sábado, 13 de julho de 2019

Faleceu o meu 3.º professor de Latim e meu único professor de Inglês


Andava ontem, dia 12 de julho, à procura de informação no site da Câmara Municipal de Moimenta da Beira por motivos atinentes a notícias dos últimos dias e deparei-me com o facto do falecimento do Cónego António de Sousa Pinto, que ocorrera a 11 de julho, dia litúrgico de São Bento de Núrsia, padroeiro principal da Europa. Mais tarde, vi a notícia confirmada no site do jornal diocesano “Voz de Lamego” e na agência Ecclesia.  
O Presidente da Câmara Municipal de Moimenta da Beira, José Eduardo Ferreira, lamentando profundamente o seu desaparecimento e endereçando “à família e a todos os paroquianos os seus mais sentidos pêsames”, sublinhava a importância da “personalidade do Cónego Sousa Pinto, que marcou incontestavelmente muitas gerações”. E destacava esta “figura distinta do nosso meio eclesiástico, merecedor do respeito por parte do município e do seu povo, pela sua vida de entrega, de trabalho às causas da Igreja, na valorização espiritual dos crentes, no contexto da sua ação social, no exercício da responsabilidade de formação eclesiástica, como gestor eclesiástico e como professor que foi”.
As notas biográficas referem que era natural de Vide, da freguesia de Rua (paróquia de Vila da Rua), nascido a 10 de junho de 1929 (faleceu, pois com 90 anos de idade), Filho de João de Sousa Júnior e de Maria José Pinto de Sousa. Foi batizado na igreja paroquial de Vila da Rua. Fez o curso dos seminários diocesanos. Depois de recebida a ordem do diaconado, a 16 de março de 1957, e a do presbiterado, a 17 de agosto do mesmo ano, ambas na Capela do Seminário de Lamego e das mãos do então Bispo de Lamego, Dom João da Silva Campos Neves, foi nomeado professor (sobretudo de Latim, Inglês e Canto Coral) e prefeito do Seminário de Resende, passando mais tarde a acumular com as funções de ecónomo do mesmo Seminário.
Em 26 de novembro de 1966, foi nomeado pároco de Leomil e simultaneamente professor de Inglês no Seminário de Lamego, bem como confessor e auxiliar na direção espiritual no mesmo seminário. Foi, depois, professor no Externato Infante Dom Henrique e na Escola Preparatória Duarte Madeira Arrais, em Moimenta da Beira.
A 21 de setembro de 1976, foi-lhe confiada a paróquia de Moimenta da Beira, e, mais tarde, também a de Alvite. Exerceu ao cargo de arcipreste de Moimenta da Beira durante alguns anos. Vigário Episcopal de Zona Riba Távora em 12 de março de 1982, foi nomeado cónego honorário em 11 de fevereiro de 1988 e, a 2 de março de 1996, foi nomeado cónego capitular.
A 20 de janeiro de 2002 foi nomeado pároco de Nagosa e de Aldeia de Nacomba, do arciprestado de Moimenta da Beira, cargo que desempenhou até 2 de outubro de 2002.
O site da Câmara Municipal de Moimenta da Beira refere que “foi também pároco de Ariz e de Aldeia de Nacomba, nunca deixando Leomil”.
Vivia na Paróquia de São Tiago de Leomil, da qual foi pároco durante muitos anos.
Convém, neste momento a oração e o agradecimento a Deus pelo dom da sua vida, da sua vocação e do seu ministério sacerdotal e, como diz o Bispo diocesano, Dom António Couto, deve sublinhar-se “a graça do encontro com Deus na ressurreição dos mortos, na vida eterna, deste nosso irmão, com quem nos encontraremos em definitivo quando chegar a nossa hora” e pedir Deus “a sabedoria para valorizarmos a vida como dom e como bênção”.
O funeral foi a 12 de julho, às 18 horas, a partir da Igreja Matriz de Vila da Rua, Moimenta da Beira, onde foi celebrada missa de corpo presente.
***
Devo, em memória do Cónego Sousa Pinto, uma palavra de aplauso e outra de gratidão.
A palavra de aplauso deve-se à sua simplicidade pessoal, à constante procura da sabedoria que induz o aprofundamento do conhecimento e a sua comunicação oportuna e importunamente, como recomenda o Apóstolo, ao seu estilo de proximidade e ao zelo com se aplicava ao seu múnus. Porém, a sua humildade quase natural não o impedia de reivindicar direitos que julgasse fundamentais para si e, sobretudo, para as comunidades que servia.
No quadro desta simplicidade, gosto de recordar as situações em que, pela sua intervenção a viagem de Lamego para Resende, aquando dos dias de entrada no Seminário Menor, se tornava leve e alegre. Isto explica-se do seguinte modo: Nós, os que viajávamos de Castro Daire para Lamego em autocarro da Empresa Guedes, encontrávamo-nos em Lamego com os que viajavam a partir do Vale do Távora em autocarro da EAVT. E todos, a partir do cimo da Praça do Comércio, viajávamos para Resende em autocarro da Empresa Soares Oliveira – um horror – o cheiro a gasóleo demasiado queimado, só curvas e contracurvas e sentados três em cada banco. Então o Padre Sousa Pinto, que tomara o autocarro da EAVT na Vila da Rua, distraía e animava a malta cantando, explicando algumas coisas do que se avistava e contando algumas anedotas. E a viagem de quase uma hora tornava-se mais alegre e menos maçadora. Obviamente, à saída de Lamego era usual a recitação da Avé Maria a Nossa Senhora dos Remédios.
Como professor, primava pela assiduidade e pontualidade, bem como pela simpatia, clareza, rigor e exigência. Como prefeito, a simpatia e a atenção aos rapazes não o impediam de infligir alguns castigos em moda na época, embora optasse pelos mais brandos. Como pároco, sempre ouvi sublinhar o seu zelo e proximidade, bem como a sua vontade de articular a segurança da doutrina e da liturgia com a abertura a novas ideias e estilos.     
Naturalmente, o excesso de simplicidade e alguma persistência não entendida por outrem como por ele originaram alguma incompreensão nalguns momentos, tal como a maneira simples com que reconhecia e elogiava o trabalho de colegas o levava às vezes, nos últimos tempos de vigário episcopal a discurso bastante longo, repetitivo e mesmo hiperbólico. É a vida!    
Como vigário episcopal (recordo que a sua simplicidade me levara a um esforço junto de outros para a sua eleição) – e é sobretudo aqui que entra a minha palavra de gratidão –, devo salientar a solicitude com que se entregava a este múnus de coordenação pastoral, sem pompa, mas disponibilizando-se sempre na atenção aos problemas dos colegas e no apoio, sobretudo se solicitado, pois não se intrometia indevidamente na vida e na gestão do espaço dos colegas. E, sempre que necessário ou sempre solicitado, presidia a eventos pastorais na zona de Riba Távora e acompanhava as reuniões do clero com o prelado diocesano. Confesso o desapontamento com que vi um grupinho de leigos a pedir ao Bispo diocesano que presidisse a um determinado evento local ou que se fizesse representar, mas não pelo Senhor Vigário Episcopal de Zona.
Do meu lado, lembro três casos: aquele em que alguém tentou junto do prelado diocesano que este me impedisse de testemunhar em tribunal sobre uma ocorrência; aquele em que o Bispo diocesano, supostamente influenciado por um autarca, me desautorizaria em relação a uma diligência em que me envolvi em prol da comunidade; e aquele em que um sacerdote com largo tempo de serviço como professor de Educação Moral e Religiosa Católica ficaria fora do sistema após a publicação do Decreto-lei n.º 407/89, de 16 de novembro (que criou nas escolas dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e nas escolas do ensino secundário lugares do quadro para professores da disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica). Intervim junto do vigário episcopal, que, em articulação com o então vigário geral adjunto, hoje Bispo emérito de Lamego, Dom Jacinto Tomás de Carvalho Botelho, contribuiu para a reversão das preditas situações que estavam na iminência de ser alteradas.
Por fim, devo salientar o seu desempenho como confessor e diretor espiritual, marcado pela lucidez e compreensão, sentido do humano e do divino, conhecedor das limitações e instigador das possibilidades de quem lhe contava a vida.
Por tudo, além do que disse Dom António Couto, penso dever agradecer a Deus pelo bem que fez através deste sacerdote, professor e líder de comunidades, bem como agradecer todos os benefícios que Deus lhe concedeu. De resto, como se reza em Igreja, que descanse eternamente nos esplendores da luz perpétua.
2019.07.13 – Louro de Carvalho       

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