A escalada
de tensão entre os EUA e o Irão, que corre o risco de inflamar o Oriente Médio,
não diminui. Segundo alguns meios de comunicação social, na penúltima noite, ao
norte de Bagdad, novo ataque aéreo estadunidense atingiu o comandante do grupo
paramilitar pró-iraniano Hashed Al Shaabi. Embora a coligação internacional
anti-Isis liderada pelos EUA tenha desmentido a notícia, as forças de
mobilização popular confirmaram o ataque, relatando que as vítimas são médicos
próximos do grupo e que nenhum membro da milícia foi morto.
Num tuíte,
Francisco convida a crer que o outro tem
a nossa mesma necessidade de paz e assegura que “não se obtém a paz se não
se espera por ela”. Por sua vez, Dom Shlemon Warduni, bispo auxiliar de Bagdad,
exprime a preocupação do povo iraquiano e da comunidade cristã com esta tensão:
“Quem paga as consequências dos conflitos
são sempre os mais fracos”.
Como era de
esperar, a capital iraquiana, na manhã do dia 4, foi palco do cortejo fúnebre
do general iraniano Soleimani que desfilou pelas ruas do distrito de Kazimiya,
onde existe um santuário xiita. Milhares de pessoas participaram, gritando muitas
delas slogans contra os EUA. No final
do desfile fúnebre, foi realizado o funeral nacional oficial na área verde de
Bagdad na presença de muitos líderes iraquianos, incluindo o Primeiro-Ministro
Adil Abdul-Mahdi.
E, enquanto
as diplomacias pedem moderação, registou-se o protesto oficial do Irão à ONU e
a firmeza do presidente Trump, que reitera as alegadas razões da operação e
mantém a pressão sobre todos os ambientes ligados ao Governo de Teerão. Trump
afirma que Soleimani estava a planear ataques iminentes e que não foi morto
para uma mudança de regime ou para iniciar uma guerra, embora os EUA estejam
prontos para qualquer resposta que seja necessária.
Os oficiais
da Defesa dos EUA anunciaram que serão enviados ao Médio Oriente 3.500 soldados
adicionais. Serão enviadas tropas ao Iraque, Kuwait, Líbano em resposta às
ameaças de vingança dos ambientes xiitas. Mas a coligação anti-Isis no Iraque vai
reduzir as suas operações por “razões de segurança” – uma linha de prudência
que a NATO também seguirá suspendendo as missões de treinamento no Iraque.
Por outro
lado, sobre a retaliação contra os responsáveis pelo ataque, falou o líder
espiritual supremo Ali Khamenei, que proclamou três dias de luto nacional. Tons
fortes também por parte do presidente iraniano, Hassan Rohani, que declarou que
“o sangue do mártir Soleimani será
vingado no dia em que virmos a mão maligna dos EUA ser cortada para sempre da
região”. E os protestos do Irão chegaram à ONU em carta que fala de uma
grave violação do direito internacional e de “terrorismo de Estado”.
Dom Shlemon Warduni, já referido, diz que “é um momento crítico, muito
difícil, porque a nossa religião é a paz”, quando o mundo atual, que se move
por interesses pessoais e materiais, quer apenas ocupar aqui e ali. E, sentindo
a dor dos iraquianos, refere:
“Os nossos iraquianos estão em grandes
dificuldades, eles sofrem tanto. Este é o apostolado do Santo Padre: semear a
paz no mundo. E ele tira isso do Evangelho de Jesus porque ele, Cristo, nos
diz: ‘amai-vos uns aos outros’. Portanto, pedimos ao mundo inteiro para fazer a
paz, para ajudar verdadeiramente a semear a paz, sem interesses pessoais.”.
E,
certificando que “todos têm medo de que estamos a ir ao encontro da guerra”, o
que seria terrível por a família iraquiana já estar espalhada por todo o mundo,
assegura:
“Não temos paz. É por isso que só queremos paz e tranquilidade. Esperamos
que seja isso que os chefes de Estado façam, porque o mundo inteiro está de
cabeça para baixo: em vez de se semear a paz, semeia-se o ódio. Agradecemos ao
Santo Padre, mas pedimos ao mundo inteiro que reze, que volte a Deus: isto é o
mais importante, porque afastando-se de Deus, todo o mal possível é feito. Por
isso, pedimos a todos, pedimos que rezem pela paz.”.
Não sabe se é possível “uma paz duradoura e forte”, pois, face a interesses pessoais, lembramos que
o Senhor disse claramente que não podemos servir a riqueza (Mammona) e a Deus ao mesmo tempo, mas o mundo prefere o dinheiro. Ora, é
necessário que “o mundo inteiro reze pela paz, para ajudar a semear a paz” –
diz.
***
Por telefone, Dom Leo Boccardi, núncio apostólico em
Teerão, descreve a situação de tensão e protestos causados pela morte do
general Soleimani após o ataque estadunidense e diz que “devem ser usadas as
armas da negociação e da justiça”.
De facto, o aumento da tensão
entre Washington e Teerão, após a morte do general Qassem Soleimani, uma das
figuras-chave do cenário iraniano, vítima dum ataque aéreo estadunidense,
desperta apreensão na Santa Sé, com o Papa, que segue a evolução da situação, a
rezar pela paz. E o núncio apostólico diz:
“O Papa foi informado do que está a ocorrer.
(…) Tudo isso cria preocupação e nos mostra como é difícil construir e
acreditar na paz. A boa política está a serviço da paz, toda a comunidade
internacional deve colocar-se ao serviço da paz, não só na região, mas em todo
o mundo.”.
***
No final da
oração do Angelus neste domingo, dia 5, o Papa exortou a evitar “a sombra da
inimizade”, referindo-se às tensões que estão atravessando várias regiões do
mundo. E, recordando que “a guerra traz destruição e que é necessário trabalhar
para favorecer o diálogo entre as partes, disse:
“Em tantas partes do mundo sente-se um
terrível ar de tensão. A guerra traz apenas morte e destruição. Convido todas
as partes a manterem acesa a chama do diálogo e do autocontrolo e a evitarem a
sombra da inimizade. Rezemos em silêncio para que o Senhor nos dê esta graça.”.
O Alto
Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de
Segurança, Josep Borrell, interveio expressando “profunda preocupação com o aumento
dos confrontos no Iraque” e exortando à moderação para evitar uma nova escalada
de violência. Borrell convidou o ministro das Relações Exteriores
iraniano Mohammad Javad Zarif para ir a Bruxelas. Entretanto, continuam
as acusações recíprocas entre Washington e Teerão. O Irão pede a evacuação das
bases militares dos EUA na região, prometendo vingança, se isso não ocorrer, e
afirmando que já identificou 35 alvos a serem atingidos. Não seriam descartados
ataques no Estreito de Ormuz, pelo qual passa cerca de 20% do tráfego mundial
de petróleo por mar. A ameaça foi imediatamente levada a sério por Londres, que
dispôs escolta militar para os navios com a bandeira britânica. Por sua vez, o
presidente dos EUA, Donald Trump, declarou que, no caso de ataque iraniano, os
EUA estão prontos para a ação contra 52 locais importantes para a cultura
iraniana, 52 como os reféns estadunidenses sequestrados por Teerão em 1979. No
twitter, o ministro iraniano das Relações Exteriores, Zarif, escreveu que “atingir
locais culturais seria um crime de guerra”.
Neste
contexto, Louis Raphael Sako, Patriarca da Igreja católica caldeia, fez um
forte apelo:
“Os iraquianos ainda estão chocados com o
que aconteceu na semana passada. Temem que o Iraque se torne um campo de
batalha, em vez de ser uma nação soberana capaz de proteger os seus cidadãos e as
suas riquezas. Em circunstâncias tão críticas e tensas, é sábio realizar um
encontro em que todas as partes envolvidas se sentem em torno de uma mesa para
um diálogo sensato e civilizado que poupará consequências inesperadas para o
Iraque. Nós imploramos a Deus Todo-Poderoso que garanta ao Iraque e à região
uma "vida normal, pacífica, estável e segura, à qual aspiramos.”.
Enfim, o apelo é para diminuir a tensão, chamar
todos à negociação e acreditar no diálogo, renunciando ao conflito e
armando-nos com outras armas, que são as da justiça e da boa vontade.
2020.01.05
– Louro de Carvalho
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