Já há muitos
anos que não temos um bom orçamento de Estado, mas apenas o orçamento possível.
O deste ano não é exceção, embora o Ministro das Finanças o considere um
orçamento de esquerda. Na verdade, depois de acérrimas negociações e contraditórias
asserções no âmbito das forças políticas que apoiam o Governo, o Conselho de
Ministros aprovou, após uma reunião de cerca de 10 horas, no dia 13, a proposta
de Orçamento do Estado para 2017, que o Ministro das Finanças entregou na Assembleia
da República no dia 14 e cujas linhas gerais explicitou na conferência de imprensa
adrede agendada, tendo sido relevadas as medidas mais emblemáticas que vão
mexer com a vida dos portugueses no próximo ano.
Em síntese,
apurou-se, como pontos a destacar, que a sobretaxa do IRS só acaba para todos
no fim do ano, as pensões mais baixas só terão aumento de 10 euros em agosto e
os refrigerantes vão pagar imposto especial.
O debate na
generalidade, onde é discutida e votada a primeira versão do Orçamento,
acontecerá no início de novembro, seguindo-se depois o debate minucioso na
especialidade, onde ainda haverá espaço para o PCP, o BE, o PEV e o PAN afinarem
agulhas com o Governo, tal como os partidos colocados à direita, que podem
apresentar propostas de alteração.
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A eliminação da sobretaxa
de IRS processar-se-á faseadamente, sendo o 1.º momento em janeiro.
Implementada
pelo XX Governo, começou a ser reduzida faseadamente em 2016 e continuará a ser
reduzida de forma gradual e por escalões de rendimento durante o ano de 2017. Não
acaba para todos a 1 de janeiro de 2017 como o Governo prometera e como
estipulara em lei aprovada pela Assembleia da República em dezembro último,
antes do OE 2016. Agora, a ideia é pôr quem ganha mais a continuar a pagar
durante o ano quase todo (só deixará de pagar em dezembro) e quem ganha menos a deixar de pagar mais cedo. O
valor diminui para todos. Assim: quem está no 2.º escalão de rendimentos (entre € 7.091
e € 20.261 de rendimento coletável anual) ainda pagará
sobretaxa no 1.º trimestre, embora passe de 1% para 0,25%, deixando de pagar em
abril; quem está no 3.º escalão (entre € 20.261 e € 40.522 euros de
rendimento anual), continuará
a pagar 0,88% de sobretaxa, deixando de pagar em junho; quem está no 4.º
escalão (entre € 40.522
e € 80.640 euros anuais) deixará de
pagar em outubro, sendo que até lá o seu rendimento será taxado em 2,25%. No
último escalão (isto é, quem ganha mais de 80 mil euros por ano), continuará a pagar 3,21% de sobretaxa (atualmente
paga 3,5%) até novembro, sendo que só em
dezembro deixará de ser taxado.
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No atinente a pensões,
também se registam alterações. As pensões até 840 euros subirão 0,7% em janeiro,
aplicando-se a fórmula prevista na lei, e as pensões mais baixas, até 630 euros
(equivalente
a 1,5 o valor do Indexante dos Apoios Sociais – IAS), terão uma atualização real de 10 euros em
agosto (ficam excluídas as
pensões mínimas que foram atualizadas na anterior legislatura), o que não corresponde ao sugerido à esquerda, pois
o PCP queria um aumento de 10 euros para todas as pensões, com exceção do
último escalão, e logo a partir de janeiro, algo que o BE também reclama. Continuarão
a batalhar por isto no debate na especialidade. O aumento das
pensões será faseado. Em janeiro aplica-se a fórmula prevista na lei, que tem
em conta a inflação de novembro (sem habitação) e o crescimento da economia, abrangendo todos os
pensionistas com reformas até aos dois IAS (isto é, até cerca de 800 euros, na
medida em que o indexante dos apoios sociais que também será atualizado no
próximo ano). Para as
pensões mais baixas (até 1,5 IAS) é aplicado
o aumento (extraordinário e a título excecional) de 10
euros, a partir de agosto. Em 2018 e anos seguintes, as pensões serão
atualizadas apenas nos termos da lei, ou seja, em função do valor da inflação.
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O novo imposto sobre
o património começa nos 600 mil euros para todos. O novo imposto
sobre o imobiliário incidirá em património a partir de 600 mil euros para
contribuintes particulares e empresas. A exceção são os imóveis afetos à
atividade industrial e ao turismo. Para perfazer os 600 mil euros contam todos
os imóveis que estejam em nome do contribuinte (individual ou coletivo) e não cada imóvel em si mesmo. A taxa será de 0,3% e
é aplicada sobre os valores que ultrapassem o patamar de 600 mil euros de valor
patrimonial. Constitui, na prática, uma sobretaxa sobre o IMI que gerará uma
receita de 170 milhões de euros, segundo as previsões atuais, mas, ao invés do
IMI, que reverte para as autarquias, este novo imposto será proveito do Estado,
designadamente do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, um
instrumento que tem como finalidade assegurar uma almofada financeira para o pagamento
de pensões, como está previsto na proposta de lei. É um caso excecional de
consignação de receitas. Apesar de o limite a partir do qual se aplica a taxa
ser igual para todos, a proposta de lei prevê que, no caso de casais que optem
por declaração conjunta, o teto a partir do qual se aplica o imposto é
multiplicado por dois, chegando aos 1,2 milhões de euros.
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Metade do subsídio de
Natal será paga em duodécimos. O Governo pretendia acabar com o pagamento do subsídio
de Natal em duodécimos a pensionistas e funcionários públicos, o que
faria mais sentido com o fim da sobretaxa de IRS, já que foi para minorar o seu
impacto que os duodécimos foram criados. No entanto, depois do volte-face na
sobretaxa de IRS e das preocupações de partidos e sindicatos, o Governo
ficou-se a meio. Assim, funcionários públicos e pensionistas receberão o
subsídio de férias na íntegra (como já sucedia); e, em vez
de receberem o subsídio de Natal todo em duodécimos, receberão metade do valor em
novembro e a outra metade distribuída pelos salários mensais.
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Vão ser taxadas bebidas
com açúcar. A “fat tax” vai avançar para os refrigerantes e não
para todos os alimentos nocivos para a saúde. A partir de janeiro, os
refrigerantes e as bebidas com uma taxa de álcool entre 0,5% e 1,2% vol. (conhecidas
como bebidas sem álcool) com açúcar
adicionado ficarão mais caros. O aumento máximo não deverá ultrapassar os 16
cêntimos por litro e o mínimo rondará os oito cêntimos por litro, consoante a
quantidade de açúcar presente na bebida. O que significa que, por exemplo, uma
lata de Coca-Cola (de 33 cl), que tem 106
gramas de açúcar por litro, terá um acréscimo de cinco cêntimos por via deste
novo imposto – cinco cêntimos que acrescerão ao preço da bebida antes do IVA,
ou seja, a subida do preço final desta bebida será superior a cinco cêntimos.
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As bebidas alcoólicas
serão mais taxadas. Também as sidras e o hidromel (alcoólicas) serão tributados em sede de Imposto sobre
o Álcool, assim como as demais bebidas alcoólicas (IABA), sendo que o imposto varia entre 8,22 euros e os
16,46 euros, consoante o teor de açúcar. Isto quer dizer que ficam sujeitos a
imposto as bebidas não alcoólicas destinadas ao consumo adicionadas de açúcar
ou de outros edulcorantes, bem como
cerveja, gin ou vodka (e similares), que ficarão mais caras, num agravamento do imposto
à semelhança do sucedido em 2016. O aumento do imposto sobre o álcool é, pois,
de 3%. O vinho fica de fora, como sucedeu este ano.
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Imposto Sobre Veículos aumenta em
2017. Segundo a
proposta de OE 2017, automóvel com cilindrada até 1.000 cm3 pagará
98 cêntimos por cm3 (mais 3 cêntimos que atualmente). Entre os 1.001 e os 1.250 cm3, o
aumento será de 3 cêntimos. E veículos com mais de 1.250 cm3 terão um
aumento de 16 cêntimos por cm3.
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Aumenta o subsídio de
refeição para a função pública. Os funcionários públicos terão, a partir de janeiro,
um aumento de 25 cêntimos por dia no subsídio de refeição, o que significa
que ao fim do mês ganharão mais € 5,5 (contabilizando 22 dias úteis). Será a 1.ª atualização em 7 anos, já que este
subsídio se mantém nos 4,27 euros por dia desde 2009. A CGTP e a UGT há muito
que queriam uma atualização, apontando sempre para valores acima dos € 6.
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Continuará o apoio
extraordinário a desempregados de longa duração. Prolongar-se-á
por um ano o apoio extraordinário aos desempregados de longa duração, uma
prestação que pode atingir um máximo de € 335 e de que beneficiarão os trabalhadores
que esgotaram o subsídio de desemprego e o subsídio social desemprego. A medida
foi negociada no Orçamento do Estado para 2016 a pedido do PCP, acabando por
ser aprovada, tendo entrado em vigor a 30 de março, e voltará a integrar o
Orçamento, estendendo-se por mais um ano.
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Todos os alunos do
1.º ciclo terão manuais escolares gratuitos. No ano letivo de 2017/2018, todos os
alunos do 1.º ciclo do ensino público terão acesso a manuais escolares
gratuitos (o que já é realidade para os alunos do 1.º ano), cabendo ao responsável governamental pela área da
Educação definir as condições em que serão disponibilizados os livros, bem como
as regras para o seu uso e reutilização, “podendo os mesmos ser reutilizados na
mesma escola ou em qualquer outra escola ou agrupamento que os tenha adotado”. Era
um dos cavalos de batalha do PCP, mas que o próprio Governo também sempre assumiu
como prioridade.
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A tarifa social da
água com atribuição automática para chegar a mais pessoas não avança já. O alargamento
do número de beneficiários da tarifa social da água, pela atribuição automática,
está a ser discutido no quadro do Orçamento. Depois de luz e gás, chegará a vez
de alargar significativamente os beneficiários de tarifas sociais na fatura da
água. É uma medida defendida pelo BE, que já conseguira o alargamento das
tarifas sociais na eletricidade e gás. O orçamento definirá agora a
constituição dum regime para
as tarifas sociais da água, por forma a harmonizar o que até agora é tratado
individualmente e de forma diferenciada, pelas autarquias. Ou seja, o Governo
solicita uma autorização legislativa para legislar a matéria sem ter de passar
pela Assembleia da República, mas não é obrigado a fazê-lo. Para já, manifesta
a intenção.
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O Governo compensa a
perda de poder de compra causada pela suspensão de salários entre 2011 e 2015
e pelo brutal aumento de impostos sobre o trabalho. Para tanto, repõe ou
regulariza vencimentos e pensões, operando aumentos em certos casos, mitiga em
certa medida o agravamento fiscal que incide sobre o trabalho e rendimentos
dele resultantes e acentua a carga fiscal pela via dos impostos indiretos e
sobre bens não essenciais. E a economia, que é dela?
É orçamento de esquerda,
como diz o Ministro, mas só em certa medida, digo eu. É pouco, mas já sabe bem!
2016.10.15
– Louro de Carvalho
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