Estará aberto, desde o dia 29 de julho, o período
de candidaturas a diretor-geral do FMI (Fundo
Monetário Internacional), que irá até 6 de setembro. Esta instituição internacional espera ter o
novo líder escolhido a 4 de outubro.
Na prática, a corrida à liderança do FMI já estava em
ação desde o anúncio de que Christine
Lagarde iria abandonar, a 12 de setembro, o cargo de diretora-geral para
assumir a presidência do BCE (Banco Central Europeu), sendo a primeira mulher, e não economista, a ocupar este cargo europeu,
mas só esta sexta-feira o fundo oficializou a demanda por um novo líder.
Na verdade, especificando
que “os candidatos podem ser nomeados por um governador do fundo ou
diretor executivo”, o FMI comunicou:
“O Conselho Executivo anunciou hoje [da 26
de julho] que adotou um processo aberto, com base no mérito, e transparente
para a seleção do próximo diretor-geral, semelhante ao usado nas últimas rondas”.
Para ser considerada a candidatura, cada candidato deve possuir um
histórico de funções de decisor de política económica a nível sénior, background profissional de excelência, já ter demonstrado
as capacidades tanto de gestão como de diplomacia necessárias para liderar uma
instituição global e ser nacional de um dos países membros do fundo.
O período de nomeações vai decorrer, com se disse,
entre 29 de julho e 6 de setembro, sendo que
os nomes serão apenas comunicados ao secretário do fundo. Após este tempo, será
criada uma shortlist com base no apoio
dado pelos governadores ou diretores aos candidatos e o processo de seleção estará
finalizado a 4 de outubro.
A lista de candidatos, que será tornada pública, incluirá um português. Mário Centeno, Ministro das Finanças e presidente do
Eurogrupo, é um dos nomes que está em cima da mesa para suceder a
Christine Lagarde. O Primeiro-Ministro, que terá dito que este não era
nosso objetivo, já admitiu a hipótese, ao passo que Centeno se tem mantido em
silêncio sobre o assunto.
Uma fonte oficial do Governo francês, a quem incumbe a liderança do processo de
seleção do candidato europeu, confirmou que o Ministro das Finanças português é
um dos nomes apontados para liderar o FMI. A confirmação partiu de uma fonte oficial do Governo
francês, citada pela agência de notícias Reuters
(conteúdo em inglês), que diz que o atual ministro das Finanças de Portugal e presidente do
Eurogrupo é um dos cinco nomes possíveis.
O governo francês ficou responsável por coordenar os trabalhos no seio dos
países da UE (União Europeia) para que
seja apresentado um único candidato da União à sucessão de Lagarde. De acordo
com declarações de Bruno Le Maire, Ministro das Finanças francês, no final de
uma reunião do G7 em França, há acordo sobre o processo de seleção, que passa
por encontrar “uma candidatura europeia de consenso,
que seja sólida, credível e que permita à Europa continuar a liderar o FMI”. Em cima da mesa estão também os nomes da búlgara Kristalina Georgieva, atual diretora executiva do
Banco Mundial, o holandês e ex-presidente do Eurogrupo Jeroen Dijsselbloem, a Ministra da Economia espanhola, Nadia Calviño, o governador do Banco de Inglaterra, Mark Carney, e
o Governador do Banco Central da Finlândia, Olli Rehn. Todavia, os Governos
da UE estão divididos: os países do norte da Europa preferem
Dijsselbloem ou Rehn, enquanto os do sul preferem Nadia Calvino ou Mário
Centeno.
Entretanto, soube-se que a falta de apoio dos governos
europeus às candidaturas de Jeroen Dijsselbloem e Mark Carney ao cargo de topo do FMI levou à exclusão desses
dois nomes das listas de potenciais candidatos, que agora fica reduzida a três hipóteses,
incluindo Mário Centeno, ministro das Finanças português e líder do Eurogrupo.
Segundo avança o Político (conteúdo em inglês), o holandês Dijsselbloem, desconhecido até ser desencantado
pelos governos da Zona Euro para liderar o Eurogrupo, não convenceu nem italianos, nem ingleses, que se juntaram aos
países do Sul da Europa, os que Dijsselbloem apontou como tendo populações que
só gastam dinheiro em “álcool e mulheres”.
O apuramento das posições de cada governo em relação aos candidatos ao FMI
aconteceu nos últimos dias, durante encontros informais tidos à margem do
encontro de ministros das finanças e de governadores de bancos centrais do G7,
em Chantilly, França, como adianta o Político.
Além de ter sido riscado nome do holandês, também o nome de Mark Carney
não sobreviveu a este encontro informal. A falta de apoio ao inglês está
intimamente ligada ao Brexit, que nesta
altura desmotiva muitos executivos europeus a apoiar algo vindo da
Grã-Bretanha. E deixou de se falar de Kristalina Georgieva por
já ter 65 anos (França não obteve consenso para superar este óbice).
A saída destes nomes da lista de potenciais líderes do FMI acaba por
reforçar as hipóteses dos restantes candidatos, com a lista agora reduzida a
três nomes: Mário Centeno, Nadia Calviño, ministra da Economia de Espanha, e o
líder do banco central finlandês, Olli Rehn.
***
O processo de seleção do sucessor de Lagarde arranca
no dia 29 e as candidaturas podem chegar até 6 de setembro. Mas pode não ser
fácil preencher todos os requisitos. Leonor Mateus Ferreira explica no ECO on line como é escolhido o diretor
do FMI e elenca as 6 caraterísticas do sucessor de Lagarde, a qual do não inicial
aceitou a escolha feita pelo Conselho Europeu, suspendeu funções e acabou opor
apresentar a sua demissão (com efeitos a partir de 12 de
setembro).
É um processo “aberto, com base no mérito, e transparente”. Mas não é muito
simples. Da nacionalidade ao apoio, passando pela experiência ou pela
idade, são várias as caraterísticas do candidato. Com efeito, o próximo
diretor-geral do FMI terá uma função de destaque no trabalho do fundo,
nomeadamente de liderança do conselho executivo, gestão de cooperação com
entidades exteriores e comunicação. Tem de ser imparcial, objetivo e empenhado.
Para chegar a esta pessoa, o fundo lançou uma lista de 6
requisitos (semelhantes aos de 2011 e 2016), que os candidatos têm de preencher: um histórico de distinção em decisão de política
económica a nível sénior; um background profissional
de excelência; demonstradas capacidades de gestão e diplomacia; nacionalidade
de um dos países membros do fundo; nomeação por um governador do fundo ou
diretor executivo; menos de 65 anos (requisito de poderão ser dispensados
por voto da maioria dos governadores, que o não foi conseguido).
No período de candidaturas – entre 29 de julho e 6 de setembro – os nomes
propostos serão comunicados ao secretário do fundo e mantidos em segredo. Após
aquele tempo, o secretário divulgará, ao Conselho Executivo, os nomes dos
nomeados que tenham mostrado interesse em ocupar o cargo. Caso haja 4 ou mais
candidatos, os 24 membros do conselho limitarão a lista a apenas 3 com base no
perfil dos nomeados e sem preferências geográficas. O objetivo é que nos 7 dias
seguintes seja criada e divulgada uma shortlist com
três nomes. E o fundo clarifica:
“O processo de shortlisting será
implementado consoante os candidatos que receberam maior apoio dos diretores,
tendo em consideração o seu peso no sistema de voto do FMI. Apesar
de o Conselho Executivo poder adotar uma shortlist por
maioria, o objetivo é que o faça por consenso.”.
Quanto a Centeno (terá de ser nomeado e escolhido para a shortlist), se tal
suceder, reunir-se-á, depois, em Washington D.C. com o Conselho Executivo, que
analisará os pontos fortes de cada candidato e tomará a decisão final. O FMI espera completar o processo de seleção a 4 de outubro, dia
em que deverá ser escolhido o candidato. Nessa altura, já Christine
Lagarde estará fora da instituição. Até outubro, David Lipton
desempenhará funções de diretor-geral interino.
***
Se Centeno conquistar a liderança do FMI, juntar-se-á
a uma já longa lista de portugueses em lugares de topo.
Após 8 anos à testa do FMI, Lagarde está de malas aviadas para suceder a
Mario Draghi no topo do BCE, pelo que deixa a liderança do fundo à disposição
do senhor ou da senhora que se segue. Centeno, o denominado “Ronaldo da
Finanças”, está na corrida ao cargo, podendo vir a juntar-se aos muitos
portugueses que ocupam cargos de topo internacionais. A questão que alguns levantam é se Portugal é
um caso raro ou é normal tanta exportação deste tipo de talento.
Os especialistas dividem-se em relação à tese de
Portugal ser um caso raro na exportação deste tipo de talento ou à de estarem
em questão casos singulares que pouco ficam a dever ao país.
A 17 de julho, um dia depois de Lagarde ter apresentado oficialmente a sua
carta de demissão do cargo de diretora administrativa do FMI, o Político indicou Centeno como um dos
possíveis sucessores da francesa. E, em entrevista à Rádio Observador, o Primeiro-Ministro, questionado
sobre tal possibilidade, admitiu que é “uma hipótese”, mas não um
objetivo, defendendo que ainda é prematuro “fazer juízos de
probabilidade”. Porém, no encerramento da convenção dos socialistas, António Costa foi mais longe, dizendo que Centeno poderá vir a
exercer funções de “grande dimensão internacional”, uma alusão ao FMI.
A concretizar-se essa eleição, Mário Centeno juntar-se-á a um rol
significativo de nomes portugueses que já ocupam cargos internacionais de
topo. Na ONU (Organização das Nações Unidas), está António Guterres como secretário-geral, mas também António Vitorino e Mónica Ferro em duas
das agências dessa organização. Na OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Económico), está
Álvaro Santos Pereira. Na UNICEF, Catarina Albuquerque. Na liderança da maior
organização de astronomia do mundo, Teresa Lago. E já “à espera” de Centeno no
FMI, está Vítor Gaspar, que tem as rédeas do Departamento de Assuntos
Orçamentais. O ex-ministro das Finanças do “enorme aumento de
impostos” poderá ficar, deste modo, a trabalhar sob a asa do atual Ministro das
Finanças, ao qual a direita deu o cognome de “o cativador”. É ainda de notar que,
embora o Executivo de Costa tenha ficado marcado por uma redução dos impostos (com o
desdobramento dos escalões do IRS e a abolição da sobretaxa, por exemplo), a carga fiscal atingiu máximos históricos nesta
legislatura.
Entre os nomes que chegaram ao topo de cargos internacionais, está o
de Guterres, antigo primeiro-ministro português (entre 1995 e
2002) e secretário-geral da ONU, desde 2017.
Guterres foi escolhido em detrimento da candidata búlgara Kristalina Georgieva
(que era
apoiada pela Alemanha), pelo seu trabalho enquanto líder do ACNUR (Alto
Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados). Enquanto
ocupou esse cargo, o português teve mesmo de lidar com uma das mais graves
crises de refugiados das últimas décadas e com o agudizar dos conflitos na
Síria e Iraque.
Também António Vitorino, antigo ministro do Executivo de Guterres,
assumiu um lugar de relevo numa das agências da ONU: desde 2018 é diretor-geral da OIM (Organização Internacional para as
Migrações). Esta é apenas a segunda vez em quase 50 anos que esta agência não é
liderada por um norte-americano (o candidato dessa nacionalidade
ficou pelo caminho, depois de mensagens suas com conteúdo racista terem vindo a
público). Ainda na ONU, a antiga Secretária
de Estado da Defesa Mónica Ferro é, desde abril de
2017, diretora do UNFPA (Fundo
Populacional das Nações Unidas para a População). Antes de assumir esse cargo, Ferro chegou a ser deputada,
vice-presidente do grupo parlamentar do PSD e coordenadora do grupo parlamentar
para a população e desenvolvimento. A estes nomes, somam-se o de Vítor Gaspar, que é diretor do Departamento de
Assuntos Orçamentais do FMI, e o de Álvaro Santos Pereira,
que é diretor do Departamento de Estudo sobre Países da OCDE. Além
destes, destaca-se Teresa Lago, que é, desde 2018, secretária-geral da UAI (União
Astronómica Internacional), a maior organização de astronomia do mundo, sendo a
autoridade internacional responsável pela atribuição dos nomes oficiais de
todos os corpos celestiais e das suas superfícies. E, nesta lista de
portugueses a ocupar cargos relevantes internacionais, aparece ainda Catarina Albuquerque, jurista lusa e atual CEO da agência da UNICEF Sanitation and Water for All. Este
é o cargo mais elevado ocupado por um português na UNICEF nos últimos 20 anos.
O processo de seleção durou cinco meses, tendo Albuquerque ultrapassado
quase duas centenas de candidatos.
Mas, além de todos
estes nomes, Portugal já teve outros em destaque. Recordem-se, a título de
exemplo, os casos de Durão Barroso, que foi presidente da Comissão Europeia;
Vítor Constâncio, que foi vice-presidente do BCE Banco Central Europeu; Diogo
Freitas do Amaral, que foi presidente da Assembleia Geral da ONU; Ramiro Lopes,
que foi presidente do PAM (Programa Alimentar Mundial); Mário Soares, que esteve à testa do MEI (Movimento
Europeu Internacional), da CMISO (Comissão Mundial Independente Sobre os Oceanos), do Comité Promotor do Contrato Mundial da Água e da Fundação Portugal África;
Jorge Sampaio, que foi Enviado Especial da ONU para a Luta contra a Tuberculose e Alto
Representante da ONU para a Aliança das Civilizações pelo Secretário-Geral das
Nações Unidas; Cardeal
Saraiva Martins, que foi Prefeito da Congregação par as Causas dos Santos; e
Cardeal Manuel Monteiro de Castro, que foi Penitenciário-Mor do Supremo
Tribunal da Penitenciaria Apostólica.
Carlos Gaspar, investigador do IPRI (Instituto Português de Relações
Internacionais) considera
“raro em termos comparativos” que um país de pequena dimensão
consiga uma lista tão considerável de cargos relevantes, enquanto António
Costa Pinto, politólogo e coordenador do ICS (Instituto de Ciências Sociais) da Universidade de Lisboa, anota que estão em
referência casos concretos, cujo percurso não pode ser explicado pelo “país
como um todo”.
Carlos Gaspar entende que “Portugal tem uma elite
política com grandes qualidades”, explicando que tal fica a dever-se
sobretudo à Revolução dos Cravos, já que, sem essa viragem política,
os “melhores” não teriam entrado na vida política nacional e seguido, a partir
daí, o seu caminho até à ribalta internacional. O especialista lembra
que, “antes [do 25 de Abril], não havia portugueses em cargos internacionais, a
não ser representantes oficiais”. Segundo Gaspar, a revolução trouxe “o
prestígio de uma nova democracia” o que impulsionou essa projeção
internacional. Por outro lado, “há personalidade políticas
portuguesas com grandes qualidades” quando comparadas com os seus pares,
o que explica a relevância que acabaram por assumir e a raridade da projeção
portuguesa nesse universo. Costa Pinto explica que, no caso de Guterres, a escolha ficou ligada essencialmente ao trabalho de diplomacia
portuguesa e aos seus esforços no Alto Comissariado. E no caso de Centeno, a possível
eleição para o FMI seria resultado do “modelo de seleção”, de “competirem
europeus” e do facto de ser o atual líder do Eurogrupo.
Aliás, como aponta o politólogo, esse último ponto seria mesmo “o fator
decisivo”. Portanto, Costa Pinto salienta que estão em causa casos concretos, “não
são justificados pelo país como um todo”. Não obstante, admite
que a “imagem pacífica” de Portugal ajuda, à semelhança do que acontece com a
Suíça, cuja neutralidade tem levado os seus cidadãos a cargos de topo.
Costa Pinto discorda, no entanto, de Carlos Gaspar e salienta que Portugal não é “excecional” na exportação deste tipo de
talento, já que outros países pequenos europeus, como a Suíça e a
Holanda, têm projeções semelhantes. E, sobre os benefícios trazidos ao país por
tantos portugueses ocuparem cargos de topo a nível internacional, frisa que,
embora Portugal ganhe “mais saliência internacional”, assumir esses
lugares não é necessariamente vantajoso, porque alguns desses organismos
não dão azo a esse destaque e, do meu ponto de vista, não raro põem os
titulares entre as exigências do cargo e as necessidades e apetências do país.
Ao invés, Carlos
Gaspar sublinha que “há uma confiança acrescida em Portugal” vincando
que a leitura é sempre ambivalente e que, por exemplo, os espanhóis acham mesmo
que os portugueses ocupam cargos a mais.
***
Veremos o que espera Centeno e, se for diretor-geral do FMI, quem lhe
sucederá à testa do Eurogrupo e quem se seguirá na pasta das Finanças se o PS
ganhar as eleições legislativas: se a dor de cabeça de Costa e a vitória
pessoal de Centeno, como referiu Marques Mendes, ditarão Mourinho Félix, Secretário de
Estado-adjunto das Finanças, Elisa Ferreira, atual vice-governadora do Banco de
Portugal ou outros. O FMI, que até foi um espinho para Portugal não resolve
tudo.
2019.07.27
– Louro de Carvalho
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