O Bloco de Esquerda (BE) foi a primeira formação partidária a anunciar que
não votaria a favor do OE2020, dizendo que não se revia minimamente na proposta
governamental, mas foi dizendo que a posição poderia evoluir consoante o que
viesse a ser negociado com o PS.
O PCP foi o primeiro partido a anunciar a
abstenção, dado o Governo ter manifestado alguma abertura para a melhoria da
proposta de lei e confiando em avanços em sede de discussão na especialidade na
Comissão de Orçamento e Finanças. A seguir, veio o PAN sustentado na mesma
lógica. E hoje, dia 9 de janeiro, veio o BE com a manifestação da sua posição
abstencionista, estribado na abertura do Governo para um aumento extraordinário
das pensões mais baixas e para o términus mais rápido das taxas moderadoras nos
Centros de Saúde.
Depois do PCP
e do PAN, o BE anunciou que vai abster-se na votação do Orçamento. O Bloco
junta-se, assim, ao PCP e ao PAN que anunciaram o mesmo sentido de voto, o que
significa que os votos favoráveis dos deputados do PS são suficientes para que
o documento seja aprovado na votação na generalidade a 10 de janeiro. Catarina
Martins anunciou que as pensões voltarão a ter aumento extraordinário em 2020 e
falou num “reforço ambicioso” do investimento no SNS (Serviço
Nacional de Saúde). Ao
todo são sete as garantias que o
BE leva de uma “negociação tardia”, como a classificou Catarina Martins.
A negociação
foi feita em “condições muito difíceis” e só terminou “esta manhã”, explicou a líder do BE, referindo que, “até
à última hora”, o BE acordou “medidas concretas e uma redação precisa” de um
pacote de medidas de respostas à emergência no setor da saúde, onde se inclui o
reforço, no Orçamento para o próximo ano, de 180 milhões de euros do
investimento em meios complementares de diagnóstico no SNS. Além disso, o BE
diz que da negociação com o PS saiu também a eliminação imediata das taxas moderadoras em cuidados de saúde primários,
já neste Orçamento, em vez da forma faseada como estava previsto na proposta
inicial do Executivo, medida que terá um impacto orçamental de 20 milhões de
euros. E a isenção vai estender-se aos meios complementares de diagnóstico a
partir de janeiro de 2021.
Neste pacote dirigido ao SNS, o
Governo aceitou ainda a proposta do BE para a criação de um regime de exclusividade, “de dedicação plena”
para trabalhadores e médicos. O modelo será aplicado de forma progressiva aos
coordenadores das Unidades de Saúde Familiar e aos diretores de Centros de
Responsabilidade Integrados. E também aceitou a criação de “equipas de saúde
mental na comunidade”, a “criação de internamento psiquiátrico nos hospitais
que não oferecem estas respostas”, que sejam dispensados fármacos
antipsicóticos nas consultas de especialidade hospitalar ou de medicina geral e
familiar.
No quadro de
outras medidas, além do SNS, o BE vangloria-se por ter obtido nova redução
das propinas no primeiro ciclo do
ensino superior, em 20%, com a propina máxima a cair de 871 euros para
697 euros. Segundo a Coordenadora do BE, a redução das propinas em 2020 terá um
impacto orçamental na ordem dos 50 milhões de euros.
Outra
garantia obtida pelo BE na negociação com Centeno foi o alargamento do Complemento Solidário para Idosos, com
a eliminação da ponderação nos 2.º e 3.º escalões de rendimento dos filhos para
definir o valor a atribuir. Esta medida custa 12 milhões de euros.
Quanto
ao aumento extraordinário das
pensões, a líder do BE explicou que também ficou acordado com o Governo
que vai acontecer em 2020 de forma “semelhante” e “em linha” com o que aconteceu na anterior legislatura, a
XIII, mas sem esclarecer o modelo concreto. No ano passado, este aumento até 10
euros para pensões até aos 653,6 euros e até 6 euros para os três escalões mais
baixos entrou em vigor logo em janeiro, mas em 2017 e 2018 chegou apenas no mês
de agosto. É caso que “está ainda em aberto”, disse Catarina Martins.
Também está
em aberto a discussão para as questões da energia e salários, disse a líder do
BE, em que “não houve acordo”. O partido tem-se batido pela redução do IVA da
luz e quer propor a redução generalizada do imposto e também a baixa dos custos
da energia por via das rendas excessivas. E, dizendo que o pacote de
medidas, agora acordado, só garante a viabilização da proposta na primeira
votação, assegurou não prescindir da
baixa dos custos da energia”, continuando este percurso na discussão na especialidade,
até porque “as medidas que estão
em aberto são questões fundamentais para o Bloco de Esquerda”. Ou
seja, deixa a pressão sobre o Governo na especialidade, para depois anunciar a
orientação do voto na votação final.
O Governo
tem, por agora, a garantia de que a primeira votação da sua proposta no
Parlamento será aprovada, ou seja, a aprovação do Orçamento na generalidade
será um facto. O BE já tinha anunciado que não votava a favor do Orçamento e
agora, sem surpresa, confirma que optará pela abstenção. PSD e Chega já
anunciaram que vão votar contra o Orçamento, o que também fará o CDS-PP, embora
os sociais-democratas não tenham os votos dos deputados da Madeira garantidos,
que podem abster-se também. Enfim, é um orçamento que passa pela via da
abstenção e à espera de contrapartidas em sede da discussão na especialidade.
***
Também no fim da manhã de hoje o PEV
(Partido Ecológico os Verdes) veio
manifestar publicamente a sua intenção de se abster na votação do OE na
generalidade. Assim, no dia em
que arrancou o debate na generalidade do documento, falta apenas conhecer-se,
em termos da esquerda, a intenção de voto do Livre, que com uma deputada única,
que pode não seguir a indicação do partido, não terá efeito nas contas finais
para a aprovação do Orçamento no dia 10.
Antes da posição do BE e, agora, do PEV, as
contas estavam a um deputado de distância
para a aprovação da lei do Orçamento do Estado, na generalidade. A conferência
de imprensa dos Verdes até sofreu uns ajustes no horário, não fosse coincidir
com a hora a que o BE anunciava o seu sentido de voto. Mas o partido que vai a
eleições coligado com o PCP acabou por revelar que iria abster-se também, sem
grandes surpresas, mas depois dos outros, incluindo o BE. E também tal como com os outros
partidos, houve o anúncio e um aviso. O deputado José Luís Ferreira frisou que “a abstenção na generalidade em nada
compromete o sentido de voto dos Verdes na votação final global do Orçamento do
Estado”. Para o PEV a abstenção equivale a “uma oportunidade para o PS poder refletir e perceber as reais
necessidades do país e dos portugueses”.
Por outro
lado o PEV será mais um partido a sentar-se no debate com o PS e o Governo
aquando da discussão parlamentar na especialidade com um caderno de exigências
que espera ser atendido: combate às alterações climáticas; combate às
assimetrias regionais; maior investimento nos transportes públicos; e maior
justiça fiscal. São os 4 eixos destacados pelo líder parlamentar dos Verdes que
ainda não viram o Governo incluir no Orçamento do Estado nenhuma das suas
propostas em concreto, mas apenas “umas migalhas”. E diz o deputado:
“No
Orçamento do Estado, o Governo teve em conta migalhas do que são as nossas
pretensões. Na eficiência
energética, no reforço de verbas para agricultura biológica, na proteção da
floresta, por exemplo, mas em relação ao conjunto das propostas que vamos
apresentar em sede de especialidade, nada.”.
José Luís
Ferreira reiterou que este é um “orçamento de continuidade na forma como o Governo
olha para as contas do défice”. E disse:
“Havendo margem para uma real valorização dos salários e pensões; para o
investimento nos serviços públicos; para encarar de frente o desafio ambiental,
o PS prefere fazer bonito a Bruxelas em vez de dar resposta aos problemas do
país”.
***
Na abertura do debate na generalidade do OE2020,
o Chefe do Governo defendeu que este orçamento é o melhor dos cinco
apresentados. António
Costa defendeu que o Governo está aberto ao diálogo para melhorar o Orçamento
do Estado para 2020, mas sinaliza que não dará tudo
agora e que há um caminho de uma legislatura para o qual pede estabilidade
política.
O Primeiro-Ministro explicou que este Orçamento “vai além da reposição de
rendimentos”, “da recuperação dos cortes no investimento”, da “reversão do
enorme aumento de impostos” e “da redução do défice”. E, depois, falou para os
partidos à esquerda, avisando que, apesar da disponibilidade para melhorar o
Orçamento em sede de especialidade, BE, PCP, PEV e PAN não deverão esperar
conseguir tudo o que querem já este ano, pois é muito importante que todos
compreendam que “este é apenas o primeiro Orçamento da nova legislatura”; é o começo, e não o fim, de um novo ciclo”.
***
Resta saber até onde o Governo cede às esquerdas e até que ponto estas se
ficam para manterem, pelo menos, a abstenção na votação final global. De que o
orçamento é um instrumento fundamental da governação não há dúvida. Que temos
necessidades cuja colmatação não pode esperar é um facto e que temos
compromissos internacionais que podem esperar mais um pouquito é justo que a UE
o entenda e aposte mais na solidariedade para com os pequenos em nome da paz e
do desenvolvimento.
Quanto ao mais, importa que o eleitorado se prepare para confirmar ou
corrigir a sua votação em eleições legislativas em 2023 ou antes se os nossos
representantes se desentenderem. E que não se refugiem na abstenção, a arma da
comodidade!
2020.01.09 –
Louro de Carvalho
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