sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

No 30.º aniversário da pertença de Portugal à União Europeia

Faz hoje 30 anos que Portugal passou a integrar oficialmente e em definitivo a organização internacional europeia então denominada CEE (Comunidade Económica Europeia), por força da assinatura do Tratado de Adesão a 12 de junho de 1985. Por se tratar duma decisão que hoje nos traz inúmeros escolhos para a vida coletiva, julgo oportuno proceder a um pequeno balanço.
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Portugal, apesar de não ter participado oficialmente na II Guerra Mundial (1939-1945), envolveu-se nos movimentos que lhe sucederam com vista à criação, na Europa, de organizações de cooperação entre os seus diversos Estados. Porém, a política de manutenção das colónias de Portugal na África, na Ásia e na Oceânia constituíam um óbice a tal cooperação, redundando num isolacionismo progressivo do país no concerto das nações – situação que se tornou insustentável a partir dos anos 60, com repercussões na dificuldade de acompanhamento da fase de expansão económica do mundo ocidental.
Todavia, porque a manutenção das colónias exigia o reforço das alianças militares com as grandes potências ocidentais, Portugal assumiu-se, em 1949, como um dos países fundadores de uma organização militar ocidental de defesa, a NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte).
Por outro lado, em 1948, Portugal e os demais países que aceitaram a ajuda americana após a guerra através do Plano Marshall, criaram a OECE (Organização Europeia de Cooperação Económica), para coordenarem a aplicação da predita ajuda. Eram participantes os seguintes países: Portugal, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, França, Itália, Alemanha Federal, Reino Unido, Áustria, Suíça, Dinamarca, Noruega, Suécia, Islândia, Grécia, Turquia, Irlanda e depois a Espanha (1959). Em 1961, a OECE passou a ser designada por OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), abrangendo 30 países europeus e os EUA, o Canadá e o Japão. Atualmente, assegura a expansão económica dos seus membros e a ajuda aos países subdesenvolvidos como os seguintes objetivos: incentivar o crescimento económico, a geração de empregos, a expansão do comércio e a estabilidade financeira dos países membros.
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Logo a seguir ao termo da II Guerra Mundial, surgiu o conflito fronteiriço entre a Alemanha Ocidental e a França, resultante da escassez de recursos e do colapso económico da Europa. Para obviar a tal situação foi criada pelo Tratado de Paris, em 1951 e para entra rem vigor em 1952, a CECA (Comunidade Europeia do Carvão e do Aço) segundo um plano de Schuman e sob a presidência de Jean Monnet. Foram subscritores do Tratado: a Alemanha federal, a França, a Itália, a Bélgica, o Luxemburgo e a Holanda. O tratado estipulava a livre circulação, entre os países membros, do carvão, do ferro e do aço, e defendia políticas para a instalação de indústrias siderúrgicas. Em 1957, pelo Tratado de Roma, aqueles seis países estabeleceram a criação da CEE (Comunidade Económica Europeia), culminando os esforços de cooperação económica desenvolvidos no pós-guerra.
Portugal, em virtude do seu regime ditatorial, não podia integrar a CEE, pelo que veio a integrar a EFTA (Associação Europeia do Comércio Livre), com os países europeus que não haviam estado na criação da CEE: Portugal, Reino Unido, Suécia, Noruega, Dinamarca, Suíça, Áustria e, mais tarde, a Finlândia e Islândia. 
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O derrube da ditadura, a 25 de abril de 1974, marcou uma profunda mudança no país, um dos mais pobres da Europa. A guerra colonial (1961-1974) absorvera a maior parte dos recursos económicos e humanos do país, condicionando fortemente o seu desenvolvimento.
O fim das colónias implicou uma completa reorganização da economia, que estava dependente dos recursos coloniais. Muitas das grandes empresas encerraram, setores económicos inteiros entraram em rutura e o desemprego acabou por subir. Por outro lado, assistiu-se ao regresso de cerca de um milhão de pessoas – os retornados – e as guerras internas que se desencadearam em Angola, Moçambique, Timor e Guiné-Bissau trouxeram para Portugal, até aos anos 90, centenas de milhares de refugiados.
O aparelho de Estado, com uma vasta organização gizada para dirigir o Império Colonial, colapsou. E vários grupos profissionais apropriaram-se das suas estruturas para manterem privilégios ou criarem outros. Por conseguinte, a inflação chegou a atingir, neste período, valores superiores a 29%. O escudo sofreu sucessivas desvalorizações. As finanças públicas ficaram à beira da bancarrota. Por duas vezes, Portugal negociou acordo com o FMI (1977 e 1983).  Foi este o quadro em que surgiu a opção Europeia e, em particular, o pedido de adesão à CEE (1977), com três objetivos em vista: evitar o isolamento do país; obter apoios externos para consolidar o regime democrático; e conseguir ajuda para relançar a economia e para as reformas necessárias. Apesar de a situação do país ser pouco favorável, em dez anos de democracia, registaram-se enormes progressos nos indicadores sociais e nas infraestruturas.
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Após um período de cerca de 9 anos de negociações, a 12 de junho de 1985, o então Primeiro-Ministro Mário Soares e o seu Vice-Primeiro Ministro Rui Machete assinavam o Tratado de Adesão à CEE nos Claustros do Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, pelo que, no dia 1 de Janeiro de 1986, Portugal entrou na CEE. O evento representou uma efetiva abertura económica e um aumento na confiança interna da população, que a princípio se revelava cética, já que iríamos perder soberania e identidade como país e teríamos de vir a pagar a longo prazo todos os benefícios auferidos no imediato.
O próprio Tratado foi assinado sob o signo da dissolução da Assembleia da República e marcação de eleições antecipadas, mercê da denúncia do acordo de governação feita pelo recentemente eleito líder do PSD, Cavaco Silva.
Com a entrada na CEE, o Estado pouco ou quase nada se reformou, as clientelas do costume continuaram a engrossar. Não obstante, avançou-se bastante em termos da concretização de muitos direitos sociais (habitação, saúde, educação, segurança social, etc); as infraestruturas começaram a renovar-se a bom ritmo; e o crescimento económico atingiu surpreendentes valores, impulsionado pelo surto de obras públicas e pelo aumento de consumo interno.   
Mas a adesão revelou-se catastrófica para o nosso setor exportador, tendo as cotas de mercado de produtos portugueses caído abruptamente nos seus mercados tradicionais. E, graças à condução da política económica por iberistas, as empresas espanholas tiveram entrada facilitada em setores estratégicos de Portugal, o que contribuiu para o colapso das nossas exportações.
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Em 7 de fevereiro de 1992, pela assinatura do tratado de Maastricht em resultado da cimeira reunida naquela cidade holandesa em dezembro de 1991, a CEE deu origem à UE (União Europeia), em cujo horizonte estava a criação da moeda única, uma política externa comum e, a longo prazo, a união política (federação de estados). Portugal acompanhou, como bom aluno, todo o processo e aderiu ao Euro que, em 2002, substituiu o escudo.
Dado que esta evolução da CEE ultrapassava a dimensão socioeconómica, desenhou-se, embora sem êxito, a ideia da necessidade de referendar a matéria europeia, ideia apadrinhada pelo próprio Presidente Soares, que vaticinou: “Hão de arrepender-se”.
Este facto transformacional da CEE implicava, no curto prazo, uma revolução na economia portuguesa, dado que: o país passava a dispor de uma moeda forte, mas sem possibilidade de a desvalorizar para tornar competitivos os seus produtos; o fabrico de artigos de baixo valor acrescentado, como os têxteis ou o calçado, deixou de ser competitivo; o crédito tornou-se mais acessível e barato, provocando desde logo o aumentando do consumo interno, fazendo subir o endividamento das famílias, tendo as poupanças das famílias descido a pique; e as importações começaram a crescer mais do que as exportações.
Como as reformas feitas não foram suficientes, os resultados foram sofríveis. Entre 1986 e 1998, o PIB que vinha a crescer a uma média de 5% ao ano (entre 1986 e 1998), baixou para zero depois. O desemprego, que estava nos 5%  (em 1998), subiu para 8% em 2005. A divida pública, que era 55% do PIB, subiu para 64%. O rendimento “per capita”, que era 71% (em 1998) da média europeia desceu para 66% em 2005. Apenas a inflação estabilizou entre 1998 e 2005 (2,2 e 2,3, respetivamente). 
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Em dezembro de 2000, em Nice, os Estados-Membros da UE convencionaram o chamado Tratado de Nice, assinado a 26 de fevereiro de 2001, que entrou em vigor a 1 de fevereiro de 2003. Foi o culminar da CIG (Conferência Intergovernamental), realizada em fevereiro de 2000, cujo objetivo era a adaptação do funcionamento das instituições europeias antes da chegada de novos Estados-Membros.
O Tratado abriu a via para a reforma institucional necessária ao alargamento da União Europeia aos países candidatos do Leste e do Sul da Europa. Algumas das suas disposições foram adaptadas pelo Tratado de Adesão, assinado em Atenas, em abril de 2003, que entrou em vigor em 1 de maio de 2004, dia do alargamento. As principais alterações introduzidas incidiram na limitação da dimensão e composição da CE (Comissão Europeia), na extensão da votação por maioria qualificada, numa nova ponderação dos votos no Conselho e na flexibilização do dispositivo de cooperação reforçada.
Também, em 23 e 24 de Março de 2000, o Conselho Europeu definiu a Estratégia de Lisboa, elegendo o emprego, as reformas económicas e a coesão social como base de uma economia baseada no conhecimento. Esta cimeira definiu os objetivos da UE até 2010. A Estratégia de Lisboa foi revista e flexibilizada em 2005.
A 29 de outubro de 2004, foi assinado em Roma o Tratado Constitucional, que os franceses e os holandeses rejeitaram, respetivamente a 29 de maio e a 1 de junho de 2005. No 2.º semestre de 2007, a presidência portuguesa promoveu um novo Tratado Constitucional, que foi assinado em Lisboa, a 13 de dezembro do mesmo ano, e que pôde tirar a Europa do impasse em que se encontrava depois dos referendos falhados. Este tratado abandonou a ideia inicial de reforma e junção num único tratado de todos os anteriores e focou a atenção na reforma das instituições, visando dar novas competências às instituições e órgãos, criar novas instituições e reformular formas e procedimentos de decisão ao nível dos vários órgãos institucionais. Prevista inicialmente a sua entrada em vigor para o dia 1 de janeiro de 2009, foi protelada para depois do termo do processo de ratificação por todos os 27 Estados, a 1 de dezembro de 2009.
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O alargamento da UE (União Europeia) fez disparar em Portugal a concorrência interna, agravada com o impacto da globalização. O euro, adotado em 2002, implicava uma revolução completa na economia portuguesa, que não aconteceu. As consequências deste processo tornaram-se catastróficas, levando: à estagnação económica, ao encerramento de muitas empresas, ao aumento do desemprego, etc. O desempenho económico de Portugal tornou-se dececionante, e o país não soube enfrentar a crise de dimensão europeia e mundial – oportunidade para o enriquecimento de uns poucos com o sacrifício de muitos, mercê da gestão danosa de bancos e de outras empresas. O crédito fácil fez disparar os níveis de endividamento de Estados, famílias e empresas. As estruturas produtivas foram abandonadas em favor duma economia de serviços e de especulação imobiliária e, de há uns tempos para cá, também de especulação financeira.
A UE e, em especial os países da zona Euro, dividiram-se. Os que haviam sido aparentemente menos afetados pela crise financeira vieram a acusar os restantes de perdulários, de pouco empreendedores e de se terem habituado a viver à custa de dinheiro barato, pensando que se podiam endividar indefinidamente, ou seja, de viverem acima das suas possibilidades. E, devido a uma supina sucessão de políticos incompetentes (alguns corruptos) – estribados em aparelhos partidários que se alimentam da corrupção que grassa no Estado, nas autarquias e nas empresas públicas – os resultados globais não têm sido os melhores para os países do Sul. Portugal não para de divergir no seu desenvolvimento da média europeia.
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Uma fatia considerável de portugueses, depois de 2011, formou a clara consciência de que se cometeu um claro erro estratégico em relação à União Europeia. A excessiva focalização das relações económicas e políticas do país na UE reforçou o caráter periférico do país em relação ao centro da Europa e tornou-o refém de grandes potências como a Alemanha. A crise económica internacional em que mergulharam os países do Sul foi habilmente aproveitada pelos alemães para lhes imporem regras benéficas para as empresas alemãs.    
Sendo assim, uma alternativa viável é a da diversificação das relações económicas e políticas para fora do espaço da União Europeia, tirando partido da globalização e de laços históricos com outras regiões do mundo. A insatisfação em relação à UE, comum à maioria dos outros estados membros, está ligada não só aos problemas económicos que Portugal atravessa, mas também à falta de democraticidade no funcionamento da UE e à enorme incerteza quanto ao seu futuro. Por outro lado, os países postergados para um lugar de subalternidade e sujeitos a maior sacrifício e descrédito político têm de se unir e levar à renegociação de toda a estratégia europeia, de modo que a Comissão se paute mais pelos critérios da subsidiariedade e não pela ambição de tutelar toda a legislação dos Estados-Membros.
Não obstante, a União Europeia e a Zona EURO, tal como a CEE, trouxeram para Portugal enormes benefícios, permitindo melhorar a vida da maior parte da população, de modo que a eventual saída do Euro se tornaria muito problemática para nós.

2016.01.01 – Louro de Carvalho

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