A
Cáritas Portuguesa realizou, de 30 de março até hoje, 2 de abril, em Lamego, o
seu primeiro Conselho Geral do ano de 2017, com a participação de cerca de 70
pessoas que representam a “quase totalidade” das Cáritas diocesanas em Portugal (são
20) e que assumiram
a necessidade de “repensar as metodologias de intervenção” desta instituição
católica.
A
sessão de boas vindas aos participantes realizou-se no Teatro Ribeiro
Conceição, onde decorreram também os trabalhos do Conselho Geral da Cáritas
Portuguesa. Nesta sessão participaram o Presidente da Câmara Municipal de
Lamego, Francisco Manuel Lopes, e o Bispo da Diocese, Dom António José da Rocha
Couto. O encontro terminou com a celebração da Eucaristia na Sé de Lamego.
Da
agenda de trabalhos, para lá das questões estatutárias, constaram alguns dos
aspetos que fazem parte da vida da Cáritas em Portugal, nomeadamente, a
reflexão sobre as metodologias das campanhas realizadas a nível nacional e a
renovação do site caritas.pt, bem
como a análise do Plano Estratégico da Cáritas em Portugal para os anos
2017-2020.
O
grupo de trabalho responsável pelo acompanhamento da renovação do site vai dar continuidade ao processo com
o desenvolvimento duma fase-piloto em algumas das dioceses que constituem este
grupo. Na linha do Plano Estratégico da Cáritas, insistiu-se no reforço da
Cáritas “pela sua identidade, pela capacidade de planear e pela sua
fundamentação”. O seu ponto de chegada é a promoção da dignidade do outro, em
necessidade; e o seu alicerce é a solidariedade, entre todas as Cáritas,
perante qualquer tipo de adversidade, “na busca de soluções para todos os problemas
e todas as pessoas sem exceção”.
Presidiu
ao encerramento dos trabalhos do Conselho Geral o Arcebispo Primaz de Braga,
Dom Jorge Ortiga, na qualidade de presidente da Comissão Episcopal da Pastoral
Social e Mobilidade Humana, que sublinhou a necessidade contínua de uma
instituição como a Cáritas se manter numa perspetiva de inquietação e renovação
sobre a sua identidade, capaz de responder à complexidade das debilidades da
pessoa humana com inovação e transparência. E lembrou que a Cáritas terá de ser
testemunho de uma unidade sólida e consistente no essencial, com respeito pela
autonomia de cada uma das Cáritas diocesanas.
De
entre as conclusões do Conselho Geral, destaca-se a aprovação da realização de
um encontro, agendado para o dia 17 de junho do corrente ano, com base no
caminho feito a partir do II Plano Estratégico da Cáritas em Portugal e com o
objetivo de “repensar as metodologias de intervenção face aos desafios deixados
pela crise social e económica, que ainda persiste, e que alterou o perfil das
pessoas em situação de privação de recursos”. Para lá desta preocupação espelhada
no objetivo definido, o encontro constituirá também uma oportunidade para “uma
reflexão interna com vista à consolidação e coerência da ação da rede Cáritas
em Portugal”.
Para
o ano de 2018, a Cáritas em Portugal terá como lema “Cuidar da Casa Comum”, que será também o tema da Semana Nacional Cáritas 2018.
No
âmbito da campanha “Cáritas ajuda as
vítimas dos incêndios”, de 2016, o Conselho Geral foi informado da
angariação de 311 856,67 euros em donativos à Cáritas Portuguesa, a que se
somaram mais 150 mil euros provenientes do Ministério da Administração Interna.
E, segundo o que adianta a Cáritas Portuguesa, “esta verba está a ser aplicada
na reconstrução e recuperação de seis casas de 1.ª habitação, na reabilitação e
recuperação de 24 postos de trabalho e de equipamentos vários, domésticos e
industriais, e no apoio a 182 produtores de gado”.
Foi
dado, ainda, a conhecer o resultado peditório público de 2017, que está com um
resultado ainda provisório de 145 659,06€, faltando apurar o valor de duas
Cáritas Diocesanas. No entanto, este valor representa uma quebra de cerca de
30% face ao do ano de 2016.
***
No âmbito do tema da “(Des)Identidade”
e “Esperança”, Dom António
Couto, no arranque do Conselho Geral,
acolheu os participantes e pediu o “reconhecimento da riqueza das pessoas necessitadas”.
Foi justamente com este pedido, em tom de desafio, que o Bispo da Diocese de
Lamego marcou a sua intervenção no Conselho Geral da Cáritas Portuguesa, explicitando
que “Ser Cáritas é perder a minha
identidade para poder acolher a identidade dos irmãos que me procuram e de quem
eu vou ao encontro”. Dom António Couto deixou, desta forma, uma mensagem
que foi sobretudo de esperança face às adversidades e disse que a Cáritas “terá
de ser, em todas as circunstâncias e contextos, uma referência para os mais
fracos”. E recordou um depoimento do antigo Arcebispo de Buenos Aires, o agora
Papa Francisco, que solicitava aos colaboradores da Cáritas da sua diocese que,
na preocupação de reforço da sua própria identidade pessoal e coletiva, não
pusessem em causa a identidade do outro.
Por
seu turno, o Presidente da Câmara Municipal de Lamego sublinhou a importância
do trabalho em rede entre todas as forças vivas da sociedade para dar uma
resposta que seja de promoção da dignidade para todos os que dela precisam,
sustentando que “é fundamental ajudar a
construir uma teia de cooperação para dar resposta aos problemas como os que a
Cáritas enfrenta – pobreza e exclusão social”.
Eugénio
Fonseca, presidente da Cáritas Portuguesa, na sua intervenção falou de uma Cáritas cuja ação
terá de ser “planeada, organizada e
fundamentada” sendo este, sempre, “ponto
de partida, sendo que, a meta é, essa será sempre, o cuidar do outro”. Ou seja,
“agindo como promotor de Amor, a Cáritas deve ter no seu olhar, como
prioridade, o olhar do outro”. É o movimento que se quer simultâneo de “dois
olhares que se cruzam, tendo como guias de entendimento a justiça e a dignidade”.
Disse
o Presidente que os novos cenários – “social, cultural, económico, político,
ambiental e religioso – implicam a associação da leitura dos “sinais dos tempos
às realidades do presente” e postulam a aceitação, pela nossa parte, dos “desafios
do nosso momento histórico” e que sejamos cada vez mais “uma Igreja construtora
da civilização do amor”. Por isso, não podemos narcisistamente enclausurar-nos
nas nossas estruturas, no seu conforto ou na sua rigidez burocrática (é
disto que devemos ter medo e não ter medo de falhar), mas sair “das nossas
comunidades, das nossas instituições e traduzir o Evangelho nesses novos
contextos”. Por outras palavras, não devemos estar à espera de que os pobres
nos venham bater à porta da Cáritas ou que venham ter connosco como que para
tomar “o veículo do Amor de Deus que abre o seu coração”, mas devemos sair “à procura
dos que mais necessitam desse amor”. É a dinâmica da Igreja em saída de que
fala o Papa Francisco. E é por este sinal de amor que mostramos ser discípulos!
***
Parece
importante este discurso de Eugénio Fonseca, talvez até para responder a duas
tentações: fazer da Cáritas uma área de serviço a que as pessoas recorrem para
satisfação das suas necessidades de pobreza e em que são atendidas enquanto houver
stock e que, não havendo, tenham
paciência e venham noutra ocasião; ou fazer da Cáritas uma agremiação informal
de voluntários que, de forma amadora, tratam dos pobrezinhos com muita
paciência e caridade.
Como
diz o Presidente, a instituição tem de saber fundamentar-se, planear e
organizar-se para melhor servir, imbuída não da “caridadezinha”, mas da
caridade evangélica que busca a justiça para todos e cada um, não dando por
esmola o que lhes é devido por justiça. E, se tem de, em situação de
emergência, acorrer de imediato não olhando ao tempo e à distância, também deve
ser capaz – e agir em conformidade – de programar a ajuda de forma sistemática e
organizada de modo que os beneficiários ganhem autonomia pessoal e grupal, genuína
e consolidada. Também para ir em saída à procura dos mais necessitados, a
Cáritas não pode deixar de se estruturar, capacitar e pôr em ação de olhos nos homens
e ficando os pés na esteira do Evangelho. Não pode limitar-se a dar esmolas aos
pobrezinhos, como querem alguns.
***
Não posso esquecer o que aprendi no sentido de que a Cáritas
é um serviço de Igreja que em si concretiza, em grande parte, pela comunhão
cristã de bens, a missão odegética da Igreja enquanto associada ao pastoreio de
Cristo, na relação umbilical com a missão da Palavra, enquanto a escuta e a reparte
em pedacinhos fazendo-a acompanhar os gestos de solidariedade e proximidade, e
na relação com o múnus de santificação orando e convidando para a celebração da
fé e da vida.
Segundo a literatura consolidada, a Cáritas tem como missão ser
um instrumento da Igreja na área geográfica e humana da diocese e no país (conforme se trata de Cáritas diocesana
ou da nacional), de
promoção e defesa da dignidade humana à imagem de Jesus Cristo. É sua visão ser uma referência diocesana e
nacional pela qualidade e capacidade de pioneirismo nos serviços que presta à
comunidade de modo próximo, reflexivo e sustentável – baseada nos valores de:
. Humanização, já que, na defesa/promoção
da dignidade humana, desenvolve uma intervenção centrada na pessoa e na
comunidade, salvaguardando os respetivos “direitos, liberdades e garantias”,
que respeita e, quando necessário ou insuficiente, promove e urge.
. Profissionalismo, uma vez que, no trabalho que desenvolve, se pauta eticamente pelo rigor
técnico, competência e consistência.
. Compromisso,
dado que leva a cabo a sua missão plurifacetada com determinação, persistência,
empreendedorismo, disponibilidade, entrega, entreajuda e lealdade.
. Transparência,
uma vez que projeta a sua intervenção a partir da leitura da realidade e à luz
do juízo evangélico que pode formular, de modo a que a mesma intervenção possa
ser sinal visível da sua visão e missão eclesiais.
. Caridade,
pois vincula a sua ação à dimensão evangélica do amor ao próximo, na
assistência, promoção, desenvolvimento e transformação das pessoas e das
estruturas, através dos profissionais e dos voluntários.
. Universalidade, por acolher todas as pessoas independentemente da nacionalidade, etnia,
religião ou proveniência social e olhar para todas as problemáticas como repto
à sua ação.
. Criatividade,
porque faz face às múltiplas problemáticas existentes e emergentes, procurando
inovar as respostas com flexibilidade e transdisciplinaridade com vista à
eficácia e inclusão.
A Cáritas tem de ser Evangelho concretizado em
ação/reflexão/oração/ação – um sinal de Deus!
2017.04.02
– Louro de Carvalho
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