito e no atinente ao que se pode fazer em Portugal Miguel
Duarte não deixa de dizer:
“O que é preciso fazer neste momento, na
minha opinião, é continuar a indignar-se, informar-se criticamente sobre esta
situação, sobre as migrações. E não só. E é preciso fazer pressão sobre as
entidades que têm poder para fazer alguma coisa em relação a isto. É preciso
garantir que os nossos representantes sabem que estamos atentos e que a forma
como a UE está a tratar os migrantes e refugiados não é aceitável, e nós não
aceitamos isso num estado democrático.”.
Sobre o andamento do processo judicial em que está
envolvido, referiu:
“Fomos constituídos arguidos há um ano e
estamos à espera de uma acusação formal ou que o caso seja arquivado. Qualquer
um pode acontecer e neste momento não conseguimos prever.”.
Voltaria ao Mediterrâneo “amanhã se pudesse” e, sobre
a sua atual ocupação, conta:
“Neste momento, o trabalho que tenho feito é
maioritariamente este trabalho de comunicação, de dar voz a este problema,
trazer atenção para isto, nunca esquecendo que o foco é num problema muito
maior, nunca esquecendo que nós, que enfrentamos uma possibilidade de 20 anos
na prisão por ajuda humanitária, ainda conseguimos ser os privilegiados no meio
desta situação, porque há pessoas que todos os dias arriscam a vida
simplesmente à procura de segurança e é nessas pessoas e situação que temos de
focar. E é com isso que temos de nos indignar mais.”.
Considerando que um processo judicial “mexe com vidas
mas não com princípios”, clarifica:
“O processo legal aumenta a nossa indignação,
[mas] não nos faz questionar no que acreditamos. Acreditamos que a vida
humana tem um valor incalculável e é isso que tentamos defender e vai ser
isso que vamos continuar a defender. Se a nossa luta é a comunicação e não o
resgate marítimo, então vamos lutar.”.
Por fim, o voluntário português diz sonhar “com uma Europa mais humana que permita que as
pessoas vivam com dignidade, todas as pessoas, não só os europeus”.
***
Esta é
uma excelente forma de martírio, segundo o sentido originário das palavras
gregas “martyría, as” (testemunho,
depoimento duma testemunha),
“mártys, ros” (testemunha,
mártir) e “mártyros, ou” (testemunha,
protetor). Ainda há
muitos mártires “no bom sentido”, como disse o Arcebispo Primaz na homilia da
missa da festa de São Torcato, no passado dia 7 de julho.
2019.07.09 –
Louro de Carvalho
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