Com
o estoiro de 2008, o BPN foi nacionalizado e a administração do novo pequeno
banco público foi confiada à experiente (!) CGD (Caixa
Geral de Depósitos).
Depois, já no consulado de Passos Coelho, o minibanco foi vendido por 40
milhões de euros ao BIC/Portugal/Angola.
Passados
que foram os anos de perdas, reestruturação, despedimentos, encerramento de
balcões e “esquecimento”, Luís Reis Ribeiro, baseado em dados do TdC (Tribunal
de Contas),
presenteia-nos com um texto publicado no Dinheiro
Vivo, de 2 de janeiro, em que refere que o Estado tem, neste momento,
empatados 3,537 mil milhões de euros em garantias a fundos do BPN, banco que já
custou aos contribuintes 2,8 mil milhões (ao todo, mais de 6 mil
milhões).
Se
a estes montantes juntarmos um aval de 746 milhões ao Banif, teremos de
concluir que os contribuintes portugueses garantem aos dois mais que defuntos
bancos mais de 4,3 mil milhões de euros – o valor em ajudas públicas que ainda
podem vir a ser usadas pelos universos BPN e Banif, mas que apresentam
probabilidade de prejuízo “muito elevada”, se não houver retorno.
No
respeitante ao BPN, o Estado dá garantia, com aqueles mais de 3,5 mil milhões, aos
fundos que contêm os ativos tóxicos e o lixo financeiro (as
chamadas sociedades “par” – Parvalorem, Parups e Parparticipadas). Quanto ao Banif, sabe-se que a
pressa que envolvia a sua resolução foi obviada pela aquisição que o Santander
Totta fez por 150 milhões. Este montante é abatido aos cerca de 3000 milhões em
que importou o resgate da instituição. Há ainda um empréstimo do Estado no
valor de 489 milhões ao fundo de resolução, que deverá ser ressarcido. Porém,
dificilmente regressará ao erário público o restante, nomeadamente os 815
milhões de euros de capital já comprometido no banco pelo XIX Governo.
Entretanto,
informações obtidas pelo Dinheiro Vivo (DV) e outras já publicadas pelo TdC
no parecer aposto à Conta Geral do Estado de 2014, os contribuintes podem
contar com mais encargos.
De
2008 a 2014, segundo o TdC, o Estado arcou com custos líquidos de 2,8 mil
milhões de euros na sequência da nacionalização – bolo que integra o empréstimo
e o aumento de capital, feitos em 2014 e destinados às sociedades “par” no
valor de 526 milhões de euros. Depois, “em 31 de dezembro de 2014, as garantias
prestadas pelo Estado às sociedades veículo do ex-BPN totalizavam 3537 milhões
de euros, menos 383 milhões do que no final de 2013”. Como essas garantias são
passivos contingentes, ainda não contam para o défice nem para a dívida, mas entrarão
nas contas à medida que forem executadas. E, para já, o cenário mais provável
resultante do caso BPN é o do custo de 6,3 mil milhões de euros.
No
atinente ao Banif, de momento, são dados como perdidos cerca de 2255 milhões de
euros injetados em capital já; e, se as garantias forem usadas (o
cenário mais provável),
o custo chegará aos tais cerca de 3000 milhões.
E,
desta guisa, dois pequenos bancos, já mais que defuntos, podem vir a impor
perdas aos contribuintes no valor de 9,3 mil milhões de euros. É
comparativamente pouco menos que aquilo que a Segurança Social desembolsa
anualmente em pensões de velhice e mais que o défice dos dois últimos anos.
***
Entretanto,
não podemos esquecer o caso BES/GES. No mesmo DV, Sandra Almeida Simões, em artigo subordinado ao título Particulares
podem ter investido em dívida alvo de perdas no BES, diz-nos que o BdP (Banco
de Portugal)
determinou a transferência para o BES (Banco Espírito Santo) – o banco mau que resultou da
resolução do BES/GES – de cinco emissões de obrigações seniores destinadas a
institucionais, como bancos, seguradoras, fundos de investimento e de pensões. Embora
o BdP e o NB (Novo Banco)
tenham garantido que “os clientes particulares estão a salvo desta medida”, há
clientes de retalho “que investiram nestes títulos de dívida, através do
mercado secundário”. Trata-se de pequenos investidores que ainda não
conseguiram obter esclarecimentos ou a garantia oficial de que não serão
afetados com perdas muito significativas ou totais.
É
certo que “as obrigações alvo de perdas no BES não foram originariamente
vendidas a particulares, mas estavam admitidas à negociação e eram negociadas
em mercado secundário”. A título de exemplo, o DV refere que um particular terá comprado obrigações de uma dessas
séries, em 2013 e com maturidade de 2018, através do Banco Best, um banco eletrónico em que o NB detém uma participação
maioritária.
Por
outro lado, sabe-se que “as emissões vendidas a particulares nos balcões, e com
montantes mínimos de subscrição abaixo dos 100 mil euros, não foram devolvidas
ao BES”, continuando assim na esfera do NB e a salvo de perdas. Porém, apesar
de o BdP ter assegurado que a “medida protege todos os depositantes do NB, os
credores por serviços prestados e outras categorias de credores comuns”, os
particulares com estes títulos em carteira dizem não ter ainda garantia oficial
da não perda do seu dinheiro.
Ora,
a CMVM (Comissão
de Mercado de Valores Mobiliários),
a 29 de dezembro, suspendeu a negociação dos títulos no mercado regulamentado e,
a 30, deliberou o levantamento da suspensão. Todavia, as obrigações continuaram
a transacionar fora do mercado regulado, registando perdas superiores a 80% do
seu valor.
Por
outro lado, a retransmissão das obrigações não subordinadas (títulos
que têm prioridade de reembolso em caso de incumprimento dos emitentes) para o banco “mau”, no valor de
1985 milhões de euros, permite ao NB o reforço dos rácios de capital e a
criação duma “almofada” financeira para prejuízos, por ficar livre da
responsabilidade de reembolso dessas obrigações. Constitui a resposta à
exigência de capitalização por parte do BCE. Mas, uma vez que o BES entrará brevemente
em liquidação – as suas contas, recentemente divulgadas, revelam um prejuízo de
9,2 mil milhões de euros e capitais próprios negativos de 2,6 mil milhões – e
não tem recursos para honrar a totalidade dos compromissos junto de todos os
credores, os detentores daqueles títulos arriscam a perda da totalidade do
investimento.
Longe
desta problemática, a administração do NB concentra-se na concretização do seu
plano de reestruturação. Neste momento, está em marcha a venda de ativos não
estratégicos (como o Banco Internacional de Cabo Verde ou Banque
Espírito Santo et de la Vénétie).
Para
o BdP, o aval da Comissão Europeia aos compromissos a aplicar ao NB, eliminando
o ambiente de incertezas, contribui para o relançamento do processo de venda da
participação do Fundo de Resolução no capital do NB, o que acontecerá por todo
o mês de janeiro.
***
A
mesma articulista, em outro texto do DV,
conclui que “o Fundo de Resolução poderá ter de indemnizar credores do BES” já
que da resolução do BES não podem resultar “perdas maiores aos acionistas do
que da liquidação. Ou seja, nenhum credor pode assumir perda maior do que a que
assumiria caso o BES tivesse entrado em insolvência a 4 de agosto de 2014. Se o
credor receber menos, tem direito a ser ressarcido da diferença pelo Fundo de
Resolução. Resta esperar pela definição dos montantes pela avaliação em
auditoria a cargo de uma entidade independente, designada pelo BdP, a qual “incluirá
uma estimativa do nível de recuperação dos créditos de cada classe de credores
numa ótica de liquidação imediata da instituição”. Esta conclusão decorre da
leitura do RGICSF (Regime Geral de Instituições de Crédito
e Sociedades Financeiras)
e é recordada por Luís Máximo dos Santos, presidente do BES, no último
relatório e contas, recentemente divulgado.
A
estimativa acima referida terá por base todos os ativos e passivos existentes
na instituição antes da medida de resolução. A avaliação com vista à estimativa
está em curso e, segundo Luís Santos, “constitui um elemento muito importante
para o desfecho da medida de resolução”. Por seu turno, a auditora KPMG refere
que à data da assinatura da certificação legal das contas e do relatório de
auditoria, dia 30 de dezembro pp, essa avaliação não tinha sido
disponibilizada.
No
entanto, a auditoria poderá também determinar que, mesmo num processo de
liquidação, os credores não teriam direito a indemnizações.
Por
outro lado, a venda do NB acima de 4900 milhões de euros (montante
injetado aquando da sua criação)
– cenário improvável – reverte para os acionistas e credores do BES. Já a venda
por valor inferior pressupõe a assunção do custo pelas instituições que financiam
o Fundo de Resolução. Assim, na resolução, como numa insolvência normal, os
acionistas do BES assumirão as perdas em primeiro lugar, já que são os últimos
da hierarquia de credores a ser ressarcidos, pois os primeiros a ser
ressarcidos serão os credores comuns e os subordinados.
O
balanço final de 2014 do BES só foi aprovado a 18 de dezembro de 2015 e divulgado
na CMVM no dia 30. Porém, as contas ainda não contabilizam as medidas adotadas
pelo BdP, como a devolução de 1985 milhões de obrigações seniores do NB para o
BES. Por isso, a auditora adverte que tal medida fará aumentar mais os
prejuízos de 9,2 mil milhões de euros.
***
Perante
o exposto e tendo em conta o mais que tem sido dito do BdP, pergunto: para que
serve efetivamente o Banco de Portugal?
Já
foi banco emissor de moeda, já definiu os grandes parâmetros da política
monetária – funções de que está desprovido, dada a adesão de Portugal à moeda
única (euro). Resta-lhe velar, em parceria
com a CMVM, pelo cumprimento da missão do nosso sistema financeiro “garantir a formação, a captação e a
segurança das poupanças, bem como a aplicação dos meios financeiros necessários
ao desenvolvimento económico e social” (CRP, art.º 101.º). Fá-lo através das medidas e
ações de supervisão e da regulação e do controlo executório da política do
Ministério das Finanças.
Porém,
é o que se vê. BPN, BPP foram-se e o governador do BdP (Vítor
Constâncio) deu
conta tarde e a más horas. Eclodiu o caso BES/GES e o governador do BdP (Carlos
Costa), que
acompanhou de perto o BES durante quase um ano, assistiu ao seu colapso e teve
que o levar à resolução (mantendo o BES com banco mau e criando o
Novo Banco) acompanhando
estoicamente o discurso governamental do não prejuízo para os contribuintes.
Para
vender o Novo Banco, depois da tentativa gorada, contratou o ex-Secretário de
Estado dos Transportes dos XIX e do XX Governos. Porém, o NB precisava agora de
aumento de capital, que foi conseguido passando ativos do NB para o BES. E
resta o aludido cenário de indemnização a credores do BES prejudicados. Nem
conseguiu inscrever a estimativa de montantes nas contas de 2014 do BES, apesar
de elas só terem sido ultimadas a 18 de dezembro.
O
Banif foi intervencionado pelo Estado e acompanhado pelo BdP desde o início de
2013 e deu no que se viu!
Que
anda a fazer o BdP? Para estatísticas já temos o INE, que bem pode ter o seu
boletim trimestral… Para previsões e alertas sobre a execução orçamental já
temos a UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental)
e o CFP (Conselho das
Finanças Públicas).
A UTAO é “uma unidade
especializada que funciona sob orientação da comissão parlamentar permanente
com competência em matéria orçamental e financeira, prestando-lhe apoio pela
elaboração de estudos e documentos de trabalho técnico sobre a gestão orçamental
e financeira pública”, como definido na Lei de Organização e Funcionamento dos
Serviços da Assembleia da República (Lei n.º 77/88, de 1 de julho), alterada pela
Lei n.º 13/2010, de 19 de julho.
O CFP, criado pela Lei n.º 22/2011, de 20 de maio, art.º 3.º, é um
organismo independente que fiscaliza o cumprimento das regras orçamentais em
Portugal e a sustentabilidade das finanças públicas. É “um dos vigilantes
orçamentais ou fiscal watchdogs recentemente
criados na Europa, que iniciou a sua atividade em fevereiro de 2012, com a
missão de proceder a uma avaliação independente sobre a consistência,
cumprimento e sustentabilidade da política orçamental, promovendo a sua
transparência, de modo a contribuir para a qualidade da democracia e das
decisões de política económica e para o reforço da credibilidade financeira do
Estado” (vd site do CFP).
Porque
não assegura a supervisão e a regulação do sistema financeiro, em tese, o BdP
pode ser encerrado. Será que a UE ou o EURO precisam dele? Que o comprem!
2016.01.03 –
Louro de Carvalho
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