Admiravelmente não é um plano de reestruturação
desses que estão em voga quando se trata de encerrar agências/lojas/balcões de
bancos, empresas ou até departamentos do Estado. Neste caso, trata-se de
serviços, que se tiram do interior do país, da transmutação de direções-gerais
em institutos públicos independentes, da criação duma direção regional ou delegação
de um serviço central numa localidade ou da transferência ou deslocalização dum
instituto ou dum serviço para o “Porto”, Coimbra, Aveiro ou Évora.
Agora, Carlos Tavares, que foi Ministro da
Economia de Durão Barroso e de Santana Lopes, bem como Presidente da CMVM (Comissão de Mercado de Valores Mobiliários) no tempos de José Sócrates e de Passos Coelho,
quer “transformar” a CEMG (Caixa Económica Montepio Geral) e, dado que não encontra
cérebros ou “canetas” e “calculadoras” em Portugal capazes para o efeito, esta
luminosa personalidade, ao mesmo tempo CEO e Chairman do banco dito de economia
social, contrata americanos para ajudar nessa tão espinhosa como transcendente
tarefa.
Só espero que não me atribuam a culpa da
mudança de nomenclatura de “reestruturação” para “transformação”, uma vez que
eu terei dito que também era capaz de fazer reestruturações como as que fazem o
presidente da CGD, o do BCP e o do Banco CTT (confesso que
não tenho capacidade para fazer reestruturação à moda do BES/NB): encerrar balcões, dispensar
funcionários, criar ou aumentar comissões, induzir a quase obrigatoriedade de eliminar
correspondências e operações em suporte de papel (embora seja necessário poupar papel para manter as árvores e as pedras. Mas
vão-nos tirar os pacotes, os guardanapos, as toalhas e os materiais higiénicos?)…
Depois, deve ter chamado os americanos, porque
evidentemente, quando um português diz que é capaz de fazer alguma coisa de jeito,
os outros não acreditam, porque supõem que o tipo não está a falar verdade. Porém,
porque não querem ser acusados de calúnia, ou dizem que o cidadão tem uma
relação nada boa com a verdade ou apontam o facto de ele dizer inverdades (não sabem que se pode faltar à verdade, além de pela mentira, pelo
equívoco, erro, distração, inadvertência, dislexia, confusão, ignorância…) ou se calam. E, vai daí,
encomendam os serviços a estrangeiros, mudando a designação à encomenda ou
dando-lhe uma designação inglesa, que é mais fixe. Por uma questão de justiça e
honestidade intelectual, devo abrir umas exceções. Por exemplo, para fazer uma
lei com alguma complexidade, encomenda-se o serviço a uma sociedade de advogados
que tenha nome na praça; e para uma parceria público-privada ou para um swap chama-se um economista ou um grupo
de economistas (nacionais e/ou estrangeiros), bastando que saibam pôr o
estado a perder, que, mais tarde, talvez possam vir a ter um lugar no Governo
da República. E, como já não bastavam as perdas de soberania impostas pela UE e
pelo Euro, bem como as decorrentes da dívida dita soberana, arranjam-se mais umas
tantas modalidades de perda de soberania. O que importa é que o Estado não
entre em depressão por excesso de soberania ou morra de indigestão de
soberania!
***
O certo é que o CEO/Chairman da CEMG chamou em seu
auxílio americanos
da consultora Bain & Company para virem a Lisboa para ajudar na operação da transformação da Caixa
Económica Montepio em seis meses. Por outros termos, uma equipa da norte-americana Bain & Company está
há uns tempos a trabalhar com o conselho de administração da CEMG na elaboração do plano de transformação do banco,
cuja apresentação se prevê para setembro.
Estes consultores externos contratados por Carlos
Tavares, segundo dizem os observadores e está patente na mensagem enviada aos
trabalhadores no início do passado mês de maio, estão a ajudar o insigne gestor
a proceder a um “diagnóstico profundo” do banco – o que falta em Portugal não
são os diagnósticos: todos sabem qual é o mal dos bancos e do sistema financeiro
em geral. Faltam soluções políticas e gestionárias! –, num trabalho em desenvolvimento
até final do verão e do qual resultará um plano de transformação que
visará produzir “resultados num espaço de três a quatro anos”.
Registe-se que a Bain
& Company é uma empresa fundada em 1973, com sede em Boston e, apesar de estar
presente em 36 países, não tem escritório em Lisboa.
Foi criada pelos mesmos fundadores da Bain Capital, o
fundo de private equity que adquiriu uma carteira de crédito mal parado de 476
milhões de euros à Caixa Geral de Depósitos em julho de 2017. Todavia, apesar
de terem feito parte do mesmo grupo numa fase inicial, há 30 anos que estas
duas companhias norte-americanas optaram por seguir rumos diferentes e atualmente
estão 100% separadas.
Oficialmente, a Caixa Económica Montepio Geral não
comenta a contratação da Bain & Company. Mas sabem os observadores que a larga experiência que vai além do setor financeiro e a abordagem
rápida da consultora foram critérios importantes para a escolha de
Carlos Tavares, que no mês de setembro, por obrigação do Banco de Portugal,
terá de decidir se continuará como CEO ou como chairman da
instituição.
***
Entretanto, pela análise de notícias anteriores,
sabe-se que está em vista e em marcha “uma profunda reestruturação” de todo o
grupo Caixa Económica Montepio Geral, banco e participadas. Carlos Tavares
tinha dito aos trabalhadores que não iria fazer tábua rasa do que foi feito no
passado, mas que pretendia “acelerar de forma substancial o processo de
adaptação às novas realidades e desafios do setor. Era e é seu escopo “eliminar
redundâncias e silos organizativos”, bem como tornar a instituição financeira
num banco vocacionado para a economia social e para as PME.
Este reset parcial
deu um primeiro passo quando o Chairman/CEO Carlos Tavares procedeu a uma
revisão em baixa das contas anuais (não auditadas) apresentadas pelo seu
antecessor, José Félix Morgado: em vez de lucros de 30,1 milhões de euros,
afinal a Caixa Económica Montepio Geral obteve um resultado líquido de apenas
6,4 milhões, após o reforço de imparidades para “limpeza” de créditos complicados.
Uma outra operação de cosmética, mas que pode ser importante para o restabelecimento
ou reforço da confiança – que é disto que vivem os bancos, para lá dos dinheiros,
que são o suporte mínimo – é a mudança da designação e da informação do produto
da AMMG (Associação Mutualista Montepio Geral).
Assim, enquanto decorrem os trabalhos que visam o “caminho
de mudança e reforma” que o banco precisa “criticamente de percorrer”, conforme
Carlos Tavares enunciou no ato de tomada de posse a 21 de março, o banco e a associação
mutualista criaram um grupo de trabalho conjunto para avaliar a oferta de
produtos mutualistas comercializados pela caixa económica para responder às
exigências imediatas do Banco de Portugal e da CMVM.
Entre esses produtos figura o produto financeiro “Capital
Certo”, que se designa “Poupança Mutualista”, numa reformulação que inclui a
informação a prestar aos clientes na comercialização desta aplicação. A informação
espalhava-se por dez páginas e era tão detalhada que se tornava de difícil compreensão.
Carlos Tavares pretendia reduzir as dez páginas a apenas três, uma com a
identificação da Associação Mutualista, outra com as caraterísticas do produto
e uma última com indicadores financeiros da própria associação.
Outra das alterações passará pelo nome da instituição bancária. Tavares admite a
possibilidade de a Caixa Económica Montepio Geral mudar de nome, mas quer
manter a marca Montepio.
***
Os políticos que lideram a governança do país e os gestores
confiavam que a entrada da SCML (Santa Casa da Misericórdia de Lisboa) no capital do
Montepio constituiria uma forte mais-valia para a sustentabilidade do banco,
sobretudo tendo em conta a suspeita de degradação da confiança que recaíra
sobre a dona do banco, a AMMG. Porém, as dissensões surgidas no interior da
dona e os diferendos existentes no banco não permitiram a sustentabilidade da percepção
da boa saúde das duas instituições, no que ajudou a incerteza sobre as contas de
uma e de outra entidade, resultante das contradições, bem como o conhecimento
do estado financeiro da SCML, que fez com a que a sua participação se fosse
remetendo a uma participação simbólica eventualmente acompanhada duma participação
ainda mais simbólica da parte de outras instituições de economia social (vg: Misericórdias e
IPSS).
O banco chegou a garantir que não precisava de ajuda e forneceu à opinião
pública informação contraditória não sustentada; a mutualista saiu da isenção
em sede de IRC para benefício em crédito fiscal para equilibrar as contas em termos
contabilísticos; e a SCML esteve tentada a investir no banco todo o dinheiro disponível.
Tanto assim é que, em 20 de abril, o Parlamento aprovou as
recomendações do PSD e do CDS para que o Governo impeça a entrada da SCML no capital
do Montepio e uma do Bloco de Esquerda a pedir a regulação dos
investimentos daquela instituição.
Foi
ainda aprovado um projeto de lei do CDS-PP, apenas com os votos contra do PS,
para que sejam alterados os estatutos da SCML. O objetivo é consagrar a
necessidade de uma autorização da tutela – no caso, o Ministério do Trabalho,
da Solidariedade e da Segurança Social – para que a Mesa da Santa Casa efetue
“investimentos estratégicos e estruturantes”, nomeadamente que envolvam a SCML
na administração ou órgãos sociais de instituições que desenvolvem atividades
noutros setores ou que sejam em volume superior a 5% do seu orçamento anual.
E o próprio Ministro das Finanças veio recentemente, por um
lado, confirmar que a entrada da SCML “é um investimento de risco” e, por
outro, que apoiará a Mutualista se for necessário.
Nestes termos, surgiu hoje, dia 7, a promessa de que o Governo anunciará “brevemente a sua posição” sobre a relação entre SCML e
a CEMG. Presente na
conferência de imprensa para anunciar a aprovação do novo Código das
Associações Mutualistas em sede de Conselho de Ministros, o Ministro do
Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Vieira da Silva acabou por responder que “brevemente será anunciada a posição” do Executivo face aos “diversos e
diferentes documentos aprovados”. “Alguns
estão ainda em sede de debate na especialidade”, acrescentou lembrando que o
Governo desde logo se manifestou “empenhado em concretizar as orientações que
foram apontadas, de fixar regras sobre quais os investimentos que a
Misericórdia de Lisboa pode desencadear”.
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