sábado, 15 de outubro de 2016

As principais medidas do Orçamento do Estado para 2017. Hum?!

Já há muitos anos que não temos um bom orçamento de Estado, mas apenas o orçamento possível. O deste ano não é exceção, embora o Ministro das Finanças o considere um orçamento de esquerda. Na verdade, depois de acérrimas negociações e contraditórias asserções no âmbito das forças políticas que apoiam o Governo, o Conselho de Ministros aprovou, após uma reunião de cerca de 10 horas, no dia 13, a proposta de Orçamento do Estado para 2017, que o Ministro das Finanças entregou na Assembleia da República no dia 14 e cujas linhas gerais explicitou na conferência de imprensa adrede agendada, tendo sido relevadas as medidas mais emblemáticas que vão mexer com a vida dos portugueses no próximo ano.
Em síntese, apurou-se, como pontos a destacar, que a sobretaxa do IRS só acaba para todos no fim do ano, as pensões mais baixas só terão aumento de 10 euros em agosto e os refrigerantes vão pagar imposto especial.
O debate na generalidade, onde é discutida e votada a primeira versão do Orçamento, acontecerá no início de novembro, seguindo-se depois o debate minucioso na especialidade, onde ainda haverá espaço para o PCP, o BE, o PEV e o PAN afinarem agulhas com o Governo, tal como os partidos colocados à direita, que podem apresentar propostas de alteração.
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A eliminação da sobretaxa de IRS processar-se-á faseadamente, sendo o 1.º momento em janeiro.
Implementada pelo XX Governo, começou a ser reduzida faseadamente em 2016 e continuará a ser reduzida de forma gradual e por escalões de rendimento durante o ano de 2017. Não acaba para todos a 1 de janeiro de 2017 como o Governo prometera e como estipulara em lei aprovada pela Assembleia da República em dezembro último, antes do OE 2016. Agora, a ideia é pôr quem ganha mais a continuar a pagar durante o ano quase todo (só deixará de pagar em dezembro) e quem ganha menos a deixar de pagar mais cedo. O valor diminui para todos. Assim: quem está no 2.º escalão de rendimentos (entre € 7.091 e € 20.261 de rendimento coletável anual) ainda pagará sobretaxa no 1.º trimestre, embora passe de 1% para 0,25%, deixando de pagar em abril; quem está no 3.º escalão (entre € 20.261 e € 40.522 euros de rendimento anual), continuará a pagar 0,88% de sobretaxa, deixando de pagar em junho; quem está no 4.º escalão (entre € 40.522 e € 80.640 euros anuais) deixará de pagar em outubro, sendo que até lá o seu rendimento será taxado em 2,25%. No último escalão (isto é, quem ganha mais de 80 mil euros por ano), continuará a pagar 3,21% de sobretaxa (atualmente paga 3,5%) até novembro, sendo que só em dezembro deixará de ser taxado.
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No atinente a pensões, também se registam alterações. As pensões até 840 euros subirão 0,7% em janeiro, aplicando-se a fórmula prevista na lei, e as pensões mais baixas, até 630 euros (equivalente a 1,5 o valor do Indexante dos Apoios Sociais – IAS), terão uma atualização real de 10 euros em agosto (ficam excluídas as pensões mínimas que foram atualizadas na anterior legislatura), o que não corresponde ao sugerido à esquerda, pois o PCP queria um aumento de 10 euros para todas as pensões, com exceção do último escalão, e logo a partir de janeiro, algo que o BE também reclama. Continuarão a batalhar por isto no debate na especialidade. O aumento das pensões será faseado. Em janeiro aplica-se a fórmula prevista na lei, que tem em conta a inflação de novembro (sem habitação) e o crescimento da economia, abrangendo todos os pensionistas com reformas até aos dois IAS (isto é, até cerca de 800 euros, na medida em que o indexante dos apoios sociais que também será atualizado no próximo ano). Para as pensões mais baixas (até 1,5 IAS) é aplicado o aumento (extraordinário e a título excecional) de 10 euros, a partir de agosto. Em 2018 e anos seguintes, as pensões serão atualizadas apenas nos termos da lei, ou seja, em função do valor da inflação.
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O novo imposto sobre o património começa nos 600 mil euros para todos. O novo imposto sobre o imobiliário incidirá em património a partir de 600 mil euros para contribuintes particulares e empresas. A exceção são os imóveis afetos à atividade industrial e ao turismo. Para perfazer os 600 mil euros contam todos os imóveis que estejam em nome do contribuinte (individual ou coletivo) e não cada imóvel em si mesmo. A taxa será de 0,3% e é aplicada sobre os valores que ultrapassem o patamar de 600 mil euros de valor patrimonial. Constitui, na prática, uma sobretaxa sobre o IMI que gerará uma receita de 170 milhões de euros, segundo as previsões atuais, mas, ao invés do IMI, que reverte para as autarquias, este novo imposto será proveito do Estado, designadamente do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, um instrumento que tem como finalidade assegurar uma almofada financeira para o pagamento de pensões, como está previsto na proposta de lei. É um caso excecional de consignação de receitas. Apesar de o limite a partir do qual se aplica a taxa ser igual para todos, a proposta de lei prevê que, no caso de casais que optem por declaração conjunta, o teto a partir do qual se aplica o imposto é multiplicado por dois, chegando aos 1,2 milhões de euros.
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Metade do subsídio de Natal será paga em duodécimos. O Governo pretendia acabar com o pagamento do subsídio de Natal em duodécimos  a pensionistas e funcionários públicos, o que faria mais sentido com o fim da sobretaxa de IRS, já que foi para minorar o seu impacto que os duodécimos foram criados. No entanto, depois do volte-face na sobretaxa de IRS e das preocupações de partidos e sindicatos, o Governo ficou-se a meio. Assim, funcionários públicos e pensionistas receberão o subsídio de férias na íntegra (como já sucedia); e, em vez de receberem o subsídio de Natal todo em duodécimos, receberão metade do valor em novembro e a outra metade distribuída pelos salários mensais.
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Vão ser taxadas bebidas com açúcar. A “fat tax” vai avançar para os refrigerantes e não para todos os alimentos nocivos para a saúde. A partir de janeiro, os refrigerantes e as bebidas com uma taxa de álcool entre 0,5% e 1,2% vol. (conhecidas como bebidas sem álcool) com açúcar adicionado ficarão mais caros. O aumento máximo não deverá ultrapassar os 16 cêntimos por litro e o mínimo rondará os oito cêntimos por litro, consoante a quantidade de açúcar presente na bebida. O que significa que, por exemplo, uma lata de Coca-Cola (de 33 cl), que tem 106 gramas de açúcar por litro, terá um acréscimo de cinco cêntimos por via deste novo imposto – cinco cêntimos que acrescerão ao preço da bebida antes do IVA, ou seja, a subida do preço final desta bebida será superior a cinco cêntimos.
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As bebidas alcoólicas serão mais taxadas. Também as sidras e o hidromel (alcoólicas) serão tributados em sede de Imposto sobre o Álcool, assim como as demais bebidas alcoólicas (IABA), sendo que o imposto varia entre 8,22 euros e os 16,46 euros, consoante o teor de açúcar. Isto quer dizer que ficam sujeitos a imposto as bebidas não alcoólicas destinadas ao consumo adicionadas de açúcar ou de outros edulcorantes, bem como cerveja, gin ou vodka (e similares), que ficarão mais caras, num agravamento do imposto à semelhança do sucedido em 2016. O aumento do imposto sobre o álcool é, pois, de 3%. O vinho fica de fora, como sucedeu este ano.
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Imposto Sobre Veículos aumenta em 2017. Segundo a proposta de OE 2017, automóvel com cilindrada até 1.000 cm3 pagará 98 cêntimos por cm3 (mais 3 cêntimos que atualmente). Entre os 1.001 e os 1.250 cm3, o aumento será de 3 cêntimos. E veículos com mais de 1.250 cm3 terão um aumento de 16 cêntimos por cm3.

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Aumenta o subsídio de refeição para a função pública. Os funcionários públicos terão, a partir de janeiro, um aumento de 25 cêntimos por dia no subsídio de refeição, o que significa que ao fim do mês ganharão mais € 5,5 (contabilizando 22 dias úteis). Será a 1.ª atualização em 7 anos, já que este subsídio se mantém nos 4,27 euros por dia desde 2009. A CGTP e a UGT há muito que queriam uma atualização, apontando sempre para valores acima dos € 6.
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Continuará o apoio extraordinário a desempregados de longa duração. Prolongar-se-á por um ano o apoio extraordinário aos desempregados de longa duração, uma prestação que pode atingir um máximo de € 335 e de que beneficiarão os trabalhadores que esgotaram o subsídio de desemprego e o subsídio social desemprego. A medida foi negociada no Orçamento do Estado para 2016 a pedido do PCP, acabando por ser aprovada, tendo entrado em vigor a 30 de março, e voltará a integrar o Orçamento, estendendo-se por mais um ano.
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Todos os alunos do 1.º ciclo terão manuais escolares gratuitos. No ano letivo de 2017/2018, todos os alunos do 1.º ciclo do ensino público terão acesso a manuais escolares gratuitos (o que já é realidade para os alunos do 1.º ano), cabendo ao responsável governamental pela área da Educação definir as condições em que serão disponibilizados os livros, bem como as regras para o seu uso e reutilização, “podendo os mesmos ser reutilizados na mesma escola ou em qualquer outra escola ou agrupamento que os tenha adotado”. Era um dos cavalos de batalha do PCP, mas que o próprio Governo também sempre assumiu como prioridade.
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A tarifa social da água com atribuição automática para chegar a mais pessoas não avança já. O alargamento do número de beneficiários da tarifa social da água, pela atribuição automática, está a ser discutido no quadro do Orçamento. Depois de luz e gás, chegará a vez de alargar significativamente os beneficiários de tarifas sociais na fatura da água. É uma medida defendida pelo BE, que já conseguira o alargamento das tarifas sociais na eletricidade e gás. O orçamento definirá agora a constituição dum regime  para as tarifas sociais da água, por forma a harmonizar o que até agora é tratado individualmente e de forma diferenciada, pelas autarquias. Ou seja, o Governo solicita uma autorização legislativa para legislar a matéria sem ter de passar pela Assembleia da República, mas não é obrigado a fazê-lo. Para já, manifesta a intenção.
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O Governo compensa a perda de poder de compra causada pela suspensão de salários entre 2011 e 2015 e pelo brutal aumento de impostos sobre o trabalho. Para tanto, repõe ou regulariza vencimentos e pensões, operando aumentos em certos casos, mitiga em certa medida o agravamento fiscal que incide sobre o trabalho e rendimentos dele resultantes e acentua a carga fiscal pela via dos impostos indiretos e sobre bens não essenciais. E a economia, que é dela?
É orçamento de esquerda, como diz o Ministro, mas só em certa medida, digo eu. É pouco, mas já sabe bem!

2016.10.15 – Louro de Carvalho

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