A Diocese de
Coimbra está em jubileu desde o dia 12 de janeiro deste ano, com a abertura da
Porta Santa, na Igreja de Santa Cruz, até 17 de janeiro de 2021, para celebrar
o VIII centenário do martírio dos primeiros frades que São Francisco de Assis
enviou em missão para Marrocos e cujas relíquias repousam em Coimbra, bem como
a importância que este facto teve na vocação de Santo António, de modo que seja
assumida de todo a espiritualidade antoniana.
O Jubileu foi convocado por Dom Virgílio Antunes, Bispo de Coimbra, em
Carta Pastoral de Anúncio do Ano Santo, acompanhada pelo Decreto da Santa Sé
que, em nome do Papa Francisco, proclama um Jubileu com indulgência plenária
para todos os dias do Ano Santo.
Para participar no Ano Santo e alcançar a Indulgência Jubilar, propõe-se a
peregrinação à Igreja de Santa Cruz e à de Santo António dos Olivais, que pode
ser feita individualmente, em grupo e, de forma especial, por paróquia ou
unidade pastoral. Um Itinerário do Peregrino ajudará cada um a viver mais
profundamente a peregrinação.
Além da passagem pela Porta Santa, é possível a visita à Exposição Jubilar
e a visualização de um documentário histórico. Também estará disponível a todos
com diversos recursos um Guião Jubilar para preparar a vivência espiritual e
catequética deste Ano Santo.
A 16 de Janeiro de 2020, comemoram-se os 800 anos do martírio de Berardo,
Otão (sacerdotes), Pedro (diácono), Acúrsio e Adjuto (leigos), que se dedicaram apaixonadamente à
pregação e à evangelização em Marrocos, não obstante a perseguição. São
Francisco de Assis, ao saber do seu martírio, terá confessado: “Agora posso dizer que tenho cinco verdadeiros
frades menores”.
Tal facto, juntamente com a chegada das Relíquias dos Mártires à Igreja de
Santa Cruz, impressionou de tal modo o neossacerdote Fernando Martins de
Bulhões que ele se decidiu, nesse ano de 1220, a fazer-se Frade Menor. E,
assumindo o nome de António, foi recebido no convento de Santo António Abade
dos Olivais.
Este Jubileu propõe à Igreja a celebração da fidelidade da fé, o reacendimento
do ímpeto missionário nos corações dos fiéis e a dinamização duma cultura
evangelizadora. Por outro lado, na preparação para a Jornada Mundial da Juventude
Lisboa 2022, celebra-se o jovem António, que, seduzido pelo exemplo dos
Mártires de Marrocos, se tornou um apaixonado pela missão. O Jubileu será porta
aberta a todos, para que possa cada um redescobrir “a alegria do Evangelho [que] enche o coração e
a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus” (EG 1), e o ensejo para a
tomada de consciência do drama dos cristãos perseguidos atualmente e da
necessidade de um salutar diálogo inter-religioso na construção da paz.
Na carta
pastoral endereçada à diocese, Dom Virgílio Antunes aponta o “discurso forte
contra todas as descriminações” das “sociedades modernas”, que, “não raro, dão
lugar a outras, entre as quais a discriminação social e cultural dos cristãos”.
E assegura:
“Um ano jubilar é sempre um ano de graça para os cristãos que se dispõem
a fazer caminho, no seguimento das inspirações próprias das figuras ou
circunstâncias que o motivam”.
Na carta
pastoral, o prelado define “cinco desafios” para o Ano Jubilar: o da
Evangelização; o da Espiritualidade; o da Renovação Cultural; o da Vocação
Cristã e das Vocações na Igreja; e o desafio da Renovação da Piedade Popular
Antoniana”. Manifesta o desejo de que a celebração jubilar “constitua um forte
incentivo para a renovação da Igreja, para o fortalecimento da fé das
comunidades da Diocese de Coimbra e seja semente de novos cristãos”. Considera
que “numa sociedade religiosa do passado ou numa sociedade secularizada do presente,
persiste a urgência de evangelizar”. E, dando o exemplo de “Santo António que, não podendo ir para as
terras de África, como desejou, percorreu os longos caminhos do Sul da Europa a
anunciar o que viu e ouviu no encontro com Cristo”, sublinha:
“Mais do que nunca, sente-se a necessidade de evangelizar o interior do
ser humano, as suas conquistas científicas e técnicas, as relações sociais,
económicas e políticas, e até a própria religiosidade cristã vivida no espaço
eclesial”.
Por isso,
entende que o Santo convoca a Diocese “para uma nova etapa evangelizadora e
acompanha, com a sua intercessão, a nossa alegria e entusiasmo de seguir o seu
exemplo”.
Segundo Dom
Virgílio, “as perseguições aos cristãos ainda não acabaram e vão renascendo em
lugares concretos, tornando-se o maior dos desafios e a prova de fogo para a
fortaleza da fé”; e os cristãos estão “diante do desafio” do testemunho de fé e
esperança, “perante a possibilidade de uma rejeição civilizada ou de uma
perseguição cultural e ideológica bárbara”.
O Bispo, defendendo
que o diálogo cultural e religioso é um dos fatores de que depende a paz no
mundo, escreve:
“A paz está dependente de muitos fatores e, entre eles, conta-se
certamente o diálogo cultural e religioso, que assenta no respeito pelo
princípio da dignidade da pessoa humana, com os consequentes direitos e
deveres, e nos valores fundamentais, como são a vida, a paz, a verdade, a
liberdade, a justiça, a solidariedade e a caridade”.
O prelado
destaca que, de entre os muitos pontos a considerar no caminho de encontro e
diálogo, se encontram as questões “ligadas à ética, muito frequentemente lugar
de fraturas profundas”, vincando que, “de igual modo, as relações ecuménicas e
o diálogo inter-religioso precisam de estar na ordem do dia, para que sejam
elemento decisivo na construção de um mundo mais coeso e fator decisivo na
construção da paz”. E aborda a devoção e a piedade popular antonianas
sustentando que “precisam de forte renovação, para que não se reduzam a rituais
ou festas vazias de sentido espiritual e pastoral, mas sejam momentos aptos
para gerar o crescimento da fé, do amor a Deus e de santificação dos fiéis”.
***
Os Mártires de Marrocos, naturais de
Narni (Itália) abraçaram o exemplo de vida de Francisco de Assis e
ingressaram na Ordem dos Frades Menores. Partindo de Assis em 1219, passaram
por Coimbra, onde conheceram o Cónego Regrante Fernando de Bulhões (o futuro
Santo António). De passagem por Sevilha pregavam a fé
de Cristo nas mesquitas. Conduzidos ao sultão, foram encarcerados e transferidos
para Marrocos com ordem de não pregarem mais o nome de Cristo. Porém,
continuaram com grande coragem a anunciar o Evangelho, pelo que foram presos, torturados
e decapitados em Marraquexe, a 16 de janeiro de 1220. E o Infante Dom Pedro trouxe para Santa Cruz de Coimbra os seus
restos mortais, que foram acolhidos por grande multidão de fiéis, a qual lhes
atribuiu singela veneração. Foi o corajoso exemplo de fé destes frades que
motivou António a mudar de vida e a ingressar na nascente ordem franciscana.
***
Um vasto programa celebrativo, reflexivo, orante e cultural ajudará os
fiéis à vivência do jubileu, sendo de destacar, além das visitas às igrejas de
Santa Cruz e de Santo António dos Olivais, a peregrinação de fiéis de Narni a
Coimbra e a de fiéis de Coimbra a Marrocos, bem como a peregrinação das
relíquias dos mártires e de António pela Diocese de Coimbra. É pena que o
jubileu não tenha abrangido o país inteiro perpassado por forte devoção
antoniana, nomeadamente a diocese de Lisboa. Mas a comunhão intereclesial pode
prevalecer.
Enfim, pela fé, evangelização e cultura num mundo secularizado tantas
vezes hostil, avante!
2020.01.13 –
Louro de Carvalho
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