domingo, 5 de janeiro de 2020

Que o mundo inteiro reze pela paz, para ajudar a semear a paz


A escalada de tensão entre os EUA e o Irão, que corre o risco de inflamar o Oriente Médio, não diminui. Segundo alguns meios de comunicação social, na penúltima noite, ao norte de Bagdad, novo ataque aéreo estadunidense atingiu o comandante do grupo paramilitar pró-iraniano Hashed Al Shaabi. Embora a coligação internacional anti-Isis liderada pelos EUA tenha desmentido a notícia, as forças de mobilização popular confirmaram o ataque, relatando que as vítimas são médicos próximos do grupo e que nenhum membro da milícia foi morto.
Num tuíte, Francisco convida a crer que o outro tem a nossa mesma necessidade de paz e assegura que “não se obtém a paz se não se espera por ela”. Por sua vez, Dom Shlemon Warduni, bispo auxiliar de Bagdad, exprime a preocupação do povo iraquiano e da comunidade cristã com esta tensão: “Quem paga as consequências dos conflitos são sempre os mais fracos”.
Como era de esperar, a capital iraquiana, na manhã do dia 4, foi palco do cortejo fúnebre do general iraniano Soleimani que desfilou pelas ruas do distrito de Kazimiya, onde existe um santuário xiita. Milhares de pessoas participaram, gritando muitas delas slogans contra os EUA. No final do desfile fúnebre, foi realizado o funeral nacional oficial na área verde de Bagdad na presença de muitos líderes iraquianos, incluindo o Primeiro-Ministro Adil Abdul-Mahdi.
E, enquanto as diplomacias pedem moderação, registou-se o protesto oficial do Irão à ONU e a firmeza do presidente Trump, que reitera as alegadas razões da operação e mantém a pressão sobre todos os ambientes ligados ao Governo de Teerão. Trump afirma que Soleimani estava a planear ataques iminentes e que não foi morto para uma mudança de regime ou para iniciar uma guerra, embora os EUA estejam prontos para qualquer resposta que seja necessária.
Os oficiais da Defesa dos EUA anunciaram que serão enviados ao Médio Oriente 3.500 soldados adicionais. Serão enviadas tropas ao Iraque, Kuwait, Líbano em resposta às ameaças de vingança dos ambientes xiitas. Mas a coligação anti-Isis no Iraque vai reduzir as suas operações por “razões de segurança” – uma linha de prudência que a NATO também seguirá suspendendo as missões de treinamento no Iraque.
Por outro lado, sobre a retaliação contra os responsáveis pelo ataque, falou o líder espiritual supremo Ali Khamenei, que proclamou três dias de luto nacional. Tons fortes também por parte do presidente iraniano, Hassan Rohani, que declarou que “o sangue do mártir Soleimani será vingado no dia em que virmos a mão maligna dos EUA ser cortada para sempre da região”. E os protestos do Irão chegaram à ONU em carta que fala de uma grave violação do direito internacional e de “terrorismo de Estado”.
Dom Shlemon Warduni, já referido, diz que “é um momento crítico, muito difícil, porque a nossa religião é a paz”, quando o mundo atual, que se move por interesses pessoais e materiais, quer apenas ocupar aqui e ali. E, sentindo a dor dos iraquianos, refere:
Os nossos iraquianos estão em grandes dificuldades, eles sofrem tanto. Este é o apostolado do Santo Padre: semear a paz no mundo. E ele tira isso do Evangelho de Jesus porque ele, Cristo, nos diz: ‘amai-vos uns aos outros’. Portanto, pedimos ao mundo inteiro para fazer a paz, para ajudar verdadeiramente a semear a paz, sem interesses pessoais.”.
E, certificando que “todos têm medo de que estamos a ir ao encontro da guerra”, o que seria terrível por a família iraquiana já estar espalhada por todo o mundo, assegura:
Não temos paz. É por isso que só queremos paz e tranquilidade. Esperamos que seja isso que os chefes de Estado façam, porque o mundo inteiro está de cabeça para baixo: em vez de se semear a paz, semeia-se o ódio. Agradecemos ao Santo Padre, mas pedimos ao mundo inteiro que reze, que volte a Deus: isto é o mais importante, porque afastando-se de Deus, todo o mal possível é feito. Por isso, pedimos a todos, pedimos que rezem pela paz.”.
Não sabe se é possível “uma paz duradoura e forte”, pois, face a interesses pessoais, lembramos que o Senhor disse claramente que não podemos servir a riqueza (Mammona) e a Deus ao mesmo tempo, mas o mundo prefere o dinheiro. Ora, é necessário que “o mundo inteiro reze pela paz, para ajudar a semear a paz” – diz.
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Por telefone, Dom Leo Boccardi, núncio apostólico em Teerão, descreve a situação de tensão e protestos causados pela morte do general Soleimani após o ataque estadunidense e diz que “devem ser usadas as armas da negociação e da justiça”.
De facto, o aumento da tensão entre Washington e Teerão, após a morte do general Qassem Soleimani, uma das figuras-chave do cenário iraniano, vítima dum ataque aéreo estadunidense, desperta apreensão na Santa Sé, com o Papa, que segue a evolução da situação, a rezar pela paz. E o núncio apostólico diz:
O Papa foi informado do que está a ocorrer. (…) Tudo isso cria preocupação e nos mostra como é difícil construir e acreditar na paz. A boa política está a serviço da paz, toda a comunidade internacional deve colocar-se ao serviço da paz, não só na região, mas em todo o mundo.”.
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No final da oração do Angelus neste domingo, dia 5, o Papa exortou a evitar “a sombra da inimizade”, referindo-se às tensões que estão atravessando várias regiões do mundo. E, recordando que “a guerra traz destruição e que é necessário trabalhar para favorecer o diálogo entre as partes, disse:
Em tantas partes do mundo sente-se um terrível ar de tensão. A guerra traz apenas morte e destruição. Convido todas as partes a manterem acesa a chama do diálogo e do autocontrolo e a evitarem a sombra da inimizade. Rezemos em silêncio para que o Senhor nos dê esta graça.”.
O Alto Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Josep Borrell, interveio expressando “profunda preocupação com o aumento dos confrontos no Iraque” e exortando à moderação para evitar uma nova escalada de violência. Borrell convidou o ministro das Relações  Exteriores iraniano Mohammad Javad Zarif para ir a Bruxelas.  Entretanto, continuam as acusações recíprocas entre Washington e Teerão. O Irão pede a evacuação das bases militares dos EUA na região, prometendo vingança, se isso não ocorrer, e afirmando que já identificou 35 alvos a serem atingidos. Não seriam descartados ataques no Estreito de Ormuz, pelo qual passa cerca de 20% do tráfego mundial de petróleo por mar. A ameaça foi imediatamente levada a sério por Londres, que dispôs escolta militar para os navios com a bandeira britânica. Por sua vez, o presidente dos EUA, Donald Trump, declarou que, no caso de ataque iraniano, os EUA estão prontos para a ação contra 52 locais importantes para a cultura iraniana, 52 como os reféns estadunidenses sequestrados por Teerão em 1979. No twitter, o ministro iraniano das Relações Exteriores, Zarif, escreveu que “atingir locais culturais seria um crime de guerra”. 
Neste contexto, Louis Raphael Sako, Patriarca da Igreja católica caldeia, fez um forte apelo: 
Os iraquianos ainda estão chocados com o que aconteceu na semana passada. Temem que o Iraque se torne um campo de batalha, em vez de ser uma nação soberana capaz de proteger os seus cidadãos e as suas riquezas. Em circunstâncias tão críticas e tensas, é sábio realizar um encontro em que todas as partes envolvidas se sentem em torno de uma mesa para um diálogo sensato e civilizado que poupará consequências inesperadas para o Iraque. Nós imploramos a Deus Todo-Poderoso que garanta ao Iraque e à região uma "vida normal, pacífica, estável e segura, à qual aspiramos.”.
Enfim, o apelo é para diminuir a tensão, chamar todos à negociação e acreditar no diálogo, renunciando ao conflito e armando-nos com outras armas, que são as da justiça e da boa vontade.
2020.01.05 – Louro de Carvalho

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