O Parlamento Europeu acaba
de aprovar hoje, dia 13 de junho, a sua nova composição em resultado do “Brexit”, mantendo Portugal o atual
número de 21 deputados, ao invés do que se temia nos círculos de políticos e de
observadores.
Efetivamente, de
acordo com as últimas informações, veiculadas sobretudo pelo Expresso on line, o Parlamento Europeu aprovou esta quarta-feira, em
Estrasburgo, por uma esmagadora maioria – 566 votos a favor, 94 contra e 31
abstenções –, a proposta dos correlatores Pedro Silva Pereira e Danuta Hubner
no sentido de ser dado consentimento final à nova composição do Parlamento no
pós-Brexit, que entrará assim em vigor já nas eleições europeias de 2019, que
se realizarão lugar entre os dias 23 e 26 de maio de 2019.
É de registar que a proposta inicial sobre a composição do Parlamento
Europeu, apresentada pelos preditos correlatores, já havia merecido, no passado
dia 7 de fevereiro, apoio claro do plenário, pelo que a proposta seguiu então
para o Conselho Europeu, onde reuniu um amplo consenso, sendo ali aprovada sem
qualquer alteração.
Este processo legislativo concluiu-se agora com o consentimento final do
Parlamento Europeu.
Pedro Silva Pereira, Vice-Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais
e Correlator da proposta declarou:
“Estou muito satisfeito: a aprovação final
da nova composição do Parlamento Europeu é um final feliz numa negociação muito
difícil. Conseguimos três em um: uma representação mais justa dos Estados no
Parlamento, cumprindo finalmente os princípios do Tratado de Lisboa; um
Parlamento mais pequeno, com 705 deputados em vez de 751, deixando espaço
suficiente para futuros alargamentos e, além disso, a garantia de que nenhum
Estado perde lugares. É, sem dúvida, um excelente resultado para Portugal – que
mantém os seus 21 eurodeputados, ao contrário do que se temia – mas é também um
dia bom para a democracia europeia e para o projeto europeu.”.
***
Como foi
referido, a proposta foi inicialmente aprovada no Parlamento Europeu a 7 de
fevereiro do corrente ano e consistiu na redistribuição parcial dos eurodeputados
pelos países membros já sem contar com os deputados do Reino Unido na sequência
do Brexit. A proposta foi redigida, como se disse, pelo português Pedro Silva
Pereira e pela eurodeputada polaca Danuta Maria Hübner, dividindo os 73
lugares deixados pelo Reino Unido em dois grupos: um de 27 lugares que serão
distribuídos por alguns Estados-membros para compensar a representatividade; e
outro de 46 lugares que ficarão vagos para a possibilidade de eventuais
alargamentos da UE.
Segundo a
proposta, ora tornada lei, França e Espanha receberão cinco deputados,
Itália e Roménia três, Irlanda dois e Polónia, Roménia, Suécia, Áustria, Dinamarca,
Eslováquia, Finlândia, Croácia e Estónia acrescentarão um eurodeputado nas
próximas eleições europeias; e Portugal manterá os seus atuais 21 deputados.
A proposta
continha uma medida bastante polémica por incluir a possibilidade da criação de
listas transnacionais, ou seja, listas criadas pelas famílias partidárias
europeias com deputados de pelo menos 14 países, pelos quais seriam
distribuídos os 46 eurodeputados que integram o susodito segundo conjunto. No
entanto, essa parte da proposta foi rejeitada pelo hemiciclo europeu, muito
embora o grego Yánis
Varoufákis ainda persistisse nesse projeto e dele tenha feito questão entre nós
aquando das comemorações da revolução abrilina este ano, como
naquela altura foi dado público conhecimento.
Depois de
aprovada a proposta, o relatório foi discutido a 23 de fevereiro no Conselho
Europeu onde necessitava de uma decisão unânime, que foi conseguida.
Pedro Silva
Pereira, eurodeputado socialista e um dos redatores do relatório, defendeu que
a proposta procurou seguir “o princípio
básico de que nenhum estado devia perder lugares e a ideia de que se deviam corrigir
as injustiças daqueles Estados que estão sub-representados”, segundo a
proporcionalidade degressiva acordada no Tratado de Lisboa.
O documento
final, que fora remetido ao Conselho Europeu e que lá mereceu a necessária
aprovação por unanimidade, voltou ao Parlamento Europeu para ratificação ou
aprovação final.
***
Dada a
alteração que a proposta inicial teve na sessão do plenário do Parlamento
Europeu a 7 de fevereiro, os 46 lugares de reserva serão utilizados para
futuros alargamentos da União Europeia, como é o caso da Sérvia e Montenegro
que estão em processo de adesão. A este respeito, Silva Pereira explicou, na
ocasião, ao semanário SOL:
“O que para Portugal é um excelente
resultado é, num processo em que se partiu sob a ameaça de perder lugares,
chegar ao final e não só ter a garantia de manter os deputados agora como ter
uma garantia blindada para o futuro”.
E
acrescentou:
“Com os 46 lugares disponíveis que não são
distribuídos [pelos atuais Estados-Membros], mesmo que haja alargamentos
volumosos – em que entrem países grandes – nós sabemos que os nossos 21 não são
atingidos”.
Por seu
turno, Paulo Rangel, eurodeputado do PSD, considerou que a votação foi “uma
vitória enorme para a democracia europeia e para os europeístas”. E
especificou:
“Ao serem derrotadas [as listas
transnacionais] no Parlamento Europeu, julgo que isto deu uma grande força
àqueles que defendem uma composição equilibrada da União Europeia em que não se
aumente a diferença entre Estados grandes e Estados pequenos e médios”.
Também
Marisa Matias, do Bloco de Esquerda, classificou esta deliberação como “uma boa
notícia para a democracia”, considerando:
“Em relação à distribuição, penso que é uma
proposta séria e equilibrada que, pela primeira vez, numa reforma que se faz em
relação à composição do Parlamento, não retira deputados aos pequenos e médios
países”.
Porém, sobre
as listas transnacionais crê “que até às próximas eleições este debate está
encerrado”, embora não acredite que “esteja encerrado para sempre”.
Para Nuno
Melo, eurodeputado do CDS, “este
resultado consagrou anos de esforço contra as listas transnacionais”, pois,
como sustenta, “Portugal é um Estado soberano
e não uma região europeia”, evitando-se, assim “que alguns – poucos – dirigentes de grandes partidos que dominam países
europeus possam escolher representantes de outros países”.
E João
Ferreira, eurodeputado do PCP, considerou, meio insatisfeito, que esta “era uma oportunidade de ouro” para repor
os deputados perdidos ao longo dos tempos, ao passo que Marinho e Pinto, eurodeputado
do PDR, encarou a rejeição das listas transnacionais com alguma tristeza. Com
efeito, como referiu, “não houve a
coragem, a audácia, de dar mais um passo, que era um passo decisivo, no sentido
de reforçar a integração europeia”.
No atinente
às listas transnacionais, a maioria dos eurodeputados portugueses estão de
acordo em que são prejudiciais para Portugal. Apenas o PS, cujo eurodeputado
Silva Pereira foi um dos redatores do relatório, e Marinho e Pinto não
partilham tal posição.
Marinho e
Pinto defendeu e defende o ciclo eleitoral europeu a par dos círculos eleitorais
nacionais dos Estados-membros, visto que, segundo diz, “a construção europeia tem-se feito sobre tudo em torno do papel dos
Estados e tem negligenciado a interação direta com a população, com os povos
europeus e isso tem levado a um afastamento dos eleitores”. De acordo com a
crítica do eurodeputado do PDR, “as eleições para o Parlamento Europeu e as
campanhas eleitorais fazem-se em torno de problemas nacionais, são um remake das eleições para os parlamentos
nacionais – e infelizmente assim vai continuar”. Segundo Marinho e Pinto,
misturaram-se, no caso, “duas questões
completamente diferentes: um projeto político de reforço da integração europeia
e as lutas internas de galos e garnisés na feitura e hierarquização das listas”.
E enfatizou que, “além do mais, esses
receios são fantasmagóricos porque, se há coisa que na União Europeia tem
prevalecido, é justamente o respeito pelos países pequenos”, recordando que
o português Durão Barroso já foi presidente da Comissão Europeia e que o atual
presidente, Jean-Claude Juncker, é luxemburguês.
A grande
vantagem do círculo europeu, para o eurodeputado, era dar “um novo impulso ao europeísmo, à integração europeia, uma maior legitimidade
democrática para o Parlamento, porque este Parlamento é muito a soma dos
deputados nacionais, dos interesses dos Estados-membros e não há um compromisso
direto dos deputados com os seus cidadãos”.
Pedro Silva
Pereira disse que a posição do PS está expressa no relatório e afirmou:
“O Parlamento deveria deixar lugares
disponíveis para essa eventualidade porque compete ao Conselho [Europeu]
decidir”.
Já Paulo
Rangel, Nuno Melo, Marisa Matias e João Ferreira, como declararam ao SOL, estão contra este ponto da
proposta, o das listas transnacionais, já que se meteu “um verdadeiro cavalo de
Tróia nesta moção” (diz Rangel). Sobre essas
listas transnacionais, o eurodeputado do PSD confessou que “são muito más para a Europa e são
especialmente más para países como Portugal, aduzindo como argumento a criação
de “duas classes de deputados”, uma para o ciclo nacional e outra para o
ciclo único europeu, que seria um trunfo para “uma tecnocracia” ou “para um
elitismo europeu”, não constituindo, ao invés do que pensam, “uma ideia de mais
Europa e de mais integração”.
Por seu
turno, Marisa Matias disse que o Parlamento Europeu, quando produz legislação,
já está a produzir “para os 500 milhões de cidadãos dos (ainda) 28 países”. E acrescentou que não é o facto de serem
eleitos por um país que retira aos eurodeputados “essa capacidade de trabalhar
para a União Europeia no seu conjunto”. Para esta eurodeputada existe um fosso
entre as instituições europeias e a população. E, neste âmbito, explicou:
“As pessoas já não sabem o que fazemos aqui,
já não sabem o que se faz nas instituições europeias, não vão passar a saber
por, de repente, passar a haver uma lista que engloba pessoas de outros países
que não conhecem, que lhes estão menos próximas até ao nível da prestação de
contas”.
Por outro
lado, os eurodeputados estão convictos de que o desconhecimento dos candidatos
pode ser uma vantagem para o populismo, que tem vindo a ganhar expressão na
Europa. Neste aspeto, Rangel e Melo identificaram o contraste entre a
popularidade de candidatos como Marie Le Pen com os outros possíveis candidatos
nas listas pan-europeias e lançaram o repto:
“Ninguém saberá em Portugal quem é o senhor
[Gianni] Pitella – que por acaso preside ao grupo dos socialistas no Parlamento
Europeu –, mas, se perguntarem aos portugueses quem é a Marie Le Pen,
porventura saberão”.
***
Entre o PSD,
o CDS, o Bloco de Esquerda e o PCP, só o eurodeputado comunista João Ferreira
vê na nova composição do Parlamento Europeu uma “proposta injusta na medida em
que prolonga desequilíbrios já existentes nas relações de poder nas
instituições da União Europeia”, advertindo que as listas transnacionais não
nos devem fazer esquecer tudo o resto” e lembrando que “têm sido usadas muitas
vezes como um biombo”. Com efeito, o que estava em causa era a não reposição de
deputados a Portugal depois de o país ter perdido quatro representantes com os
alargamentos da União Europeia, pelo que esclareceu:
“Esta é a primeira vez que estamos a
discutir uma recomposição do Parlamento Europeu não na sequência de um
alargamento – que de resto não há nenhum em perspetiva –, mas a saída de um
Estado-membro. E não é um Estado-membro qualquer, é um Estado-membro que
atualmente ocupa 73 lugares no Parlamento Europeu.”.
Para o
eurodeputado comunista “não é compreensível nem aceitável que países que foram perdendo
deputados com os sucessivos alargamentos, como Portugal”, não ganhem um único
deputado com a redistribuição.
Já Pedro
Silva Pereira, eurodeputado do PS, descredibiliza a possibilidade de devolver
os deputados perdidos ao longo dos tempos, pois, se, como diz, “fôssemos
devolver os lugares a todos os países por perdas em ajustamentos anteriores,
então o Parlamento tinha que aumentar para 768 deputados”, ultrapassando, por
esta via, o limite dos 751, imposto pelos tratados. Assim, foi ao ponto de classificar
a proposta comunista como “uma ilusão, uma impossibilidade política e
matemática, uma ideia que simplesmente não faz sentido”.
Para Marisa
Matias, Nuno Melo, Paulo Rangel e Marinho e Pinto é positiva a forma como a
redistribuição dos eurodeputados foi assegurada.
Marisa
Matias acredita que, “do ponto de vista do maior equilíbrio de poderes e de
justiça, provavelmente, ficaríamos melhor se conseguíssemos recuperar os deputados
que, entretanto, perdemos”. Não obstante, a eurodeputada bloquista acredita que
não se pode “olhar apenas para o umbigo e perceber o que se passa em relação a
Portugal”, mas, como sustentou, “temos de olhar para aquilo que é o conjunto da
distribuição dos deputados em termos europeus”.
Por sua vez,
Paulo Rangel considerou a proposta “francamente boa” ao permitir adotar a
proporção da representatividade degressiva, como foi decidido nos tratados, que
faz com que os países maiores necessitem de mais eleitores para elegerem um
eurodeputado. E disse:
“Sinceramente acho que nem podia ser de
outra maneira porque vão sair 73 deputados britânicos e nenhum país podia
perder lugares. Não penso que haja grande mérito, mas evidentemente foi bom
assegurar isso”.
Nuno Melo
concordou com a diminuição do número de deputados do Parlamento Europeu como
forma de reserva e disse que, “se o Brexit é uma tragédia do ponto de vista
europeu, nisso ao menos constitui uma oportunidade de corrigir sem prejudicar
muito os países médios e pequenos”, sendo preferível, do seu ponto de vista, “ter
parte dos deputados do Reino Unido cativos para serem utilizados nesses futuros
alargamentos, garantindo que outros países não vão perder eurodeputados”.
E para
Marinho e Pinto este relatório (e agora a decisão final) “repõe alguma justiça na distribuição dos deputados pelos vários membros,
sobretudo por aqueles que estavam prejudicados em funções da violação da regra
da proporcionalidade degressiva”.
***
Está equilibradamente
resolvido o problema burocrático da representatividade. Falta, porém, aproximar
as instituições dos cidadãos e diminuir drasticamente as medidas de redução das
soberanias nacionais concretizadas em múltiplas e minuciosas diretivas constringentes
da ação legislativa e executiva dos Estados-membros. Por onde andam as
vagamundas subsidiariedade e solidariedade?
2018.06.13 –
Louro de Carvalho
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