Neste
final de ano e início do novo, cumpre-me fazer uma breve referência à Caminhada
de Advento-Natal/2015-2016, proposta pela diocese do Porto e que gravita
em torno de dois enunciados evangélicos: Felizes
os misericordiosos (Mt
5,7) e Há
mais alegria em dar (-se) (At
20,35).
A
Caminhada foi objeto de um documento
subscrito em 28 de outubro de 2015 pelo Bispo do Porto e respetivos bispos
auxiliares à data (agora já Dom João Lavrador é bispo bispo
coadjutor de Angra),
em que referem, citando o Plano Diocesano
de Pastoral para 2015-2020, querer “uma
Igreja que faça experiência da misericórdia de Deus e que a traduza em toda a
sua vida”. Para tanto pretendem “unir,
congregar e mobilizar toda a comunidade diocesana, dando assim seguimento ao
fortalecimento da pastoral da comunhão e ao caminho sinodal” desejado para a Diocese. E acreditam que,
especificamente, a Caminhada de Advento-Natal ajudará as
famílias e as comunidades:
.
Na
descoberta da condição alegre e feliz da identidade cristã;
.
Na
edificação de uma Igreja decidida a construir a fraternidade, mediante a
partilha de dons, com atenção privilegiada aos mais pobres e frágeis da
sociedade;
.
Na
promoção duma educação ecológica, duma cultura de respeito pelos bens da
Criação e duma vida sóbria e simples em cada pessoa, família e comunidade;
.
Na
tradução, em sentimentos, gestos e atitudes do “rosto” acolhedor e missionário
da Igreja diocesana, Mãe de bondade, de ternura e de misericórdia, a exemplo da
Mãe de Jesus.
Apelam
os bispos que servem a comunidade diocesana portuense ao enchimento semanal do “cesto dos nossos dons”, de modo que eles
“se transformem em cabaz de
generosidade” ou “em manjedoura que acolhe e abriga a vida” e
sobretudo “em sinal vivo da
misericórdia e da salvação de Deus para todos”.
Advertem
que esta Caminhada “não se destina
apenas ao percurso catequético, aos grupos de jovens ou às celebrações
dominicais, mas a toda a Comunidade e a cada Família”. Ou seja, “dirige-se a
toda a Diocese e a cada um dos diocesanos”, devendo a todos “envolver,
integrar, acolher e mobilizar”.
E
declaram que esta Caminhada de Advento-Natal
nos leva ao encontro de Cristo, a fim de que, “a partir deste encontro” – tal como
sucedeu “com Maria e José, com os anjos de Deus, com os pastores, com os magos”
e vem acontecendo, hoje como ao longo dos tempos, “com tantos discípulos
missionários” – saibamos fazer da “Alegria do Evangelho a nossa missão” e
proclamar com a palavra e as obras: “Felizes os misericordiosos!”.
***
Os
bispos utilizam as palavras cabaz, cesto/cesta e manjedoura. Os executores diocesanos das orientações episcopais
prestam-nos alguma informação sobre o significado natalício e vital de tais
vocábulos, que apresento em síntese livre.
O
cabaz, que a tradição acoplou ao Natal, é símbolo
da partilha e da onda de
solidariedade que a quadra natalina desperta em todos os homens e mulheres
de boa vontade e que ganha um sentido de transcendência e proximidade com a
virtualidade de que dispõem os crentes. Com efeito, todos os que lutam pela justiça
– geradora de fraternidade, desenvolvimento e paz – têm de preconizar, agendar
e praticar a solidariedade de modo que todos tenham o suficiente para viver com
dignidade e o acesso a todos os meios de apoio à vida. Porém, os crentes têm o
dever de envolver este esforço comum com a manta da caridade enquanto espelho efetivo
do amor de Deus tornado amor do e ao próximo enquanto oportunidade de nos
mostrarmos todos gratos para com o nosso Deus que para todos criou o mundo com
os bens e deu aos homens a capacidade de o desenvolver e colocar ao serviço das
pessoas.
***
Os
autores passam do cabaz para o cesto (ou a cesta) que marca alguns episódios
interessantes da Bíblia. Assim, “Moisés, filho de hebreus, o menino que
chorava, é salvo das águas (Ex 2,1-10) pela filha do faraó” – o que
nos transporta para o cesto como sinal de
proteção e salvação.
Lembram
também “o cesto em que os judeus colocavam as primícias dos frutos da terra,
que ofereciam no altar ao Sumo Sacerdote” (Dt 26,1-10). Assim, o cesto surge como expressão
da gratidão para com o Criador. E citando o salmista, assinalam o fim da
opressão do povo no Egito sintetizado nesta afirmação: “aliviei os seus ombros do fardo, as suas
mãos livraram-se de carregar o cesto” (Sl 81/80,7). Eis então o cesto como sinal da justiça e da libertação, operada por
Deus na história.
Na profecia de Amós, aparece a “cesta de frutos maduros” (Am 8,1-2) a anunciar “o tempo maduro”, o tempo “para Deus intervir na
história”. É “a voz do clamor do povo
eleito que chega até Deus” (Ex 3,7).
Por sua vez, o profeta Jeremias, fala
da “cesta com figos bons e maus” fazendo dos “figos bons” a imagem do
“resto de Israel”, daquele resto que se mantém na
fidelidade à aliança, aliança em nome da qual qual “Deus atende
misericordiosamente o seu Povo”.
O livro dos Atos dos Apóstolos, no Novo Testamento, apresenta-nos
São Paulo “descido num cesto por uma
janela ao longo da muralha” (At 9,25; cf 2Cor 11,33), a ser libertado da perseguição
dos judeus, em Damasco, para prosseguir no anúncio do Evangelho.
***
Vendo
no cabaz (cesta
ou cesto) o símbolo
da salvação – partilha e solidariedade, agradecimento, proteção, alívio,
libertação – encontramos nele um instrumento pelo qual experimentamos a ação
salvífica de Deus. E, esvaziando em prol dos outros o cabaz cheio de bons
frutos, aproveitaremos o vazio para a disponibilidade de nos tornarmos a
manjedoura que acolhe o misericordioso Cristo da História e o Cristo da Fé, com
a obrigação alegre de acolher os irmãos, sobretudo os mais pobres, em quem se
espelha o rosto de Cristo a implorar e a exigir a misericórdia solidária ou
justiça solidária que, em nome de Deus clama pelos pobres.
***
Para
as semanas de cada domingo de Advento e para as semanas em que se celebra o
Natal, a Sagrada Família e Santa Maria Mãe de Deus, a Epifania e o Batismo do
Senhor, elegeu-se uma palavra-chave,
a partir de uma referência bíblica assumida na Liturgia da Palavra, que se
expressará com um gesto simbólico e
proporá um desafio concreto. Assim,
as palavras-chave escolhidas com os respetivos verbos de desafio são: caridade
/ dá; confiança / confia; bondade / sê bom; acolhimento
/ acolhe; alegria / alegra-te; família / agradece; presença
/ cuida; e porta / entra.
Os
gestos alternam entre o encher o esvaziar o cabaz familiar ou de grupo e o
cabaz paroquial, apresentar e adorar o Menino Jesus e visitar o batistério como
que para atravessar a porta da misericórdia.
Quanto
aos desafios, são propostas as várias ações de que se destacam as seguintes:
Ao
nível do dar:
abdicar de algo material e colocá-lo no cabaz; prestar atenção à família e aos que
a rodeiam; e auxiliar aqueles que necessitam de ajuda nas pequenas tarefas do
dia a dia.
Ao
nível do confiar:
dedicar algum do tempo à oração confiante; experimentar o conforto e o consolo de
um Deus que confia em cada um de nós.
Ao
nível do ser bom:
disponibilizar-se para ajudar alguém; visitar, sozinho ou em família/grupo, um
amigo, um vizinho, um doente, uma pessoa só.
Ao
nível do acolher:
telefonar/marcar um encontro com alguém que não se veja há muito tempo; procurar,
dentro da comunidade, alguém que viva sozinho (ou não tenha
família) para
partilhar a Ceia de Natal.
Ao
nível do alegrar-se:
levar aos outros esta mensagem: “Deus
ama-te, Cristo veio por ti. Para ti, Cristo é Caminho, Verdade, Vida”!
Ao
nível do agradecer: partilhar com amigos e vizinhos uma foto de família,
etc…
Ao
nível do cuidar:
ir ao encontro de alguém com quem nunca se teve coragem de dialogar; sair da
“zona de conforto” e tornar-se presente daquele que aparentemente é mais
frágil; rezar pelos irmãos perseguidos, refugiados, impedidos de adorar o Deus
Menino em paz.
Ao
nível do entrar:
redescobrir o Batismo como porta de acesso à comunidade; assumir o compromisso
no seio desta comunidade, como discípulo missionário; reler o Evangelho desta
solenidade como uma mensagem pessoal de Deus para cada um de nós.
***
É
uma caminha que faz a ponte entre o fim do ano de 2015 e os alvores do 2016. É a
ponte da misericórdia, que desejamos que seja a ponte da justiça como valor
supremo do direito ao serviço do homem todo e de todos os homens e como um dos
inefáveis frutos do Espírito Santo.
2015.12.31- Louro
de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário