quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Governo confirma escolha de Nóvoa para a UNESCO


Noticiada que foi a hipótese de escolha de Sampaio da Nóvoa para embaixador de Portugal junto da UNESCO, os diplomatas portugueses reagiram corporativamente solicitando ao Governo que reconsiderasse a nomeação do professor Sampaio da Nóvoa como representante permanente de Portugal junto da UNESCO.
A UNESCO – organização precedida pela ICIC (Comissão Internacional para a Cooperação Intelectual) – como a conhecemos, foi fundada em 1945, no momento da criação das Nações Unidas (ONU); conta com 195 Estados-membros e nove membros associados; e é responsável pela coordenação da cooperação internacional nos campos da educação, ciência, cultura e comunicação.
Portugal aderiu em 1965, retirou-se da organização internacional em 1972 e reingressou em 11 de setembro de 1974.
Face à perspetiva da nomeação de Novoa como embaixador junto desta entidade internacional, a Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses (ASDP) divulgou um comunicado em que manifestou “completa surpresa e estranheza” face à escolha do antigo reitor da UL e agora seu reitor honorário, para a Organização das Nações Unidas para a Educação depois de o Governo ter decidido reabrir o posto, encerrado em 2012 pelo anterior executivo, na sequência da eleição do país para o conselho executivo deste organismo.
No predito comunicado, afirmam os diplomatas:
Não se considera que o valor demonstrado pela diplomacia portuguesa, cujo mérito tem vindo a ser tão evidente em sucessos dos últimos anos, possa ser suspenso pela nomeação de um embaixador político para um posto diplomático quando não há um excecionalismo de circunstâncias que o pudesse vir a tentar sustentar”.
Por consequência, os diplomatas apelam ao Governo a “que reconsidere a noticiada intenção” de nomear o professor para o cargo, “sem qualquer desconsideração pelo reconhecido mérito e experiência do professor Sampaio da Nóvoa no ofício académico, nem pelo seu contributo para a causa pública e para a vida política nacional”.
O presidente da assembleia geral da associação, o embaixador Manuel Marcelo Curto, contactado pela Lusa, considerou que “para um posto diplomático, nomeia-se um diplomata”. Aduzindo ser “uma questão de profissionalismo”, argumenta: “Não se está a ver um diplomata ser nomeado diretor clínico do Hospital Santa Maria ou ser graduado em almirante”.
A associação presidida pelo embaixador João Ramos Pinto entende que “a representação da República Portuguesa junto de outros Estados e organizações internacionais (...) deve assentar no exercício profissional do ofício diplomático, que se aprende e treina durante uma vida dedicada ao serviço público”. E declara que “não se considera que o valor demonstrado pela diplomacia portuguesa, cujo mérito tem vindo a ser tão evidente em sucessos dos últimos anos, possa ser suspenso pela nomeação de um embaixador político para um posto diplomático quando não há um excecionalismo de circunstâncias que o pudesse vir a tentar sustentar”.
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Em declarações à Lusa, Santos Silva garantiu que “o processo de nomeação do professor Sampaio da Nóvoa está em curso e seguirá o seu curso”, até à publicação do decreto presidencial nesse sentido. E, escusando-se a comentar a posição dos diplomatas, lembrou:
A condução da política externa compete ao Governo. A execução da política externa decidida pelo Governo compete-me a mim como Ministro dos Negócios Estrangeiros.”.
E o Ministro dos Negócios Estrangeiros, sem papas na língua, considerou:
Vivemos num país livre, o Governo tomou esta decisão, as razões são claras. Uns estarão de acordo, outros não estarão de acordo, para isso é que se fez o 25 de Abril.”.
Já na semana passada, em declarações à Lusa, quando foi conhecida a probabilidade desta decisão do executivo, o chefe da diplomacia sublinhou que a escolha de Nóvoa se deveu, entre outras razões, ao facto de o professor catedrático e antigo reitor da UL ser uma “autoridade internacionalmente reconhecida” na educação. E, salientando que Portugal fora eleito no mês de novembro passado para o conselho executivo da UNESCO (mandato que irá prolongar-se até 2021), para o Governo, isso tinha como consequência óbvia a reabertura da nossa representação permanente na UNESCO, representação que tinha sido “suspensa no tempo da troika”, devido às dificuldades financeiras do país, ficando as funções de representante junto da UNESCO entregues, em regime de acumulação, ao embaixador de Portugal em França.
O Ministro frisou que a nomeação de Nóvoa para embaixador da UNESCO dá continuidade “à tradição portuguesa” – que elogiou – de, apenas em casos muitos raros, designar para o cargo de embaixadores personalidades que não são diplomatas. Ora, a UNESCO teve “embaixadores ditos políticos” como Maria de Lurdes Pintassilgo, José Augusto Seabra, Manuel Maria Carrilho”. Porém, antes da decisão do Governo de Pedro Passos Coelho de encerrar a representação portuguesa, o cargo era ocupado pelo embaixador Francisco Seixas da Costa.
Em 2015, Passos Coelho, indicou Gilberto Jerónimo – que era, à altura, chefe de gabinete –, para assumir aquele posto quando o Governo PSD/CDS-PP cessasse funções, mas o embaixador não ocupou o lugar; e só agora o atual executivo decidiu reabrir a representação permanente.
Assim o Ministro dos Negócios Estrangeiros esclareceu que “a tradição portuguesa é também reservar ou apenas indicar os chamados embaixadores políticos para organizações multilaterais como o Conselho da Europa, OCDE ou a UNESCO” e, “quando o têm feito vários governos, os resultados têm sido positivos”.
No dia 7, o chefe da diplomacia portuguesa, Augusto Santos Silva, reiterou que quem escolhe os embaixadores é o Governo e “não uma classe profissional” e indicou que Sampaio da Nóvoa, nomeado para representar Portugal na UNESCO, será o único “embaixador político”, ou seja “o único chefe de missão que não é diplomata”.
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Em consonância com a posição da ASDP, Seixas da Costa diz que esta escolha “é um erro deste governo”. Aduzindo que a representação externa começou a ser provida por personalidades da confiança do soberano, oriundas da aristocracia, mas que se profissionalizou “com os novos tempos” e pela multiplicação das embaixadas”, esclarece que “foram progressivamente criados, em todo o mundo, quadros especializados de serviço público, para assegurar a continuidade da representação do Estado, independentemente dos ciclos políticos”.
Reconhece que alguns países “continuaram a manter a prática de designar, para a chefia de certos postos, figuras exteriores às respetivas carreiras diplomáticas” e que, em geral, as ditaduras e regimes mais ou menos autoritários abusam desta prática, que também foi corrente em regimes presidencialistas”. E refere que, entre nós “esta prática não viria a desaparecer por completo com o 25 de abril”, sendo que, nos últimos 44 anos, com justificações de oportunidade inicialmente ligadas à consolidação dos novos tempos políticos (que já lá vão!), a diplomacia portuguesa veio a albergar uma trintena de ‘embaixadores políticos’, mais notoriamente em postos multilaterais”, tendo os parisienses da OCDE e da UNESCO sido os mais escolhidos.
Frisa que alguns desses “embaixadores” serviram num posto, de que saíram, quase sempre, após uma rotação governativa, como está na natureza precária da sua nomeação, feita por confiança política; e outros rodaram por vários postos, usufruindo duma legislação que lhes permitiu passar a integrar o quadro dos embaixadores profissionais de carreira. Porém, desde 2011, passou a não haver qualquer “embaixador político” na diplomacia portuguesa.
Duvido que antigo embaixador tenha razão quando considera o concurso de acesso à carreira diplomática “o mais exigente de toda a Administração Pública portuguesa” (embora admita que seja sério, mas nada mais). É certo que os funcionários dessa carreira “fazem um percurso variado” e, como em tudo, “as tarefas diplomáticas aprendem-se com tempo e maturação”. Também é verdade que “a diplomacia profissional portuguesa é regular objeto de reconhecimento público, quase generalizado, pelo muito que faz pelo país e pelo seu prestígio”.
Talvez por isso justifique “que, dentro da carreira diplomática, subsista um permanente sentimento contra a indigitação de figuras que, não tendo feito a tarimba da vida diplomática, não tendo nela subido, ao longo dos anos, os seus diversos escalões, surjam um dia, de ‘paraquedas’, num determinado posto, qualificados como ‘embaixadores’, por uma simples decisão política” – embora admita que “houve embaixadores políticos que, no passado, fizeram bom trabalho, que acabaram por ser um valor acrescentado para o serviço diplomático”. No entanto, sem rebuço, reage popularmente: “cada macaco no seu galho”.
Em todo o caso, topa “um único conforto nesta infeliz decisão do governo”: o facto de ter escolhido “António Sampaio da Nóvoa, figura intelectual distinta e que sempre demonstrou grande competência e sentido de Estado nos cargos que exerceu”, e a quem deseja “as maiores felicidades no Ministério que generosamente o vai acolher no seu seio”.
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Ao invés, o embaixador Martins da Cruz elogia a escolha de Sampaio da Nóvoa para órgão da ONU ligado à Educação, Ciência e Cultura e saúda a decisão de Portugal voltar a ter um representante permanente junto da UNESCO, após vários anos de interregno motivado por dificuldades financeiras, o que “significa a importância” que Lisboa dá “a uma organização vocacionada” para o ensino, a educação, a cultura e a ciência. O antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo de Durão Barroso sublinhou ao DN que “o apoio a uma agência especializada das Nações Unidas como a UNESCO é sempre importante para a nossa política externa”, sobretudo “neste momento” em que a UNESCO “atravessa uma fase difícil” com a retirada dos EUA”. E, sobre a escolha de Sampaio da Nóvoa para aquele cargo, é elogioso:
Trata-se de uma personalidade académica conhecida, com uma vida internacional grande”.
Martins da Cruz elogiou a opção governamental “como exceção e não como regra”, na medida em que aquele académico será um embaixador político e não de carreira – o que representa menos uma vaga para os diplomatas profissionais. A sua posição é esclarecedora, lembrando que ele próprio propôs uma nomeação de natureza política – Basílio Horta – para a OCDE:
Acho que em certo tipo de cargos, como a UNESCO ou a OCDE, se justifica ter, não digo sistematicamente, personalidades políticas que não sejam da carreira diplomática, como exceção e não como regra”.

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Hoje, dia 8, o Conselho de Ministros aprovou a nomeação de Sampaio da Nóvoa para a chefia da missão permanente de Portugal junto da UNESCO, depois de os diplomatas terem contestado a escolha do Governo. Refere o comunicado do Conselho de Ministros:
Foi proposta a nomeação de António Manuel Seixas Sampaio da Nóvoa para a chefia permanente de Portugal junto da Organização para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO)”.
O Ministro dos Negócios Estrangeiros reiterou que “a quem compete propor ao governo as personalidades para chefiar missões” diplomáticas é o Governo e “não uma classe profissional”. E frisou que Sampaio da Nóvoa, nomeado para representar Portugal na UNESCO, será o único “embaixador político”, repetindo aos jornalistas que “a nomeação de embaixadores que não são diplomatas, na tradição portuguesa, que é uma boa tradição, é absolutamente excecional” e que o professor Sampaio da Nóvoa, com esta nomeação, será o único chefe de missão que não é diplomata”. Respondia assim o chefe da diplomacia às críticas da ASDP sobre a escolha do professor universitário e antigo candidato às eleições presidenciais para chefiar a representação permanente de Portugal junto da UNESCO.
Para o Ministro dos Negócios Estrangeiros, o convite do Governo a Sampaio da Nóvoa assentou em “três razões essenciais”, nomeadamente a de ser “uma autoridade internacional” na educação, “uma das áreas fundamentais na missão da UNESCO”. Além disso, o executivo entende que Sampaio da Nóvoa “combina a sua experiência como académico e perito nas áreas da educação e da ciência” com uma experiência “não menos relevante de gestão e direção em instituições culturais, científicas e académicas”, nomeadamente como reitor, durante vários mandatos, da Universidade de Lisboa. E Santos Silva também apontou a experiência do professor universitário na própria organização, para a qual tem trabalhado como perito.
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A carreira na administração pública visa a eficiência e a eficácia para a sustentabilidade e a boa qualidade do serviço público e paralelamente, numa perspetiva de humanização, garantem o reconhecimento do mérito e do tempo de serviço que é prestado em prol da causa pública. Só pessoas motivadas e qualificadas podem responder cabalmente aos objetivos da administração, sem que se crie a proletarização dos servidores do Estado. Porém, é preciso acentuar a natureza instrumental e não teleológica da carreira. Se a carreira é o objetivo, temos o carreirismo nefasto, que gera a rotina, o exclusivismo e o conflito social. E o Governo não é de carreira!
Assim, em democracia e sobretudo quando estão em causa as funções de soberania, tem de haver a possibilidade de recorrer a outros critérios para opções políticas. Se é desejável que a administração se paute por critérios de normalidade e estabilidade, também é verdade que deve estar aberta a outros contributos como o das competências adquiridas em outras áreas.
E os exemplos abundam: a guerra colonial viveu em parte dos oficiais milicianos (OM) e dos elementos do quadro especial de oficiais (QEO); Paulo Macedo foi da banca para diretor-geral dos impostos; advogados e economistas foram ministros da saúde; muitos diretores-gerais e subdiretores-gerais não são de carreira. Até as universidades, cuja função é a produção de conhecimento, através da investigação e da docência, e a sua divulgação por diversos meios (publicações, seminários, conferências…) se estruturam na carreira docente (professor auxiliar, associado, sem ou com agregação, e catedrático) para o que se exige o grau de doutor. Porém, houve e ainda há muitos docentes que não são doutores e até catedráticos convidados que não são doutores.
Carreira e confiança política ou administrativa podem coexistir em democracia, sem que se abuse da confiança e esta não sirva par apagar favores, mas, baseada no mérito excecional, sirva o bem público. E fica mal a inveja corporativa excludente como se a carreira fosse um fim.
2018.02.08 – Louro de Carvalho

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