Em
Português, usamos o termo “infante” para designar a criança de tenra idade, o
filho de rei que não estava na primeira linha da sucessão e o militar do
exército que integra a arma de infantaria.
O
vocábulo provém do Latim “infans, infantis” (prefixo “-in”, com sentido de negação,
e o particípio presente do verbo deponente “fari”, que significa “falar”) e
aplica-se a quem que não fala em termos físicos e, por extensão, a quem não tem
voz ativa ou voto na matéria em causa.
Assim,
utilizamos o nome “infante” (palavra igual para o masculino e para o feminino) para
designar a criança que ainda não fala, mesmo que já saiba andar. E, nestes
termos, fala-se do Menino Jesus como o Divino
Infante ou o Infante Suavíssimo. E
aplica-se o nome cognato “infância” (do Latim, “infantia, infantiae”, incapacidade de
falar, meninice) ao período mais lato em que as crianças até já falam, mas não têm
capacidade de discernimento e de decisão. Neste sentido, a Igreja católica tem
a Obra da Santa Infância e o Estado
Novo tinha a Obra da Infância Desvalida.
Paralelamente, temos o nome cognato “infantário”, como sinónimo de creche (lugar
de acolhimento de crianças pequeninas, com berçário, sala de marcha e sala de transição),
e a expressão “jardim de infância” para indicar a escola para as crianças mais
pequenas até aos seis anos de idade (educação pré-escolar). Empregamos o adjetivo
cognato “infantil” e o nome cognato “infantilidade” para caraterizar a criança
ou a atitude de adulto que, pelas suas atitudes ou comportamentos, se assemelhe
à criança – criancice –, como empregamos os nomes cognatos “infanticídio” e “infanticida”
(do nome latino “infans, infantis” e o verbo “caedere”, cortar, matar) para
designar, respetivamente, o homicídio de criança, sobretudo se se tratar de um recém-nascido,
e aquele e aquela que pratique tal homicídio.
Em
Francês, ocorrem, por exemplo, os termos “enfant” e “enfançon”, para “criança”,
“enfantement”, para “parto”, e “enfantillage”, para “criancice” ou “infantilidade”.
Desde
o longínquo ano de 972, tratavam-se, em Portugal (e ainda hoje isso acontece em
Espanha), por infantes/as os filhos (infantes) e as filhas (infantas) que não
estavam na linha direta da sucessão. E tivemos a “Casa do Infantado”, Criada pelo rei D. João IV, em 1654-1655, e
extinta em 1834, que era um conjunto de bens materiais, propriedades e
rendimentos, vasto património senhorial, na sua maioria confiscados aos
apoiantes de Espanha no período da restauração da Independência. E hoje
temos o “Centro de Acolhimento Temporário Casa do Infantado”, que iniciou a sua
atividade a 11 de julho de 1994, em instalações cedidas, através de um contrato
de comodato, pela Câmara Municipal de Loures, na zona do Infantado, e que acolhe
12 crianças de ambos os sexos, com idades compreendidas entre os 0 e os 12 anos.
Durante o Estado Novo, o nome de infante era atribuído aos
rapazes com idades compreendidas entre os 10 e os 14 anos, filiados na Mocidade
Portuguesa, uma estrutura paramilitar, propedêutica e congénere da sua versão
adulta, a Legião Portuguesa, que podia ser chamada a combater no âmbito da
Defesa Civil do Território ou como suplemento à ação das Forças Armadas.
Também
vemos o vocábulo “infanção” utilizado como título nobiliárquico que designava
os jovens nobres que pertenciam à classe situada entre a de fidalgo e a de
cavaleiro.
Estamos
a ver, por estes dois parágrafos, já alguma ligação semântica e histórica do
infante à arma de infantaria. Com efeito, infante é também o soldado de
infantaria, a arma do exército que treina os militares para a marcha a pé. Em
Latim, “infantaria” era “peditatus, us”, a força armada cujos componentes
combatiam a pé e progrediam no terreno. Os seus elementos eram os “pedites” (peões
– de “pedes, peditis”), que andavam a pé (do nome “pes, pedis”, pé). No sentido
de soldado que anda a pé, “infantaria” remonta ao Italiano “fante”, que remete
para o Latim “fans, fantis”. Assim, um fante, na Idade Média, era um criado de
pouca idade. E, com o tempo, o vocábulo passou a designar os criados dos
militares de cavalaria (“equitatus, us”, de “eques, equitis”, cavaleiro, e “equus,
i”, cavalo), seguindo estes a cavalo e aqueles a pé. Ainda hoje se diz, no exército,
da supremacia da cavalaria sobre a infantaria, mas esquece-se que é a
infantaria que logra a progressão no terreno e garante a sua ocupação, enquanto
boa tropa de quadrícula.
Como
não seriam poucas as vezes em que cavaleiros e peões acabavam por se envolver
na refrega, chamava-se “fante” ao peão, que se designa “fantassin” em Francês. Em
Italiano, também se chama “fante” à carta que, entre nós, é conhecida por
valete.
Então, o
termo “infantaria” provém da palavra “infante”, que significa criança nos idiomas
antigos Grego (“paidíon, paidíou”) e Latim (“infans, infantis”). No Grego,
significa o ou a que não se manifesta ou não pode se manifestar. No Latim,
significa o ou a que não fala, mas caminha. Em ambos os idiomas, o infante
deve obedecer sem reclamar.
Em todas as
épocas, os soldados a pé sempre foram os mais sacrificados nas lides
guerreiras. Fosse por terem de carregar pessoalmente as suas armas e
utensílios, fosse por estarem mais expostos, pela menor mobilidade, às
agressões inimigas, as suas atividades eram muito arriscadas.
Cabe à
infantaria o papel indispensável, numa campanha, de ocupar o terreno, função
que nunca desaparecerá enquanto houver guerras. Mas, dadas as dificuldades que
o soldado de tal arma enfrenta, foi comparado à criança, ao infante, que se apresenta restrito em suas capacidades de
sobrevivência. Por outro lado, a infantaria, quando empreende o assalto, tem de
valer-se do sorrateirismo e do silêncio. Obviamente, no incitamento à ação ou
em caso de perigo extremo, haverá palavras de ordem e o grito de cada unidade
ou subunidade.
Também
é recorrentemente empregue, em Português, a palavra “fantoche” para indicar o
boneco que não fala ou que se limita a ser a voz de quem fala como se fosse ele
a falar. É um termo que entrou na nossa língua através do Francês e que se diz,
em Italiano, “fantoccio”. Não é por acaso que se chama, com o pejorativo “fantoche”,
quem não é capaz de exprimir as suas ideias, pelo que, não se exprimindo
verbalmente, acaba por ter de fazer o que outros lhe imponham.
***
A infantaria é a arma mais antiga
do exército e, geralmente, dotada dos maiores efetivos, formada por
soldados que podem combater em todos os tipos de terreno e em quaisquer
condições meteorológicas, podendo usar variados meios de transporte para
chegarem à frente de combate. Tem por missão a conquista e amanutenção do
terreno, com a capacidade de progredir em pequenas frações, de difícil deteção
e grande mobilidade. Contemporaneamente, emprega o princípio de fogo e
movimento para atingir uma posição dominante em relação à do inimigo.
Agrupa as
tropas em unidades chamadas de divisões, brigadas, batalhões, companhias e
pelotões.
A infantaria é,
desde a antiguidade, a principal força combativa de um exército. A notável
exceção é das sociedades nómades, como os Hunos e Mongóis, que lutavam com
soldados a cavalo.
A infantaria
tradicional tem as suas origens nos combatentes gregos e romanos, que lutavam
em grupos compactos, armados de espadas e lanças e protegidos por couraças e
elmos metálicos. A legião romana aperfeiçoou a sua organização em unidades e
subunidades, o que hoje é base da organização dos exércitos. A legião dividia-se
em 10 coortes, que se dividiam em número variável de centúrias, que eram
compostas por cerca de 100 homens cada. A variar em função do período
histórico, a legião romana podia ter entre 3 mil a 6 mil homens.
Com o surgimento
das armas de fogo, no final da Idade Média, a infantaria passa a ter
organização tática e emprego diferente, sendo empregada em linhas contínuas de
atiradores, lado a lado que se contrapunham à outra linha, em frente do
inimigo. Como os arcabuzes e os mosquetes tinham cadência de tiro muito
lenta, os atiradores eram complementados por outras tropas armadas com armas brancas,
longas lanças, chamadas piques. Com o tempo, as armas de fogo aperfeiçoaram-se e
os piqueiros desapareceram, sendo o seu papel substituído pela baioneta,
uma lâmina afiada que é adaptada na boca do fuzil para proceder ao combate
corpo-a-corpo.
A evolução e o
aumento da capacidade das armas de fogo, bem como o desenvolvimento da
artilharia (no século XIX), com as armas a ter maior alcance e maior número de
disparos por minuto, levaram à alteração do emprego da infantaria. Nas guerras
de Secessão, do Paraguai e Franco-Prussiana, os infantes atuavam somente em
linha e cavavam trincheiras para proteção. A I Guerra Mundial ficou
conhecida como a guerra das trincheiras, pois o poder de fogo da artilharia e
das metralhadoras barrou o movimento da infantaria. Apesar de, na II Guerra
Mundial, os carros de combate da cavalaria terem papel importante nas
grandes ofensivas, a infantaria ainda era a mais numerosa das armas e
responsável pela ocupação e manutenção do terreno tomado ao inimigo. E, ao ser
transportada em veículos, passou a ser infantaria motorizada ou mecanizada.
Formas
especializadas de infantaria são o fuzileiro naval, os rangers e os
comandos, que combatem em condições excecionais, muitas delas fora do
tradicionalmente convencionado.
***
Enfim, um
exemplo de como um vocábulo tão inocente tem um ambiente tão vasto.
2022.06.18 – Louro de Carvalho
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