Ocorreu, no Altar da Basílica de São Pedro, nesta
quinta-feira, 12 de julho, às 10,45 horas, a celebração das exéquias por alma e
em memória do Cardeal Jean-Louis
Tauran, Titular da diaconia de Santo Apolinário nas Termas
Neronianas-Alexandrinas. A Liturgia decorreu sob a presidência do cardeal Angelo Sodano, Decano do Colégio
Cardinalício, junto com os cardeais, arcebispos e bispos. Além da presença do Papa, também foi notada a presença de Geneviève
Dubert, irmã do cardeal, à qual o Pontífice enviou um telegrama de condolências
há alguns dias.
No final da celebração eucarística, o Papa Francisco presidiu ao rito
da Ultima Commendatio e da Valedictio.
O camerlengo da Santa Igreja Romana e presidente do
Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-Religioso – ícone da promoção do diálogo –, que tinha completado 75 anos em abril, faleceu em
5 de Julho em Hartford, nos Estados Unidos, após longa doença. Será sepultado
na basílica de Santo Apolinário nas Termas neronianas-Alexandrinas, da qual era
titular.
Ao recordar o “inesquecível” cardeal francês, Angelo Sodano disse “foi um
irmão” que serviu “corajosamente a Santa Igreja de Cristo”, apesar do “peso da
sua doença”.
“No Evangelho, Jesus – explicou Sodano, como refere o Vatican News – recordou-nos quais são as verdadeiras bem-aventuranças
do cristão”. Na verdade, “é comovedor ouvir-lhe proclamar estas bem-aventuranças
na nossa Igreja: Bem-aventurados os
pobres de espírito. Bem-aventurados os mansos, bem-aventurados os puros de
coração, bem-aventurados os que promovem a paz”.
E o presidente da Liturgia, frisando que foi “testemunha por muitos anos do
grande espírito apostólico do cardeal Tauran”, enfatizou que “são
bem-aventuranças que iluminaram toda a vida” do eminente purpurado “como
estrelas luminosas no seu caminho”.
Mais o Decano do Sacro Colégio Cardinalício evidenciou que o
cardeal Tauran era “uma grande figura” de sacerdote, bispo e cardeal, que “dedicou,
como muitos, a sua vida ao serviço da Santa Sé, da Igreja e nos últimos anos
particularmente ao diálogo com todos os homens de boa vontade”. Desta maneira,
seguiu a linha traçada pelo Concílio Ecuménico Vaticano II no compromisso –
segundo a Gaudium et spes – da fraternidade universal (com efeito, todos somos irmãos), a qual nos leva à consciência clara de que, “chamados pela mesma vocação
humana e divina”, podemos e devemos cooperar pacificamente, “sem violência, nem
engano” na edificação “do mundo na verdadeira paz”.
***
Para recordar o cardeal Tauran, o Cardeal espanhol Santos Abril y Castelló,
ligado por uma profunda amizade com o cardeal francês, aceitou ser entrevistado
por Hélène Destombes, do que se registam as seguintes palavras:
“A minha recordação do cardeal
Tauran é verdadeiramente uma recordação de amizade e lamentação pelo facto de
ele nos ter deixado. Ultimamente, eu via-o evidentemente enfraquecido. Mas
mesmo neste período, ele colocava o seu dever em primeiro lugar: o de procurar
aproximar as posições com o mundo das outras religiões, especialmente com o
Islão. E ele fazia isso com um grande sentido de respeito para com todos, de
grande competência e com uma grande capacidade de diálogo, de propor possíveis
soluções. Ele fez tudo isso também com grande sacrifício, porque a sua saúde
era muito fraca nos últimos tempos: ele percebia que não estava nas condições
ideais para continuar o magnífico trabalho que estava fazendo para a Igreja.”.
***
É abundante e
polifacetada a folha de valorização e serviço que transparece da sua biografia como
se pode ver pelo Observador on line,
a 6 de julho, e pela Wikipédia – enciclopédia
livre.
O Cardeal Jean-Louis Pierre Tauran, que
em 13 de março de 2013, foi encarregado,
por ser o cardeal protonotário, de vir à varanda principal da Basílica de São
Pedro proclamar o pregão “Annuntio vobis
gaudium magnum, Habemus Papam” e dizer, a seguir, o nome do Cardeal Mario
Georgio Bergoglio, que assumiu o nome papal de Francisco, nasceu em Bordéus, a
5 de abril de 1943, era o presidente do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso
e camerlengo da Câmara Apostólica.
O
seu nome de batismo é Louis-Pierre e o prenome é Jean. Recebeu o sacramento da
confirmação em 5 de junho de 1955, das mãos de Paul-Marie-André Ricchau,
Arcebispo de Paris e futuro cardeal.
Estudou na Pontifícia
Universidade Gregoriana, em Roma, onde se licenciou em Filosofia e Teologia e
se doutorou, em 1973, em Direito Canónico, e no Instituto Católico de Toulouse.
Também estudou na Pontifícia Academia Eclesiástica, em Roma. Além do francês
como língua materna, falava correntemente espanhol, inglês e italiano.
Ordenado presbítero, aos 26 anos, em 20 de setembro de 1969,
em Bordéus, pelo Arcebispo de Bordéus Marius Maziers – não sem antes ter sido
professor num colégio do Líbano, aos 21/22 anos, como forma de cumprir o
serviço militar – tornou-se pároco na sua Arquidiocese, após o que ingressou no
serviço diplomático da Santa Sé em 1975, passando trabalhar em definitivo para
a Cúria Romana. Foi secretário da Nunciatura, na República Dominicana, entre
1975 e 1978 e secretário da Nunciatura no Líbano, entre 1979 e 1983.
Integrou o Conselho para os Assuntos Públicos da Igreja a
partir de julho de 1983. Participou em missões especiais no Haiti, de 1984, e
Beirute e Damasco, em 1986. Foi membro da delegação da Santa Sé para as
reuniões da Conferência sobre Segurança e Cooperação Europeia, Conferência
sobre o Desarmamento, em Estocolmo, na Suécia, e no Fórum Cultural em
Budapeste, na Hungria, e sucessivas reuniões em Viena.
Eleito Arcebispo-titular de Telepte e nomeado subsecretário
da Secretaria de Estado para as Relações com os Estados (tornando-se
o titular da secção dois anos depois – uma espécie de ministro das Relações
Exteriores do Papa), a 1 de dezembro de 1990, foi-lhe conferida a
ordenação episcopal em 6 de janeiro de 1991, na Basílica de São Pedro, por João
Paulo II, sendo coordenantes por Giovanni Battista Re, Arcebispo-titular de
Vescovio, substituto da Secretaria de Estado, secção de Assuntos Gerais, e Justin
Francis Rigali, Arcebispo-titular de Bolsena, secretário da
Congregação para os Bispos. Adotou o lema episcopal “Veritate et
caritate” (Pela
verdade e pela caridade).
É
naquela função na Secretaria de Estado que Tauran acabou se torna perante do
mundo a voz e o rosto da firme oposição do Papa à Guerra do Iraque no início
dos anos 2000. Para Tauran, dar início ou não à guerra era fazer “uma escolha
entre a força da lei e a lei da força”. E disse:
“Nenhuma
regra do direito internacional autoriza um ou mais Estados a recorrer
unilateralmente ao uso da força para mudar o regime ou a forma do governo de
outro Estado com base na alegação, por exemplo, de que possui armamento de
destruição em massa”.
Enfrentou, pois, George W. Bush com ferrenha
oposição, dialogou com líderes religiosos do mundo todo e foi o responsável por
anunciar uma das notícias mais esperadas da última década.
***
Criado cardeal-diácono no consistório de
21 de outubro de 2003, recebeu o barrete e a diaconia de Santo Apolinário nas
Termas Neronianas-Alexandrinas. Dois dias depois, a 24 de novembro de 2003, foi nomeado
Arquivista e Bibliotecário da Santa Igreja Romana, cargo que exerceu até 25 de
junho de 2007 e para o qual acabou de ser designado o português Dom José Tolentino
de Mendonça, Arcebispo-Titular eleito de Sauva.
Como representante do Papa
participou na inauguração do novo Museu do Holocausto Yad Vashem, a 15 de
março de 2005, em Jerusalém. E, nesse mesmo ano, foi o enviado especial do Papa
às celebrações centrais do Extraordinário Ano Jubilar da Diocese de Le Puy-en-Velay,
na França, ocorrido a 29 de maio, na Basílica Catedral de Notre Dame du Puy.
Participou, por nomeação papal, na X Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos,
na Cidade do Vaticano, de 2 a 23 de outubro de 2005. Nomeado presidente do
Conselho Pontifício para o Diálogo Inter-religioso a 25 de junho de 2007,
assumiu o cargo em 1 de setembro de 2007.
Este cargo colocava-o na
linha da frente do diálogo com o mundo islâmico. Falou várias vezes em defesa
dos cristãos nos países muçulmanos e criticou o facto de, em alguns países
árabes, os não-muçulmanos serem tratados como cidadãos de segunda.
Esteve recentemente na
Arábia Saudita, donde voltou, como se diz adiante, com uma importante conquista
para os muitos cristãos – sobretudo expatriados – que vivem naquele reino,
nomeadamente o direito a praticarem a sua religião, o que até então lhes estava
vedado.
Participou
na XII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, na Cidade do Vaticano,
entre 5 a 26 de outubro de 2008, sobre “A
Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja”.
Foi
o enviado especial do Papa às cerimónias conclusivas do Ano Paulino em 29 de
junho de 2009, na Turquia. Participou na II Assembleia Especial para a África
do Sínodo dos Bispos, de 4 a 25 de outubro de 2009, na Cidade do Vaticano,
sobre o tema “A Igreja na África, ao
serviço da reconciliação, da justiça e da paz: Vós sois o sal da terra, você é
a luz do mundo”. Foi o enviado especial do Papa para a celebração do
milénio da Abadia de Saint-Pierre de Solesmes, na França, ocorrido em 12 de
outubro de 2010. Participou na II Assembleia Especial para o Oriente Médio do
Sínodo dos Bispos, de 10 a 24 de outubro de 2010, na Cidade do Vaticano, como
membro eleito do Conselho Especial para o Oriente Médio da Secretaria Geral do
Sínodo dos Bispos, 23 de outubro de 2010. Em 23 de novembro de 2010, ele
recebeu o doutoramento honoris causa do
Institut Catholique de Paris. Confirmado pelo Papa Bento XVI no ofício do
cardeal protodiácono no consistório de 21 de fevereiro de 2011, há vários anos que
sofria do que foi diagnosticado como o mal de Parkinson. Apesar disso, a 19 de
junho de 2012, foi confirmado por 5 anos como presidente do Conselho Pontifício
para o Diálogo Inter-religioso.
Como cardeal-protodiácono
foi ele quem anunciou ao mundo a eleição do novo Papa e o seu nome papal, no termo
do Conclave de 2013, como foi referido, e impôs o pálio sobre Francisco na
inauguração do ministério petrino do pontífice em 19 de março de 2013.
Em
15 de abril de 2013, foi nomeado enviado especial do Papa às celebrações do
quarto centenário da chegada do ícone da Virgem Maria em Budslau, na
Bielorrússia, ocorrido em 5 e 6 de julho de 2013, no Santuário Nacional, que se
encontra no território da Arquidiocese de Minsk-Mohilev. A 26 de junho de
2013, o Papa nomeou-o membro da Pontifícia Comissão Relativamente ao Instituto
para as Obras de Religião (Banco do Vaticano). A 24 de agosto de 2013, foi nomeado enviado
especial do Papa às celebrações do primeiro centenário da Arquidiocese de Lille,
na França, que tiveram lugar em 26 e 27 de outubro de 2013. Foi confirmado como
membro da Congregação para os Bispos em 16 de dezembro de 2013.
A 12 de junho
de 2014, passou para a ordem de cardeais-presbíteros, mantendo o seu
título pro hac vice. E, a 20 de dezembro de 2014, Francisco nomeou-o Camerlengo
da Santa Igreja Romana, sendo, nesta condição, o responsável pela administração das
propriedades e receitas da Santa Sé e devendo assumir as responsabilidades de
Chefe de Estado do Vaticano entre a morte ou resignação de um Papa e a eleição
de outro.
A sua última viagem em nome da Santa Sé, em abril, foi uma visita de oito
dias à capital saudita, Riad, onde se encontrou com o rei Salman bin Abdulaziz
e com o secretário-geral da Liga Muçulmana Mundial, o sheik Mohammed Al-Issa.
Foi a primeira visita dum cardeal ao país em que ficam os dois grandes
santuários do Islão, Meca e Medina. Na pátria do wahabismo, uma das correntes
mais fundamentalistas do islão, o Cardeal fez discursos corajosos, pedindo que
os cristãos “não sejam considerados
cidadãos de segunda classe” e apostando na educação como caminho para o
diálogo e a tolerância.
Esta viagem
a Riad, já bastante debilitado, constituiu um marco para as relações entre a
Igreja e o mundo muçulmano. Nela sustentou que a
ameaça não provém do “choque de civilizações”, mas do “choque de ignorâncias e
radicalismos”. Assim, defendia que “a religião pode ser proposta, mas jamais
imposta”. E, numa entrevista em dezembro do ano passado, explicou como ele e a
Santa Sé viam com apreço o recurso ao diálogo:
“Nós cremos que, no fundo, não
obstante as posições que às vezes possam parecer distantes, é necessário promover
espaços de diálogo sincero. Apesar de tudo, estamos convencidíssimos de que se
pode viver juntos.”.
Dizia ele que frequentemente “é a ignorância que fundamenta o medo”. E assinalava
a verificação de que “a maior parte dos europeus nunca teve um encontro com um
muçulmano nem nunca abriu o Corão” e que “o contrário também é verdade: muitos
muçulmanos jamais abriram a Bíblia”. E com este espírito de diálogo movia-se na Cúria
Romana, sem intriguismos, pois nem tinha tempo para isso. E assegura o
vaticanista Andrea Tornielli que “deu o exemplo
de como se serve ao papa na Cúria Romana, sem protagonismos, fazendo sempre
presentes as próprias objeções e sugestões, sem nunca as vazar em blogs ou
entrevistas”.
(cf https://www.semprefamilia.com.br/acreditamosnoamor/quem-foi-o-cardeal-jean-louis-tauran-icone-da-promocao-do-dialogo/)
***
No telegrama de condolências enviado à irmã do
cardeal, o Papa disse que Tauran “marcou profundamente a vida da Igreja
universal”. Era, pois, “um conselheiro ouvido e apreciado, nomeadamente graças
às relações de confiança e estima que construiu com o mundo muçulmano”. E Francisco
elogiou-lhe o sentido de serviço e “amor pela Igreja”, confessando-se “emocionado”
pelo modo como soube “servir corajosamente a Igreja de Cristo até ao fim,
apesar do peso da doença” (agência Ecclesia).
Como dizia o Papa em Fátima, o doente não é só
objeto do cuidado da parte dos demais, mas é também à sua medida um cuidador,
um evangelizador.
É motivo de ação de graças a vida deste servidor
da Igreja e do mundo. Laus Deo!
2018.07 – Louro de Carvalho
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