quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Orçamento do Estado para 2021 aprovado com votos favoráveis do PS

 

Após 4 dias em debate e votações na especialidade, o Orçamento do Estado para 2021 (OE 21) foi aprovado em votação final neste dia 26 de novembro, com os votos contra do PSD, BE (Bloco de Esquerda), CDS-PP, Chega e IL (Iniciativa Liberal), com as abstenções do PEV (Partido Ecologista Os Verdes), PAN, PCP e as deputadas não inscritas e com os votos favoráveis unicamente do PS.

Quanto à abstenção do PEV, anunciada neste dia, antes do debate na Assembleia da República (AR), a deputada Mariana Silva frisou que é “um voto em defesa das pessoas”, deixando “uma imensa responsabilidade nas mãos do Governo, que com este Orçamento fica obrigado a responder aos anseios das populações” e prometendo a cobrança futura por parte do seu partido.

Também o PAN apresentou o seu sentido de voto na manhã deste dia, antes de chegar à AR, explicando que iria viabilizar o OE 21 pela abstenção, tendo em conta o “caminho que foi feito” e “as conquistas do PAN em sede da especialidade”. E, a este respeito, a deputada Inês Sousa Real esclareceu que este orçamento “não é o mesmo que aqui entrou”, como defendeu André Silva, presidente do PAN, na sua intervenção na AR.

De igual modo, os comunistas optaram por abster-se nesta votação final. O líder, que admitia, a 13 de novembro, que podia votar contra o OE, sublinhou que o partido denunciou as mais “profundas” insuficiências presentes na proposta do OE para 2021”. Além disso, Jerónimo de Sousa salientou que o atual documento que vigorará em 2021 e define apoios para diversas áreas “não responde às necessidades do país”.

O BE, reunido no dia 25 à noite, confirmou o voto contra, conforme fora proposto pela Comissão Política, sustentando que  o partido se empenhou na negociação do OE 2021 durante vários meses, mas que o Governo se manteve “intransigente em matérias centrais”. E Catarina Martins assegurou, no Parlamento, que “no momento em que votamos o Orçamento do Estado para 2021, ele já está desatualizado” e garantiu que “o que conta não é as peripécias do debate na especialidade”, fenómeno “tão fugaz como o verão de São Martinho, que já passou”.

Do lado do CDS-PP, João Almeida considerou que a votação na especialidade foi “uma verdadeira negociata”, sintomática dum “Governo sem rumo”. Para o deputado centrista, o documento aprovado é o “resultado de uma manta de retalhos, capaz de ignorar problemas centrais”, tendo o partido contribuído para a resposta, apesar de este não ser o seu orçamento.

E Isaura Morais, do PSD, apontou que o partido ia votar contra, vincando:

Se o PSD votou contra este Orçamento na generalidade, então hoje na votação global o nosso voto é contra e ainda mais convicto. Se no início da proposta orçamental só olhava para o presente e esquecia o dia de amanhã, o Orçamento de Estado para 2021 numa versão final ainda compromete mais o nosso futuro coletivo.”.

Para a IL, o debate apenas serviu “para mostrar a enorme desorientação do Governo, que não sabe o que anda a fazer no combate à pandemia”, notando que “não tem ideia ou estratégia para recuperar a economia”. E João Cotrim Figueiredo frisou que “este orçamento mostra que o PS gere mal o OE em tempos de vacas gordas e pessimamente em tempos de vacas magras”.

Do lado do PS, alinhada com o Governo, Ana Catarina Mendes, líder da bancada, elogia PCP, PEV, PAN e as deputadas não inscritas, enaltece o seu próprio grupo parlamentar, pois “a aprovação do OE 21 significa aprovar um instrumento essencial no combate à crise”.  E, olhando para Rui Rio, atira:

Com mais responsabilidade e com mais calma é preciso olhar o país. Estamos num momento difícil. Não é um momento para tanta brincadeira e tão pouca seriedade neste debate.”.

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Assim, com a votação final da proposta de Lei º 61/XIV (Orçamento do Estado 2021), terminou a discussão dum vasto leque de medidas focadas no combate à pandemia que, para lá do reforço da saúde, pretende proteger as famílias e apoiar a economia e o emprego.

Nestes termos e no âmbito da proteção dos trabalhadores, são de considerar vários itens: apoio extraordinário ao rendimento, aumento do valor mínimo do subsídio de desemprego, complemento ao subsídio social de desemprego, prorrogação do apoio à desproteção económica e social, suspensão da caducidade dos contratos coletivos, reforço do setor laboral e suplemento de insalubridade e penosidade.

O apoio extraordinário ao rendimento atingirá quem perdeu o emprego ou teve quebra significativa na sua atividade e tem como valor de referência o limiar da pobreza, fixado em 501 euros. Para ter direito ao apoio, terá de cumprir requisitos, como: trabalhar por conta de outrem (incluindo trabalhadores domésticos e trabalhadores independentes economicamente dependentes) e ter ficado sem emprego e sem direito a subsídio de desemprego (ou ter-se esgotado este); ou trabalhar por conta própria e ter sofrido uma quebra de rendimentos de, pelo menos, 40%.

O aumento do valor mínimo do subsídio de desemprego será para um montante acima do limiar da pobreza (501 euros) para os trabalhadores que recebiam, pelo menos, o salário mínimo.

O complemento ao subsídio social de desemprego atingirá quem recebe o subsídio social de desemprego, correspondendo ao valor da diferença para o novo apoio extraordinário.

A prorrogação do apoio à desproteção económica e social abrangerá as pessoas que não estão obrigatoriamente abrangidas por um regime de segurança social, nacional ou estrangeiro e que declarem o início ou reinício de atividade independente junto da administração fiscal.

A suspensão da caducidade dos contratos coletivos visa suspender os prazos para a caducidade na contratação coletiva quando não há acordo para a sua substituição, nem renovação prevista.

O reforço do setor laboral incidirá nas políticas de emprego e formação profissional, bem como em apoios adicionais à contratação, sobretudo de jovens e para PME (Pequenas e Médias Empresas).

O suplemento de insalubridade e penosidade fará o aumento dos suplementos remuneratórios e das compensações que se fundamentem na prestação de trabalho em condições de risco, penosidade e insalubridade, abrangendo os trabalhadores em funções públicas nas autarquias locais nos setores da higiene urbana e saneamento que, pela natureza das funções e dos objetos utilizados ou fatores ambientais, estejam expostos a maior probabilidade de ocorrência de lesão física, psíquica ou patrimonial, e suscetíveis à degradação do seu estado de saúde.

No âmbito da defesa dos rendimentos, são de considerar: aumento do salário mínimo, aumento extraordinário nas pensões, diminuição das taxas de retenção na fonte, baixa do IVA da eletricidade, devolução do IVA aos consumidores, oportunidades de carreira e creche gratuita.

O aumento do salário mínimo virá em linha com o aumento médio dos últimos anos, mantendo-se o objetivo de atingir os 750 euros em 2023. Embora ainda esteja em discussão na concertação social, desenha-se a possibilidade de um aumento de 23,75 euros face a 2020, passando de 635 euros para 659 euros.

O aumento extraordinário nas pensões atingirá os pensionistas que recebem até 1,5 do montante do IAS (658 euros) com um aumento extraordinário de 10 euros, a partir de 2021, ou 6 euros caso as respetivas pensões tenham sido atualizadas entre 2011 e 2015.

A diminuição das taxas de retenção na fonte garantirá às famílias liquidez adicional.

A baixa do IVA da eletricidade é aplicável até 100 kWh – ou no caso de famílias numerosas até 150 kWh –, o que permitirá uma poupança significativa.

A devolução do IVA aos consumidores aplicar-se-á no caso de despesas de restauração, alojamento e cultura, através dum crédito fiscal em vouchers, para gastar nesses setores.

Serão criadas oportunidades de carreira, tais como promoções, progressões, atualizações e novas contratações, para aumentar em 3% a massa salarial na Administração Pública.

A medida de creche gratuita visa todos os filhos das famílias no 1.º e 2.º escalões de rendimento da comparticipação familiar, ou seja, que recebam até 30% da remuneração mínima mensal ou entre 30% a 50%, respetivamente.

No âmbito do reforço da saúde, consideram-se: subsídio extraordinário de risco para os profissionais de saúde, isenção de taxas moderadoras e investimento nos cuidados de saúde.

O subsídio extraordinário de risco para os profissionais de saúde atingirá os que se encontram na linha da frente no combate à covid-19 e terá um valor de 20% do salário base, mas com o montante máximo de 219 euros.

A isenção de pagamento de taxas moderadoras alargar-se-á aos exames complementares de diagnóstico e terapêutica, prescritos no âmbito dos cuidados de saúde primários.

O investimento nos cuidados de saúde vai aumentar muito significativamente, sendo alargada a rede de cuidados continuados integrados e um reforçando o Programa de Saúde Mental.

No campo de outras medidas, foram definidas as atinentes ao combate às alterações climáticas, à densificação e reforço da oferta de transportes públicos, à manutenção dos passes sociais mais baratos e ao lançamento dum novo programa de investimento em equipamentos sociais da rede pública e setor social, atingindo as áreas de apoio à infância, idosos e pessoas com deficiência.

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Parece que foi difícil ter a AR, que, há uns anos a esta parte, se afirma como o centro do poder, produzido o principal instrumento previsional da gestão da República. Embora não fosse muito dramática em democracia a governação estribada nos duodécimos corrigidos do orçamento anterior, seria estranho que os nossos representantes “onerosos” não dessem luz verde ao Governo para gerir a coisa pública sem ter de andar de credo na boca, dada a crise pandémica que assola o país e o mundo.

Como é natural, o orçamento em si não resolve os problemas do país, mas serve de lastro à boa governança, que terá de garantir a eficaz execução física e financeira das medidas selecionadas respondendo aos problemas mais gravosos do curto prazo e estruturando o país para resistir a todos os embates do médio e longo prazo. É óbvio que umas medidas são insuficientes e outras pecam por tardias. Porém, é na dialética entre o necessário e desejável e o possível que marcha a civilização sob a égide da conveniente ação política, a qual não pode deixar-se condicionar pelo economicismo dos interesses instalados e da apetência dos grandes, bem como pelos caprichos dum capitalismo especulativo sem nome e sem rosto.

O debate revelou, a teimosia do Governo nalguns pontos, o irrealismo e capricho dalgumas oposições e o temor da entrega prematura do executivo a forças que o exerceram, sem vislumbre de alternativa, na linha da cega austeridade punitiva de quem vivera “acima das possibilidades”, alegando os governantes a força da “inevitabilidade”. Resta saber se a atual opção despesista da UE não será reedição da de 2009, para vir, depois, castigar os países economicamente débeis.  

2020.11.26 – Louro de Carvalho

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