sexta-feira, 21 de abril de 2023

O Objetivo é ter ou não ter a Ucrânia e o Mar Negro na NATO

 

O secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), Jens Stoltenberg, esteve em Kiev, a 20 de abril, no âmbito da sua primeira visita à Ucrânia, depois da invasão russa iniciada em fevereiro de 2022, como revelou um alto responsável da Aliança Atlântica, confirmando as notícias referentes à visita, publicadas, na manhã daquele dia, pelo jornal ucraniano Kyiv Independent, que divulgou fotografias de Stoltenberg no centro da capital. 

As imagens divulgadas pelo portal do jornal mostram Stoltenberg na Praça de São Miguel, em Kiev, durante uma homenagem aos militares ucranianos mortos em combate. 

Efetivamente, numa altura em que as tropas ucranianas tentam manter as suas posições na cidade de Bakhmut, claramente o alvo imediato das forças russas, a visita surpresa de Jens Stoltenberg a Kiev significa a reafirmação do apoio da NATO à Ucrânia contra nova invasão da Rússia, sendo certo que os Estados que fazem parte da Aliança Atlântica fornecem à Ucrânia equipamento militar, muito embora, para a Rússia, o apoio da Aliança Atlântica e dos Estados Unidos da América (EUA) configure o envolvimento “numa guerra por procuração”. 

“A NATO está convosco hoje, amanhã e pelo tempo que for necessário”, disse Stoltenberg, numa conferência de imprensa conjunta com o presidente ucraniano, sublinhando que “a agressão russa segue um padrão tóxico que precisa de ser interrompido” e que a NATO deve “continuar a reforçar as Forças Armadas ucranianas”. E, garantindo que os Aliados concordam que o futuro de Kiev está na NATO, frisou que a prioridade é que a Ucrânia “prevaleça” na guerra, pois só então continuará a ser uma nação independente e fará sentido considerar a adesão.

Por seu turno, o presidente ucraniano, Volodymir Zelenskyy, expressou a certeza de que a Ucrânia se tornará membro da NATO e pediu que, até que isso aconteça, a Aliança estenda as garantias de segurança ao país, algo que, “se surgir a possibilidade”, poderá acontecer já na cimeira realizar em Vílnius, na Lituânia, no próximo mês de julho, pois, como vincou, “não há nenhum obstáculo objetivo que impeça a adoção de decisões políticas sobre o convite da Ucrânia para a Aliança. “Agora, quando a maioria das pessoas nos países da NATO e a maioria dos ucranianos apoiam a entrada do nosso país na Aliança, é tempo de tomar a decisão apropriada”, defendeu Zelenskyy.

Entretanto, o Kremlin aproveitou a presença do secretário-geral da NATO em Kiev para reconhecer que um dos objetivos da campanha militar russa é precisamente impedir a entrada da Ucrânia na Aliança Atlântica. “Sem dúvida. Caso contrário, representaria uma séria ameaça ao nosso país, à sua segurança”, disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, numa conferência de imprensa, em resposta a uma pergunta sobre a questão, mas evitando comentar a forma como a Rússia encara as perspetivas de adesão da Ucrânia à NATO, uma vez que “o Kremlin não tem qualquer avaliação destas perspetivas”.

E, no dia 21 de abril, a adesão da Ucrânia à NATO e o reforço da ajuda militar para travar a invasão russa foram temas centrais na reunião da Aliança Atlântica, promovida pelos EUA, na base aérea de Ramstein, na Alemanha, no âmbito do encontro do Grupo de Contacto para a Defesa da Ucrânia, que, para lá do tema abordado, assinalou o primeiro aniversário da sua criação.

Com efeito, à chegada a Ramstein, Jens Stoltenberg, falou sobre a adesão da Ucrânia à NATO. “Eu disse ontem, em Kiev, que o futuro da Ucrânia está na família euro-atlântica e todos os aliados concordam que a Ucrânia se tornará membro da NATO. Mas o mais importante agora, claro, é garantir que a Ucrânia prevaleça.”

O secretário-geral da NATO relatou que, no dia 20, estivera com Volodymyr Zelenskyy na capital da Ucrânia, tendo ouvido os argumentos que deve transmitir aos aliados, entre eles, o forte desejo ucraniano de receber um convite formal na cimeira de julho da NATO, que decorrerá em Vílnius, onde os Estados-membros vão debater uma maior integração da Ucrânia vão debater uma maior integração da Ucrânia. Na verdade, este país candidatou-se à “adesão acelerada” à NATO a 30 de setembro. Veremos se virá a aderir ao bloco atlântico em breve.

Para Zelenskyy, esse caminho é óbvio: “Nem a maioria dos ucranianos, nem a maioria dos europeus, nem a maioria das pessoas da NATO compreenderão os líderes da Aliança, se a cimeira de Vilnius não incluir um convite político bem merecido, para que a Ucrânia adira à Aliança. A Ucrânia fez tudo para assegurar que a nossa candidatura seja concedida”, afirmou.

O presidente da Ucrânia, que também participou na reunião de Ramstein, tem vindo a pedir aviões, tanques e, agora, também armas de longo alcance para a Ucrânia se proteger dos ataques aéreos russos. E Zelenskyy, que falou a vários Parlamentos de vários países europeus a pedir ajuda e visitou o Reino Unido e a sede da União Europeia (UE), nomeadamente a Comissão e o Parlamento, ora agradece a ajuda, ora diz que deveria ser maior, como pede mais determinação ou critica o facto de a UE nem sempre se mostrar unida em torno do apoio ao seu país.

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Segundo o Portal do Governo, a ministra da Defesa Nacional, Helena Carreiras, também esteve presente em Ramstein, na dita reunião do Grupo de Contacto para a Defesa da Ucrânia.

Nesse encontro, a governante portuguesa anunciou que Portugal vai enviar para a Ucrânia um conjunto de cinco viaturas blindadas de socorro e de apoio médico no teatro de operações. Trata-se de três blindados do tipo M113, em versão preparada para o transporte de feridos, e de dois blindados do tipo M577, em versão médica, isto é, vocacionada para a montagem de postos avançados de socorro. 

Com esta nova doação, que se encontra em preparação para envio, eleva-se para cerca de 770 toneladas o total de equipamento militar, letal e não letal, fornecido por Portugal à Ucrânia desde o início da agressão perpetrada pela Rússia. 

Em articulação com as nossas Forças Armadas, o Governo português enviou para a Ucrânia carros de combate Leopard 2A6, viaturas blindadas M113, veículos aéreos não tripulados de vigilância, armamento e munições, geradores de grande capacidade para produção de energia elétrica, equipamento de proteção individual e de comunicações, equipamento médico e sanitário, e kits de primeiros socorros em combate. 

Além disso, Helena Carreiras informou da disponibilidade de Portugal para fornecer às Forças Armadas ucranianas munições de calibre 105mm.

Perante os parceiros e aliados reunidos em Ramstein, a ministra portuguesa reafirmou o compromisso do país com a defesa da soberania e da integridade da Ucrânia, estando o Ministério da Defesa Nacional (MDN) e o Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA) em constante contacto com as autoridades ucranianas e analisando as solicitações de Kiev, a que Portugal corresponderá na medida das suas capacidades e disponibilidades.

Durante a manhã, os ministros da Defesa da NATO (ou os seus representantes) dos países que têm carros de combate Leopard reuniram-se para discutir formas de apoiar a Ucrânia na sustentação logística da capacidade militar recém-formada pelas doações dos parceiros e aliados, através da criação de um centro de apoio e manutenção. 

No âmbito da missão da UE de assistência militar à Ucrânia (EUMAM-UA), cinco militares portugueses estão a providenciar formação e treino na área médica a soldados ucranianos, na Alemanha, até final de abril. Anteriormente, em fevereiro, três militares integraram um primeiro grupo de observadores. E, de acordo com o planeamento da EUMAM-UA, prevêem-se, para junho, novas ações de formação por militares portugueses, nas áreas de instrução militar e de inativação de engenhos explosivos.

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Está visto que o grande móbil da guerra, além da disputa do patrulhamento do Ártico, que já tenho referido (intensificada pelo degelo daquele Oceano polar) é, para a Rússia, travar/impedir o avanço da NATO para Leste e assegurar o monopólio da utilização do Mar Negro; e, para a Ucrânia, tornada ponta de lance da NATO e dos EUA, a que a UE se subordina, é consolidar e estender a NATO o mais possível. Isto não tira nada ao ónus que impende sobre a Rússia enquanto país agressor e invasor. Apenas significa o testemunho da ambição mútua.    

Todavia, há outro dado. A Ucrânia pretende ser incluída na NATO e, contando com a cooperação ativa da Roménia e da Moldávia, quer assumir-se, com estes países, como um bloco unido face à ameaça da Rússia, com a qual fazem fronteira.

Assim, na Conferência sobre a segurança do Mar Negro, que decorreu em Bucareste, a 14 de abril, os três países assinaram acordos de cooperação para fortalecer a proteção regional.

Com efeito, Mais de 250 líderes políticos e militares, não só da Europa, tentaram encontrar uma forma de restaurar a ordem internacional natural na região do Mar Negro. O problema, para muitos, tem uma solução simples: a retirada da Rússia da Ucrânia e a recuperação de todos os territórios ocupados, incluindo a Península da Crimeia. Isso permitiria nova configuração da segurança no Mar Negro. Até lá, a Roménia, como muitos outros países, fica do lado da Ucrânia.

A vice-ministra dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia, Emine Dzhaparova, pediu aos Estados parceiros para serem “mais decididos ao sancionar a Rússia”. “Como dizemos na Ucrânia: tudo começou na Crimeia e tudo se deve resolver na Crimeia. A Crimeia ensinou-nos a lição de que Vladimir Putin considera uma fraqueza a linguagem de apaziguamento. A sugestão que vem da Ucrânia e tem sido apoiada pela Roménia e [pela] Moldávia, [bem como por]  muitos outros países, é que temos de ser um pouco mais decididos quando se trata de isolar e sancionar a Rússia.”

A região do Mar Negro é vital para o futuro da segurança europeia e para a defesa coletiva da NATO. Por isso, a este propósito, o chefe da diplomacia ucraniana, Dmytro Kuleba, pediu a desmilitarização do Mar Negro, mas, por outro lado, referiu que chegou o momento de este se tornar um “mar da NATO”, tal como o Mar Báltico.

Por seu turno, o porta-voz do KremlinDmitri Peskov, diz que isso nunca acontecerá e fala em contradições de Kiev. Lembrou que a alegação de que o Mar Negro deve ser desmilitarizado e tornar-se um mar da NATO “são conceitos opostos”.

Enquanto se mantiverem estes objetivos por parte da Rússia e por parte da NATO, a Ucrânia ficará enredada no conflito, que nunca deveria ter começado. E as tentativas de mediação de uma paz negociada – seja da China e da França, seja do Brasil e do G20 preconizado por Lula da Silva – pouco adiantarão. Mas a paz é desejável e, desde que haja disponibilidade à cedência, é possível.

2023.04.21 – Louro de Carvalho

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