Sim, já
lá vão 25 anos. Em 29 de julho de 1993, uma quinta-feira de forte trovoada na
zona de Sernancelhe e Lapa (os telefones avariaram quase dos na
zona), foi firmado,
no auditório do CNE (Conselho Nacional de Educação), em Lisboa, o contrato-programa
da criação da Escola Profissional de Sernancelhe, juntamente com mais uma dúzia
de outras.
O
contrato-programa foi elaborado ao abrigo dos artigos 5.º, 6.º e 7.º do
Decreto-lei n.º 70/93, de 10 de março, e foi assinado em sessão solene, por
parte do Estado, pelo Dr. Alberto Antas de Barros, diretor do DES (Departamento
do Ensino Secundário),
e, por parte das entidades promotoras, pelos respetivos presidentes, Dr. José
Mário Almeida Cardoso, Presidente da Câmara Municipal de Sernancelhe, e Dr.
Joaquim António Ferreira Seixas, Presidente da Associação Jornalística de
Sernancelhe. E o Dr. Manuel Joaquim Pinho
Moreira de Azevedo,
Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário, que presidiu à sessão,
procedeu à homologação dos respetivos contratos-programa.
Estive presente na sessão, dado que, nos termos do n.º 1 do
art.º 5.º do aludido normativo legal, a criação de escolas profissionais era “precedida
da candidatura a um concurso anual de projetos para abertura de novas escolas”
e eu, na qualidade de vice-presidente da susodita Associação Jornalística de
Sernancelhe (AJS), assumi-me como um dos colaboradores ativos da
preparação da candidatura, bem como colaborador nas demais diligências prévias
tendentes à criação da escola, sua organização e funcionamento. Isto não retira
absolutamente nada ao mérito das personalidades acima referidas, já que o
trabalho desenvolvido foi um trabalho de conjunto que teve de suscitar diversas
sinergias e ultrapassar algumas resistências.
Não se pode deixar de recordar, para satisfação do estipulado
no n.º 1 do art.º 6.º do mesmo diploma, o trabalho com o Dr. Jaime Manuel
Oliveira Ferreira na definição dos estatutos, do projeto educativo, áreas e
perfis de formação, recursos humanos e materiais, financiamento e gestão, bem
como a natureza e objectivos da escola, denominação e regime de acesso – no que
ajudaram imenso os contributos da direção da Escola Profissional de Torredeita
e os serviços jurídicos do Departamento
do Ensino Secundário. Obviamente que a parte de
financiamento que incumbia às entidades promotoras foi definida por estas sob a
égide dos respetivos presidentes.
É de justiça salientar o apoio de dactilografia prestado pela
funcionária do município Graça Figueiredo e as diligências feitas no RNPC (Registo Nacional de Pessoas Coletivas), da parte do
então motorista do Conselho Diretivo do Centro Regional de Segurança Social,
Viseu, Jorge Patrício, já falecido, bem como o acompanhamento de Nelson Soares
um pouco para todo o lado.
***
O processo conducente à criação da Escola Profissional foi um
tanto longo e teve informações contraditórias da parte do DES. E o Presidente
da Câmara foi firme no contorno da situação.
Começando do início, deve dizer-se que a ideia da criação da
escola resultou no âmbito de um debate, que moderei, sobre a prossecução dos
estudos dos jovens sernancelhenses (já que
no concelho não havia oferta formativa no ensino secundário), ocorrido a 2
de novembro de 1991 no Salão Nobre do Município com a presença de antigos
alunos e professores do Colégio Infante Santo (criado
em 1966, vindo progressivamente a dar lugar ao ensino público), os
presidentes daquelas que viriam a ser as entidades promotoras, vários
professores, com destaque para o então Presidente do Conselho Diretivo da EB
2/3, o Governador Civil, um Deputado e o antigo Diretor do Colégio.
Quando foram auscultados técnicos do DES, a orientação era de
que o processo não deveria mencionar a autarquia. Como assim se procedeu na
elaboração do material da candidatura, esta acabou por não ser considerada
justamente por não estar expressamente envolvida na mesma a câmara municipal.
Esta foi a grande contradição lançada precisamente por quem tinha a função de
analisar as candidaturas.
Também se ficou a saber que o Secretário de Estado que
tutelava diretamente a criação das escolas profissionais não estava pela
criação da escola em Sernancelhe e alguns achavam descabida a insistência de
Sernancelhe neste projeto, o qual teve a persistência de prosseguir.
Entretanto, o Primeiro-Ministro Cavaco Silva, a 21 de
novembro de 1992, visitou Tarouca, Armamar, Tabuaço, São João da Pesqueira,
Penedono, Sernancelhe e Aguiar da Beira.
Sernancelhe recebeu-o em peso em frente à EB 2/3. E, além dum
memorando rubricado por seis presidentes da câmara presentes, o Presidente da
Câmara de Sernancelhe, em seu discurso, enfatizou a relevância da criação da
escola profissional no concelho, desafiando retoricamente o líder do Governo a
percorrer as diversas paragens do território do município, garantindo-lhe que,
vendo tanto trabalho dos munícipes e seus animadores, “até levaria a mal
estarmos a pedir-lhe tão pouco” (cito
de cor). E foi mais explícito ao dizer: “a maior e melhor obra que V. Ex.cia
pode inaugurar em Sernancelhe será a escola profissional” (cito de cor).
O Primeiro-Ministro respondeu ao discurso e, no atinente à
escola profissional, referiu que estávamos numa escola, que a escola é o
principal motor do desenvolvimento, que à Câmara Municipal cabia a liderança do
projeto e que, depois, “numa perspetiva de complementaridade, o meu Governo
pode apoiar”. Portanto, “não será por culpa do meu Governo que Sernancelhe não
terá a escola profissional” (cito de cor).
As palavras do Primeiro-Ministro foram escutadas por todos,
incluindo José Manuel Durão Barroso, Ministro dos Negócios Estrangeiros, Álvaro
José Brilhante Laborinho
Lúcio, Ministro da Justiça, Manuel Joaquim Dias Loureiro, Ministro
da Administração Interna, José Manuel Nunes Liberato, Secretário da
Administração Local e Ordenamento do Território, e José Manuel Bracinha Vieira,
Secretário de Estado dos Recursos Educativos. Bastava que alguém fosse
lembrando a Cavaco Silva que tinha prometido a criação da escola, o que alguns
dos presentes tentaram fazer logo no dia seguinte em Viseu e que Bracinha
Vieira manteve até ao fim.
Uns dias antes do Carnaval, estivemos (Presidente da Câmara, Presidente e Vice-presidente da AJS) no gabinete de
Bracinha Vieira a dar conta do projeto de candidatura, que deveria ser por nós
entregue nas instalações do DES no Porto. E Bracinha Vieira fez questão de
lembrar diante de nós, por telefone, a Joaquim Azevedo a promessa de Cavaco
Silva em Sernancelhe.
***
Criada a escola, entrou em funcionamento em setembro
seguinte, com duas turmas do 1.º ano, uma de construção civil/condução de obra
e uma de turismo/profissionais de informação turística. E foi crescendo e
gerida pelos órgãos previstos nos estatutos.
Entretanto, com a publicação do Decreto-lei n.º 4/98, de 8 de
janeiro, que estabelecia o regime jurídico das escolas profissionais, estas,
sendo privadas, deixavam de funcionar sob a égide de entidades promotoras, mas
tinham de ser detidas por uma entidade proprietária. Esta podia ser uma pessoa
singular, uma pessoa coletiva – isoladamente ou em regime de associação. Era,
na prática uma refundação, visto que o art.º 20.º do Decreto-lei n.º 4/98, de 8
de janeiro, estabelecia que o regime ora estabelecido se aplicava às escolas
profissionais criadas ao abrigo da legislação anterior; que estas dispunham do
prazo de um ano para procederem à reestruturação decorrente do regime
estabelecido; e que os direitos e obrigações de que eram titulares as
escolas profissionais e/ou as respetivas entidades promotoras e que se
encontrassem afetos ao desempenho das funções daquelas escolas se transferiam,
por força do susodito diploma, que constituía título bastante para efeitos de
registo, com dispensa de qualquer outra formalidade, para as entidades
proprietárias.
Como a AJS deixara de funcionar, fora criada uma associação
designada por Liga dos Amigos da Esproser, a funcionar nos termos estatutários.
Recordo parenteticamente que Esproser era a designação abreviada de Escola
Profissional de Sernancelhe como constava no contrato-programa. E, havendo
dúvidas sobre a forma de entidade proprietária a constituir para responder aos
objetivos do ensino profissional, entendeu-se que a melhor forma seria a de
sociedade anónima (SA), embora sem
fins lucrativos. E, ainda que fossem necessários, ao tempo, nos termos do
código das sociedades comerciais, cinco subscritores para se constituir uma SA,
desde que um dos subscritores fosse uma entidade pública que subscrevesse a
maioria do capital social, bastava um outro subscritor privado. Assim, a
entidade proprietária surgiu duma parceria entre o município, que subscreveu
60% do capital social, e a Liga dos Amigos da Esproser, que subscreveu 40%.
O projeto de estatutos, elaborado com a colaboração de um
jurista e um economista recomendados pela ANESPO, foi submetido, para
aprovação, à Assembleia Municipal e à assembleia geral da Liga dos Amigos da
Esproser.
No RNPC, foi acordado para a SA com a representante da escola
a designação de ESPROSER – Escola
Profissional, S.A.
E, a 9 de junho de 1999 (já lá
vão 19 anos), foi celebrada escritura pública no cartório notarial de
Sernancelhe em que outorgaram, pelo município, o Dr. José Mário Almeida Cardoso,
Presidente da Câmara Municipal, e, pela Liga dos
Amigos da Esproser, o Dr. António Adelino Conde Rebelo, Presidente, e
eu próprio, vice-presidente (os estatutos da Liga obrigavam a
duas assinaturas).
Entretanto,
foi efetuado o registo na Conservatória do Registo Comercial e o Ministério da
Educação emitiu o alvará de funcionamento. E, em setembro, a SA e a escola já
funcionaram com os novos órgãos estatutários.
E,
obviamente, ao longo do tempo, a ESPROSER e a escola foram-se ajustando às
alterações legislativas e às novas circunstâncias. Mas estão de pedra e cal
como uma válida resposta formativa de Sernancelhe às necessidades da região (e
de alguns PALOP) e
como contributo para o seu progresso – e a cumprir as suas obrigações com a
educação, o Estado e a sociedade.
Porém, é
de justiça deixar esta referência da génese e dos alvores da escola para que
conste, já que 25 anos são uma bonita etapa. Só espero que ninguém pense que pretendo
tirar qualquer proveito pessoal ou partidário, já que, a 29 de julho de 2007, também
domingo, me coube apresentar um livro e seu autor, meu amigo. A apresentação, porque
o livro era adequado, fez-se dentro da capela da Senhora das Necessidades e eu
frisei que aquele dia era importante para o concelho de Sernancelhe por ser o
dia aniversário da escola profissional. E alguém disse, na sessão subsequente
da Assembleia Municipal, que eu fora fazer política (?) na capela!...
2018.07.30 –
Louro de Carvalho
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