A sessão extraordinária do Conselho de Ministros de 21 de outubro
debruçou-se, como era de esperar, sobre um conjunto de propostas que Comissão Técnica
Independente (CTI),criada sob a égide da Assembleia
da República, apresentou no seu relatório sobre o impacto dos incêndios
florestais de 17 a 22 de junho, replicado com reforço nos passados dias 14 a 16
de outubro – propostas que o Expresso
sintetizou em sete pontos que aqui se abordam da forma seguinte:
- Criação da Agência para a Gestão Integrada dos Fogos Rurais – na
dependência da Presidência do Conselho de Ministros, que deveria reunir conhecimento para a análise integrada
do sistema de prevenção e combate aos incêndios, evitando que os fogos se propaguem
de forma descontrolada, contaria com
peritos em gestão de fogo e que saibam ler as previsões meteorológicas, coordenaria a elaboração e a execução de um
novo Plano de Gestão Integrada dos Fogos Rurais e deveria equilibrar investimentos entre prevenção e combate, validar as
qualificações dos profissionais e funcionar como uma ‘célula de crise’.
- Reforço do Grupo de Intervenção de Proteção de Socorro – para articular de
modo profissional prevenção estrutural (gestão e limpeza das florestas no
inverno) e combate no início dos fogos,
devendo ser abertos concursos para
técnicos florestais, que sairiam do Instituto da Conservação da Natureza e das
Florestas para a agência.
- Criação de Laboratórios Colaborativos – ideia que surgiu no Ministério da Ciência em resultado da criação da Unidade de
Missão para o Desenvolvimento do Interior e cujo objetivo é ter organizações de produtores ou a
indústria do setor florestal a financiar a investigação científica, sendo
que a Fundação para a Ciência e
Tecnologia já abriu concursos.
- Substituição ou Reformulação do SIRESP – ainda sem
certezas sobre o que será o novo sistema ou o existente reformulado, mas com a
noção clara de que a tecnologia do SIRESP terá de ser substituída por uma tecnologia mais evoluída, capaz de
incorporar imagem e vídeo.
- Registo Desmaterializado de Informações – dado que a verificação
de que “o comando da Proteção Civil interrompeu o registo de informações na
fita do tempo durante o incêndio de Pedrógão levou os especialistas a sugerirem
que se acabe com o registo manual de dados”, que deve ser substituído por um processo automático, semelhante ao das
caixas negras dos aviões. – Criação de Programas de Autoproteção das Populações
– devendo os municípios funcionar como
agentes ativos de proteção civil, ensinando e mobilizando as populações para
limparem as áreas em redor das casas e saberem o que fazer em situações
extremas.
- Integração da Escola Nacional de bombeiros no Sistema Formal de Ensino
– adotando o modelo de escola profissional, a garantir “a formação com
equivalência ao ensino secundário”, admitindo-se a criação de uma Escola Superior de Proteção Civil, pois “os
bombeiros devem ser profissionalizados, com possibilidade de integração na administração
(central e local).
***
À medida que o Conselho de Ministros ia avançando com algumas conclusões,
vinham à Praça ministros dar conta dos resultados.
A primeira comunicação veio pela voz da Ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, que anunciou que o Governo vai
para já “assumir a responsabilidade das indemnizações às vítimas mortais”,
através dum mecanismo de adesão voluntária e extrajudicial – aliás como fora
acertado com os representantes da associação das vítimas. O mecanismo
servirá para acudir às situações tanto do incêndio de Pedrógão Grande como dos
incêndios do dia 16 de outubro.
A Resolução do
Conselho de Ministros Extraordinário referente à matéria criou também uma
comissão composta por representantes das associações das vítimas, do Conselho
Superior de Magistratura e do Conselho de Reitores das Universidades
Portuguesas, que definirá os critérios para a concessão das indemnizações, com
um prazo já definido de 30 dias. Findo este prazo, o processo de concessão da
indemnização será avaliado caso a caso pelo Provedor de Justiça.
***
A seguir,
vieram Pedro Marques, Ministro do Planeamento e Infraestruturas, Vieira da
Silva, Ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, e Capoulas
Santos, Ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, anunciar cerca
de 400 milhões de euros de apoio aos
cidadãos e empresas. Com
efeito, a decisão que saiu da reunião deste Conselho de Ministros
Extraordinário distribui os apoios naquele montante pelos setores seguintes:
Florestas e agricultura: 35 milhões. Capoulas Santos anunciou que, na área florestal, serão criadas duas
linhas de crédito, uma de 5 milhões de euros para a instalação
de parques para depósito da madeira ardida, e outra de 3 milhões de euros para a
comercialização da madeira ardida a preços considerados razoáveis. No setor
agrícola, as medidas que vão ser adotadas de imediato são de apoio à alimentação
dos animais, que se estimam em meio milhão de ovinos e de mais de 100
mil bovinos, para o que serão criadas 5 plataformas logísticas
para a entrega de elementos compostos para animais encomendados pelo Governo à
indústria de rações portuguesa. O Governo vai ainda apoiar, segundo Capoulas
Santos, em 100% os prejuízos até 5000 euros dos pequenos agricultores
e, “acima desse valor, 50% a fundo perdido em tudo o que tenha a ver com perda
de máquinas, equipamentos, instalações, estábulos, motores e culturas
permanentes como vinhas, pomares e olivais”.
Casas e empresas: 30 milhões canalizados para a
recuperação ou reconstrução de habitações afetadas pelos incêndios (que serão
cerca de 500); e outros 100
milhões para apoio às 300 empresas destruídas afetadas e para
manutenção de postos de trabalho nas regiões em causa.
O Ministro
do Planeamento e Infraestruturas, Pedro Marques, afirmou que “adicionalmente, o
Governo decidiu estruturar uma linha de crédito de outros 100 milhões de euros para
apoio à tesouraria das empresas, complementando assim a parte dos investimentos
a realizar em relação à componente não coberta pelo anterior programa de apoios
a fundo perdido”. E disse que “tal como nas habitações, tudo isto se fará
sempre no pressuposto de que primeiro entram os seguros das empresas para a
recuperação da sua atividade. O Governo decidiu ainda criar um novo sistema de
incentivos ao investimento nas regiões afetadas pelos incêndios, que envolverá
“50
milhões de euros de fundos comunitários, que permitirão apoiar 100
milhões de euros de novos investimentos”, medida complementada por um
sistema de crédito fiscal ao investimento.
Salários: cerca de 13 milhões.
O Ministro
do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Vieira da Silva, anunciou que o
Governo aprovou uma medida temporária de apoio ao pagamento de salários de
trabalhadores com emprego em risco em consequência de a atividade económica da
região se encontrar parcial ou totalmente paralisada devido aos incêndios. A
medida, que poderá atingir os 13 milhões de euros, terá um período
de três meses, eventualmente prorrogável. Vieira da Silva frisou que esta
medida de apoio ao emprego será extensível aos casos de postos de trabalho em
risco resultantes dos incêndios de junho passado em Pedrógão Grande.
Resta-me questionar o que pensa o Governo fazer em
relação aos riscos dos incêndios de outubro e outros também de gravidade, já
que não há incêndios inocentes e sem danos a carpir.
***
Também
vieram, de outra vez, os Ministros do Planeamento, Pedro Marques, do Ambiente, Matos Fernandes, e
da Economia, Caldeira Cabral, fazer declarações durante o Conselho de Ministros
Extraordinário, o qual
aprovou a tomada de posição acionista do
Estado na empresa responsável pelo SIRESP, o sistema de comunicações de
emergência utilizado pelos serviços públicos. A decisão do
Conselho de Ministros foi anunciada pelo Ministro do Planeamento e das
Infraestruturas, Pedro Marques, que afirmou que, com o reforço do seu papel na
gestão do SIRESP, o Estado fará novos investimentos, na ordem dos 8
milhões de euros:
“Vamos adquirir mais quatro estações
móveis com ligação satélite para reforçar as comunicações de emergência quando
há incêndios, ou quando se verificam interrupções de rede. Será também
contratado um sistema adicional de redundância com ligação à rede de satélite.”.
Além disso, foram contemplados os seguintes setores:
Limpeza ao longo das
estradas. No atinente
ao programa de limpeza de áreas nas faixas das rodovias e das ferrovias, Pedro
Marques disse que será feita “uma limpeza
integral até aos dez metros, reforçando-se assim a segurança no contexto dos
territórios com maior risco de incêndio”. E prometeu:
“Até ao verão de 2018, neste
processo de limpeza das faixas de proteção da rodovia e da ferrovia, daremos
prioridade aos territórios mais sujeitos ao risco de incêndio”.
Também serão
dados incentivos ao enterramento de cabos aéreos nos canais técnicos que
existem nas estradas e ferrovias (era a crítica recorrente do
Primeiro-Ministro), reduzindo
o pagamento à Infraestruturas de Portugal, que gere a rede de estradas
nacionais e a rede ferroviária.
Mais cem equipas de
sapadores florestais. O Ministro do Ambiente, Matos
Fernandes, anunciou um investimento de cerca de 20 milhões de euros em
várias medidas, nomeadamente na contratação de 500 sapadores florestais (100 equipas) e de 50 vigilantes da natureza. Esta contratação será feita ao longo dos próximos
dois anos e elevará o número de equipas de sapadores a quase 400, sendo também
adquiridos novos equipamentos. Dos novos vigilantes da natureza 20 entrarão ao
trabalho no dia 4 de novembro de 2017. No âmbito da prevenção estrutural das
matas nacionais, o Governo vai alocar três milhões de euros à rede
primária de defesa contra incêndios. E o projeto-piloto da Peneda-Gerês, que
causou uma diminuição da área ardida 60% inferior ao ano passado, vai ser
replicado noutros parques florestais nacionais.
Aproveitamento de
combustível. O Ministro da Economia, Manuel
Caldeira Cabral, anunciou que vão ser feitos os estudos para criar um mercado
de combustíveis para biorrefinarias capazes de utilizar os resíduos resultantes
da limpeza das florestas – modelo que incentivará a valorização dos resíduos
florestais, “criando assim uma capacidade de desenvolver um sistema de recolha,
quer pelas autarquias, quer por empresas que o queiram fazer”.
Será
que a Nova Secretaria de Estado, ora criada, da Proteção Civil e cujo titular foi
empossado, porá em marcha a agência acima referida, bem como a integração da
Escola Nacional de Bombeiros no sistema
formal de ensino rumo à profissionalização bem como a informação atempada
para autoproteção das populações? Bastarão estas medidas? E a reforma da
floresta?
***
Estava nestas cogitações interrogativas quando dei conta da Conferência de
Imprensa de Costa.
Nessa Conferência, após uma sessão de 10 a 11 horas do Conselho de Ministros,
o Primeiro-Ministro reiterou o anúncio
das medidas adiantadas pelos ministros mencionados supra, especificando, além
do que foi dito, a profissionalização dos bombeiros, a existência de uma unidade
que atuará até dezembro do próximo ano na execução de todas as medidas
discutidas. E acrescentou que se aprovou “uma estratégia nacional de Proteção Civil preventiva”, indicando que este órgão não
servirá “só para depois das calamidades” e declarando:
“A Proteção Civil tem que
começar na informação que é dada desde a escola até cada casa, para que todos
possamos estar melhor preparados para nos protegermos dos riscos”.
Ao nível dos bombeiros e autoridades, sublinhou que é
“prioritário reforçar o profissionalismo e a capacitação em todo o sistema”.
Além da aposta na profissionalização, a Estratégia Nacional
de Proteção Civil Preventiva vai reforçar o papel das (FA) Forças Armadas (e, em especial, da Força Aérea) na prevenção e combate aos incêndios. Assim, nesta área, as FA
terão papel reforçado no apoio de emergência, a nível do patrulhamento, cabendo
à Força Aérea a gestão e operação dos meios aéreos, que abrangerão os meios
próprios que este ramo das FA venha a dispor, mas também “a gestão dos meios
próprios do Estado e a gestão dos contratos de meios aéreos de combate aos
incêndios”. Segundo Costa, haverá um papel alargado das FA no atinente “ao
apoio militar de emergência ao nível do patrulhamento, nas ações de rescaldo, parte
logística, auxílio junto das populações e, ainda, no respeitante às capacidades
no apoio ao processo de decisão”. E, no sentido de profissionalização do modelo
de combate aos fogos, “será retomada a expansão das companhias dos GIPS (Grupo de Intervenção
Proteção e Socorro) da GNR”.
Por outro lado,
“o
Ministério da Agricultura tem que ganhar uma nova centralidade à frente deste
processo”. Serão criadas condições para os atuais cabos
aéreos, quer de comunicações, quer de eletricidade, não serem apanhados pelo
fogo, devendo ser enterrados, para evitar ou, ao menos, minimizar esta
possibilidade. Serão, ainda, criadas mais 4 unidades móveis satélite para assegurar as comunicações em zonas onde
a rede fixa deixe de funcionar.
O Primeiro-Ministro
terminou a conferência de imprensa com uma apreciação pessoal sobre a sua
contenção durante este verão, num misto de explicação e de apresentação de mea culpa:
“Cada um de nós vive as emoções de
um modo próprio e quem é primeiro-ministro deve procurar diferenciar as
emoções que sente enquanto pessoa da forma como as exterioriza no exercício das
suas funções. Admito ter errado na forma como contive essas
emoções, gostava muito mais se alguém tivesse dito que eu tinha abusado das
minhas emoções”.
As declarações
dos ministros e de António Costa configuram a apresentação das linhas
gerais de uma reforma profunda da prevenção e combate de incêndios em Portugal, a responder às Críticas da CTI. Costa
trouxe, já ao final da noite, a estrutura de uma reforma sistémica do sistema
de prevenção e combate de fogos, que será implementada por uma comissão que
responderá diretamente ao Primeiro-Ministro. Entre as alterações a fazer, contam-se, por
exemplo, a institucionalização da Proteção Civil, que passará a ter dirigentes
nomeados por concurso, e a especialização entre o combate aos
fogos rurais e a proteção de povoações, que será separada entre GNR e bombeiros
voluntários. É a priorização simultânea da aproximação ao meio rural e do aludido
reforço do profissionalismo e da capacitação em todo o sistema.
Na sua
intervenção, transmitida pelas televisões a partir de São Bento, assumiu:
“Compreendo
a revolta que muitos sentem. O tempo das instituições não é o tempo da vida de
cada um de nós.”.
O Governo promete!...
2017.10.21 –
Louro de Carvalho
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