Comemorou-se,
a 30
de janeiro, o Dia Escolar da Não Violência e da Paz, criado
em 1964, em Espanha, por Llorenç Vidal, poeta, pedagogo e pacifista espanhol, e
acolhido a nível internacional. Foi escolhido o dia 30 de janeiro por assinalar
o falecimento do grande pacifista indiano Mahatma Gandhi, sendo que, a 2 de
outubro, dia do seu falecimento, se comemora o Dia da Não Violência. Porém, nos países do hemisfério sul, com
calendários escolares diferentes, o Dia
Escolar da Não Violência e da Paz celebra-se por volta de 30 de março.
O objetivo é alertar
alunos, professores, pais, políticos e governantes para a necessidade de uma
educação para a paz, que promova valores como o respeito, a igualdade, a
tolerância, a solidariedade, a cooperação e a não violência. E as preocupações
da efeméride são: fomento da comunicação entre todos, prevenção de situações de
bullying e incremento da amizade.
Em Portugal
realizaram-se diversas atividades nos agrupamentos de escolas e escolas não
agrupadas tendo em vista o objetivo e corporizar as sobreditas preocupações.
Das atividades recomendadas
destacam-se: escrever frases ou manifestos pela paz; ler textos sobre a paz;
realizar trabalhos de grupo com o tema da paz; fazer desenhos com o tema da paz;
exibir filmes sobre a paz, sobre Gandhi e outros pacifistas; largar balões ou
pombas; construir laços e corações humanos; fazer uma árvore com textos e
desenhos dos alunos; produzir um PowerPoint;
encenar peças de teatro; fazer um debate sobre a paz e a não violência; …
***
A
nível das estruturas nacionais, regista-se o lançamento do Observatório
Nacional do Bullying, em
Matosinhos, que disponibiliza um questionário com vista a denúncia informal e
anónima de casos de bullying em
contexto escolar. A este respeito, Sofia Neves, coordenadora científica do Observatório Nacional do Bullying e
presidente da Associação Plano i, responsável por esta iniciativa, explicou, em
declarações aos jornalistas:
“Este observatório é uma plataforma de
denúncia informal de casos de bullying
que pode ser utilizada por pessoas que estão neste momento a ser vítimas, que
foram vítimas no passado, que testemunharam ou que tiveram conhecimento destas
situações”.
Para Sofia Neves, esta recolha de dados anónima permitirá
o mapeamento do fenómeno e uma caraterização das vítimas, dos agressores e das dinâmicas
e consequências do bullying. Os dados
são recolhidos através dum questionário online que está disponível desde o dia
30 de janeiro no site da Associação Plano i que pretende
contribuir para o reforço das políticas públicas de combate ao fenómeno do bullying em contexto escolar, incluindo
o ensino universitário.
Na verdade, a experiência obtida no âmbito do Observatório da Violência no Namoro,
também da responsabilidade da Plano i, demonstra que muitos dos casos
reportados nunca chegam às estatísticas oficiais, porque há uma resistência por
parte das vítimas em denunciar, e que só por via do observatório podem ser
contabilizadas. E Sofia Neves concluiu:
“O que nós esperamos é que estes dados
possam ser indicadores agregados aos indicadores oficiais e que nos permitam
depois elaborar estratégias que possam reforçar as políticas públicas de prevenção
e combate ao bullying”.
A associação, que escolheu o Dia Escolar da Não Violência e da Paz para lançar o observatório,
apresentou publicamente, o programa Plano B, de prevenção do bullying dirigido aos alunos dos 2.º e
3.º ciclos de escolaridade. E, em declarações aos jornalistas, Paula Allen,
coordenadora científica do plano e do Observatório Nacional, explicou que o
programa, financiado pela Direção-Geral da Saúde, envolve três municípios –
Matosinhos, Porto e Figueira da Foz – num total de 40 turmas dos 2.º. e 3.º
ciclos de escolaridade. E referiu:
“Trata-se de um programa que trabalha de uma
forma muito completa e complexa o fenómeno do bullying envolvendo desde alunos a encarregados de educação,
assistentes operacionais, docentes e direções das próprias escolas e entidades
parceiras [autarquias e Agrupamento de Centros de Saúde].”.
A intervenção está dividida em três momentos, o
primeiro dos quais, já em implementação no terreno, consiste na observação e
recolha das necessidades específicas de cada contexto escolar.
E Paula Allen referiu:
“Desenvolveu-se para aplicação posterior um
programa de sete sessões em sala com cada turma. São 40 turmas do 2.º e 3.º
ciclo. E esta intervenção tem um enfoque nas questões de género, da
discriminação e do combate ao bullying
e vai ter em conta aquilo que foi observado na primeira fase”.
De acordo com a coordenadora do programa, em
Matosinhos há 5 escolas ou agrupamentos de escolas que integram este plano de
prevenção do bullying – Escola Secundária Gonçalves Zarco, Agrupamento de
Escolas da Senhora da Hora, Agrupamento de Escolas de Perafita, Agrupamento de
Escolas Irmãos Passos e o Agrupamento de Escolas de Matosinhos. No Porto,
integram o programa o Agrupamento de Escolas Alexandre Herculano e o
Agrupamento Pero Vaz de Caminha e na Figueira da Foz o Agrupamento de Escola de
Paião e Figueira Norte.
***
Também neste dia
se ficou a saber que a polícia está empenhada em ensinar os professores a gerir
conflitos e a recuperar autoridade. Com efeito, cada vez mais diretores escolares pedem ajuda à polícia para
encontrar formas de gerir conflitos na escola, manter a disciplina nas salas de
aula e evitar agressões. E João Cunha, coordenador da equipa da Escola Segura
da 4.ª Divisão da PSP, em Lisboa, e que tem a seu cargo 116 escolas, contou à Lusa, a propósito do Dia Internacional da Não Violência e da Paz
nas Escolas, que “os professores estão aflitos e preocupados e necessitam
de aconselhamento sobre como agir”.
Assim, as equipas da PSP da Escola Segura realizaram, no
passado ano letivo, só na 4.ª divisão 164 ações sobre violência escolar, tendo
a maioria sido dirigida a crianças e jovens, mas há cada vez mais professores e
funcionários interessados no assunto. E o referido coordenador observa que as
sessões de esclarecimento com quem trabalha diariamente nas escolas são cada
vez mais procuradas e a polícia da Escola Segura tem vindo a ser abordada para “essa
dificuldade das escolas em exercerem a sua autoridade”.
Ainda na semana passada, esteve uma equipa na escola EB23
Paula Vicente a pedido da direção que pretendia saber como “prevenir futuras
ações”. Esta escola, que tem problemas que são do conhecimento da polícia, não
é uma exceção, pois o que se passa aqui repete-se um pouco por todo o país. Só
no ano letivo de 2017/2018, a PSP e a GNR registaram mais de seis mil
ocorrências em meio escolar. Em média, os agentes tiveram de se deslocar 17
vezes por dia a uma escola do país, segundo o último Relatório Anual de Segurança Interna, que revela uma diminuição de
registos. E, se o Ministério da Educação garante que há uma tendência de
redução dos casos de violência, a perceção de quem passa todo o dia na escola é
bem diferente.
Na Paula Vicente, por exemplo, até o diretor, que assumiu
funções apenas em setembro, já foi ameaçado por um encarregado de educação –
assinala o “educare.pt”.
As injúrias e ameaças são a terceira principal razão das
queixas à PSP e GNR. Em primeiro lugar aparecem as ameaças à integridade física
e depois o furto. Durante a predita sessão de esclarecimento, sucederam-se as
histórias de agressões entre alunos e de professores humilhados dentro da sala
de aula. A maioria dos casos relatados aconteceu longe dali, mas ninguém na
sala parece ficar admirado com a violência que existe no meio. Além dos casos
de professores agredidos e ameaçados por alunos, há docentes ameaçados por pais
porque deram más notas ao filho, porque o mandaram para a rua ou apenas porque
o repreenderam, como aconteceu com o diretor da escola.
Em setembro, um professor censurou um estudante por bater num
colega e, quatro meses depois, foi alvo de represálias. Em meados de janeiro,
um encarregado de educação simulou ter um problema no carro e pediu ajuda ao
diretor. Quando o mesmo professor passou os portões da escola, foi surpreendido
pelo encarregado de educação, que lhe disse: “Se voltas a ameaçar o meu filho, parto-te a cara toda”. Valeram-lhe
dois funcionários que acorreram em seu auxílio.
As agressões por parte de pais são cada vez mais frequentes,
como fica patente nos órgãos de comunicação social. E, para evitar que as
escolas se transformem em campos de batalha, o agente Antero Correia recorda
algumas regras de segurança básica que devem ser acauteladas. Sair da escola
para falar com encarregados de educação “não será a melhor opção”. Além disso,
o professor deve ter ao seu lado “sempre alguém presente e chamar [o
encarregado de educação] para a sua zona de conforto e zona segura” e “não sair
da sua zona segura”. Fazer queixa à Escola Segura é decisão aplaudida pelo
chefe da PSP, pois, como diz, “não
podemos deixar que os pais queiram mandar aqui”. E, havendo outras
situações que nunca chegam ao conhecimento das autoridades, João Cunha admite
que tem dificuldades em aceitar que as vítimas não façam queixa, porque, “se um
aluno insulta um professor na sala de aula, não se pode ficar por um processo
disciplinar”, pois “isso é crime e é dever do professor fazer uma denúncia, caso
contrário também poderá estar a incorrer no crime de ocultação”.
Professores agredidos, ameaçados e até expostos nas redes
sociais são casos que chegam diariamente ao conhecimento da polícia. Como se
pode ler no “educare.pt”, num email
da direção da referida escola enviado para o chefe da 4.º Divisão da PSP, os
professores apresentaram alguns cenários de problemas na sala de aula: “O aluno
começa por provocar o professor dentro da sala de aula. O que faz o
professor?”; “O aluno resiste a sair da sala de aula”… vai lendo João Cunha.
Para os agentes da Escola Segura, nada disto é novidade.
Aos cenários sugeridos no email, João Cunha acrescenta casos
reais muito mais violentos. Os agentes recordam umas fotografias “manipuladas
de uma professora dentro da sala de aula em atos sexuais”. As imagens
tornaram-se virais. E Antero Correia recorda que “aquilo estava mesmo bem
feito” de modo a haver dificuldade em conseguir repor a verdade.
E João Cunha, acrescentando que “o ano de 2019 foi atípico no
que toca à divulgação de imagens e sons dentro das salas de aulas”, deixou um
pedido:
“Não hesitem, não tenham medo. A classe de
professores não pode ter medo. Compete a cada um de nós exercer a autoridade
que cada um de nós tem.”.
João Cunha acredita que pode demorar, mas a “restituição da
autoridade vai acontecer”. E lembra que, até lá, “o aluno não pode ver medo nem fraqueza”.
***
Entretanto, o poder político bem podia fazer algo mais pelo
restabelecimento e reforço da autoridade do professor, que presta um serviço
público ao país, e não andar a dizer que a violência está a diminuir ou que e
caso isolado, o que não da para acreditar. A docência tem de ser revalorizada!
2020.01.31 – Louro de Carvalho
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