Após 4 dias
em debate e votações na especialidade, o Orçamento do Estado para 2021 (OE 21) foi aprovado em votação final neste dia 26 de
novembro, com os votos contra do PSD, BE (Bloco de Esquerda), CDS-PP, Chega e IL (Iniciativa Liberal), com as abstenções do PEV (Partido
Ecologista Os Verdes), PAN, PCP e
as deputadas não inscritas e com os votos favoráveis unicamente do PS.
Quanto à
abstenção do PEV, anunciada neste dia, antes do debate na Assembleia da
República (AR), a deputada Mariana Silva frisou
que é “um voto em defesa das pessoas”, deixando “uma imensa responsabilidade
nas mãos do Governo, que com este Orçamento fica obrigado a responder aos
anseios das populações” e prometendo a cobrança futura por parte do seu partido.
Também o PAN
apresentou o seu sentido de voto na manhã deste dia, antes de chegar à AR,
explicando que iria viabilizar o OE 21 pela abstenção, tendo em conta o “caminho
que foi feito” e “as conquistas do PAN em sede da especialidade”. E, a este
respeito, a deputada Inês Sousa Real esclareceu que este orçamento “não é o mesmo
que aqui entrou”, como defendeu André Silva, presidente do PAN, na sua
intervenção na AR.
De igual
modo, os comunistas optaram por abster-se nesta votação final. O líder,
que admitia, a 13 de novembro, que podia votar contra o OE, sublinhou que
o partido denunciou as mais “profundas” insuficiências presentes na proposta do
OE para 2021”. Além disso, Jerónimo de Sousa salientou que o atual documento que
vigorará em 2021 e define apoios para diversas áreas “não responde às
necessidades do país”.
O BE, reunido
no dia 25 à noite, confirmou o voto contra, conforme fora proposto pela
Comissão Política, sustentando que o partido se empenhou na negociação do
OE 2021 durante vários meses, mas que o Governo se manteve “intransigente em
matérias centrais”. E
Catarina Martins assegurou, no
Parlamento, que “no momento em que votamos o Orçamento do Estado para 2021, ele
já está desatualizado” e garantiu que “o que conta não é as peripécias do
debate na especialidade”, fenómeno “tão fugaz como o verão de São Martinho, que
já passou”.
Do lado do
CDS-PP, João Almeida considerou que a votação na especialidade foi “uma verdadeira
negociata”, sintomática dum “Governo sem rumo”. Para o deputado centrista, o documento
aprovado é o “resultado de uma manta de retalhos, capaz de ignorar problemas
centrais”, tendo o partido contribuído para a resposta, apesar de este não ser
o seu orçamento.
E Isaura
Morais, do PSD, apontou que o partido ia votar contra, vincando:
“Se o PSD votou contra este Orçamento na generalidade, então hoje na
votação global o nosso voto é contra e ainda mais convicto. Se no início da
proposta orçamental só olhava para o presente e esquecia o dia de amanhã, o Orçamento
de Estado para 2021 numa versão final ainda compromete mais o nosso futuro
coletivo.”.
Para a IL, o
debate apenas serviu “para mostrar a enorme desorientação do Governo, que não
sabe o que anda a fazer no combate à pandemia”, notando que “não tem ideia ou
estratégia para recuperar a economia”. E João Cotrim Figueiredo frisou que “este
orçamento mostra que o PS gere mal o OE em tempos de vacas gordas e
pessimamente em tempos de vacas magras”.
Do lado do
PS, alinhada com o Governo, Ana Catarina Mendes, líder da bancada, elogia PCP,
PEV, PAN e as deputadas não inscritas, enaltece o seu próprio grupo
parlamentar, pois “a aprovação do OE 21 significa aprovar um instrumento
essencial no combate à crise”. E,
olhando para Rui Rio, atira:
“Com mais responsabilidade e com mais calma é preciso olhar o país.
Estamos num momento difícil. Não é um momento para tanta brincadeira e tão
pouca seriedade neste debate.”.
***
Assim, com a
votação final da proposta de Lei º 61/XIV (Orçamento do Estado 2021), terminou a discussão dum vasto leque de medidas
focadas no combate à pandemia que, para lá do reforço da saúde, pretende
proteger as famílias e apoiar a economia e o emprego.
Nestes
termos e no âmbito da proteção dos trabalhadores, são de
considerar vários itens: apoio
extraordinário ao rendimento, aumento do valor mínimo do subsídio de desemprego,
complemento ao subsídio social de desemprego, prorrogação do apoio à
desproteção económica e social, suspensão da caducidade dos contratos coletivos,
reforço do setor laboral e suplemento de insalubridade e penosidade.
O apoio
extraordinário ao rendimento
atingirá quem perdeu o emprego ou teve quebra significativa na sua
atividade e tem como valor de referência o limiar da pobreza, fixado em 501
euros. Para ter direito ao apoio, terá de cumprir requisitos, como: trabalhar
por conta de outrem (incluindo trabalhadores domésticos e trabalhadores
independentes economicamente dependentes) e ter
ficado sem emprego e sem direito a subsídio de desemprego (ou ter-se
esgotado este); ou trabalhar
por conta própria e ter sofrido uma quebra de rendimentos de, pelo menos, 40%.
O aumento do valor mínimo do
subsídio de desemprego será para um
montante acima do limiar da pobreza (501 euros) para os trabalhadores que recebiam, pelo menos, o
salário mínimo.
O complemento ao subsídio social de
desemprego atingirá quem recebe
o subsídio social de desemprego, correspondendo ao valor da diferença para
o novo apoio extraordinário.
A prorrogação do apoio à
desproteção económica e social abrangerá as
pessoas que não estão obrigatoriamente abrangidas por um regime de segurança social,
nacional ou estrangeiro e que declarem o início ou reinício de atividade
independente junto da administração fiscal.
A suspensão da caducidade dos
contratos coletivos visa
suspender os prazos para a caducidade na contratação coletiva quando não há
acordo para a sua substituição, nem renovação prevista.
O reforço do setor laboral
incidirá nas políticas de emprego e formação
profissional, bem como em apoios adicionais à contratação, sobretudo de jovens
e para PME (Pequenas e Médias Empresas).
O suplemento de insalubridade e
penosidade fará o aumento dos
suplementos remuneratórios e das compensações que se fundamentem na prestação
de trabalho em condições de risco, penosidade e insalubridade, abrangendo os
trabalhadores em funções públicas nas autarquias locais nos setores da higiene
urbana e saneamento que, pela natureza das funções e dos objetos utilizados ou
fatores ambientais, estejam expostos a maior probabilidade de ocorrência de
lesão física, psíquica ou patrimonial, e suscetíveis à degradação do seu estado
de saúde.
No âmbito da defesa dos
rendimentos, são de considerar: aumento do salário mínimo, aumento
extraordinário nas pensões, diminuição das taxas de retenção na fonte,
baixa do IVA da eletricidade, devolução do IVA aos consumidores, oportunidades
de carreira e creche gratuita.
O aumento do salário mínimo
virá em linha com o aumento médio dos
últimos anos, mantendo-se o objetivo de atingir os 750 euros em 2023. Embora
ainda esteja em discussão na concertação social, desenha-se a possibilidade de um
aumento de 23,75 euros face a 2020, passando de 635 euros para 659 euros.
O aumento extraordinário nas
pensões atingirá os
pensionistas que recebem até 1,5 do montante do IAS (658 euros) com um aumento extraordinário de 10 euros, a partir
de 2021, ou 6 euros caso as respetivas pensões tenham sido atualizadas entre
2011 e 2015.
A diminuição das taxas de retenção
na fonte garantirá às
famílias liquidez adicional.
A baixa do IVA da eletricidade é aplicável até 100 kWh – ou no caso de famílias
numerosas até 150 kWh –, o que permitirá uma poupança significativa.
A devolução do IVA aos consumidores
aplicar-se-á no caso de despesas de
restauração, alojamento e cultura, através dum crédito fiscal em vouchers, para
gastar nesses setores.
Serão
criadas oportunidades de carreira,
tais como promoções, progressões, atualizações e novas contratações, para
aumentar em 3% a massa salarial na Administração Pública.
A medida de creche gratuita visa todos os filhos das famílias no 1.º e 2.º
escalões de rendimento da comparticipação familiar, ou seja, que recebam até
30% da remuneração mínima mensal ou entre 30% a 50%, respetivamente.
No âmbito do reforço da saúde,
consideram-se: subsídio extraordinário de risco para os profissionais de saúde,
isenção de taxas moderadoras e investimento nos cuidados de saúde.
O subsídio
extraordinário de risco para os profissionais de saúde atingirá os que se encontram na linha
da frente no combate à covid-19 e terá um valor de 20% do salário base, mas com
o montante máximo de 219 euros.
A isenção de pagamento de taxas
moderadoras alargar-se-á aos exames
complementares de diagnóstico e terapêutica, prescritos no âmbito dos cuidados
de saúde primários.
O investimento nos cuidados de
saúde vai aumentar muito
significativamente, sendo alargada a rede de cuidados continuados integrados e
um reforçando o Programa de Saúde Mental.
No campo de outras medidas,
foram definidas as atinentes ao combate às alterações climáticas, à densificação e reforço da oferta de transportes
públicos, à manutenção dos passes sociais mais baratos e ao lançamento dum novo
programa de investimento em equipamentos sociais da rede pública e setor
social, atingindo as áreas de apoio à infância, idosos e pessoas com
deficiência.
***
Parece que
foi difícil ter a AR, que, há uns anos a esta parte, se afirma como o centro do
poder, produzido o principal instrumento previsional da gestão da República. Embora
não fosse muito dramática em democracia a governação estribada nos duodécimos
corrigidos do orçamento anterior, seria estranho que os nossos representantes “onerosos”
não dessem luz verde ao Governo para gerir a coisa pública sem ter de andar de
credo na boca, dada a crise pandémica que assola o país e o mundo.
Como é
natural, o orçamento em si não resolve os problemas do país, mas serve de lastro
à boa governança, que terá de garantir a eficaz execução física e financeira das
medidas selecionadas respondendo aos problemas mais gravosos do curto prazo e estruturando
o país para resistir a todos os embates do médio e longo prazo. É óbvio que
umas medidas são insuficientes e outras pecam por tardias. Porém, é na
dialética entre o necessário e desejável e o possível que marcha a civilização sob
a égide da conveniente ação política, a qual não pode deixar-se condicionar
pelo economicismo dos interesses instalados e da apetência dos grandes, bem
como pelos caprichos dum capitalismo especulativo sem nome e sem rosto.
O debate
revelou, a teimosia do Governo nalguns pontos, o irrealismo e capricho dalgumas
oposições e o temor da entrega prematura do executivo a forças que o exerceram,
sem vislumbre de alternativa, na linha da cega austeridade punitiva de quem
vivera “acima das possibilidades”, alegando os governantes a força da “inevitabilidade”.
Resta saber se a atual opção despesista da UE não será reedição da de 2009,
para vir, depois, castigar os países economicamente débeis.
2020.11.26 – Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário