domingo, 11 de fevereiro de 2018

Sobre a estranha e gigantesca mostra de poluição no rio Tejo


Se o Governo da República e as autarquias locais, embora com a cooperação das diversas associações, não asseguram o bem-estar das populações, é de perguntar para que servem. E não há dúvida de que a defesa e segurança das populações não estão garantidas se o ecossistema fica seriamente prejudicado, seja por causa das guerras, seja por causa das epidemias, ou devido às más políticas públicas ou, como neste caso, por força da busca desenfreada do lucro.
Segundo o que revelou a APA (Agência Portuguesa do Ambiente), em conferência de imprensa, a carga orgânica visível no Tejo, na zona de Abrantes, acima do açude, foi provocada pelas indústrias de pasta de papel. As análises detetaram níveis de celulose cinco mil vezes acima dos níveis recomendados, com a Celtejo a contribuir para a maioria das descargas.
Nuno Lacasta, presidente da APA, responsabiliza todas as fábricas de papel da região, mas reconhece que a Celtejo é responsável por 90% das descargas deste tipo de indústrias que chegam ao rio na zona em causa.
E esta empresa foi notificada para durante 10 dias reduzir as descargas a metade. Passado esse período, a fábrica de pasta de papel da Altri, em Vila Velha de Ródão, 5 de fevereiro, procedeu-se a uma reavaliação da poluição no rio. Só nessa altura ficou definido o volume de reduções necessário, a atribuir tanto à Celtejo como às restantes papeleiras.
A Celtejo veio agora defender a divulgação dos resultados das análises à poluição no rio Tejo colocados em segredo de justiça pelo Ministério Público (MP). Fonte da Celtejo disse à Lusa:
A Celtejo concorda com os ambientalistas na importância da divulgação dos resultados das análises [feitas pela Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território]”.

Na verdade, as associações ambientalistas, Quercus e Zero, defenderam a necessidade de respeitar a decisão do MP de colocar em segredo de justiça o inquérito à poluição no Tejo, embora entendam que, por razões de saúde pública, os resultados deveriam ser públicos.
À Lusa, o presidente da Quercus, João Branco, lamentando que o inquérito esteja em segredo de justiça, embora aceite a ordem judicial, sustentou:
Nós achamos que devia ser divulgado, que é uma informação relevante para a opinião pública, mas não só. Por questões de segurança e saúde pública, os valores deviam ser conhecidos.”.

Por seu turno, Francisco Ferreira, da Zero, defendeu que deve ser respeitada a decisão judicial e considerou fundamental que se “averigúem as circunstâncias” do episódio de poluição no rio Tejo, para se perceber se houve ou não um acidente relacionado com a fábrica de celulose Celtejo ou se se tratou apenas de poluição acumulada. E opinou:
Seria importante que toda esta informação fosse pública para nós melhor percebermos o que se pode e deve decidir em relação à produção naquela zona”.

O MP notificou a IGAMAOT (Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território) de que os elementos recolhidos no âmbito do inquérito sobre a poluição no Tejo estão em segredo de justiça. E, em nota divulgada no dia 9, a IGAMAOT referia que recebeu uma notificação do DIAP (Departamento de Investigação e Ação Penal) de Castelo Branco sobre o inquérito por crime de poluição no rio, na qual se lia que “todos os elementos já coligidos, bem como todos os demais elementos juntos e a obter, relativos à investigação no âmbito do processo de inquérito (…) se encontram sujeitos a segredo de justiça”.
Também a PGR (Procuradoria-Geral da República) revelou, no dia 27 de janeiro, que o MP instaurou um inquérito a empresas de Vila Velha de Ródão, na sequência de participação de crime de poluição apresentada pelo Ministério do Ambiente. A abertura do inquérito surgiu na sequência dos recentes fenómenos de poluição detetados a 24 de janeiro, junto à queda de água do açude insuflável de Abrantes. E, a dia 31 de janeiro, o presidente da APA, como foi dito, revelou que a carga poluente que afetou o Tejo teve origem nas descargas da indústria da pasta de papel.
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Unidos contra a poluição do Tejo, os partidos políticos querem a revisão de licenças ambientais das empresas que operam no rio e exigem o reforço da sua fiscalização.
Depois de António Costa ter garantido que a redução das emissões de descarga vai mesmo avançar, estes grupos políticos com representação parlamentar juntam-se à luta.
Neste mesmo sentido, o Ministério do Ambiente anunciou, no passado dia 5, que a limitação imposta à Celtejo (ou seja, a redução de 50% do volume diário de descargas efluentes no Tejo) vai ser prolongada por mais 30 dias.
E, para o PS, há três pontos fundamentais considerar: a remoção da matéria orgânica acumulada no fundo das albufeiras, depositada sob a forma de sedimentos; a revisão das licenças ambientais das empresas que operam no Tejo, seguindo os princípios ‘adaptar’ e ‘mitigar’, em face da nova realidade deste recurso hídrico; e a limitação do volume de efluentes rejeitados pela Celtejo, enquanto não estiver concluído o plano de investimentos da empresa.
Já o Bloco de Esquerda realça que “o problema da poluição do rio Tejo tem responsáveis identificados e uma história de propostas apresentadas num passado recente”. Por outro lado, o deputado Pedro Soares destaca, positivamente, a decisão do Governo do encerramento da empresa Fabrióleo e da imposição de limites à produção da Celtejo.
Os comunistas dizem que o foco tem de estar na fiscalização. A deputada Paula Santos defende que “no imediato é necessário o reforço das ações de fiscalização pelas autoridades competentes para garantir o cumprimento da legislação em vigor em matéria ambiental”, mas O PCP diz que não será necessário aumentar os meios humanos e técnicos para concretizar essa mudança.
Até à direita, as opiniões convergem neste mesmo sentido. O PSD define como prioridade o cumprimento das licenças de descarga e realça a necessidade de “ajustar e flexibilizar essas licenças às oscilações de caudais”. Os socialdemocratas pedem ainda a instalação de “sistemas de monitorização permanente, quer nos rios quer no interior das fábricas” a fim de “garantir a sua consulta independente e autónoma, sem intervenção da empresa em causa”. Contudo, neste ponto, divergem dos comunistas, exigindo mais recursos humanos e técnicos, bem como a criação dum “tribunal especializado em ambiente e recursos naturais que tenha recursos especializados, quer no apoio, quer assessoria dos magistrados nestes assuntos”.
Também a palavra de ordem para o CDS é “fiscalização”, sendo “inquestionável a necessidade de revisão das licenças de descarga emitidas”.
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A Celtejo, além de ter exigido a publicação dos resultados das análises, sublinhou que os técnicos da IGAMAOT “não conseguiram realizar a recolha”, sendo que “a incompetência na recolha, mesmo com a presença das autoridades em permanência no local, é profundamente penalizadora para a Celtejo”, segundo afirmou à Lusa fonte da fábrica, que afirmou, por outro lado, que as amostras sempre foram recolhidas sem qualquer problema. No entanto, segundo a Celtejo, os técnicos da IGAMAOT “não conseguiram realizar a recolha, ao contrário do que aconteceu com os coletores da Celtejo e da ARH (Administração da Região Hidrográfica) que funcionaram normalmente”.
Porém, Nuno Banza, inspetor-geral da IGAMAOT, explicou, no dia 5, em conferência de imprensa sobre os resultados das análises aos afluentes da ETAR:
A recolha de amostras na indústria Celtejo teve, por duas vezes, problemas ao nível do coletor automático que não recolheu o líquido por razões que desconhecemos. Na terceira tentativa, pedimos o apoio da GNR, do Serviço de Proteção da Natureza e Ambiente e esse coletor foi guardado. Durante 24 horas, o coletor funcionou, no entanto, apenas recolheu no final alguma espuma e muito pouco líquido.”.

Também no passado dia 6, o proTejo-Movimento pelo Tejo veio acusar a inspeção de incompetência na recolha das amostras.
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As empresas não gostam de que se lhes pisem os calos. E o ambientalista Arlindo Marques, do proTejo-Movimento pelo Tejo e conhecido como o “guardião do Tejo”, vai responder em tribunal num processo movido pela empresa de celulose Celtejo, a qual, acusada pelo ambientalista de fazer as descargas que poluem o rio, exige uma indemnização no valor de 250 mil euros, acrescidos de juros de mora até integral pagamento para “compensar a autora pelos danos sofridos por causa da ofensa cometida” – alegadamente contidas nas “afirmações que têm por objetivo gerar na opinião pública a ideia de que a autora é responsável, ou corresponsável, pela alegada poluição do rio Tejo”.
Porém, o ambientalista dispõe duma testemunha de defesa de peso. Com efeito, o juiz do TICÃO disponibilizou-se para ser testemunha de defesa de Arlindo Marques. E, ao jornal regional mediotejo.net, Carlos Alexandre assume a defesa do ambientalista, declarando:
Disponibilizei-me e vou servir de testemunha do Arlindo Marques no processo porque sou de Mação, porque conheço bem o rio e os seus problemas com a poluição (…) e por estar solidário com o exercício de cidadania de Arlindo Marques”.

Ao mesmo jornal, o predito juiz lembra que viveu em Mação até aos 18 anos e que, em 1983, quando estava no 5.º ano da Faculdade, foi carteiro em Ortiga. Nessa altura bateu  “à porta daquela gente toda” e é por isso que conhece “bem o rio e as gentes ribeirinhas, os problemas de poluição e a importância dos seus impactos no Tejo e de quem fazia e quer fazer vida dele”.
Carlos Alexandre, conhecido por ser o juiz de instrução de processos mediáticos como o que decorre da Operação Marquês ou do caso GES, no âmbito daquelas declarações, alerta também para o problema dos incêndios:
Em Mação temos duas frentes que nos dão muitas dores de cabeça (…) Por terra, é o problema dos incêndios; por água, é o problema do rio e da poluição. Nota-se a olhos vistos a deterioração das águas do Tejo, a jusante de Vila Velha de Ródão, e vou dar testemunho disso mesmo em tribunal, na defesa do Arlindo, porque a ele me associo e ao trabalho de cidadania que tem desenvolvido.”.

Porém, o réu diz ter escrito duas cartas a Marcelo e que o Presidente já lhe respondeu.
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Na defesa do interesse público e na promoção da segurança do território, pessoas e bens, o Estado tem de ser muito cuidadoso na produção de legislação e na atividade fiscalizadora. E quem de direito deve fazer justiça ante a transgressão. A instalação e a manutenção de empresa da índole das referenciadas devem ser objeto duma autorização que obrigue à autoconstrução dum mecanismo de tratamento eficaz dos efluentes, não se podendo contemporizar com mínimos nem se ficar pelas reduções. O rio não pode ser o vazadouro do que quer que seja. A fiscalização deve ser apertada e o rio vigiado. Bem basta a sedimentação devida à erosão das margens, que já deveria levar a operações frequentes de desassoreamento e dragagem.
Rio poluído dá águas inquinadas, vegetação envenenada, peixes e outras unidades zoológicas contaminadas. É a necrose contagiante que vitima pessoas e animais e põe em causa a produção agrícola e hortícola e o abastecimento de água às comunidades! O bem público merece mais.
2018.02.11 – Louro de Carvalho    

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