O Decreto-Lei
n.º 27/20, de 17 de junho, alegando o compromisso do Governo com a modernização
do Estado, enquanto “pedra angular do desenvolvimento socioeconómico do País e
de uma maior eficiência, eficácia e qualidade nas respostas às necessidades das
populações”, altera a orgânica das comissões de coordenação e desenvolvimento
regional” (CCDR). Por outro lado, evoca o Programa do
XXII Governo Constitucional, que, no quadro da “concomitante transformação do
modelo de funcionamento do Estado” postulada pela predita modernização, “prevê
a consolidação do processo de descentralização em curso, estabelecendo uma
governação de proximidade baseada no princípio da subsidiariedade, aprofundando
a autonomia das autarquias locais e a sua capacidade para garantir o melhor
interesse dos cidadãos e das empresas que procuram uma resposta mais ágil e
imediata da parte da Administração Pública”.
O predito decreto-lei
procede à 3.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 228/2012, de 25 de outubro, na redação,
que aprovou a orgânica das CCDR, incidindo na forma de designação do presidente
e dos vice-presidentes, para garantir “uma maior representatividade de todos os
intervenientes locais”, uma “melhor administração ao nível regional”, o reforço
da legitimidade democrática e a transparência “ao nível da governação regional”.
Neste âmbito,
estabelece que a CCDR “é dirigida por um presidente, coadjuvado por dois
vice-presidentes”, que “são nomeados por resolução do Conselho de Ministros”,
na sequência dos procedimentos previstos no presente diploma.
O presidente
é indicado mediante eleição por um colégio eleitoral composto pelos seguintes
eleitos locais da área geográfica de atuação da respetiva CCDR: presidentes das
câmaras municipais; presidentes das assembleias municipais; vereadores eleitos,
ainda que sem pelouro atribuído; e deputados municipais, incluindo os
presidentes das juntas de freguesia. O sufrágio é individual e secreto, em
urna, e cada eleitor dispõe de um voto. Um vice-presidente é indicado pelos respetivos
presidentes das câmaras municipais, respeitando os procedimentos da eleição do presidente,
com as devidas adaptações. E o outro vice-presidente é indicado pelo Governo,
por proposta do membro do Governo responsável pela coesão territorial, em
prévia coordenação com os membros do Governo responsáveis pelas áreas das
autarquias locais e do ambiente, após consulta ao presidente e ao
vice-presidente eleitos.
O presidente
é substituído nas suas ausências e impedimentos pelo vice-presidente designado
por eleição, a menos que o presidente decida de forma diferente.
A designação
do presidente e vice-presidentes respeitará a representação equilibrada de
género.
São elegíveis
os cidadãos maiores cujas habilitações literárias confiram o grau académico de
licenciado e que possuam capacidade eleitoral passiva nos termos do n.º 1 do
art.º 5.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, na sua redação
atual.
As
candidaturas para presidente são propostas por, pelo menos, 10 % dos membros do
colégio eleitoral. A DGAL (Direção-Geral
das Autarquias Locais)
organiza, até 40 dias antes das eleições, uma lista atualizada para cada um dos
colégios eleitorais, com a indicação nominativa dos eleitores. As candidaturas
são apresentadas até 20 dias antes da data da realização do ato eleitoral. No
prazo de 5 dias úteis, contados do termo do prazo para apresentação de
candidaturas, a DGAL verifica a respetiva regularidade, decide, fundamentadamente,
da sua aceitação e torna pública a listagem das candidaturas aceites, através
da respetiva publicação no seu sítio oficial na Internet.
O ato
eleitoral realiza-se durante o mês de setembro e é convocado pelo membro do
Governo responsável pela área das autarquias locais, por comunicação escrita
dirigida às assembleias municipais da área geográfica de atuação da CCDR, com a
antecedência mínima de 30 dias relativamente à data da sua realização. Decorre
no dia indicado na convocatória, entre as 8 e as 21 horas, nas instalações de
cada Assembleia Municipal, sob a responsabilidade da respetiva mesa eleitoral. A
mesa eleitoral é composta por três membros efetivos, um dos quais preside, e 3
suplentes, indicados, respetivamente, pelo membro do Governo responsável pelas
autarquias locais, pela ANMP (Associação Nacional de Municípios Portugueses) e pela ANAFRE (Associação Nacional de Freguesias). A DGAL acompanha o ato eleitoral e cumpre
ao tribunal central administrativo competente o contencioso sobre o processo
eleitoral.
São eleitos
presidente e vice-presidente os candidatos que obtiverem o maior número de
votos validamente expressos dos respetivos colégios eleitorais, não se
considerando como tal os votos em branco. E os resultados eleitorais são publicados
nas instalações da CCDR e no sítio na Internet da DGAL.
O presidente
e os vice-presidentes de cada CCDR tomam posse perante o Primeiro-Ministro, até
ao 20.º dia posterior à publicação, no DR,
da predita resolução do Conselho de Ministros.
A duração dos
mandatos do presidente e dos vice-presidentes é de 4 anos, sujeitos ao limite
de três mandatos consecutivos. E cessam: pelo seu termo; por renúncia ou pedido
de demissão do titular, mediante comunicação escrita dirigida ao membro do
Governo responsável em razão da matéria, com a antecedência mínima de três
meses; por extinção ou reorganização da CCDR; e por deliberação do Governo,
mediante resolução do Conselho de Ministros, nos seguintes casos:
- Incumprimento das orientações
estratégicas e dos objetivos fixados para as CCDR, articulados entre os
membros do Governo responsáveis pelas áreas do ambiente, do ordenamento do
território e das autarquias locais;
- Incumprimento dos objetivos definidos no plano de atividades aprovado
ou desvio substancial entre o orçamento e a sua execução, salvo por razões não
imputáveis aos respetivos titulares;
- Prática de infrações graves ou reiteradas às normas que regem as CCDR;
- Inobservância dos princípios de gestão fixados nos diplomas legais e
regulamentares aplicáveis.
Em caso de
vacatura do cargo de presidente, a designação em substituição é feita pelo
membro do Governo responsável pela coesão territorial, em coordenação com os
membros responsáveis pelas áreas das autarquias locais e do ambiente, para
garantir a continuidade da ação da CCDR até nova eleição e designação de novo
titular. E, em caso de vacatura do cargo de um ou ambos os vice-presidentes, a
designação do novo titular é feita, nos três meses seguintes à data da
verificação da vacatura, segundo os procedimentos pelos quais obtiveram o cargo.
O novo
titular desempenha funções até ao termo do mandato do titular anterior.
***
Antes de
mais, é de vincar que temos um regime que não é carne nem peixe: uma designação
resultante de uma eleição por um colégio eleitoral restrito (caso do presidente) e, no caso dum vice-presidente, um
colégio eleitoral minimalista. E há um vice-presidente indigitado pelo Governo.
Depois, trata-se duma eleição em que não tem voz o grosso dos cidadãos eleitores,
quando afinal elegem os deputados nacionais, os eurodeputados, o Chefe de
Estado, a assembleia municipal, a câmara municipal e a assembleia de freguesia.
Ora, se um órgão regional tem a relevância que se propala, porque não é eleito
diretamente pelos cidadãos com capacidade eleitoral ativa?
Já basta de eleições
indiretas para as áreas metropolitanas e para as comunidades intermunicipais…
Por outro
lado, é estreita a ação da tutela governativa: pode fazer cessar os designados
por eleição; indigita um vice-presidente; acompanha, pela DGAL, o ato
eleitoral; continua a definir os objetivos da CCDR; e recebe a posse dos
dirigentes da CCDR através do Primeiro-Ministro.
Não temos
verdadeira descentralização, visto que as CCDR não passam a gozar autonomia estratégica,
os dirigentes podem ser exonerados administrativamente, e não pelo poder judiciário,
e o controlo é feito pelo Governo e não por um órgão eleito democraticamente.
Quanto à legitimidade,
tanto vale uma nomeação governamental, já que os cidadãos elegeram o Governo
indiretamente quando elegeram o Parlamento, como uma designação através das câmaras
e assembleias municipais. E isto não aumenta nada nem acrescenta à proximidade.
O Governo não
quer ir para um procedimento de regionalização porque foge ao referendo e
subscreve a vontade do Chefe de Estado. Aí teríamos a assembleia regional
eleita diretamente e com poder deliberativo e fiscalizador do poder executivo. Ora,
se não se pode ou se não se quer ir para uma regionalização com órgãos próprios
e democráticos, não se tape os olhos dos eleitores com a peneira, dando alegadamente
mais poderes aos autarcas. Não há necessidade, pois o povo sabe esperar e
julgar em tempo oportuno. A democracia não ganha com tal manobra governativa e perde
credibilidade.
O decreto-lei
vai ser objeto de apreciação parlamentar. Os deputados têm a faca e o queijo
para deliberar de forma sensata. Resta saber se o farão efetivamente ou se
apenas fazem soar os sinos da bagunça.
2020.07.07 – Louro de Carvalho
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