O
24 de janeiro de 2016 vai ficar na História política do país como o 9.º dia de escolha
do Presidente da República por sufrágio direto, secreto e universal depois da
revolução abrilina (tivemos dois não eleitos). Já lá vão 8 eleições presidenciais
(uma
delas com segunda volta):
já fizemos quatro presidentes, que perfizeram dois mandatos cada um, já que se
candidataram a uma segunda eleição consecutiva, tendo sido reeleitos.
A
próxima eleição vai originar a sucessão do Presidente que sairá de Belém com o
índice mais baixo (e negativo) com que saiu qualquer Presidente da República depois
de 1976, quiçá desde a I República, obviamente tendo em conta as diversas circunstâncias
políticas de conjuntura.
Com
efeito, não merecem o favor popular factos como o denunciado hoje, dia 23, pelo
JN, de que patrocinou em segredo a
negociação de 300 diplomas legais ou os seguintes, que a mesma edição do
referido diário recorda: o ajuste direto das aquisições para a Presidência da República,
“quase sempre às mesmas empresas” e “sem divulgar os contratos” ou a não
prestação anual de contas, apesar das promessas do Presidente (factos
denunciados pelo Tribunal de Contas),com
exceção da conta relativa a 2014; a interrupção de férias em 2008, para uma comunicação
ao país a fim de mostrar a sua indignação pela alegada restrição dos poderes presidenciais
a propósito do Estatuto político-administrativo da Região Autónoma dos Açores;
a embrulhada no caso do BPN denunciada em 2009, referente a 2001-2003, mal
explicada pelo Presidente; a lastimável denúncia das alegadas operações de escuta
ao Palácio de Belém por agentes da área próxima do Governo, em 2009; a ausência
no funeral de Saramago em 2010, o único prémio Nobel português da literatura; o
discurso de vitória eleitoral em 2011 (reeleição) e sobretudo o da posse para o
segundo mandato, para que fora reeleito; a acusação a Sócrates de falta
lealdade institucional por motivo da semiocultação do PEC4; a queixa sobre as
suas reformas baixas, a ponto de não ter a certeza se o montante daria para
pagar as contas; o apelo sem sucesso ao compromisso entre os partidos da coligação
e o PS em 2013, com a promessa de dissolução do Parlamento e marcação de eleições
em 2014 (promessa que não lhe ficou bem fazer); as circunstâncias e remoques que
envolveram a indigitação de Passo Coelho depois das eleições de 4 de outubro de
2015; o teor das declarações a propósito da formação do XXI Governo; as suas sugestões
intempestivas sobre matérias atinentes a revisão constitucional; os comentários
despicientes que fez a propósito da Grécia e da sua eventual saída do Euro; e o
pouco relevo dado ao Conselho de Estado.
***
Porém,
agora vamos votar. Não vamos ficar em casa nem vamos votar em branco. Vamos escolher
um homem ou uma mulher para presidir ao Estado e para o representar e garantir a
sua unidade e independência. Não vamos deixar de cumprir o nosso dever cívico e
de exercer o nosso direito político.
Não
vamos fazê-lo como quem descarrega a mercadoria ou a consciência ou ainda como
quem se limita a cumprir um ritual, fazendo uma peregrinação, abeirar-se de uma
mesa e fazer uma cruz. Vamos, sim, com o gesto de quem se apresenta perante uma
equipa de mesários declarar a nossa identidade civil e a capacidade eleitoral ativa,
receber um papel, marcar nele no segredo da nossa consciência responsável a
expressão da nossa vontade e entregá-la ao cofre de contagem escrutinadora.
Este
é o compromisso que estamos a exigir ao que vier a ser eleito ou à que vier a
ser eleita e que, de futuro, lhe recordaremos pelos meios ao nosso alcance:
-
De zelar pelo nosso país para que seja sempre “uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na
vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”
(CRP,
art.º 1.º);
-
De zelar pelo nosso país para que seja sempre “um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no
pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na
garantia de efetivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e
interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica,
social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa” (CRP,
art.º 2.º);
- De garantir as funções fundamentais do
Estado, estabelecidas no art.º 9.º da CRP;
- De representar “a República
Portuguesa”,
garantir “a independência nacional, a unidade do Estado e o regular
funcionamento das instituições democráticas”
e ser, “por inerência, Comandante Supremo
das Forças Armadas” (cf CRP, art.º 120.º);
-
De “desempenhar fielmente as funções” em que fica “investido e defender, cumprir e
fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa” (cf CRP, art.º 127.º);
-
De exercer cabal, ativa e ponderadamente (e não caprichosamente) todas as suas competências – em
relação a outros órgãos (vd CRP, art.º 133.º), para prática de atos próprios (vd CRP, art.º 134.º) e nas relações internacionais (vd CRP, art.º 135.º) –, bem como o direito de veto sempre
que necessário, nos termos do art.º 136.º e nos dos artigos 278.º e 279.º da
CRP.
***
Isto
significa que o/a Presidente não será um mero árbitro ou notário, mas tem de
exercer em pleno a sua magistratura de influência, de forma discreta ou aberta,
conforme o ditame do interesse público. Nunca deve ser um espectador da
condução da política geral do país da parte do Governo. Não o poderá substituir,
mas deverá questioná-lo e colaborar com ele.
Perante
a cena internacional, não poderá pôr-se em bicos de pés nem olhá-la com
despiciência ou com receio. Porém, não pode ficar à espera de que os benefícios
entrem pelo país adentro. Tem de concertar com o Governo todas as formas de negociação,
não se lhe sobrepondo, mas colaborando e exigindo. E, sem interferir nas
atribuições parlamentares ou na área da Justiça, deverá, através das mensagens
e/ou dos discursos ser um catalisador do funcionamento de todas as instituições
democráticas e não ficar à espera de que elas falhem.
E
deve exercer o supremo comando das forças armadas, não exercendo comando operacional,
é certo, mas sem se limitar a receber as honras militares ou a assinar de cruz diplomas
atinentes às forças armadas ou a assistir à sua progressiva degradação.
Esperamos
outrossim que o/a Presidente não se resigne a deixar que o país se governe à
luz de uma “Constituição” não escrita, ditada do exterior, subalternizando a
nossa Constituição da Republica Portuguesa, de cujo cumprimento ele/a se assume
como garante. Ademais que seja o provedor efetivo do cidadão e nunca a modos de
floreira ornamental. Que venha ao povo, não para o conhecer – que tem outros meios
para isso – nem para se passear pelo país (Que ambiguidade a dos roteiros!), mas para ouvir o povo nas suas
angústias e clamores e com ele festejar a vida e o sucesso, sem pactuar com situações
irregulares ou de compadrio.
Haja
Presidente e não mero/a íncola ou ocupante de Belém!
2016.01.23 –
Louro de Carvalho
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