terça-feira, 21 de março de 2017

Um programa de peregrino…

O Papa Francisco virá a Fátima a 12 e 13 de maio como peregrino. Embora estejam previstos, em lugares e horas acertados, encontros com o Presidente da República e com o Primeiro-Ministro, a visita de Sua Santidade (dada a idiossincrasia deste Papa, parece nem soar bem este tratamento, mas é-lhe devido como aos demais) não assume a configuração duma visita de Estado. Para sermos mais claros, Francisco estará em Fátima com os peregrinos e não com a autoridade que lhe advém da sucessão petrina – sem alguma vez se esquecer de que é o sucessor de Pedro e confirma os irmãos na fé – nem revestido do poder que lhe conferem a tradição eclesiástica medieval e renascentista ou o Tratado de Latrão.
Além disso, os preditos encontros revestem um caráter privado. Não obstante, desde que o Pontífice, embarcado no Aeroporto de Fiumicino, em Roma, chegue à Base Aérea de Monte Real, às 16 horas e 20 minutos do dia 12 de maio, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, assumir-se-á por inteiro como o anfitrião do Santo Padre, papel que desempenhará até ao momento em que o ilustre peregrino levante voo a partir de Monte Real, pelas 15 horas do dia 13, em avião da TAP, com destino ao Aeroporto de Ciampino, em Roma.
Depois da aterragem na referida Base Aérea, ocorrerá a cerimónia de boas-vindas, a que se seguirá o encontro privado, de 20 minutos, com o Chefe de Estado e a visita à capela da Base, onde há 50 anos rezou (a 13 de maio) Paulo VI, que rumou a Fátima como peregrino da Paz, e João Paulo II, a 12 de maio de 1991, regressando da viagem às regiões autónomas dos Açores e da Madeira e rumando a Fátima.
O programa da viagem – viagem que responde aos convites da Conferência Episcopal Portuguesa e do Estado Português, entregues respetivamente pelo bispo de Leiria-Fátima, Dom António Marto, e pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa – foi divulgado a 20 de março pela Sala de Imprensa da Santa Sé e replicado, quer pelo Santuário de Fátima quer pela Comunicação Social Portuguesa.
Após os atos previstos para Monte Real, o Papa deslocar-se-á, em helicóptero da Força Aérea Portuguesa, para o Estádio de Fátima, que servirá de heliporto, e do Estádio deslocar-se-á em carro aberto até ao Santuário, para que os circunstantes possam, ao longo da jornada, ver e saudar o Sumo Pontífice e este mostrar alguns de seus gestos típicos.
Prevê-se a visita papal à Capelinha das Aparições pelas 18 horas e 15 minutos, onde o Pontífice terá um momento de oração. E, depois do necessário o tempo de repouso e refeição (também aspetos inerentes à condição de peregrino), as 21 horas e meia oferecerão a oportunidade da bênção das velas a partir da Capelinha das Aparições, a saudação do Santo Padre e a recitação do Santo Rosário.
O dia 13 iniciar-se-á com um encontro privado, de cerca de meia hora, com o Primeiro-Ministro, António Costa, pelas 9 horas e 10 minutos, na Casa de Retiros Nossa Senhora do Carmo, seguido da visita à Basílica de Nossa Senhora do Rosário de Fátima, onde se encontram os túmulos dos três pastorinhos: Francisco, Jacinta e Lúcia. E, pelas 10 horas, celebrar-se-á a Santa Missa no Altar Recinto de Oração, com a homilia do Santo Padre e a bênção e saudação aos doentes – a celebração mais marcante da peregrinação aniversária.
O último ato oficial do programa será o almoço com os bispos portugueses no dia 13 na Casa de Retiros Nossa Senhora do Carmo, devendo o protocolo do Estado prover ao acolhimento dos Chefes de Estado que, na ocasião, estiverem em Portugal, na sequência do repto lançado por Marcelo na cimeira ibero-americana e na da CPLP.
Duas horas depois, o Papa estará de volta à Base Aérea de Monte Real, donde partirá em avião da TAP rumo a Roma após a cerimónia de despedida, estando a chegada a Roma prevista para as 19 horas e 5 minutos, hora de Roma.
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Francisco será o 4.º Papa a peregrinar para Fátima e, obviamente, o 4.º Papa a visitar Portugal. Porém, o mais assíduo visitante de Portugal e de Fátima foi São João Paulo II: esteve quatro vezes em Portugal, sendo que uma consistiu numa escala técnica no Aeroporto de Lisboa, onde falou aos portugueses, e três vezes em Fátima.
Paulo VI, como confidenciou no discurso que proferiu perante o Chefe de Estado em Monte Real, veio, por ocasião do cinquentenário, “render homenagem filial à excelsa Mãe de Deus, na Cova de Iria” e “suplicar a Nossa Senhora de Fátima que faça reinar na Igreja e no mundo o inestimável bem da paz”, bem como pedir a “Nossa Senhora de Fátima se digne derramar sobre Portugal católico as mais copiosas graças de bem-estar espiritual e material, de prosperidade, de progresso e de paz”. Não é de somenos sublinhar, para aquele tempo, o segmento discursivo transcrito em itálico!
João Paulo II veio, no aniversário do atentado que sofreu na Praça de São Pedro, com esta mística, referida à chegada a Portugal: “Em direção a Fátima ou no retorno de Fátima, levo no coração o cântico de ação de graças de Nossa Senhora, por Deus me ter salvado a vida, aquando do atentado sofrido, a 13 de Maio do ano passado; assim, em atitude adoradora, vou repetindo: “A minha alma glorifica o Senhor / e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador” (Lc 1,47).
Voltou, 10 anos depois, a Fátima para “agradecer a Nossa Senhora a proteção dada à Igreja nestes anos, que registaram rápidas e profundas transformações sociais, permitindo abrirem-se novas esperanças para vários povos oprimidos por ideologias ateias que impediam a prática da sua fé”, bem como para “renovar a minha gratidão pela especial proteção da Virgem Mãe que me salvou a vida no atentado de há dez anos, mais precisamente em 13 de maio de 1981 na Praça de São Pedro”. E expressou o desejo de que em Portugal todos me sintam próximo de suas pessoas e vida, como mensageiro da Boa Nova da Salvação e do Amor de Deus”.
E, no ano 2000, veio celebrar a beatificação dos videntes Jacinta e Francisco e, sem que a opinião pública estivesse a contar, acabou por induzir a revelação e interpretação teológica da terceira parte do Segredo de Fátima.
Por seu turno, Bento XVI veio a Portugal “como peregrino de Nossa Senhora de Fátima, investido pelo Alto na missão de confirmar os meus irmãos que avançam na sua peregrinação a caminho do Céu”. Ao mesmo tempo, não esqueceu de vir afirmar que, “situada na história, a Igreja está aberta a colaborar com quem não marginaliza nem privatiza a essencial consideração do sentido humano da vida”. E, lembrando o centenário da viragem republicana, declarou:
“Não se trata de um confronto ético entre um sistema laico e um sistema religioso, mas de uma questão de sentido à qual se entrega a própria liberdade. O que divide é o valor dado à problemática do sentido e a sua implicação na vida pública. A viragem republicana, operada há cem anos em Portugal, abriu, na distinção entre Igreja e Estado, um espaço novo de liberdade para a Igreja, que as duas Concordatas de 1940 e 2004  formalizariam, em contextos culturais e perspetivas eclesiais bem demarcados por rápida mudança.
Mas sublinhou que “os sofrimentos causados pelas mutações foram enfrentados geralmente com coragem” e na convicção de que “viver na pluralidade de sistemas de valores e de quadros éticos exige uma viagem ao centro de si mesmo e ao cerne do cristianismo para reforçar a qualidade do testemunho até à santidade, inventar caminhos de missão até à radicalidade do martírio”.
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Resta-nos estar atentos a ver o que o Papa Francisco vem dizer e fazer. Para já, sabemos que, a 7 de setembro de 2015, no seu encontro com os bispos de Portugal durante a visita “ad Limina”, Francisco transmitiu-lhes o “desejo profundo” de visitar Fátima. E, em 29 de setembro de 2016, a Rádio Renascença recolhia declarações do Cardeal Patriarca e Presidente da CEP, Dom Manuel Clemente, do Bispo Auxiliar do Patriarcado, Dom Nuno Brás (que acentuava a alegria com que o Papa o terá dito), e do Bispo de Leiria-Fátima – todas no sentido de que o Papa viria a Portugal no âmbito do centenário, mas só a Fátima.
Entretanto, o Santuário de Fátima divulgou o site e o logótipo da vinda do Papa, que veio a ser assumido pelo Vaticano, em que surge a figura de Francisco e a legenda “Com Maria Peregrino na esperança e na paz”.
Por isso, temos de prestar toda a atenção às declarações que houver por bem fazer e, em especial, nesses dias 12 e 13 de maio, que o crente, o português e devoto de Maria espera com esperançosa ansiedade. Certamente que a palavra de Francisco proferida em Fátima será semente que terá, parafraseando Carvalho Rodrigues, o condão de se globalizar e tornar-se planetária e cósmica, porque será palavra seminal produzida no solar da Mãe de Deus (cf Carvalho Rodrigues em vídeo “Vozes do Centenário”, 13 de maio).

2017.03.21 – Louro de Carvalho  

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