Ainda há
pouco era dito pelo Governo que não havia dinheiro para suportar a contagem
integral do tempo de serviço dos professores e seria um problema orçamental se
todos os funcionários que integram as outras 16 carreiras específicas na
Administração Pública reivindicassem tal.
Este
tipo de asserções levou a que José Abraão, da FESAP, sugerisse ao Ministro das Finanças que olhasse mais para as
pessoas e menos para os números e a que Ana Avoila, da Frente Comum, acusasse o
Governo de acenar com o papão, que não há, e denunciasse a hipocrisia de não
haver dinheiro para os funcionários, mas de o haver para tudo o mais.
Muito se
tem falado do dinheiro dos contribuintes perdido na banca, nos vencimentos,
subsídios e prémios dos grandes gestores, nas reformas chorudas de muitos, na
ginástica feita pelos sistema para engrossar as remunerações dos deputados,
enfim, nas diversas formas de pôr tantos e tantas a viver acima das
possibilidades do comum dos cidadãos e mesmo dos que integram a classe média em
vias de extinção.
***
Entretanto,
vieram à estampa na comunicação social, sobretudo no DN e no Dinheiro Vivo,
informações curiosamente iníquas sobre aquilo que os contribuintes, enquanto
consumidores, pagam sem que beneficiem do bem ou serviço.
***
Assim, entre
2016 e 2020, os portugueses pagam 1,2 mil milhões de euros por ano pelas energias
renováveis, mesmo que delas não beneficiem (6 mil milhões no espaço
de 5 anos), ou seja,
as energias limpas pesam 24,1% na conta da luz (11 mil euros por
família). Mais: os
consumidores vão continuar a suportar as tarifas com subsídio nas renováveis
além de 2030.
São
números decorrentes de cálculos da ERSE (Entidade reguladora dos
Serviços Energéticos)
e da DGEG (Direção-Geral de Energia e Geologia), que mostram que só em 2026 o
valor do sobrecusto com a PRE (Produção em Regime Especial) ficará abaixo dos mil milhões,
caindo depois a pique, em 2028, para cerca de 200 milhões. Dos atuais encargos
anuais de 1,2 mil milhões até 2020, a esmagadora maioria (cerca
de mil milhões) diz
respeito a centrais eólicas e hídricas (barragens).
Porém, a
APREN (Associação
Portuguesa de Energia renováveis)
contesta estes números. Segundo o seu presidente, António Sá da Costa, face aos
dados de 2017 da ERSE, a associação contabiliza 1315 milhões de euros de
sobrecusto com a PRE (renovável e cogeração), dos quais só 500 milhões dizem
respeito às eólicas (5313 MW de potência instalada, de um
total de 13 806 MW renováveis),
e prevê que até 2020 os encargos com as tarifas subsidiadas baixem.
Seja
como for, tudo isto tem impacto direto nas faturas dos consumidores. Diz a ERSE
que a PRE é uma das mais de 10 parcelas que integram o bolo dos custos de
interesse económico geral (CIEG, ou “custos políticos”), responsáveis por 40% do valor
pago pelos clientes domésticos. Segundo o regulador, só por si, as renováveis
pesam 24,1% na fatura das famílias. Em números absolutos, em 2018 o sobrecusto
com as renováveis está avaliado em 1268 milhões de euros. E, considerando que a
fatura média dos consumidores domésticos é de 45,7 euros por mês (incluindo
IVA), isto significa
que cada família terá de pagar este ano, diretamente na sua fatura da luz, 132
euros para financiar as tarifas subsidiadas às renováveis (média
de 11 euros por mês).
Já
segundo a APREN, 98% da Produção em Regime Especial são pagos pelos clientes
domésticos, ficando a indústria poupada a este encargo, em conformidade com o Decreto-lei
n.º 90/2006, de 24 de maio (era Sócrates Primeiro-Ministro e
Manuel Pinho Ministro da Economia).
A isto a ERSE esclareceu que “o sobrecusto da PRE renovável é fundamentalmente
pago pelos consumidores residenciais” e “qualquer alteração deste critério terá
que ser efetuada mediante alteração legislativa de igual nível, ou seja por
aprovação de um novo decreto-lei do Governo”.
Já se
sabia – e é agora confirmado pelo Eurostat – que Portugal é o segundo país da
UE com a eletricidade mais cara (a seguir à Alemanha), em termos de paridade do poder
de compra. E Seguro Sanches, Secretário de Estado da Energia, quer inverter a
tendência e aproximar os preços da energia à média da UE até ao fim do mandato,
o que representa uma descida de 10%. Este ano as tarifas baixaram 0,2%, mas o
governante pretende mais para 2019. Porém, adverte:
“Há questões que não podemos controlar. Estamos ainda a pagar 1,2 mil
milhões de encargos com as renováveis com tarifas subsidiadas. Está
contratualizado. E o Governo anterior ainda aumentou mais 7 anos estas tarifas
subsidiadas.”.
Por
outro lado, o Secretário de Estado da Energia sublinhou ao Dinheiro Vivo que o Governo já autorizou “mais de 1000 MW de
renováveis [na energia solar] sem qualquer tipo de subsídios”. E disse que, ao
invés do que muitos pensavam, “não continuámos o erro e pusemos fim às tarifas
feed-in”, tendo alguns garantido que “nunca íamos conseguir”. Contudo, não prevê
fazer qualquer alteração legislativa para baixar os subsídios às renováveis,
como sugeriu o BE.
Com
efeito, na visão de Jorge Costa, deputado do BE e relator da comissão de
inquérito às rendas excessivas da energia, “o sobrecusto da PRE não é todo ele
uma renda excessiva”, mas “deveria ter sido previsto um mecanismo que
reajustasse ao longo do tempo o valor da parte subsidiada da tarifa”. E adverte
para a possibilidade de um pagamento excessivo de 400 milhões”. E, quanto à decisão
do governo de Passos, em 2013, de prolongar mais 7 anos (de
2020 até 2027) os
subsídios às renováveis e fala de benefício extra de quase mil milhões de euros
aos produtores eólicos.
Depois
de Mira Amaral ter ido ao Parlamento falar do “monstro elétrico”, gerado pelo boom das eólicas com subsídio, quase
todos os especialistas que já passaram pela CPI (comissão parlamentar
de inquérito)
alertaram para as rendas excessivas nas renováveis. E Sá da Costa riposta:
“Foi assim que foi decidido pelos governos anteriores. Não se pode
voltar atrás. Há coisas que são irreversíveis.”.
***
Outro encargo do Estado a favor de privados que
pesa nas contas das famílias via fatura da eletricidade é o carregamento de
baterias dos carros elétricos. São 29 mil euros por mês que engordam
iniquamente a fatura aos contribuintes. Com efeito, a Mobi.E – empresa pública (nossa, que
não quisemos nem a autorizamos a pagar o que não queremos nem consumimos) paga mensalmente, em média, este montante pela
eletricidade fornecida aos postos de carregamento normais e que agora será
fornecida exclusivamente pela Galp.
É certo que
os carregamentos rápidos (80% da bateria em 30 minutos) em
60 postos da rede Mobi.E serão pagos
pelos utentes a partir de outubro. Estava previsto que esse regime passasse a
vigorar a partir de 1 de julho, mas o atraso (aliás nova derrapagem) faz com que os contribuintes sejam sobrecarregados
durante mais de um ano com um benefício de que não usufruem.
No
entanto, a “fatia de leão” tem a ver com o valor pago pela Mobi.E (o
Estado) face aos
restantes 400 postos de carregamento normal: a tal fatura mensal que já ascende
a 29 mil euros por mês e com perspetivas de novos aumentos ao longo dos
próximos 6 meses, em função do preço da eletricidade e do aumento do número de
carregamento e de carros elétricos a circular nas nossas estradas. Este
valor foi revelado por fonte do processo, que diz ter a conta paga pela Mobi.E sofrido já uma
subida na ordem dos 4000 euros mensais desde meados de 2017.
Números
da Mobi.E mostram que no 1.º semestre deste ano foram registados 223 000
carregamentos (mais 150% face ao período homólogo) na rede Mobi.E, atinentes a 2,3
GWh (mais
206%). Na totalidade,
em 2017, houve 229 000 carregamentos e 2,1 Gwh. Outra fonte revela que os
carregamentos rápidos (80% da bateria em meia hora) começarão a ser pagos pelos
proprietários dos carros elétricos ainda no 3.º trimestre (até
outubro), enquanto
os carregamentos normais ficarão a cargo dos consumidores “no início de 2019”.
(https://www.dinheirovivo.pt/economia/carregamentos-eletricos-custam-29-mil-euros-por-mes-aos-contribuintes/)
A AUVE (Associação de Utilizadores de Veículos
Elétricos) espera novidades para “este verão” no sentido de cada um começar
a pagar a rede de carregamento rápido. Mas, para já, o processo está do lado da ERSE,
cabendo-lhe chegar a acordo com a Mobi.E, após reunião da passada semana, sobre
se a conta da mobilidade incluirá a contribuição para o audiovisual (2,85
euros por mês, sem IVA)
paga à RTP, entre outras parcelas que poderão sobrecarregar os preços.
Fonte da
EDP atira para a Mobi.E a responsabilidade da “definição do calendário relativo
ao início da cobrança dos carregamentos”, sendo que “o modelo requer que esteja
totalmente definida a contratualização entre agentes, conceitos a cobrar, e
testes de operacionalização da plataforma”. Obviamente, a EDP não regista “perdas
significativas”. Não obstante, avisa que “a ausência de cobrança dos
carregamentos tem consequências para o desenvolvimento da mobilidade elétrica,
dissuadindo o investimento dos operadores em infraestruturas”.
Até
agora e desde abril de 2017, cabia à ENAT Energias o fornecimento de energia
elétrica à rede da Mobi.e. Porém, a Galp já anunciou que passará a ser a
fornecedora exclusiva de eletricidade nos pontos de carregamento da rede
pública de mobilidade elétrica da Mobi.E, que integra cerca de 1000 tomadas, ou
seja, a partir de agora será a Galp a cobrar à Mobi.E os cerca de 29 mil euros,
ou mais, por mês. Informou, a este respeito, a empresa em comunicado:
“A energia elétrica fornecida pela Galp será utilizada no carregamento
dos veículos elétricos nos pontos de carregamento normais da rede pública de
mobilidade elétrica [...], durante a fase que antecede a abertura de mercado”.
O mesmo
comunicado refere:
“Atualmente os utilizadores de veículos elétricos carregam gratuitamente
os seus veículos nos pontos de carregamento da rede pública de mobilidade
elétrica. O arranque da fase de mercado que estava previsto para junho de 2018
foi entretanto adiado, prevendo-se agora que ocorra neste terceiro trimestre.”.
A partir
desse momento, como explica a Galp, os utilizadores de veículos elétricos terão
de estabelecer contrato com uma CEME (Comercializadora de
Energia para a Mobilidade Elétrica)
– como a Galp Power, a EDP Comercial ou a Prio, entre outras –, e pagarão a
eletricidade com que abastecem os seus veículos na rede pública.
A ACAP (Associação
Automóvel de Portugal)
diz que nos primeiros 6 meses do ano se venderam 1868 automóveis movidos só com
baterias elétricas, mais do dobro (156,2%) que no período homólogo.
Nas razões
dos sucessivos atrasos na cobrança dos carregamentos elétricos, a Mobi.e fala
em trabalhos em curso e diz que só quando todos os stakeholders se sentirem
prontos, se avançará para a fase de mercado, pois a empresa tem todo o
interesse em a mobilidade elétrica funcionar da melhor forma. Ademais, está a
decorrer um projeto de atualização tecnológica em 304 postos da rede de
carregamentos, a cargo da Efacec (por 570 mil euros) que ficará pronto até outubro.
***
Um
estudo da ERSE prova que existem compensações excessivas a produtores de
eletricidade, nomeadamente na energia eólica com tarifas subsidiadas.
Na verdade,
Cristina Portugal, presidente da ERSE, anunciou hoje, dia 24, no Parlamento que
o regulador está a levar a cabo um estudo, cujas conclusões serão atempadamente
apresentadas, que prova a existência de compensações excessivas a alguns
produtores de eletricidade, nomeadamente na energia eólica com tarifas subsidiadas,
entre outros. Na sequência desse estudo, a ERSE proporá “medidas corretivas” a
tais compensações excessivas para baixar as tarifas pagas pelos consumidores.
Na intervenção inicial, a responsável da ERSE afirmou que a Produção em Regime
Especial (que diz respeito às renováveis) tem “um peso muito
significativo nas tarifas” pagas pelos consumidores.
Frisando
que o predito estudo será publicado “muito em breve, até setembro”, durante a
vigência da CPI às rendas excessivas aos produtores de eletricidade, Cristina
Portugal partilhou com os deputados uma conclusão do mesmo: “85% da produção de eletricidade em Portugal
tem algum tipo de subsídio ou incentivo”. E confessou a dificuldade
presente de dizer que “já chegámos a um mercado verdadeiramente liberalizado”,
pois, ainda há ajustamentos a serem feitos para funcionar de forma mais livre”.
E, vincando que a “sobrecompensação paga pelos consumidores pode ter a ver com
as tecnologias”, disse:
“Alguns produtores terão sobrecompensação. Pode ter a ver, por exemplo,
com as eólicas com tarifa feed-in em que, entre o tempo dado para uma eólica
entrar em produção e o momento em que realmente entrou, a tecnologia
embarateceu. Aqui a rentabilidade é mais elevada face aos que entraram mais
rapidamente em produção.”.
Além disso,
revelou que o regulador está a fazer o aludido estudo “para determinar os
custos nivelados de produção elétrica e a rentabilidade face aos 10 principais
segmentos de produtores, tendo em conta os “mecanismos de mercado e os
mecanismos complementares”. De facto, “antes, não era possível realizar esta
análise”; agora, o estudo quer perceber “como estamos a remunerar os produtores”
e “quem está subsidiado”, entre outras questões.
***
BE o
PCP puseram a redução do IVA na eletricidade na lista de prioridades para o OE 2019,
por melhorar os rendimentos de “todo o país” e por
ser medida a tratar como as demais reversões da troika (a subida do IVA de 6% para 23% na
eletricidade e gás foi a 1 de outubro de 2011). Agora, uma primeira avaliação resultaria num
ganho de 120 a 170 milhões de euros.
Também
o Governo está nesta onda, mas avisando que o cálculo tem de
ser feito com cautela, não deixando de fora nenhum custo, como ponderar se a descida
se estende ao gás, mesmo ao gás de botija. E ainda é preciso pensar no corte
nas rendas pagas aos produtores de energia.
Num
artigo de opinião publicado, em 2017, no Público,
na sequência do estudo apresentado, o economista Marvão Pereira dizia:
“Quanto
ao IVA sobre a eletricidade, na UE existem hoje apenas 5 países com taxas de
IVA sobre a eletricidade mais elevadas. São eles a Croácia, a Dinamarca, a
Finlândia, a Hungria e a Suécia.”.
Será que
a luz que se vislumbra bruxuleante ao fundo do túnel não se irá apagar? Até quando
continua o assalto legal à carteira dos contribuintes?
Rendas
excessivas sobre qualquer produção pagas pelo contribuinte? Não, por favor! Experiências
de novas explorações de energia e sua utilização pagas pelos contribuintes? Não!
Redução
de imposto aos produtores e experienciadores, sim, mas os custos diretos ou
indiretos que não sejam pagos pelo Estado e não utentes, mas pelas respetivas
empresas! Haja vontade política: tal como um Governo pôde decidir, outro também
o pode fazer… Porque não?
2018.07.24 – Louro de Carvalho
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