sábado, 4 de janeiro de 2020

Confirmará a próxima presidência da ESA fenómenos de outros planetas?


Os Estados-membros da ESA (Agência Espacial Europeia) encontraram-se em Sevilha, nos dias 27 e 28 de dezembro de 2019, para definirem a estratégia da agência para a próxima década.
Portugal, que investirá 250 milhões de euros em 2030 e espera mais mil empregos qualificados no setor, assumiu, em conjunto com a França, a presidência do Conselho Ministerial da ESA entre 2020 e 2023, segundo informação do MCTES (Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior) por comunicado que detalhava algumas das propostas nacionais para o futuro da agência que estiveram em debate no predito encontro, a conferência “Space 19+”.
O encontro, que decorreu no Palacio de Congresos y Exposiciones de Sevilha, juntou os Estados-membros que integram a ESA e serviu para definir “a estratégia da agência e os níveis de investimento para os próximos cinco anos”, de 2020 a 2024. Estiveram ainda em discussão “novos programas, no que diz respeito às áreas da exploração, acesso e transporte (lançadores), operações e investigação, entre outros domínios do setor espacial”, como informou o Governo.
No encontro, o MCTES, liderado por Manuel Heitor, apresentou o seu plano de implementação da estratégia “Portugal Space 2030”.
Segundo Manuel Heitor, esta conferência representou “um momento crítico para a Europa promover a sua posição competitiva no contexto espacial global”.
O conselho, presidido pela comitiva portuguesa e francesa da ESA, aprovou “um portefólio ambicioso de programas espaciais com um orçamento superior a 14 biliões de euros” e abordou também “os desafios ligados ao setor”.
Enquanto tiver a presidência do Conselho Ministerial, Portugal espera mobilizar todos os Estados-membros da ESA no empenho sério em torno do balanço contínuo das atividades espaciais e do fortalecimento do papel da ESA na Europa em estreita articulação com a Comissão Europeia”.
Os números são ambiciosos. Em Portugal, o Governo prevê que, em 2030, a contribuição nacional para a Agência seja 20% superior à atual, atingindo os 250 milhões de euros. O MCTES prevê também que o investimento público na área do Espaço possa “servir para alavancar um investimento global de 2500 milhões de euros, com um equilíbrio de 50/50 entre receitas públicas e privadas, de forma que o setor do Estado cresça dos atuais 40 a 50 milhões anuais, para cerca de 500 milhões anuais de faturação em 2030”.
E estima-se que venham a ser criados “cerca de mil empregos qualificados nos próximos dez anos”, nas áreas de “Observação da Terra, Telecomunicações e desenvolvimento de pequenos satélites”. Porém, os resultados só serão obtidos com recurso a “uma estratégia nacional desenvolvida em consonância com a Agência Espacial Portuguesa, a indústria nacional e internacional e instituições de interface”.
***
Entretanto, em outubro de 2019, a NASA revelou que sismos de magnitude 3,7 e 3,3 em Marte produziram sons peculiares – tão suaves que são quase impercetíveis – graças aos quais os geólogos da NASA descobriram que Marte pode ser mais parecido com Lua do que com a Terra. A agência espacial norte-americana publicou dois ficheiros com sons peculiares detetados em Marte pela sonda InSight. A agência crê que foram provocados por dois sismos no Planeta Vermelho: um de magnitude 3,7 na escala de Richter; e outro de magnitude 3,3. Podem ser ouvidos no site da agência com uso de bons headphones e num sítio sossegado.
O primeiro áudio foi gravado a 22 de maio de 2019, quando o sismómetro da sonda InSight, equipado por um instrumento extremamente sensível às vibrações inventado por engenheiros franceses, detetou um sismo de magnitude 3,7 na escala de Richter na superfície marciana. Nesse momento, a missão já decorria há 173 dias marcianos (o som é tão suave que é quase impercetível). O segundo “som peculiar” foi detetado em Marte uns meses mais tarde, a 25 de julho, quando um sismo de magnitude 3,3 na escala de Richter chegou aos sensíveis ouvidos do sismómetro da sonda InSight. A missão decorria havia 235 dias marcianos na altura em que este ficheiro de áudio foi gravado. Pode ouvir-se, mas com mais dificuldade que o primeiro.
Num comunicado de imprensa, a NASA explicou que os registos sonoros captados pelo sismómetro estão numa frequência “muito abaixo da capacidade auditiva humana” e que, portanto, “tiveram de ser acelerados e ligeiramente processados para serem audíveis através de headphones“. Embora tão subtis, estes ficheiros de áudio cumprem o objetivo de descobrir o que há debaixo do pó vermelho da superfície marciana. Os astrofísicos norte-americanos dizem que “os dois [sons] sugerem que a crosta marciana é como uma mistura da crosta da Terra com a da Lua” e que “Marte, com a sua superfície cheia de crateras, é ligeiramente mais parecido com a Lua, com ondas sísmicas a agitarem durante mais ou menos um minuto, enquanto na Terra os sismos podem surgir e desaparecer em segundos”.
Na Terra, as fissuras na crosta são fechadas à medida que a água passa por elas e as preenche com novos materiais, o que permite às ondas sonoras viajarem sem interrupções mesmo que passem por fraturas antigas. Na Lua, as ondas sonoras não conseguem viajar em linhas retas porque se cruzam com fissuras e crateras não preenchidas. Precisam, pois, de muito mais tempo para chegar de um ponto ao outro do corpo celeste – o que também sucede em Marte.
E não foi a primeira vez que a NASA publicou os sons provocados pela passagem de ondas sísmicas na sonda InSight. Em abril, quando a missão decorria há cerca de 4 meses, a agência divulgou o primeiro registo de um sismo em Marte e percebeu que os sons provocados pelas ondas sísmicas em Marte viajavam em frequências muito diferentes das observadas na Terra.
As notícias sísmicas vindas de Marte chegaram poucos dias depois de Jim Green, líder dos cientistas da NASA, ter dito que podemos estar a poucos anos de descobrir vida extraterrestre ali. Disse ele ao The Telegraph:
Tenho estado preocupado com isso porque penso que estamos perto de a encontrar e de fazer alguns anúncios”.
Não obstante, o cientista afirma que a sociedade não está preparada para receber esse conhecimento e apresenta algumas questões científicas:
Essa vida será como nós [como a nossa]? Como estaremos relacionados? Pode a vida mover-se de planeta em planeta ou temos uma faísca e o ambiente certo e essa faísca gera vida?”.
E concorda que a descoberta de vida fora da Terra seria algo “revolucionário”:
Será como quando o Copérnico afirmou: ‘Não, nós é que andamos à volta do Sol’. (…) Não há motivos para acreditar que não há civilizações noutros lugares já que estamos a encontrar exoplanetas por todo o lado.”.
***
Depois, não é só de Marte que vêm novidades. Vénus também as origina, porquanto pode ter vulcões ativos. Cientistas cruzaram dados de laboratório com medições de uma sonda da ESA e descobriram que Vénus pode ter vulcões ativos como a Terra. A lava pode ter poucos anos – sugere o estudo publicado. Com efeito, uma equipa de astrofísicos diz ter encontrado provas de que há vulcões ativos na superfície do planeta Vénus. O estudo, publicado pela revista científica Science Advances, no dia 3 de janeiro, é da Universities Space Research Association, uma associação privada de universidade com programas de investigação na área do espaço.
A confirmarem-se tais dados, Vénus é o único planeta principal, além da Terra, a ter vulcanismo ativo na atualidade. Entre as luas do Sistema Solar, só mesmo Io, um satélite natural que orbita Júpiter, tem vulcões que expelem lava vinda duma camada magmática debaixo da superfície do corpo celeste. Marte também já teve vulcanismo ativo (é aqui que fica o maior vulcão do Sistema Solar, o Monte Olimpo, com 27 quilómetros de altura), mas cessou há milhões de anos.
Segundo um artigo de divulgação do estudo publicado na página Phys.org, os cientistas recriaram a atmosfera de Vénus em laboratório para descobrirem como é que os minerais reagem às caraterísticas do planeta. Foi assim que descobriram que a olivina, mineral abundante numa rocha magmática chamada basalto, se exposta a temperaturas de 900ºC durante até um mês, fica revestida em poucas semanas por magnetita e hematita, minerais ricos em óxido de ferro com uma cor vermelha muito escura que são difíceis de detetar. Depois, os investigadores compararam esses resultados com os dados obtidos ao longo dos anos pela sonda Venus Express, desenvolvida pela ESA para a sua primeira missão espacial ao planeta. A sonda detetou sinais de olivina na superfície de Vénus, indicando que se terá formado há muito pouco tempo ou já estaria “escondida” pelos minerais escuros que a sonda não consegue encontrar.
Esta sugestão, aliada ao facto de os investigadores já terem encontrado altas emissões de luz visível e próxima do infravermelho em vários locais da superfície venusiana em 2010 e ao de a atmosfera de Vénus ser muito rica em dióxido de enxofre, produto das erupções vulcânicas, levou a equipa a sugerir que os “fluxos de lava em Vénus são muito jovens” e que podem ter “apenas alguns anos de idade”. Justin Filiberto, cientista que liderou esta investigação, diz que, “se Vénus for realmente ativo hoje, será um ótimo lugar para visitar e entender melhor o interior dos planetas”. E adianta: “Poderíamos estudar como os planetas arrefecem e porque é que a Terra e Vénus têm vulcanismo ativo, mas Marte não”.
***
Espera-se que a presidência conjunta (Portugal e França) contribua para consolidar as informações de ordem sísmica marcianas e confirme o vulcanismo de Vénus – a dizer se a olivina da superfície venusiana é mesmo recente ou se estava oculta por minerais negros que escapam à sonda –, investindo na ciência interplanetária em detrimento do turismo espacial.
2020.01.04 – Louro de Carvalho   

Sem comentários:

Enviar um comentário