quinta-feira, 14 de junho de 2018

Novas do Parlamento Europeu


O Parlamento Europeu acaba de aprovar hoje, dia 13 de junho, a sua nova composição em resultado do “Brexit”, mantendo Portugal o atual número de 21 deputados, ao invés do que se temia nos círculos de políticos e de observadores.
Efetivamente, de acordo com as últimas informações, veiculadas sobretudo pelo Expresso on line, o Parlamento Europeu aprovou esta quarta-feira, em Estrasburgo, por uma esmagadora maioria – 566 votos a favor, 94 contra e 31 abstenções –, a proposta dos correlatores Pedro Silva Pereira e Danuta Hubner no sentido de ser dado consentimento final à nova composição do Parlamento no pós-Brexit, que entrará assim em vigor já nas eleições europeias de 2019, que se realizarão lugar entre os dias 23 e 26 de maio de 2019.
É de registar que a proposta inicial sobre a composição do Parlamento Europeu, apresentada pelos preditos correlatores, já havia merecido, no passado dia 7 de fevereiro, apoio claro do plenário, pelo que a proposta seguiu então para o Conselho Europeu, onde reuniu um amplo consenso, sendo ali aprovada sem qualquer alteração.
Este processo legislativo concluiu-se agora com o consentimento final do Parlamento Europeu.
Pedro Silva Pereira, Vice-Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais e Correlator da proposta declarou:
Estou muito satisfeito: a aprovação final da nova composição do Parlamento Europeu é um final feliz numa negociação muito difícil. Conseguimos três em um: uma representação mais justa dos Estados no Parlamento, cumprindo finalmente os princípios do Tratado de Lisboa; um Parlamento mais pequeno, com 705 deputados em vez de 751, deixando espaço suficiente para futuros alargamentos e, além disso, a garantia de que nenhum Estado perde lugares. É, sem dúvida, um excelente resultado para Portugal – que mantém os seus 21 eurodeputados, ao contrário do que se temia – mas é também um dia bom para a democracia europeia e para o projeto europeu.”.
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Como foi referido, a proposta foi inicialmente aprovada no Parlamento Europeu a 7 de fevereiro do corrente ano e consistiu na redistribuição parcial dos eurodeputados pelos países membros já sem contar com os deputados do Reino Unido na sequência do Brexit. A proposta foi redigida, como se disse, pelo português Pedro Silva Pereira e pela eurodeputada polaca Danuta Maria Hübner, dividindo os 73 lugares deixados pelo Reino Unido em dois grupos: um de 27 lugares que serão distribuídos por alguns Estados-membros para compensar a representatividade; e outro de 46 lugares que ficarão vagos para a possibilidade de eventuais alargamentos da UE.
Segundo a proposta, ora tornada lei, França e Espanha receberão cinco deputados, Itália e Roménia três, Irlanda dois e Polónia, Roménia, Suécia, Áustria, Dinamarca, Eslováquia, Finlândia, Croácia e Estónia acrescentarão um eurodeputado nas próximas eleições europeias; e Portugal manterá os seus atuais 21 deputados.
A proposta continha uma medida bastante polémica por incluir a possibilidade da criação de listas transnacionais, ou seja, listas criadas pelas famílias partidárias europeias com deputados de pelo menos 14 países, pelos quais seriam distribuídos os 46 eurodeputados que integram o susodito segundo conjunto. No entanto, essa parte da proposta foi rejeitada pelo hemiciclo europeu, muito embora o grego Yánis Varoufákis ainda persistisse nesse projeto e dele tenha feito questão entre nós aquando das comemorações da revolução abrilina este ano, como naquela altura foi dado público conhecimento.
Depois de aprovada a proposta, o relatório foi discutido a 23 de fevereiro no Conselho Europeu onde necessitava de uma decisão unânime, que foi conseguida.
Pedro Silva Pereira, eurodeputado socialista e um dos redatores do relatório, defendeu que a proposta procurou seguir “o princípio básico de que nenhum estado devia perder lugares e a ideia de que se deviam corrigir as injustiças daqueles Estados que estão sub-representados”, segundo a proporcionalidade degressiva acordada no Tratado de Lisboa.
O documento final, que fora remetido ao Conselho Europeu e que lá mereceu a necessária aprovação por unanimidade, voltou ao Parlamento Europeu para ratificação ou aprovação final.
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Dada a alteração que a proposta inicial teve na sessão do plenário do Parlamento Europeu a 7 de fevereiro, os 46 lugares de reserva serão utilizados para futuros alargamentos da União Europeia, como é o caso da Sérvia e Montenegro que estão em processo de adesão. A este respeito, Silva Pereira explicou, na ocasião, ao semanário SOL:
O que para Portugal é um excelente resultado é, num processo em que se partiu sob a ameaça de perder lugares, chegar ao final e não só ter a garantia de manter os deputados agora como ter uma garantia blindada para o futuro”.
E acrescentou:
Com os 46 lugares disponíveis que não são distribuídos [pelos atuais Estados-Membros], mesmo que haja alargamentos volumosos – em que entrem países grandes – nós sabemos que os nossos 21 não são atingidos”.
Por seu turno, Paulo Rangel, eurodeputado do PSD, considerou que a votação foi “uma vitória enorme para a democracia europeia e para os europeístas”. E especificou:
Ao serem derrotadas [as listas transnacionais] no Parlamento Europeu, julgo que isto deu uma grande força àqueles que defendem uma composição equilibrada da União Europeia em que não se aumente a diferença entre Estados grandes e Estados pequenos e médios”.
Também Marisa Matias, do Bloco de Esquerda, classificou esta deliberação como “uma boa notícia para a democracia”, considerando:
Em relação à distribuição, penso que é uma proposta séria e equilibrada que, pela primeira vez, numa reforma que se faz em relação à composição do Parlamento, não retira deputados aos pequenos e médios países”.
Porém, sobre as listas transnacionais crê “que até às próximas eleições este debate está encerrado”, embora não acredite que “esteja encerrado para sempre”.
Para Nuno Melo, eurodeputado do CDS, “este resultado consagrou anos de esforço contra as listas transnacionais”, pois, como sustenta, “Portugal é um Estado soberano e não uma região europeia”, evitando-se, assim “que alguns – poucos – dirigentes de grandes partidos que dominam países europeus possam escolher representantes de outros países”.
E João Ferreira, eurodeputado do PCP, considerou, meio insatisfeito, que esta “era uma oportunidade de ouro” para repor os deputados perdidos ao longo dos tempos, ao passo que Marinho e Pinto, eurodeputado do PDR, encarou a rejeição das listas transnacionais com alguma tristeza. Com efeito, como referiu, “não houve a coragem, a audácia, de dar mais um passo, que era um passo decisivo, no sentido de reforçar a integração europeia”.
No atinente às listas transnacionais, a maioria dos eurodeputados portugueses estão de acordo em que são prejudiciais para Portugal. Apenas o PS, cujo eurodeputado Silva Pereira foi um dos redatores do relatório, e Marinho e Pinto não partilham tal posição.
Marinho e Pinto defendeu e defende o ciclo eleitoral europeu a par dos círculos eleitorais nacionais dos Estados-membros, visto que, segundo diz, “a construção europeia tem-se feito sobre tudo em torno do papel dos Estados e tem negligenciado a interação direta com a população, com os povos europeus e isso tem levado a um afastamento dos eleitores”. De acordo com a crítica do eurodeputado do PDR, “as eleições para o Parlamento Europeu e as campanhas eleitorais fazem-se em torno de problemas nacionais, são um remake das eleições para os parlamentos nacionais – e infelizmente assim vai continuar”. Segundo Marinho e Pinto, misturaram-se, no caso, “duas questões completamente diferentes: um projeto político de reforço da integração europeia e as lutas internas de galos e garnisés na feitura e hierarquização das listas”. E enfatizou que, “além do mais, esses receios são fantasmagóricos porque, se há coisa que na União Europeia tem prevalecido, é justamente o respeito pelos países pequenos”, recordando que o português Durão Barroso já foi presidente da Comissão Europeia e que o atual presidente, Jean-Claude Juncker, é luxemburguês.
A grande vantagem do círculo europeu, para o eurodeputado, era dar “um novo impulso ao europeísmo, à integração europeia, uma maior legitimidade democrática para o Parlamento, porque este Parlamento é muito a soma dos deputados nacionais, dos interesses dos Estados-membros e não há um compromisso direto dos deputados com os seus cidadãos”.
Pedro Silva Pereira disse que a posição do PS está expressa no relatório e afirmou:
O Parlamento deveria deixar lugares disponíveis para essa eventualidade porque compete ao Conselho [Europeu] decidir”.
Já Paulo Rangel, Nuno Melo, Marisa Matias e João Ferreira, como declararam ao SOL, estão contra este ponto da proposta, o das listas transnacionais, já que se meteu “um verdadeiro cavalo de Tróia nesta moção” (diz Rangel). Sobre essas listas transnacionais, o eurodeputado do PSD confessou que “são muito más para a Europa e são especialmente más para países como Portugal, aduzindo como argumento a criação de “duas classes de deputados”, uma para o ciclo nacional e outra para o ciclo único europeu, que seria um trunfo para “uma tecnocracia” ou “para um elitismo europeu”, não constituindo, ao invés do que pensam, “uma ideia de mais Europa e de mais integração”.   
Por seu turno, Marisa Matias disse que o Parlamento Europeu, quando produz legislação, já está a produzir “para os 500 milhões de cidadãos dos (ainda) 28 países”. E acrescentou que não é o facto de serem eleitos por um país que retira aos eurodeputados “essa capacidade de trabalhar para a União Europeia no seu conjunto”. Para esta eurodeputada existe um fosso entre as instituições europeias e a população. E, neste âmbito, explicou:
As pessoas já não sabem o que fazemos aqui, já não sabem o que se faz nas instituições europeias, não vão passar a saber por, de repente, passar a haver uma lista que engloba pessoas de outros países que não conhecem, que lhes estão menos próximas até ao nível da prestação de contas”.
Por outro lado, os eurodeputados estão convictos de que o desconhecimento dos candidatos pode ser uma vantagem para o populismo, que tem vindo a ganhar expressão na Europa. Neste aspeto, Rangel e Melo identificaram o contraste entre a popularidade de candidatos como Marie Le Pen com os outros possíveis candidatos nas listas pan-europeias e lançaram o repto:
Ninguém saberá em Portugal quem é o senhor [Gianni] Pitella – que por acaso preside ao grupo dos socialistas no Parlamento Europeu –, mas, se perguntarem aos portugueses quem é a Marie Le Pen, porventura saberão”.
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Entre o PSD, o CDS, o Bloco de Esquerda e o PCP, só o eurodeputado comunista João Ferreira vê na nova composição do Parlamento Europeu uma “proposta injusta na medida em que prolonga desequilíbrios já existentes nas relações de poder nas instituições da União Europeia”, advertindo que as listas transnacionais não nos devem fazer esquecer tudo o resto” e lembrando que “têm sido usadas muitas vezes como um biombo”. Com efeito, o que estava em causa era a não reposição de deputados a Portugal depois de o país ter perdido quatro representantes com os alargamentos da União Europeia, pelo que esclareceu:
Esta é a primeira vez que estamos a discutir uma recomposição do Parlamento Europeu não na sequência de um alargamento – que de resto não há nenhum em perspetiva –, mas a saída de um Estado-membro. E não é um Estado-membro qualquer, é um Estado-membro que atualmente ocupa 73 lugares no Parlamento Europeu.”.
Para o eurodeputado comunista “não é compreensível nem aceitável que países que foram perdendo deputados com os sucessivos alargamentos, como Portugal”, não ganhem um único deputado com a redistribuição.
Já Pedro Silva Pereira, eurodeputado do PS, descredibiliza a possibilidade de devolver os deputados perdidos ao longo dos tempos, pois, se, como diz, “fôssemos devolver os lugares a todos os países por perdas em ajustamentos anteriores, então o Parlamento tinha que aumentar para 768 deputados”, ultrapassando, por esta via, o limite dos 751, imposto pelos tratados. Assim, foi ao ponto de classificar a proposta comunista como “uma ilusão, uma impossibilidade política e matemática, uma ideia que simplesmente não faz sentido”.
Para Marisa Matias, Nuno Melo, Paulo Rangel e Marinho e Pinto é positiva a forma como a redistribuição dos eurodeputados foi assegurada.
Marisa Matias acredita que, “do ponto de vista do maior equilíbrio de poderes e de justiça, provavelmente, ficaríamos melhor se conseguíssemos recuperar os deputados que, entretanto, perdemos”. Não obstante, a eurodeputada bloquista acredita que não se pode “olhar apenas para o umbigo e perceber o que se passa em relação a Portugal”, mas, como sustentou, “temos de olhar para aquilo que é o conjunto da distribuição dos deputados em termos europeus”.
Por sua vez, Paulo Rangel considerou a proposta “francamente boa” ao permitir adotar a proporção da representatividade degressiva, como foi decidido nos tratados, que faz com que os países maiores necessitem de mais eleitores para elegerem um eurodeputado. E disse:
Sinceramente acho que nem podia ser de outra maneira porque vão sair 73 deputados britânicos e nenhum país podia perder lugares. Não penso que haja grande mérito, mas evidentemente foi bom assegurar isso”.
Nuno Melo concordou com a diminuição do número de deputados do Parlamento Europeu como forma de reserva e disse que, “se o Brexit é uma tragédia do ponto de vista europeu, nisso ao menos constitui uma oportunidade de corrigir sem prejudicar muito os países médios e pequenos”, sendo preferível, do seu ponto de vista, “ter parte dos deputados do Reino Unido cativos para serem utilizados nesses futuros alargamentos, garantindo que outros países não vão perder eurodeputados”.
E para Marinho e Pinto este relatório (e agora a decisão final) “repõe alguma justiça na distribuição dos deputados pelos vários membros, sobretudo por aqueles que estavam prejudicados em funções da violação da regra da proporcionalidade degressiva”.
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Está equilibradamente resolvido o problema burocrático da representatividade. Falta, porém, aproximar as instituições dos cidadãos e diminuir drasticamente as medidas de redução das soberanias nacionais concretizadas em múltiplas e minuciosas diretivas constringentes da ação legislativa e executiva dos Estados-membros. Por onde andam as vagamundas subsidiariedade e solidariedade?
2018.06.13 – Louro de Carvalho

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