E não é para menos. O Papa Francisco, na sua peregrinação “com Maria na esperança e na paz”,
decidiu trazer uma bela prenda ao Santuário de Fátima, aos portugueses e a
todos os crentes que de algum modo se reveem na mensagem da Senhora da Cova da
Iria.
***
A ressonância à boa nova
Para lá do que refere Marcelo Rebelo de Sousa na sua
mensagem presidencial – e ele tomou a postura de Presidente de uma República aconfessional
ao saudar e felicitar “a comunidade católica, crente em Fátima” – a mensagem da
Senhora dirige-se a todas as pessoas em todos os povos; Fátima é hoje uma
referência de fé e cultura em todo o mundo; os pastorinhos são o ícone de fé,
vida interior e espiritualidade – centradas em Jesus Cristo e na Santíssima
Trindade pela via oferecida por Maria; e Fátima diz muito a todos os portugueses,
se não a todos pela fé católica (e sobretudo pela fé nas aparições), ao menos por cem anos de história, pelo turismo,
pelo espaço de interioridade e como canto de refúgio e repouso.
Seja como for, é bem-vinda a mensagem do Presidente da
República que “saúda e felicita a
comunidade católica, crente em Fátima, pela decisão de canonização de Jacinta e
Francisco Marto, que, certamente, conhecerá na próxima visita do Papa Francisco
o culminar de um longo processo eclesiástico”. E tudo leva a crer que o cidadão
Marcelo se inclui no universo dos destinatários da sua mensagem.
E
o que muitos esperavam e muitíssimos mais desejavam acontecerá: os Beatos
Francisco Marto e Jacinta vão ser canonizados no próximo dia 13 de maio, em
Fátima, na celebração eucarística a que presidirá o Papa Francisco, que estará
em peregrinação ao Santuário de Fátima entre 12 e 13 de maio a pontificar nas
celebrações do Centenário das Aparições. O anúncio foi feito na manhã de
hoje, dia 20, em Roma, no Consistório Ordinário Público para o voto sobre
algumas Causas de Canonizações.
Mal
se soube da notícia os sinos do Santuário de Fátima repicaram. E o reitor do Santuário, Padre Carlos Cabecinhas, juntou-se pouco depois aos peregrinos e visitantes,
na Capelinha das Aparições, para um “momento singelo de oração”, declarando:
“Alegramo-nos com esta notícia e
damos graças a Deus por estes exemplos de santidade que nos são oferecidos”.
E acrescentou,
antes de se cantar o hino dos pastorinhos no Recinto de Oração:
“Pedimos também neste lugar tão
especial, a Capelinha das Aparições, a ajuda de Nossa Senhora para sabermos
imitar o exemplo dos futuros santos Francisco e Jacinta Marto”.
Dom
António Marto, Bispo de Leiria-Fátima, reagiu com “indescritível alegria” à boa
nova, referindo em comunicado que sublinha o significado especial que tem a canonização
destes Beatos em ano de celebração dos cem anos das Aparições, encerrando um
processo de 65 anos:
“Este acontecimento é um grande dom
para a nossa diocese de Leiria-Fátima, donde são originários os pastorinhos,
como também para o Santuário de Fátima, para a Igreja em Portugal e para a
Igreja universal, para todos os que reconhecem nos pastorinhos o exemplo
luminoso de um caminho de santidade que, através do Imaculado Coração de Maria,
nos conduz até Deus”.
E assegura:
“Com a peregrinação do
Santo Padre a Fátima e a canonização dos Pastorinhos podemos dizer que a
celebração do centenário atinge todo o seu esplendor”.
Por seu turno, o reitor do Santuário de Fátima exprime o
sentimento de gratidão a Deus e ao Santo Padre, por ter tomado a decisão de
canonizar os Pastorinhos no Santuário de Fátima. E justifica, em declaração
publicada esta manhã:
“Que esta canonização tenha
lugar em Fátima torna-a, para nós, muito especial: porque é este Santuário que
custodia as suas relíquias; é neste Santuário que estão os seus túmulos; muito
especial porque escolher Fátima para este ato solene da Igreja universal é
reconhecer a importância mundial de Fátima e é igualmente reconhecer Fátima como
verdadeira ‘escola de santidade’; por fim, muito especial porque a canonização
dos dois mais jovens videntes de Fátima vem coroar a grande celebração do
Centenário das Aparições”.
Também a Conferência Episcopal Portuguesa,
através de nota publicada hoje pelo Padre Manuel Barbosa, seu secretário e porta-voz,
manifestou o sue júbilo:
“É com
imensa alegria que a Conferência Episcopal Portuguesa acolhe o anúncio que o
Papa Francisco acaba de fazer hoje sobre a data e o local da Canonização de
Francisco e Jacinta Marto: 13 de maio em Fátima, Portugal. Renova assim a mesma
congratulação que manifestou aquando da aprovação do milagre necessário para a
sua canonização.”.
Depois,
apresenta a valorização desta atitude papal:
“O
Centenário das Aparições, a Canonização de Francisco e Jacinta Marto e a
presença do Santo Padre entre nós são motivos maiores para estarmos todos,
peregrinos na esperança e na paz, em sintonia de oração e de acolhimento do dom
da santidade. Nunca é demais recordar e insistir na vocação universal à
santidade, proclamada pelo Concílio Vaticano II, na fidelidade ao que a Palavra
de Deus nos transmite sobre esta essencial dimensão da vida cristã.”.
E exorta:
“Que o exemplo de vida de
Francisco e Jacinta Marto, agora apresentados a toda a Igreja como modelos e
intercessores da santidade, contribua para intensificarmos a vivência da
mensagem que Nossa Senhora do Rosário nos ofereceu em Fátima.”.
A novidade da canonização dos Pastorinhos
em Fátima, a 13 de maio p,f., surge um mês depois de o Santo Padre ter aprovado
o milagre necessário para a canonização dos videntes de Fátima.
***
Questões levantadas sobre o ‘modus
peregrinandi’ deste Papa
Já se levantou a questão de Francisco
pretender vir a Fátima e só a Fátima. Acentuava-se a linha da saída às
periferias; e Portugal vive no mundo europeu. Porém, a linha da periferia não é
única neste Papa. Há a da misericórdia, a da sinodalidade, a da peregrinação, a
do sofrimento, a da piedade dos simples… São periferias? Sim, mas que se apoiam
no centro onde encontram acolhimento, refúgio e retempero de energias.
Eu pensava que Francisco viria como
peregrino à boa maneira do seu inspirador Paulo VI, no cinquentenário (1967), a pedir a Maria a Paz no mundo e o revigoramento da
Igreja: aterra em Monte Real e ruma a Fátima. Agora penso que também assume o perfil de João Paulo II: vem a 12 de
maio e celebra a 13. E, se o Papa polaco beatificou os irmãos pastorinhos, Francisco
canoniza-os. Os pequenos que desfrutam de um culto local passam à veneração
universal.
A Irmã
Ângela Coelho, postuladora da Causa, dizia recentemente que poderíamos ter novidades
no Centenário. E o Reitor dizia ao JN
ser possível a canonização ocorrer em 13 de maio, mas era ao Papa que incumbia
decidir o tempo e o lugar. Porém, o Santuário estava preparado. Até já
selecionara as relíquias (da costela de
Francisco e do cabelo de Jacinta),
relicário (2 candeias, a simbolizar a luz que os
dois luzeiros irradiam) e véu branco (evocando
a candura batismal que enforma a vida cristã).
E
pergunta-se o que dirá Francisco aos portugueses e ao mundo. O Padre Cabecinhas
entende que o Pontífice virá dizer algo que nos incomoda. Vamos ver. Eu penso
que o Papa irá insistir na dimensão evangelizadora do Santuário e nas consequências
para o aprofundamento da espiritualidade pela celebração da fé e da vida com
vista ao mergulho na misericórdia e à prática efetiva das obras – em linha com
Carta Pastoral Sanctuarium in Ecclesia,
que desclericaliza o santuário, o areja em termos de piedade e o torna pedra de toque de evangelização.
Com
efeito, por natureza, o Santuário é o lugar sagrado onde se pode
ouvir a Palavra de Deus, participar nos Sacramentos e fortalecer a ação evangelizadora
e catequética, pois no Santuário, encontram refúgio e coragem enfermos, pobres,
marginalizados, pessoas necessitadas.
E o Santuário deve olhar a todos: débeis, oprimidos, descartados
e despidos da sua dignidade.
***
Do processo que
levou à Canonização
Segue resenha cronológica do
percurso que atinge o ápice com a canonização, sintetizada a partir do texto
publicado no site do Santuário de
Fátima.
O processo,
iniciado pelo então bispo de Leiria, Dom José Alves Correia da Silva, a 30 de
abril de 1952, um ano após a trasladação dos restos mortais de Jacinta para a
Basílica de Nossa Senhora do Rosário de Fátima, tem agora, 65 anos depois,
o aguardado desfecho.
Francisco,
afetado pela epidemia da pneumónica desde 18 de outubro de 1918, recebeu, com
grande lucidez e piedade, o sacramento da Reconciliação, a 2 de abril de 1919,
e o Viático no dia seguinte. Faleceu em sua casa, em Aljustrel, pelas 22 horas
do dia 4 de abril.
Jacinta,
a mais nova dos três videntes, adoecera, como o irmão, no outono de 1918. Esteve
internada no Hospital de Vila Nova de Ourém de 1 de julho a 31 de agosto de
1919 e foi novamente internada, desta vez no Hospital de D. Estefânia, em
Lisboa, a 2 de fevereiro de 1920, onde foi operada e acabou por falecer a 20 de
fevereiro. Foi sepultada no cemitério de Vila Nova de Ourém.
Eurico
Lisboa, um dos médicos responsáveis pela sua hospitalização na capital, relata
que, “na tarde de 20 de fevereiro, pelas 18 horas, Jacinta disse que se sentia
mal e que desejava receber os sacramentos. Chamado o prior da freguesia dos Anjos,
Dr. Pereira dos Reis, ouviu-a de confissão, cerca das 20 horas. E, apesar de a
menina insistir para que lhe levassem o Sagrado Viático, o prior não concordou
por a ver aparentemente bem, prometendo levar-lhe Nosso Senhor no dia seguinte.
Jacinta insistiu em pedir a comunhão, dizendo que morreria em breve. E, pelas
20,30 horas, faleceu com a maior tranquilidade, sem ter comungado.
Os
restos mortais de Jacinta foram trasladados para o cemitério de Fátima a 12 de
setembro de 1935. O testemunho indireto de Lúcia refere ter sido “encontrado
íntegro” o seu rosto.
A
30 de abril de 1951, os restos mortais de Jacinta foram identificados e, em 1
de maio desse ano, trasladados para a Basílica de Nossa Senhora do Rosário de
Fátima.
A
17 de fevereiro de 1952, os restos mortais de Francisco foram exumados. A sua
identificação, dificultada pelo facto de a campa ter acolhido diversos corpos,
ficou a dever-se, em grande medida, às 148 contas do rosário com que fora
sepultado encontradas junto às suas ossadas e prontamente reconhecidas pelo pai
do vidente. O corpo foi transladado para a Basílica de Nossa Senhora do Rosário
de Fátima a 13 de março desse ano.
Dom
José Alves Correia da Silva abriu, como já foi dito, os processos diocesanos
sobre a vida, virtudes e fama de santidade de Francisco e de Jacinta a 30 de abril
de 1952. De início, as causas de beatificação de Francisco e de Jacinta
seguiram procedimentos independentes, tendo-se tornado causa comum apenas após
o decreto das virtudes dos irmãos Marto.
O
processo de Francisco contou com 63 sessões e 25 testemunhas; e o de Jacinta, com
77 sessões e 27 testemunhas. O Processo Diocesano da Causa de Beatificação e
Canonização de Jacinta foi encerrado a 2 de julho de 1979; e o de Francisco, a
1 de agosto também de 1979.
João
Paulo II assinou o decreto de heroicidade das virtudes de Francisco e Jacinta,
a 13 de maio de 1989. Os decretos das virtudes dos irmãos Marto e a concessão
do título de veneráveis representam
um momento verdadeiramente significativo para a História da Igreja, já que,
pela primeira vez e depois de longo período de reflexão teológica iniciada em
resposta à Causa dos dois pastorinhos de Fátima, é reconhecida a heroicidade
das virtudes e a maturidade de fé de crianças não mártires, abrindo o
precedente para que a santidade das crianças seja reconhecida.
Em
28 de junho de 1999, João Paulo II promulgou o decreto sobre o milagre da cura de
Emília Santos, obtida por intercessão de Francisco e Jacinta. Estava aprovada a
beatificação.
E,
a 13 de maio de 2000, João Paulo II peregrinou, pela terceira e última vez a
Fátima, no decurso do Jubileu do Ano 2000, e beatificou os videntes Francisco e
Jacinta, apresentando-os à Igreja e ao Mundo como “duas candeias que Deus acendeu para iluminar a humanidade nas suas
horas sombrias e inquietas”. Proferido no recinto de Fátima, o decreto
papal frisava:
“Acolhendo o desejo expresso pelo nosso irmão Dom Serafim
bispo de Leiria-Fátima, por muitos outros irmãos no episcopado e por tantos fiéis
cristãos, depois de termos ouvido o parecer da Congregação da Causa dos Santos,
com a nossa autoridade apostólica concedemos que, de hoje em diante, os
veneráveis servos de Deus Francisco e Jacinta Marto sejam chamados beatos e
possa celebrar-se anualmente, nos lugares e segundo as normas do direito, a
festa de Francisco e Jacinta Marto no dia 20 de fevereiro. Em nome do Pai e do
Filho e do Espírito Santo.”
A
23 de março de 2017, Francisco promulgou o decreto sobre o milagre da cura duma
criança brasileira, obtida pela intercessão dos Beatos Francisco e Jacinta. A
canonização era assim aprovada. E hoje, 20 de abril, Francisco estabeleceu
e anunciou a Canonização de Francisco e Jacinta para o dia 13 de maio de 2017,
durante a sua peregrinação a Fátima, na celebração do Centenário das Aparições
da Santíssima Virgem, Senhora do Rosário.
Era motivo
para os sinos do Santuário de Fátima tocarem a repique para celebrar a notícia.
***
Que a “Pia
Sociedade” dos santos Irmãos Marto seja incentivo à vivência da fé de todos e
inspire a educação cristã das crianças e adolescentes, segura, livre e equilibrada!
2017.04.20 – Louro de Carvalho
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