Noticia o Expresso
que chegou agora o parecer do Conselho Superior de Obras Públicas (CSOP) sobre o Programa Nacional de Investimentos (PNI 2030), aprovado pelo Governo em janeiro de
2019,
deixando muitas dúvidas sobre quantos projetos suficientemente amadurecidos tem o país para
concretizar no curto prazo. Obviamente – nem era preciso que o parecer o
referisse – o programa tem de ser reformulado, pois a crise pandémica tornou-o francamente
desatualizado.
Não obstante, o documento do CSOP aponta o dedo a “investimentos
por definir e avaliar, projetos por calendarizar e orçamentar, análises de
viabilidade financeira por fazer, mecanismos de controlo por instituir”. E,
quando a UE chega a um acordo que obriga Portugal a executar uma média de €6
mil milhões de subsídios europeus por ano entre 2021 e 2029, o recado deste
órgão independente não deixa de ser pertinente. Porém, o Primeiro-Ministro já
sabia e tinha avisado que se trata dum “enorme desafio”, porque o país terá
mais que duplicar o ritmo de execução dos fundos para não perder o dinheiro
disponibilizado na UE para recuperar da crise, o que implica um aumento da
execução física e financeira dos projetos e da respetiva avaliação.
E o Governo não pode descartar as culpas que o cartório lhe
mostra, pois fazer depender a execução de grandes projetos da sua aprovação por
uma maioria qualificada parlamentar é um desiderato politicamente insensato,
pois muitas vezes os grandes projetos não podem esperar um consenso tão
alargado sob pena de nunca serem levados por diante. No entanto, um organismo a
quem o Governo confia a emissão dum parecer técnico que sustente a boa
definição de políticas públicas, se se perde no tempo, deixa de ser eficaz e é
de utilidade nula ou redundante.
O desafio começa a 1 de janeiro de 2021. No entanto, o
parecer do CSOP, criado por Costa e formado por peritos eleitos pela Assembleia
da República, no seguimento da promessa eleitoral que ambicionava obter
consenso político e pareceres técnicos para os maiores investimentos públicos,
questiona a preparação para o ciclo que se aproxima. Efetivamente, a menos de
seis meses do arranque do próximo quadro comunitário, segundo o Expresso, “pouco se sabe sobre os
primeiros projetos a arrancar; faltam análises de custo-benefício e de
viabilidade financeira; não estão estabilizados os calendários, as fontes de
financiamento ou os modelos de contratação dos investimentos, nem definidos os
mecanismos de acompanhamento deste ‘megaprograma’ de €22 mil milhões de
investimentos que juntaram Estado e privados”.
É certo que, nas 51 páginas do parecer, a nota é positiva no
geral, designadamente em termos de “coerência” e “sintonia com os diagnósticos
da realidade nacional”. Todavia, ao longo dos 60 pontos das conclusões finais,
há dezenas de referências críticas. Ente elas, sobressai “um certo
desequilíbrio espacial em favor das duas áreas metropolitanas, em especial da
Área Metropolitana de Lisboa, em detrimento do restante território
continental”, sobretudo na área dos transportes, “comprometendo assim o
objetivo da coesão territorial”. Por outro lado, o CSOP adverte que as obras no
aeroporto de Lisboa e o novo aeroporto do Montijo não são uma solução “no longo
prazo”; regista que a distribuição dos investimentos “privilegia a área dos
transportes e mobilidade com mais de metade do investimento total, em contraste
com a área do regadio”; aponta, nos transportes, para a formulação genérica de
alguns programas, bem como algumas indefinições, vindo alguns a exceder “significativamente
os montantes de investimento previsto”; e anota que a “área do ambiente” inclui
“alguns programas com valores insuficientes face à dimensão das carências
identificadas”.
Contudo, mais que os projetos em si, o que leva ao ceticismo dos
peritos é a capacidade do país em implementar esta estratégia com os necessários
cuidados e avaliações. Assim, recomendam, como “importante e urgente”, a
“avaliação sistemática da efetiva maturidade dos projetos, bem como da sua viabilidade técnica, económica e financeira, do seu impacto territorial e ambiental e do
seu enquadramento orçamental e respetivo modelo de contratação”. E pedem ao
Governo “a disponibilização atempada de informação sobre as prioridades de
investimento”, de modo a permitir que “as entidades públicas responsáveis e os
agentes económicos em particular se organizem com a devida antecedência face às
oportunidades de investimento que se irão abrir progressivamente”.
Ademais, face a todo um novo cenário económico, em que a
covid-19 travou a economia, os desafios “reclamam a urgência do arranque do PNI
2030”, mas com alterações, pelo que “o Programa deve ser revisitado” e
acrescentado, apostando mais no digital.
Veremos se o plano de Costa Silva (o conselheiro nomeado pelo
Primeiro-Ministro) para
a retoma apresentado, que incorpora, sem os substituir, vários dos
investimentos previstos no PNI 2030, acrescentando-lhes outros que considera
decisivos para o futuro do país, irá por diante.
Entretanto, fonte do Gabinete do Primeiro-Ministro, como
indica o Expresso, sustenta, com uma clara
nota de confiança, apesar de Marcelo ter declarado que o parecer é sobre o
passado:
“O que está no PNI 2030 não é alterado e
mantém-se plenamente. O que está agora em causa vai para lá disso e não é da
mesma natureza, não é estritamente um plano de infraestruturas. É mais do que
isso e abrange outras áreas (resiliência à pandemia, adaptação às alterações
climáticas, recuperação das empresas, emprego, qualificações, social, etc.). As
prioridades vão naturalmente assentar no documento de Costa Silva e têm também
de estar alinhadas com as recomendações específicas da Comissão Europeia para
Portugal dos últimos anos.”.
E o parecer do CSOP dá uma ajuda listando duas dezenas de
investimentos a que deve ser dada prioridade, avançando já no curto prazo,
entre 2021 e 2023. Neste âmbito, destaca-se: a seleção rápida dos projetos de
desenvolvimento dos sistemas de transportes coletivos nas Áreas Metropolitanas
de Lisboa e do Porto e demais cidades acima de 100 mil habitantes e a decisão
de por onde consolidar as redes de metropolitano; o avanço rápido, na ferrovia,
do programa de reforço da capacidade da rede das áreas metropolitanas, o
aumento de velocidades no eixo Porto-Lisboa e a antecipação da data de início
da nova ligação Sines-Grândola; a célere conclusão, na rodovia, do IP8 entre
Sines e Beja, o reforço do programa de construção de missing links ou a aceleração do programa Arco Ribeirinho Sul –
Ligação A2/Aeroporto; e a consolidação de redes nacionais de eletricidade, a
promoção das energias de fontes renováveis, a revitalização do regadio e a via
navegável do Douro, bem como a segunda fase da expansão do Aeroporto Humberto
Delgado, que deve avançar rapidamente “se a opção não for por uma solução
aeroportuária de longo prazo para Lisboa”.
Enfim, compete ao Governo promover, quanto antes, planos de
ação devidamente quantificados e calendarizados, de modo que não se percam
verbas por incompetência e o país se revitalize.
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