Face à
probabilidade de as escolas retomarem a quase normalidade, entre 14 e 17 de
setembro, com aulas presenciais para toda a escolaridade e à previsão da DGS (Direção-Geral
da Saúde) da possibilidade dum surto em
outubro, há comportamentos do ano letivo anterior a não repetir.
O Ministro
da Educação disse que a aplicação do regime não presencial ou do regime misto
apenas acontecerá “se as autoridades de saúde nos disserem que é preciso
fazê-lo num determinado território ou em todo o país”. Entretanto, professores e diretores advertem que
não se podem repetir alguns erros do passado na hora de regressar a casa.
O DN afirma que os relatos de escolas
encerradas fazem prever que no próximo ano letivo se remará consoante a maré. E
aponta o caso da criança dum jardim de infância testou positivo para a covid-19,
no dia 14, obrigando ao isolamento de outras 28 crianças e 4 funcionários,
o dum surto registado numa fábrica, o dum surto numa escola básica, que levou
ao encerramento deste estabelecimento de ensino de forma preventiva, para
limpeza e desinfeção, e o da infeção duma funcionária num centro de ATL, que
obrigou ao seu encerramento.
Faltando dois
meses para o arranque das escolas e vindo as autoridades de saúde nacionais e
internacionais a avisar que a pandemia está longe do fim, com a DGS a colocar
em cima da mesa a possibilidade dum pico de infeções em outubro, mudança de
estação, em que se tornam mais visíveis as fragilidades na saúde dos cidadãos, o
Ministro da Educação diz que “temos de
estar preparados para o pior”, ou seja, para voltar a fechar as escolas e
acionar de novo o ensino à distância. Porém, isto implica ter em conta as fragilidades de milhares de
famílias: as que não têm computador ou que não têm um computador a mais
para os filhos, bem como as que não podem ficar em casa a garantir-lhes o apoio.
E, tendo o Governo prometido acionar um programa de universalização do acesso a
equipamento e internet para todos os alunos já no próximo ano letivo, Filinto
Lima, presidente da ANDAEP (Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e
Escolas Públicas) afirma que
o cumprimento desta promessa “é
essencial” para um ensino à distância mais sereno, embora admita não ser
suficiente por haver “outras situações a ter em consideração no regresso do
ensino à distância para professores e alunos”.
Recorde-se que, depois do encerramento das escolas em março, os professores tiveram de repensar a forma de ensinar,
mas a grande dúvida manteve-se sobre a forma mais justa de avaliar os alunos,
com recursos e contextos tão diversos. A grande maioria trocou os testes por apresentações de trabalhos e pela
valorização da assiduidade e do esforço comprovado de cada aluno – o que
os diretores e professores dizem ser um passo no caminho certo e que já deveria
ser a realidade educativa em Portugal. E
era, mas a pressão social fê-los incidir sobre os testes!
Contudo, nem
todos os professores foram capazes de garantir avaliações inovadoras neste
contexto, o que gerou críticas da parte de pais. Por isso, Filinto Lima alerta
que o modelo de avaliação deve ser repensado “seriamente” se os alunos
regressarem a casa, sendo importante
definir os critérios de avaliação como se fez para o 3.º período e diminuir a
ponderação dos testes de avaliação, pois “fazer uma avaliação à distância, à
partida, será sempre diferente”. E diz que os testes escritos, por
exemplo, “podem ser feitos pelos pais ou com outras ajudas, sem que o saibamos”,
esquecendo que os outros trabalhos
também o podem ser.
Já Paula Carqueja, dirigente da ANP (Associação
Nacional de Professores), opina é mais importante a avaliação permanente dos alunos que julgá-los
por um teste”, não só em tempos de pandemia, mas de forma contínua. Esquece o que as escolas já se tinham
habituado a fazer, tendo apenas sucumbido à pressão dos rankings e dos pais!
(Li no antigo site da DGIDC que os testes nunca foram obrigatórios: tudo
dependia do professor). E esta dirigente
da ANP, em entrevista ao DN em junho,
já lembrava que no teste há vários fatores associados “a todo o momento e à
resposta”, o que prejudica a avaliação e aprendizagem do aluno e apontava a
desmotivação do aluno que, tendo um trabalho excelente – em que se esforçou
para investigar e ser criativo, o que hoje pede o mercado de trabalho, “depois
falha num teste de memorização, de atenção”.
Quanto aos
exames nacionais, Paula Carqueja afirma perentoriamente que “devem continuar a
existir”, frisando que, ao invés dos testes escritos durante o ano letivo, “o
exame não funciona com uma percentagem superior” a todos os restantes critérios
envolvidos na avaliação final do aluno, “é simplesmente mais uma prova” e “um instrumento
de equidade nacional”. E é apologista de que os exames nacionais devem prosseguir
“nos moldes em que ocorreram neste ano”, em que os estudantes fazem apenas
os exames de que necessitam para concorrerem aos seus cursos na faculdade. Assim, como é que o exame é só mais uma
prova, se decide o ingresso e não tem a ver com a classificação da disciplina
para termo do ensino secundário?
Desde que o
aluno trocou a sala de aula por uma secretária (às vezes, improvisada) em casa, os pais passaram a estar perto de um ataque
de nervos com a quantidade de trabalho que recaía sobe o filho e, inevitavelmente, sobre eles. Com
efeito, pela distância, vários professores aceleraram o ritmo dos
alunos, pedindo diversos trabalhos que deveriam ir sendo apresentados para lá
das aulas síncronas. Os diretores, que reconheceram, na altura, ter havido “exagero”
da parte de alguns docentes, prometem que o erro não se repetirá. Na verdade,
segundo Filinto Lima, não só deve ser repensada a avaliação, mas “também deverá existir maior cuidado em
relação às tarefas que os professores entregam aos seus alunos”, pois
foi grande o desafio que o ensino à distância acarretou para muitas famílias,
divididas entre a vida profissional e a vida escolar dos filhos. “Os pais são
parte essencial, sobretudo ao nível do 1.º ciclo, mas a tentativa deve ser a de
procurar não os deixar como apoio constante aos alunos” – sentencia.
***
A
este respeito, Andreia Lobo vinca ao “educare.pt”
que os pais não são “professores” no ensino à distância. De facto, com a escola em casa, pais e professores quase trocaram
papéis. Porém, ensinar cabe aos professores; dos pais, espera-se a criação das
condições para o sucesso.
Muitos pais dividiram os dias de confinamento entre o
trabalho e o apoio aos filhos no ensino. Ao longo de 4 meses, a escola mudou-se
para casa. E agora, o ensino à distância e o ensino misto são dois cenários
possíveis para o regresso às aulas
Perante a possibilidade de o próximo ano letivo não
ser presencial para todos os alunos, Júlia Azevedo, presidente do SIPE (Sindicato
Independente de Professores e Educadores), clarifica
que escola em casa não significa transformar os pais em profissionais da
educação, pois o seu papel será o de supervisionar e criar condições para que o
filho “tenha o melhor sucesso”, por exemplo, ajudá-lo a organizar o horário
para conseguir ser assíduo e pontual, proporcionar um local adequado para ele
estar no computador… E relata que “muitos alunos estavam na cama ou a tomar o
pequeno-almoço, ou num local completamente desconfortável”. Ora, porque “ todos
sabemos muito bem o que acontece quando tudo é em casa”, avisa que “os pais
devem tentar criar vários momentos: o de trabalho, o de lazer, o da refeição…”.
Na lista de afazeres parentais mantém-se, segundo Júlia Azevedo, a necessidade
de verificar o cumprimento das tarefas escolares, “apoio que já deveria existir
no ensino presencial, só que agora é muito mais premente”. E, como “os pais têm
de saber que o processo ensino-aprendizagem é uma interação professor-aluno”,
não lhes cabe “interromper, nem dar dicas nas aulas, porque assim só estão a
desautorizar o professor, a falar do que não sabem e a prejudicar o filho e a
turma inteira”.
Por seu turno, Jorge Ascenção, presidente da CONFAP (Confederação
Nacional das Associações de Pais), acredita
que, “se alguma lição os pais retiraram da experiência letiva destes últimos
meses, foi a de que acompanhar os filhos é muito mais que ajudar nos trabalhos
de casa, levá-los à escola ou ir às reuniões de direção de turma. Assim, “muitas
famílias que não acompanhavam os filhos além do essencial, perceberam que o
acompanhamento é estar envolvido no processo educativo, é conhecer a escola e
dar-se a conhecer à própria escola”. E resume: “é participar de uma forma ativa,
pró-ativa e não apenas passiva”.
Este dirigente do movimento associativo parental diz que os
pais tiveram uma perceção diferente do que é o trabalho escolar, pois “de
alguma forma a sala de aula esteve em nossa casa”, não porque os pais tivessem
de estar presentes na sala de aula, mas, sentindo-se obrigados a dar ajuda em
algumas dificuldades pela impossibilidade de o professor estar permanentemente
presente, “puderam perceber todo o processo educativo”.
Júlia Azevedo, julgando pela quantidade de e-mails que
os professores receberam das famílias a agradecer o apoio nestes meses, está
convicta de que muitos pais perceberam a importância do trabalho docente. No
entanto, insiste em que “ensinar cabe aos professores” e em que “não podemos
sobrecarregar os pais com um trabalho que não lhes é possível ter e também que
não sabem nem lhes compete fazer”. E, por outro lado, assegura que, “se os pais
ficaram por dentro do processo educativo, os professores entraram na vida das
famílias” a ponto de observarem que muitos “preparavam os lanches, chegavam os
livros e por aí fora”, e perceberem “alguma falta de autonomia” das crianças do
2.º e 3.º ciclo, causadora de “entraves à aprendizagem”.
Também Jorge Ascenção, que passou muitas horas da
quarentena a responder a e-mails de pais, percebeu que “algumas famílias
tiveram consciência de que até aqui não estariam a acompanhar os filhos como é
preciso”, enquanto outras descobriram nos filhos capacidades que até agora
desconheciam. Como refere, “às vezes, temos a ideia de que as crianças não são
capazes de ter autonomia ou de pensar em certas coisas, pelo que “foi uma
descoberta interessante em termos de família perceber que os nossos filhos têm
capacidades das quais nós duvidávamos”.
E, na perspetiva dum ensino à distância ou misto, com
todas as condicionantes identificadas ao longo destes 4 meses, Júlia Azevedo
antevê que o 1.º período de 2020/2021 será “extenuante para toda a comunidade
educativa”. E Jorge Ascenção diz que “setembro não será um recomeço, mas um
começar diferente”, com a vantagem de não sermos apanhados de surpresa.
Enfim, que esta ataraxia coletiva ajude a superar
melhor a crise sanitária, a crise escolar e a crise socioeconómica. E que Deus
ajude, que bem é preciso!
2020.07.18 – Louro de Carvalho
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