terça-feira, 11 de abril de 2017

Bento XVI, “o Papa da coragem”

O Papa emérito Bento XVI celebrará o seu 90.º aniversário natalício no próximo dia 16, domingo de Páscoa. A marcar tal efeméride, Mimmo Muolo, vaticanista do diário “Avvenire” (da Conferência Episcopal Italiana), fez publicar, nestes dias, o seu último livro a que deu o título “O Papa da coragem”.
O volume tem prefácio de Dom Rino Fisichella, Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização, dicastério criado pelo ora Papa emérito, em 21 de setembro de 2010, através da Carta Apostólica em forma de Motu ProprioUbicumque et Semper”, para estimular “a reflexão sobre os temas da nova evangelização” e identificar e promover “as formas e os instrumentos aptos para a realizar”.
Rino Fisichella, o primeiro e atual responsável pelo predito novo dicastério, para o qual foi escolhido pelo Papa Ratzinger, refere que o Pontífice emérito “colocou diante de nós o drama da sua existência como homem e como fiel, como professor e como Papa” e que “as interrogações que suscitou não ficaram sem resposta”. E eu acrescento que o fez com a mesma naturalidade com que o Papa São João Paulo II expôs, ao longo do seu pontificado, as suas opções, ideias, iniciativas, fragilidades, resultados de atentado sofrido, quedas, doenças e enfermidades e, por fim, a debilidade da sua pessoa e o silêncio da sua voz.
Em declarações à Rádio Vaticano, Mimmo Muolo detém-se sobre o título do livro em que ressalta, justamente, a dimensão da coragem de Bento XVI.
Chama-lhe “o Papa da coragem” porque “a sua decisão da renúncia é uma decisão quase sem precedentes, historicamente falando” e é por isso entendida como “uma decisão que implica coragem”. Depois, apesar de tudo o que se disse e escreveu sobre ele – desde logo, a comunicação social se lhe revelou adversa –, “foi um Papa que permaneceu de pé, enfrentando uma tempestade após outra, muitas vezes suscitadas pelos meios de comunicação que tinham uma posição preconceituosa em relação a ele”, até porque aquilo que passou para a opinião pública foi a ideia do estilo tenebroso que alegadamente perpassava a Congregação da Doutrina da Fé, que ele dirigia desde 25 de novembro de 1981.
E Muolo, recordando que Bento XVI sempre disse que ‘o verdadeiro pastor não foge diante dos lobos’, assegura que o Papa Ratzinger fez exatamente isso e, quando as águas se acalmaram, quando considerou que o perigo imediato não mais existia, teve a coragem de dizer: ‘Não sou mais o pastor apropriado para proteger este rebanho – devo passar o cajado para outro’.
Sobre o facto de ter escrito no livro que Bento XVI foi o Papa do essencial e que “focalizou a atenção na questão da fé”, justifica aduzindo que é ‘O Papa do essencial’ porque são dois os grandes eixos que “perpassam a sua vida e o seu Pontificado”: a fé e o diálogo.
Com grande veemência, ele colocou a questão da fé dentro da Igreja (Até proclamou o Ano da Fé). Na verdade, se falta a fé, todo o resto se torna supérfluo. E, em relação ao mundo, o tema do diálogo com o cristianismo – o outro grande eixo cartesiano –, o Papa alemão convidou à racionalidade alargada, ao diálogo com os que não creem, como o Pátio dos Gentios e muitas outras iniciativas que vão nessa direção. Vê-se também aí, segundo Mimmo Muolo, “uma grande distância entre o Papa real e o Papa como era percebido”. O Papa real, como homem de cultura, sempre buscou o diálogo, apaixonado pelo Evangelho e por Jesus Cristo; e, do Papa que era apresentado como refratário ao diálogo, diz o autor do livro que ainda hoje terá muito a ensinar-nos. E pensa que o seu magistério está a passar também “no Pontificado do Papa Francisco, o qual obviamente o interpreta segundo o seu estilo e segundo os seus cânones”.
Segundo o que Dom Fisichella escreve no prefácio do livro de Muolo, “as interrogações suscitadas por Joseph Ratzinger em toda a sua vida de serviço à Igreja, portanto, não somente como Papa, não ficaram sem resposta”. Além disso, diz que parece existir a sensação de que nestes anos, desde quando Bento XVI renunciou ao exercício do ministério petrino, haja talvez “uma maior e melhor compreensão daquilo que foi o seu Pontificado”.
Muolo comenta estas asserções na convicção de que “o ato da renúncia de certo modo o despojou daquela aura preconcebida” que se lhe reconhecia. A sua renúncia “fez-nos ver o verdadeiro Joseph Ratzinger”, e o verdadeiro Joseph Ratzinger é o que diz à Igreja: que a fé é importante, bem como o diálogo ente a fé e a razão. O verdadeiro Joseph Ratzinger – insiste Muolo – “é o que buscou constantemente dialogar com os homens e as mulheres do seu tempo”.
Mimmo Muolo não deixa de ver em Francisco uma réplica atualizada do discurso de Ratzinger: “a fé é importante – sem a fé, todo o resto se reduz – diria o Papa Francisco – a uma ong piedosa”. Muolo diz: “É a mesma coisa que – repito, com um estilo diferente do ponto de vista humano – está fazendo o Papa Francisco”.
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Também em torno do 90.º aniversário de Joseph Ratzinger, o Padre Frederico Lombardi, o jesuíta que o Pontífice alemão fez diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé e da Rádio Vaticano, recordou, no passado dia 6, que no próximo Domingo de Páscoa, o Papa emérito completará 90 anos. E frisou que, imediatamente após a sua eleição à Cátedra de Pedro, a 19 de abril de 2005, o novo Bispo de Roma se definira com “um simples e humilde trabalhador na vinha do Senhor”. Para dar testemunho sobre o Papa emérito e sobre esta importante efeméride, a Rádio Vaticano entrevistou o Padre Lombardi, ora Presidente da “Fundação Ratzinger – Bento XVI”, que fora, durante o Pontificado do Papa alemão, um dos seus mais estreitos colaboradores.
Lombardi diz, sem rodeios, que Bento XVI “tem uma lucidez de mente, de memória, de diálogo com as pessoas que encontra, com os seus visitantes, absolutamente admirável, maravilhosa”. Refere que, assim, “é muito belo, muito aprazível e sempre muito enriquecedor encontrá-lo, ouvi-lo, poder dialogar com ele”. Reconhecendo que “as forças, naturalmente, são de uma pessoa que tem 90 anos”, vê nele “a fragilidade que lhe é própria”, mas também a capacidade de “desempenhar as relações com os outros, vivendo discretamente este tempo de retiro, de vida reservada de oração e de reflexão em sua casa”.
Sendo-lhe perguntado o que esta idade da vida dá a Joseph Ratzinger, o entrevistado opina:
“Aquilo que ele de certo modo nos tinha anunciado já antes da sua renúncia ou na ocasião da sua renúncia, ou seja, um tempo de vida mais em recolhimento, de vida de mais intensa oração, de reflexão e também de diálogo com as pessoas com as quais entra em contacto, embora dessa forma mais reservada, mas um diálogo sempre muito concentrado, a este ponto, nos temas essenciais da vida, do sentido da vida, da história, porque é evidente o clima de preparação para o encontro com o Senhor”.
Em relação às múltiplas manifestações de afeto em torno destes 90 anos de Bento XVI, Lombardi assente que se poderá dizer, de certo modo, que após a renúncia ao exercício do ministério petrino (nestes anos), muitos releram e também compreenderam melhor o Pontificado, o que ele quis testemunhar. Na verdade, “vê-se a grande coerência, a linearidade e a coerência desta vida dedicada ao serviço da Igreja de vários modos, com diferentes funções, mas sempre com esta atitude de buscar a verdade do exercício da inteligência da fé e na fé, ao serviço da Igreja, do povo de Deus, de uma compreensão mais profunda da relação entre fé e razão, também em diálogo com a cultura hodierna e com o mundo que nos rodeia”.
E  Frederico Lombardi faz ao Papa emérito, pelos seus 90 anos, os seguintes votos:
“Que possa viver este tempo em completa serenidade, com todo o fruto e a alegria da união com Deus que alguém possa desejar; que essa mensagem de alegria e de paz na preparação para o encontro com Deus seja acolhida pela comunidade da Igreja como uma riqueza; e que a comunidade da Igreja sinta a sua atenção e a sua oração como rica, frutuosa não só para o seu sucessor, mas para todos nós que – ao menos por ora – continuamos caminhando no tempo, sentindo, porém, a sua presença como uma presença de serviço espiritual”.
Já no passado dia 11 de fevereiro, Lombardi salientava o binómio “Unidade e fraternidade” de Bento XVI com Francisco. Com efeito, ao evocar o 4.º aniversário da declaração de renúncia, o jesuíta Presidente da “Fundação Ratzinger – Bento XVI” dizia desse ato:
“Um gesto inédito que, hoje, pode ser compreendido cada vez mais, graças à extraordinária relação de fraternidade com o Papa Francisco. Nestes quatro anos, o Papa emérito oferece ao mundo um precioso testemunho de oração silenciosa”.
E explicitou: 
“O modo com o qual [Bento XVI] viveu e vive nestes quatro anos corresponde ao que havia dito, ou seja, ‘viver na oração e retirado, do ponto de vista espiritual e com extrema discrição, o seu serviço de acompanhamento, na oração, da vida da Igreja e em solidariedade com a responsabilidade do seu Sucessor’. É o que está acontecendo em plenitude. No entanto, o Papa emérito está muito lúcido, mental e espiritualmente, não obstante, com o passar do tempo, as suas forças enfraquecem, como toda a pessoa idosa. Contudo, as suas orações são coerentes com o seu encontro com Deus, onde a presença divina ocupa o centro da sua existência, como ele afirmou no seu livro “Conversas finais”. Eis o belíssimo testemunho que ele dá ao mundo contemporâneo.”.
E sobre o que mais o chama a atenção sobre a relação entre os dois – Bento e Francisco –, neste período inédito da história da Igreja, assegura:
“É inédito mas foi vivido com extrema serenidade e normalidade, porque a motivação e o modo em que aconteceu, foi extremamente linear com o que Bento XVI havia dito, na sua discreta e serena proximidade espiritual, ao seu Sucessor, ao qual prometeu obediência, respeito e apoio. De facto, o Papa Francisco mantém uma relação muito íntima e frequente com o Papa emérito, mediante visitas e telefonemas. São sinais de familiaridade, de respeito e de apoio espiritual: é um belo exemplo de unidade da Igreja, na sua variedade e diversidade.”.
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Além destes testemunhos e, entre as múltiplas iniciativas tomadas a propósito dos 90 anos de Bento XVI, é de assinalar que diversas publicações homenageiam Joseph Ratzinger, na celebração da efeméride. Entre as tantas obras que chegam às livrarias nestes dias, está “Bento XVI. A arte é uma porta para o infinito. Teologia Estética por um Novo Renascimento”. O livro será apresentado a 22 de abril, às 11 horas, no Palácio da Chancelaria, em Roma. Os autores são o vaticanista Alessandro Notarnicola e Monsenhor Jean Marie Gervais, Prefeito coadjutor do Capítulo Vaticano, expoente da Penitenciaria Apostólica e fundador de “Tota Pulchra”.
Surgido como homenagem desta Associação cultural a Bento XVI, o livro apresenta-se como um manual de arte com comentários do artista Bruno Ceccobelli, que realizou, para a ocasião, 10 mesas-redondas inéditas inspiradas em pronunciamentos do Papa emérito sobre arte.
O prefácio é assinado pelo Cardeal Angello Comastri, Vigário-Geral do Papa para a Cidade do Vaticano, Arcipreste da Basílica de São Pedro e Presidente da Fábrica de São Pedro.
Outra publicação que homenageia Bento XVI é “Bento XVI – Imagens de uma vida”, da pena de Maria Giuseppina Buonanno e Luca Caruso, numa publicação da Paulus.
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Bem o merece o intelectual, o professor, o sacerdote, o pontífice, o homem de fé e diálogo – cujo pontificado merece atenção e estudo!

2017.04.11 – Louro de Carvalho

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