domingo, 19 de março de 2017

Interação entre as Igrejas Cristãs – postulado dos sinais dos tempos

A 26 de fevereiro, soube-se do convite feito por três bispos de diferentes Confissões cristãs ao Papa Francisco para que visite o Sudão do Sul, solicitando que “não venha sozinho, venha com o Arcebispo de Cantuária”. Foi o próprio Pontífice que o revelou, e nestes termos, durante a sua visita à paróquia anglicana de Todos os Santos nesse dia de domingo.
A concretizar-se, não será a primeira viagem papal a um país africano em guerra, pois, em novembro de 2015, visitou a República Centro-Africana, marcada pela índole ecuménica e de diálogo inter-religioso, abrindo caminho para uma possível solução do conflito. E não será a sua primeira viagem ecuménica e de diálogo inter-religioso, já que realizou duas viagens inteiramente ecuménicas: à Terra Santa (a 23 e 24 de maio de 2014), acompanhado pelo Patriarca Ecuménico Bartolomeu I: e à Ilha de Lesbos (a 16 de abril de 2016), com Bartolomeu I e Hyeronimos (o Arcebispo ortodoxo de Atenas e de toda a Grécia), ao encontro de milhares de refugiados que fogem das guerras, da perseguição e da fome. Por outro lado, o ecumenismo e o diálogo inter-religioso estiveram na ordem do dia nas viagens à Arménia, Geórgia e Azerbaijão. Porém, a visita em estudo ao Sudão do Sul, com o Primaz da Comunhão Anglicana, Justin Welby, salienta e amplifica a perspetiva do percurso indispensável e irreversível que as Igrejas cristãs encetaram e desenvolvem, conscientes de que esta interação é exigência dos sinais dos tempos. E, tendo em consta a crítica situação do mundo atual, ficará cada vez mais premente nas viagens apostólicas do Santo Padre a escolha de um responsável pelo ecumenismo pastoral para as integrar.
Com efeito, Francisco tem ressaltado, em diversas ocasiões, que o trabalho conjunto e de cooperação entre as diversas Confissões cristãs, para obviar às emergências do nosso tempo, não pode esperar pelos entendimentos no campo teológico, de mais difícil resolução. Neste sentido, adquiriu significativa relevância o encontro com os luteranos na Suécia, onde após o tempo de oração na Catedral, os líderes das duas religiões seguiram juntos para a Arena de Malmö, para fazer ressaltar a importância do trabalho conjunto em torno dos temas urgentes da humanidade. No último encontro pela paz, em Assis, ficou mais evidente que o compromisso e o serviço comum das Igrejas cristãs e dos seus responsáveis exigem testemunhos eloquentes como fermento para favorecer a justiça, a fraternidade e a paz dos povos. E no atinente à relação entre católicos e anglicanos, a declaração comum firmada, em 5 de outubro de 2016, em Roma, pelo Papa Francisco e pelo Primaz da Igreja Anglicana, responde plenamente às motivações da possível visita comum ao Sudão do Sul, como se pode ler no texto da declaração:
“Em uma cultura do ódio, assistimos a indizíveis atos de violência, frequentemente justificados por uma compreensão distorcida do credo religioso. A nossa fé cristã leva-nos a reconhecer o inestimável valor de cada vida humana e a honrá-la por meio de obras de misericórdia...sempre buscando resolver os conflitos e de construir a paz. Enquanto discípulos de Cristo, consideramos a pessoa humana sagrada e, enquanto apóstolos de Cristo, devemos ser os seus advogados.”.
***
Entretanto, soube-se que tem estado em fase de estudo uma eventual “viagem- relâmpago” à conturbada região do Oriente Médio, em especial ao Egito, que tem assistido a um recrudescimento nos ataques contra a comunidade cristã copta e onde se pode falar de um autêntico martírio de cristãos.
A ideia da viagem não é recente nem descola do contexto de outras realizações. Na verdade, a fina flor do centro teológico sunita e o Sumo Pontífice encontraram-se no Vaticano em 23 de maio de 2016, assinalando um novo tempo no diálogo entre a Igreja Católica e o Islão. Do guião do encontro, constavam o empenho comum das autoridades e dos fiéis das grandes religiões, em prol da paz no mundo, a rejeição da violência e do terrorismo e a situação dos cristãos no contexto dos conflitos e das tensões no Oriente Médio, bem como a sua proteção. E, a 6 de fevereiro de 2017, o Patriarca Ibrahim Isaac Sedrak e os bispos da Igreja Patriarcal de Alexandria dos coptas, em visita ad limina apostolorum, convidaram formalmente o Papa para visitar o país. O convite dos prelados chegou após o convite do Presidente da República Abdel Fattah Al Sisi, recebido em audiência papal, em 24 de novembro de 2014, e  também de Ahmed el-Tayyb, o Grão Imame de Al-Azhar.
Depois, nos dias 22 e 23 de fevereiro, decorreu um encontro realizado na cidade do Cairo, onde, em Simpósio promovido pelo Centro para o Diálogo da Universidade de Al-Azhar e pelo Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso, se debateram formas de enfrentar o terrorismo religioso. E, no final do encontro, foi divulgado um comunicado e o comentário do Cardeal Jean-Louis Tauran, Presidente do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso, nos termos seguintes:
“Deliberadamente falámos sobre o que gostaríamos de fazer juntos hoje e amanhã e acredito que seja importante, pois esta é a ‘concretude’. Nós estivemos de acordo em avaliar a gravidade da situação de violência e também a necessidade de transmitir valores às jovens gerações. Buscamos, juntos, as causas da violência: todos estamos de acordo, todos – sobretudo os muçulmanos – em afirmar que não é lícito invocar a religião para justificar a violência”.”.
E, apontando a perspetiva de futuro, declarou:
“Devemos continuar por este caminho: quanto mais a violência aumenta – e é grave – mais é necessário multiplicar este tipo de encontros. Encontros como este que se realizaram são realmente presentes que se fazem à humanidade, porque demonstram a possibilidade de trabalharmos juntos. O que, pelo contrário, querem os terroristas é demonstrar que não é possível trabalhar juntos, com os muçulmanos; nós afirmamos o contrário.”.
***
E, como corolário deste percurso e sinal do que se espera que aconteça no futuro, foi hoje, dia 18 de março, anunciado pela Sala de Imprensa da Santa Sé que o Papa Francisco fará uma visita apostólica ao Egito nos dias 28 e 29 do próximo mês de abril.
Assim, não é a vinda do Papa a Fátima a sua 18.ª viagem fora de Itália, como assegurava o nosso Presidente da República (será a 19.ª, se outros planos não surgirem), mas a viagem ao Egito. 
A notícia desta visita-relâmpago do Papa ao Egito, cujo programa será definido muito em breve, é motivo de grande alegria neste país norte-africano, sobretudo para a comunidade copta católica, como disse à Rádio Vaticano, o bispo emérito de Giza, Dom Antonios Aziz Mina:
“A visita do Papa é uma bênção para nós, para a Igreja e para todo o povo egípcio, que o acolhe com grande prazer. Ficamos alegres por Francisco ter acolhido o nosso desejo e por vir abençoar a nossa terra. É uma visita que nos recorda a de João Paulo II no ano 2000, no ano do Jubileu [do milénio].”.
Sobre os sofrimentos do povo egípcio, o prelado emérito refere:
“Toda a região tem passado por situação de duras provações e a presença dos cristãos é sempre um testemunho da cruz. Nós, agora, neste tempo da Quaresma, vivemos com participação o mistério da espera, da alegria da Páscoa.”.
No atinente à situação dos cristãos no Egito, sustenta:
“É a mesma de todos os egípcios. Acabamos de sair de uma situação difícil... Após as duas revoluções, estamos procurando reerguer-nos. Precisamos que o mundo inteiro nos ajude e nos apoie e, como cristãos, vivemos um momento muito propício e bom para a liberdade de culto e para a liberdade de religião.”.
Quanto ao risco do terrorismo no Egito, propõe:
“O terrorismo deve ser combatido sobretudo com a força do pensamento, com a cultura e com o amor, a paz, a convivência, a igualdade dos direitos para todo cidadão na terra onde mora”.
E, porfiando a gratidão dos egípcios ao Santo Padre, refere que, uma vez que “o Papa é a única força no mundo que, quando fala, fala em defesa dos direitos do homem e os direitos dos povos em nome de Jesus, em nome de Deus”, a mensagem principal que se espera do Papa é o incentivo à busca da assunção dessa cultura de paz entre os povos da região.
***
Também, contra o que se pensava no sentido de que este 5.º ano do pontificado de Francisco ficaria vazio em viagens apostólicas fora de Itália, a Vice-diretora da Sala de Imprensa da Santa Sé, Paloma Garcia Ovejero, anunciou, no passado dia 10 de março, a visita do Papa Francisco à Colômbia de 6 a 11 de setembro próximo, passando pelas cidades de Bogotá Villavicencio, Medellín e Cartagena.
A viagem, cujo programa será publicado proximamente, constitui a resposta papal ao convite do Presidente e dos bispos colombianos, não querendo os bispos a sua instrumentalização política.
Ao mesmo tempo que era anunciada a viagem no Vaticano, realizava-se, em Bogotá, uma conferência de imprensa onde foi apresentado o logótipo da viagem do Papa, cuja frase emblemática é “Dêmos o primeiro passo”. E o texto que acompanha o logótipo da viagem sublinha que o país “viveu o conflito armado mais longo da América Latina”.
Com efeito, estes mais de 50 anos de violência marcaram muito profundamente o coração duma sociedade que “anseia reconstruir-se, curando as feridas que lhe causaram somente dor, indiferente diante da violência e distante das lágrimas”. Tendo os colombianos aprendido a “conviver com a violência”, que aceitaram e justificaram durante muito tempo, a dor tornou-se parte da história da Colômbia e permeou “o coração de milhões de cidadãos”. Muitos perderam os laços que uniram os colombianos. Separaram-se como nação, sentaram-se “em bancos diferentes” e olvidaram o diálogo e a escuta ao próximo.
O problema não foi exclusivamente a guerra, mas “os 50 anos de motivos que apagaram de nossos corações os valores da paz e da unidade”; e a violência instalou-se como forma de vida. Deixaram “a outros a tarefa de construir um país” e não entenderam que “a construção da paz” sempre esteve nas mãos dos cidadãos colombianos – “construída em espaços pequenos, nas mesas na hora de partilhar uma refeição, nas esquinas dos bairros, na maneira como dialogamos com o nosso próximo, na forma como cuidamos dos nossos filhos e como respeitamos os nossos pais”. Por isso, o texto sustenta:
“A vinda do Santo Padre à Colômbia é um convite para que, como colombianos, nos vejamos com esperança e possamos dar o primeiro passo para: reconhecer o sofrimento dos outros, perdoar àqueles que nos feriram, voltar a encontrar-nos como colombianos, entender a dor dos que sofreram, curar o nosso coração, descobrir o país que se esconde atrás das montanhas e construir a nação que sempre sonhamos: um país em paz. É um convite do Papa Francisco a ir para as ruas a fim de estar ao lado dos colombianos na construção da paz. ‘Quero que a Igreja vá para as ruas, a paz constrói-se caminhando’.”. 
A visita é apresentada com a imagem do Papa “caminhando a fim de construir um símbolo de ação, dar o passo e começar a construir e sonhar, pois toda a mudança começa pela conversão do coração (indivíduo) e precisa dum momento para nos voltarmos a encontrar” (coletivo). É um momento para “nos descobrirmos como nação”. Por isso, “hoje, temos de semear a esperança em nossos corações, a bondade em nossas ações, a paz em nossas palavras e o amor em nosso país para que desta forma a vinda do Santo Padre seja um ponto de partida para começar algo novo”. (texto respigado com supressões e adaptações de Rádio Vaticana, em português do Brasil, 10.03.2017).
Vem animar a ação pastoral, a aproximação ao Senhor e renovar a nossa fé cristã – afirmou o Arcebispo Octavio Ruiz, Secretário do Pontifício Conselho para a Nova Evangelização, acrescentando que Francisco visitará uma prisão, como normalmente faz em suas viagens.

2017.03.18 – Louro de Carvalho

Sem comentários:

Enviar um comentário