O núcleo de alunos da Faculdade de
Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da
Universidade Nova de Lisboa ligado à associação Nova Portugalidade organizou uma conferência, para o dia 7 de março
pp., subordinada ao título “Populismo ou
Democracia? O Brexit, Trump e Le Pen em debate”, cujo conferencista
convidado seria o politólogo Jaime Nogueira Pinto.
Entretanto, a Associação de
Estudantes decidiu boicotar a predita conferência, por considerar os
organizadores da conferência – o grupo Nova
Portugalidade – nacionalistas e colonialistas, e a direção da Faculdade
cancelou-a alegando razões de segurança, ou eufemisticamente, por “ausência das
indispensáveis condições de normalidade”.
O escritor, politólogo, empresário e antigo professor do ISCSP critica o “espírito tacanho e
totalitário” de quem diz defender a liberdade, ou melhor, ser porta-voz da
democracia e da liberdade. Por outro lado, garante que não sofreu “ameaça
nenhuma” por causa da conferência onde ia falar sobre “Populismo ou Democracia? O Brexit, Trump e Le Pen em debate”. E disse
à Rádio Renascença:
“A direção da Associação decidiu boicotar a
conferência e a direção da Faculdade achou mais prudente não realizar a
conferência. Não me incomodava nada porque, primeiro, não recebi ameaças nenhumas
e mesmo com ameaças iria fazer a conferência na mesma.”.
Ao facto do cancelamento da
conferência o eurodeputado Francisco Assis e o jurista João Taborda da Gama
reagiram com repúdio.
Assis classifica este ato como “um
ato de censura” e acha gravíssima, “ não apenas a posição da associação de
estudantes” (“aí ainda
poderemos ter em conta a sua juventude” – admite), mas também a postura da direção da Faculdade ao
tomar “uma posição desta natureza”. Mais: além de constituir um ato de censura,
“é ainda mais grave porque se passa no interior de uma universidade”, sendo
“absolutamente inadmissível” e “não enquadrável num Estado de Direito
democrático, como é o caso de Portugal”.
Por seu turno, João Taborda da Gama,
comentador diário no programa Carla Rocha – Manhã da Renascença, ao lado de
Francisco Assis, diz tratar-se de um “ato abjeto”, decorrente de uma “tentativa
de pensamento único, que tem mais de único do que de pensamento”. E explicita:
“Não conheço pessoalmente o Dr. Jaime
Nogueira Pinto, mas deve estar bastante divertido por, com esta idade, ser
vítima da censura de esquerda em 2017. Por esta não esperaria e deve estar a
achar alguma piada, porque isto também tem de ser visto com algum espírito de
humor, embora seja um ato abjeto.”.
Taborda da Gama afirma ansiar por
“Ver
qual vai ser a posição oficial da reitoria da Universidade Nova” e espera “que
rapidamente seja reposta a justiça e a universidade faça jus ao seu nome e à
sua essência”.
Já a Associação 25 de Abril veio a liça a manifestar o seu repúdio pelo cancelamento
da conferência na FCSH da
Universidade Nova de Lisboa com o politólogo Nogueira Pinto e disponibilizou as
suas instalações para a realização do encontro, se ele assim o entender.
O Presidente da Associação, Vasco
Lourenço, refere que as suas ideias são muito diferentes das que defende Jaime Nogueira
Pinto, mas a liberdade de expressão está acima de tudo. E explica:
“É mais que conhecido que as nossas
posições políticas e as minhas, pessoalmente, não são as mesmas do Professor
Jaime Nogueira Pinto, mas isso não implica que, acima de tudo, não defendamos
as liberdades, neste caso a liberdade de expressão. E foi isso que a Associação
25 de Abril fez.”.
Para o conhecido capitão de Abril, “não
é normal que haja coarctada a liberdade de expressão ou qualquer outra” no
Portugal abrilino.
Por sua vez, a Associação de estudantes da FCSH da Universidade Nova, alegou “cumprimento estatutário”,
esclarecendo que o pedido de cancelamento da conferência de
Jaime Nogueira Pinto surgiu na sequência de uma moção à qual a associação ficou
vinculada. Assim, um comunicado da Associação divulgado na rede social Facebook
refere:
“Queremos deixar bem claro que esta
questão não se prende com um silenciamento de divergências políticas nem com um
ataque a qualquer orador convidado, mas sim com um cumprimento estatutário à qual
a AEFCSH está vinculada”.
Na verdade,
em 2 de março, foi apresentada, discutida e aprovada em Reunião Geral de
Alunos/as (RGA) uma moção que defendia o cancelamento da conferência. Para tanto,
a direção da teria de cancelar a reserva da sala para o evento organizado pelo
grupo Nova Portugalidade.
Na moção aprovada, os alunos
proponentes afirmavam que
“O
evento está associado a argumentos colonialistas, racistas, xenófobos que
entram em colisão com o programa para o qual a associação foi eleita, além de
entrar em colisão com a mais básica democraticidade e inclusividade”.
Então, se isto não é censura e
silenciamento, o que é? Hipocrisia? Status
quo?
***
O Ministro do Ensino Superior revelou
ter entrado em contacto telefónico, no próprio dia 7 de março, com do reitor da
Universidade Nova de Lisboa (UNL) para pedir
garantias de que o cancelamento da conferência com Jaime Nogueira Pinto não
coloca em causa o direito à liberdade de expressão (Então não causou?) – revelação prestada pelo Ministro
Manuel Heitor no Parlamento, no decurso de uma audição na comissão parlamentar
de Educação e Ciência, depois de questionado pela deputada do PSD Nilza de Sena
sobre o cancelamento da conferência.
Na interpelação ao Ministro, Nilza de
Sena manifestou-se “muito preocupada” por “num país livre” se impedir o “livre
pensamento, livres ideias, não seguidistas, contrárias ao pensamento dominante”
e de se colocarem “rótulos às pessoas”, apelidando-os de perigosas. E a
deputada socialdemocrata ironizou e sustentou:
“A liberdade de expressão é só para as
ideias conformes. Isto é uma clara manifestação de intolerância política e
censura à voz de quem não é um 'aparatchik' da esquerda radical, pelo
contrário, e se torna inconveniente aos ditames de quem está. Mas não é um bom
sinal, e é muito pior quando vem de gente jovem.”.
Manuel
Heitor, questionado sobre a sua posição face a este cancelamento, respondeu de
forma evasiva, dizendo estar certo que o ensino superior português “é hoje um
ensino digno, responsável, que se adequou ao estado democrático”.
Também o
Presidente da República falava aos jornalistas no final de uma visita à
Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), em Lisboa, disse esperar um esclarecimento sobre o cancelamento da
conferência do politólogo Jaime Nogueira Pinto pela FCSH da Universidade Nova,
considerando-o incompreensível. A este respeito, declarou aos jornalistas:
“O
Presidente da República é o guardião dos direitos constitucionais, entre eles a
liberdade de expressão. Por isso, para mim é incompreensível uma decisão
daquelas por parte de uma instituição pública, como é uma faculdade pública.”.
E acrescentou:
“Eu espero
um esclarecimento, e também os efeitos decorrentes de uma decisão dessas”.
Questionado
sobre os efeitos que espera, respondeu:
“Para já,
tentar perceber a razão de ser de uma decisão tão absurda no quadro de uma
democracia”.
O Chefe de
Estado salientou “o contraste entre essa posição de uma instituição pública e a
posição de uma instituição privada como a Associação
25 de Abril”, que disponibilizou as suas instalações para a realização da
conferência que estava prevista para a FCSH.
Segundo
Marcelo, a Associação 25 de Abril “teve
a atitude exatamente oposta” à da FCSH, “lembrando-se do que significou o 25 de
Abril” de 1974, “feito precisamente para consagrar a liberdade e a democracia”.
Por isso, questionou “como foi possível” a FCSH tomar aquela decisão. E frisou:
“Eu não
entendo como é que um responsável de uma instituição pública toma uma decisão
daquelas”.
O reitor da Universidade Nova de
Lisboa já veio a terreiro dizer que não comenta as declarações do Presidente da
República, que viera classificar de “incompreensível” o cancelamento da
conferência de Nogueira Pinto. Porém, António Rendas rejeita a ideia de que a
liberdade de expressão esteja em causa na instituição (Então não esteve?) e garante que não existiu qualquer
tipo de tentativa de censura a Jaime Nogueira Pinto (não lhe cortaram trechos de textos…). E explicou-se:
“O Professor Jaime Nogueira Pinto
merece-me a maior consideração. Não tendo eu falado com ele diretamente, já
houve contactos e ele já aceitou participar num debate sobre o mesmo tema, que
é muito importante, que será organizado dentro das próximas semanas, num clima
sereno, de abertura ao diálogo e plural, que eu acho que é muito mais útil
neste contexto do que qualquer opinião. Eu não tenho nenhuma censura nem acho
que isso faça algum sentido.”.
Relativamente
à interpelação que o Ministro lhe fizera, o reitor disse ter-lhe garantido que
a Universidade preserva e cultiva a cultura de liberdade de expressão e reforça
a ideia de que a conferência foi adiada para mais tarde (tive colegas que não ficavam
reprovados, mas adiados),
aduzindo:
“Eu tive informação deste processo há
cerca de 48 horas. Já mobilizei um conjunto de pessoas, estou, como é lógico, empenhado
– porque é essa a nossa cultura – em que esta possa ser uma situação natural
dentro da universidade para o futuro. O que o ministro disse no Parlamento foi
que falou comigo e eu transmiti-lhe que, em relação à liberdade de expressão, a
Universidade Nova de Lisboa é o garante que essa cultura existe na Universidade
e que faz parte da nossa forma de estar.”.
***
O caso faz-me recordar, por contraste,
o que se passa em Londres. Em nome da liberdade, a conquista mais valiosa do Reino Unido, há quase 200 anos, quem vive na
Inglaterra conquistou o direito de se expressar livremente no Hyde Park, no centro
de Londres. É o Speaker’s Corner.
As pessoas vão para lá, sobem um caixote, um banquinho, uma cadeira e
começam a falar, dando sua opinião. E, quase sempre, do outro lado, surge uma
outra pessoa com uma opinião completamente diferente. É a liberdade, o direito
que o cidadão tem de falar, de se expressar, de opinar.
Contam que um grupo de turistas portugueses escutava um orador a verberar o
Governo e a própria Família Real. Surgiu a polícia e os turistas pensavam que seria
para mandar calar o homem. Não, era simplesmente para garantir que ninguém o
importunaria por deixar a sua opinião. Grande exemplo!
Foi mau, muito mau que Nogueira Pinto não tenha podido usar da palavra no tempo
e lugar e a convite dos organizadores. Nem sempre as deliberações da maioria
são legítimas, sobretudo quando se trata de opinar. Opinar deve ser livre, o
que não quer dizer que leve a deliberação ou decisão em conformidade. Por isso,
fez muito bem a Associação 25 de Abril
em repudiar o facto e disponibilizar as suas instalações para a conferência.
Já o reitor respondeu “nim” ao caso. Que meios tem ao seu dispor para
garantir a liberdade de pensamento e de expressão na sua Universidade se um
evento destes borregou por “rotulagem”? Não têm as escolas superiores homens de
segurança encarregados de manter a ordem nos espaços afetos à Universidade? Como
vai garantir a conferência noutro momento, como prometeu?
E o Presidente da República, que é o garante de tudo, de que meios dispõe para
garantir a liberdade de expressão? Só com declarações públicas? Tem uma guarda
pretoriana?
Mas populismo,
democracia, Brexit Trump e Le Pen precisam de ser discutidos: em tese e por
urgência! Faça-se o debate quanto antes. Venham daí Nogueira Pinto, Adelino Maltez,
Costa Pinto e todos os entendidos!
2017.03.08
– Louro de Carvalho
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