Pelo
Natal, assinala-se uma pausa significativa no desenvolvimento normal do
trabalho, embora com as conhecidas e gravosas exceções. Quantos trabalham mais
e mais tempo para que os outros possam viver estes momentos em família ou no
lazer de umas miniférias na serra ou no estrangeiro!
Também
o Presidente da República concede, por tradição, alguns indultos nesta quadra
natalícia – dizem que o Presidente Cavaco fora bastante mais avaro nesta
matéria que o seu antecessor imediato – e umas centenas de reclusos costuma
gozar do regime de saída precária.
Há, por outro lado, outros casos de saída precária: são as saídas da
estrada que os acidentes de viação originam ao ocasionarem os ferimentos com
gravidade. Estas saídas implicam a baixa ao hospital e implicam o esforço
acrescido de quem tem de trabalhar neste período de tempo, caraterizado pelo
congestionamento das urgências hospitalares.
E temos as saídas precárias impostas pela resolução dos bancos. Passam
capitais e trabalhadores de banco para banco, outros para veículo de
determinados ativos não especificados. E muitas saídas definitivas para casa,
com dramas para as pessoas e custos para os contribuintes!
***
É óbvio que as saídas precárias dos estabelecimentos prisionais são de
saudar, sobretudo neste tempo em que a família se quer sentir em proximidade e,
se possível, em festa. E todos os que vivem as horas de prisão, os familiares e
amigos normalmente almejam o dia em que a saída perde a nota de precariedade e
se patenteia como definitiva. Falta a integração e a acomodação económica, mas
estabelece-se a base do recomeço. E volta – oxalá sempre por bem – a batalha de
todos os dias pela vida.
Também as saídas precárias que a estrada catapulta para o hospital e/ou
para as situações de dependência familiar são no mínimo bem-vindas, ainda que
tantas vezes impliquem da parte dos parentes e amigos maior dedicação e desvelo
acompanhados de alguma impaciência e até de reperspetivação da vida.
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Mas as estradas lançam também, por ocasião da quadra natalícia, algumas
lamentáveis saídas, já não para o hospital, mas para a tumba ou para o
crematório. Todos as lamentam, mas, por mais operações de segurança que se
organizem ou por mais alterações que se façam aos códigos, nomeadamente ao
código da estrada, os comportamentos irresponsáveis persistem e pontificam. Por
outro lado, os veículos respondem com maior velocidade e conforto, mas as
estradas primam por deficientes técnicas de construção e as vias existentes
carecem supinamente de manutenção, reparação ou mesmo recuperação. Todavia, a
gente acelera!
Depois, há aqueles casos em que a estrada ou a vida em geral ocasiona a
saída precária por acidente de viação, de construção civil e/ou obras públicas
e de doença súbita. E, porque é fim de semana ou período festivo, a urgência
entupiu ou falta a equipa especializada. E a saída de precária passa a
definitiva. Depois, choramos ou queremos justiça, que funciona a conta-gotas,
se é que funciona. E, mesmo que funcione, não traz a vida de volta.
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O Natal de 2015 evidenciou os problemas
com o tratamento de aneurismas cerebrais durante os fins de semana no Hospital de
S. José, do Centro Hospitalar de Lisboa Central, a propósito do óbito do jovem
David Duarte, por falta da existência de equipa de Neurocirurgia Vascular.
A opinião pública deu-se conta agora,
mas os alertas vêm já desde 2013 quer por notícias de imprensa quer por
questionamento dos partidos. E só este ano já tinham ocorrido 4 óbitos.
Assim e segundo o Expresso
on line, a pesquisa realizada pela agência Lusa
aos requerimentos partidários entregues na Assembleia da República em relação ao
hospital de S. José mostram, por exemplo, que o Bloco de Esquerda (BE) alertara o Ministério da Saúde por quatro vezes,
desde 2013, sobre a falta de tratamento dos aneurismas cerebrais no hospital de
São José aos fins de semana. Com efeito, o BE questionou o XIX Governo, já em junho
de 2013 (ao tempo da famigerada crise do irrevogável),
sobre a precariedade da escala de Neurorradiologia de Intervenção no Centro
Hospital de Lisboa Central/, tendo o Ministério da Saúde reconhecido o problema
e respondido esperar que tal “constrangimento esteja ultrapassado brevemente”.
Em requerimento ao Ministro, de 30 de janeiro de 2015,
o BE lamenta que, passado mais de um ano, a situação “se deteriorou”, dado que,
em meados de 2014, o hospital de São José deixou de ter equipa de Neurocirurgia
Vascular ao fim de semana. Por conseguinte, as pessoas que dessem entrada nesta
unidade hospitalar com aneurisma a partir de sexta-feira às 16 horas teriam de
aguentar até à segunda-feira para tratar do aneurisma – situação clinicamente desadequada,
que sujeita os doentes a “consequências graves e irreversíveis”. Segundo o documento,
a situação deve-se ao facto de o governo ter operado cortes no pagamento de
horas extraordinárias a todos os funcionários públicos e, por isso, a equipa de
neurorradiologia de intervenção ter recusado continuar a assegurar a escala de
fim de semana porque “implicaria estarem 48 horas sempre disponíveis a um preço
inaceitável”.
Mas o BE não desistiu e entregou novo requerimento a
23 de março de 2015, ao constatar que o governo “não responde a grande parte
das perguntas endereçadas no prazo regimental de 30 dias”. E, a 27 de maio, o BE
procedeu ao reenvio da questão “Tratamento dos aneurismas cerebrais no hospital
de São José”, aduzindo que o governo persistia em não responder a “grande parte
das perguntas endereçadas” e que o prazo de resposta se encontrava ultrapassado.
Só, a 29 de setembro de 2015, o gabinete de Paulo
Macedo respondeu ao BE, dizendo que, segundo o Conselho de Administração do
CHLC, não houve qualquer conhecimento de queixa ou reclamação, da parte do
gabinete utente/cidadão, relativamente à não realização de cirurgia de
embolização precoce. Estranho critério para o Ministério não intervir nem responder!
Quanto à transferência de doentes para outras unidades
hospitalares, o gabinete de Paulo Macedo esclareceu que esta é “de facto
limitada na medida em que a imobilização e transporte na fase aguda da
hemorragia subaracnoídea por aneurisma roto, não se revela como a mais adequada
conduta médica”. No entanto, segundo o Ministério, o CHLC poderia ter de
recorrer à transferência dos doentes, em casos de necessidade extrema que em
função de análise de risco/benefício, o que não se verificara desde abril de
2014”.
Conhecido o óbito de David Duarte, o Ministério
Público abriu inquérito para apurar eventuais responsabilidades criminais enquanto
o CHLC instaurou inquérito interno para averiguar esta e outras mortes
imputáveis à falta de assistência médica a doentes com esta patologia durante o
fim de semana. Porquê só agora?
Segundo a governança pragmática (não ideológica), vidas
humanas valem pouco! Até quando?
2015.12.26 – Louro de Carvalho
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