quarta-feira, 15 de março de 2017

O Banco de Portugal vai perder competências!

Não é assim um drama tão grande como alguns o pintam como se fosse o apoderamento do sistema financeiro por parte da esquerda que influencia hoje o exercício do poder.
Segundo o “Dinheiro Vivo”, o Banco de Portugal (BdP) vai perder a competência para resolver casos extremos na banca, como foram os do BES e do Banif, e a supervisão macroprudencial.
São dois dos 13 poderes que detém atualmente. Mas ninguém alimente esperanças de contenção ou moderação. Se houver cortes nos salários do pessoal da função pública ou nas remunerações dos gestores públicos, os dirigentes do BdP e colaboradores (agora não há propriamente trabalhadores) não serão emagrecidos nas suas “justas” regalias; e apenas se lá entra por “competência” (!). O BdP é Estado, mas não é Estado: é Estado dentro de outro Estado ou para além do Estado. É o caso em que os antónimos “fora” e “dentro” são sinónimos! É como no famoso spot publicitário “vá para fora cá dentro!”...
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Segundo a nossa Constituição (vd art.º 102.º), “o Banco de Portugal é o banco central nacional e exerce as suas funções nos termos da lei e das normas internacionais a que o Estado Português se vincule”.
Em conformidade com o estipulado pela CRP, a natureza e as atribuições do Banco de Portugal estão definidas na sua Lei Orgânica (aprovada pela Lei n.º 5/98, de 31 de janeiro, com sucessivas alterações, sendo a última aprovada pela Lei n.º 39/2015, de 25 de maio). 
Nos termos da LO do BdP, o Banco é uma pessoa coletiva de direito público, com autonomia administrativa e financeira e património próprio. Faz parte do Eurossistema e do Sistema Europeu de Bancos Centrais, do Mecanismo Único de Supervisão e do Mecanismo Único de Resolução. E age através dos seus órgãos: o Governador, o Conselho de Administração, o Conselho de Auditoria e o Conselho Consultivo
O BdP tem duas missões essenciais: a manutenção da estabilidade dos preços e a promoção da estabilidade do sistema financeiro. E desempenha várias funções relacionadas com estas missões, designadamente as atinentes: à política monetária; à gestão de ativos e reservas; à supervisão prudencial; à resolução; à política macroprudencial; à supervisão comportamental; aos sistemas de pagamentos; à regulação e fiscalização do mercado cambial; à emissão de moeda; à compilação e elaboração de estatísticas; à produção de estudos e análises económicos; à atividade internacional; e às relações com o Estado.
Com a CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários) e a Autoridade dos Seguros, o BdP assegura a concretização do estabelecido no art.º 101.º da CRP, fazendo que o sistema financeiro, que é “estruturado por lei”, garanta “a formação, a captação e a segurança das poupanças, bem como a aplicação dos meios financeiros necessários ao desenvolvimento económico e social”.
Neste momento, o BdP, enquanto regulador e supervisor do sistema bancário, funciona com base numa estrutura de 1777 funcionários do quadro, com um salário médio bruto de 5054 euros mensais (descontando 81 efetivos que estão em licença sem vencimento, portanto, 1696).
De acordo com o último relatório e contas, relativo a 2015, a sua despesa anual é de 120 milhões de euros. A despesa salarial média de 5054 euros absorvida pelos referidos 1696 funcionários no ativo representa um valor distorcido em alta pelas remunerações do conselho de administração. Carlos Costa, o governador, ganha 15 572,67 euros, contando com o apoio de dois “vice-governadores”, com salários de 14 599,38 euros, cada um, e ainda com o apoio de três administradores, que auferem 13 626,10 euros mensais, cada um.
O BdP tem atualmente as 13 competências acima enumeradas, devendo vir a perder duas delas, que aliás só fazem parte dos seus poderes formais desde 2013, segundo a respetiva lei orgânica.
As medidas que combatem o risco do sistema financeiro e a capacidade de resolução, à semelhança do aconteceu com o BES e Banif e se diz poderem vir a acontecer com o Montepio, passarão para uma nova entidade supervisora, que, no âmbito da responsabilidade última pela estabilidade, será a autoridade macroprudencial e de resolução.
De facto, uma das medidas que deu maior brado na opinião pública e no sistema financeiro é a sua capacidade de encerrar bancos e criar novas entidades. O episódio mais mediatizado ocorreu em agosto de 2014, quando o atual governador acabou com o BES e criou o Novo Banco, nos termos da Lei e alegadamente sem intervenção do Governo. O cenário repetiu-se, embora em modalidade bastante diferente, no final de 2015, com a resolução do Banif. Ora, esta vai deixar de ser competência do BdP. Porém, há muitas outras competências que serão mantidas.
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Na verdade, dando andamento a uma opção anunciada logo no início do mandato do XXI Governo Constitucional, o executivo de António Costa pretende criar uma nova entidade que supervisione o setor financeiro português, apostando na real substituição do atual Conselho Nacional de Supervisores por um novo organismo, independente, que assegure a troca de informações entre todos os supervisores, reunindo em si igualmente os poderes de autoridade nacional de resolução, hoje função detida em exclusivo pelo BdP.
Segundo o Ministro das Finanças, o Governo proporá “a criação de uma entidade com a missão de assegurar a troca vinculativa de informações” entre reguladores financeiros – CMVM, BdP e Autoridade dos Seguros – e de servir de órgão coordenador entre as três entidades. E o predito governante detalhou:
“Esta nova entidade, tendo a responsabilidade última pela estabilidade financeira, deverá ter as funções de autoridade macroprudencial e autoridade nacional de resolução”.
Esta nova entidade será dotada de personalidade jurídica e de um estatuto de independência próprio, com uma administração composta pelas “autoridade de supervisão setorial, mas dirigida por personalidades independentes, garantindo assim em simultâneo a participação e a responsabilização plena de todas as autoridades de supervisão nas matérias de prevenção e risco sistémico”.
Na explicação de Mário Centeno, dada na Assembleia da República, o lançamento desta nova entidade compensará o atual quadro de supervisão financeira das alterações que lhe foram sendo feitas nos últimos anos, sempre numa lógica de novas camadas e não do ponto de vista mais geral. Assim – diz o titular da pasta das Finanças – “impõe-se uma coordenação reforçada, que permita conjugar a autonomia das funções e a especialização de cada setor, com uma entidade vocacionada para uma visão global do sistema financeiro, que assegure uma atuação coerente e concertada sobre cada instituição supervisionada.”
O Ministro das Finanças Mário Centeno advertiu, porém, que esta proposta está ainda a ser trabalhada nos círculos governamentais, prometendo revelar o texto da proposta muito em breve, explicitando:
“A proposta que será conhecida brevemente deverá dotar o sistema de supervisão de maior racionalidade, maior eficácia, com menos sobreposições ou redundâncias, e maior capacidade de atuação das autoridades de supervisão”.
A proposta do Governo de António Costa surge depois de Carlos Tavares, ex-presidente da CMVM, ter apresentado ao executivo as conclusões do grupo de trabalho que, nos últimos dois meses, avaliou o atual modelo de supervisão financeira para propor alterações à mesma. As conclusões deste trabalho estão agora a ser apreciadas pelo Governo.
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Porém, o BdP continuará a ser o braço nacional para a política monetária determinada pelo BCE (Banco Central Europeu), que se foca na estabilidade dos preços. Continuará na sua alçada a supervisão microprudencial sobre as instituições de crédito, sociedades financeiras e instituições de pagamento, podendo aplicar medidas preventivas e sancionatórias. Manter-se-á intacta a supervisão comportamental, sendo que, neste caso, o fim em vista é regular, fiscalizar e sancionar a conduta das instituições.
Colocado perante a questão sobre quem servirá de interlocutor com o BCE na sequência das mudanças previstas para meados do ano, o Ministério das Finanças entende que este é um ponto “prematuro” para abordar, dado que o quadro destas alterações ainda será objeto de discussão pública” e só depois se concertará a proposta em definitivo.
Entre as competências que se vão manter na alçada do BdP, conta-se ainda a gestão de parte das reservas cambiais, a vigilância sobre os sistemas de pagamentos, a regulação do comércio de câmbios, a elaboração de estatística e de estudos e análises económicos e a emissão de moeda sob a égide do BCE.
E perde para a nova autoridade nacional a resolução ordenada dos bancos em situação de insolvência, garantindo a estabilidade do sistema, sendo esta autoridade a responsável por eventual liquidação ou venda de bancos; e, ao nível macroprudencial, a identificação de riscos e proposta medidas que previnam ou reduzam o seu impacto, devendo, por exemplo impor determinados rácios de capital a todos os bancos.
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Não será um escândalo para os demais servidores da causa pública a continuação da perceção salarial média de 5054 euros mensais, acima referida, pelos colaboradores do BdP, para mais depois de perder algumas competências? Justifica-se o número de 1696 trabalhadores naquele regulador e supervisor? Porque não se aplica àquele pessoal o teor da informação veiculada hoje pelo JN, que refere que “a administração do Novo Banco decidiu retomar as avaliações aos colaboradores, suspensas em 2015, mas com uma alteração”, sendo que “ novo modelo prevê limites máximos para boas notas: pelo menos 80% de cada equipa deve ser avaliada entre o inaceitável e o regular”? É o que se passa com todos os trabalhadores da administração pública, o regime de quotas para as avaliações mais altas!
Deixaremos de verificar falhas graves na supervisão bancária? Continuaremos com o pingue-pongue do Governo para o BdP e do BdP para o Governo, em nome da Lei e dos contribuintes?
Estará o BdP mesmo a controlar preventivamente um eventual descalabro do Montepio? Podemos voltar a confiar no Banco de Portugal?

2017.03.14 – Louro de Carvalho

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